Capacitação profissional é a chave para
um bom diagnóstico
A epilepsia
não é uma doença específica, mas sim
o resultado de uma anomalia nas funções cerebrais
que pode ser causada por inúmeras síndromes e processos
patológicos diferentes. Existem epilepsias que são
genéticas, outras são causadas por tumores, contusões
que resultam principalmente de acidentes automotivos, algumas surgem
durante a infância e depois somem, e várias delas aparentemente
não têm uma causa específica. O diagnóstico,
portanto, aponta a causa das crises e o tratamento mais adequado.
Para que os portadores de epilepsia possam ter acesso a um tratamento
bem sucedido é fundamental que, primeiramente, existam profissionais
bem qualificados.
"No
caso de epilepsias complexas, cuidados médicos especializados
e tratamentos cirúrgicos, quanto mais experiência os
médicos e hospitais tiverem, melhores serão os resultados",
afirma a Cleveland Clinic Foundation, especializada no diagnóstico
e cirurgia de pacientes com epilepsia em Ohio, nos Estados Unidos.
Nesse sentido, a criação de centros de atenção
especial à epilepsia contribuem grandemente para otimizar
o treinamento desses profissionais, que se dividem entre neurologistas,
psiquiatras, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros,
pediatras e médicos em geral. Esses centros multidisciplinares,
portanto, "atendem aos encaminhamentos para tratamento cirúrgico
da epilepsia e funcionam como pólos de capacitação
e treinamento", afirma Pedro Gabriel Godinho Delgado, coordenador
da saúde mental do Ministério da Saúde.
No
entanto, há poucos exemplos no Brasil. Atualmente existem
sete centros credenciados para o tratamento cirúrgico das
epilepsias, que são apoiados pelo Sistema Único de
Saúde (SUS), de acordo com dados fornecidos pelo Ministério
de Saúde. São eles: Instituto de Neurologia de Goiânia,
em Goiânia (GO); Hospital de Clínicas da Universidade
Federal do Paraná, em Curitiba (PR); Hospital São
Lucas, em Porto Alegre (RS); Fundação Faculdade de
Medicina de São Paulo, em São Paulo (SP); Hospital
de Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto,
em Ribeirão Preto (SP), Fundação Faculdade
Reg. Medicina de São José do Rio Preto (SP); Hospital
Universitário, em São José do Rio Preto (SP);
e a Universidade Estadual de Campinas, em Campinas (SP). Existem
centros como o criado, em 1998, pelo Hospital Alemão Oswaldo
Cruz, em São Paulo, mas que atende pacientes que podem pagar
pelo seu tratamento.
Como
a epilepsia só se revela após a primeira crise, o
diagnóstico não é simplesmente baseado em exames,
mas muito mais clínico, ou seja, voltado para uma detalhada
descrição das crises epilépticas e sintomas
relacionados à elas, fornecidos por familiares ou testemunhas.
Informações sobre fatores que desencadearam a crise,
parte do corpo afetada e progressão da atividade, além
de quanto durou a crise e em que momento do dia ela ocorreu, são
imprescindíveis para um diagnóstico acurado, como
informam os autores do livro Epilepsia (leia resenha
na ComCiência).
Uma
vez com suspeita de epilepsia o paciente poderá ser encaminhado
para uma bateria de exames que poderão apontar a área
do cérebro afetada e um possível tratamento. Entre
esses exames está o eletrencefalograma (EEG), que mede, através
de eletrodos fixados no couro cabeludo, a atividade cerebral. O
exame durante o sono pode ser solicitado pelo neurologista que monitora
o paciente durante 24 horas. Um EEG normal não exclui, no
entanto, a possibilidade de epilepsia, uma vez que as anomalias
podem ocorrer bem no interior do cérebro e não serem
captadas ou simplesmente não ocorrer nenhuma alteração
durante o exame. Nesse caso, exames como a tomografia computadorizada
e a ressonância magnética poderão ser solicitados.
A
omissão de informações, pressa ou má
interpretação na análise dos exames, pode levar
o médico a errar o diagnóstico, levando alguns pacientes
a serem considerados portadores de epilepsia. "Não dispomos
de dados de falso-diagnóstico. O que sabemos é que
há um número imenso de casos não tratados e
muitos encaminhamentos errôneos para o setor de média
e alta complexidade (ambulatórios de neurologia e hospitais)",
lamenta Delgado.
Com
o intuito de melhorar o conhecimento, as atitudes e o tratamento
da epilepsia entre os profissionais de saúde, além
de desenvolver um programa contínuo de educação
profissional, a versão brasileira do projeto Epilepsia Fora
das Sombras desenvolveu uma estratégia de ação
educativa. O projeto procurará formar capacitadores em cada
região do país, que serão responsáveis
por ministrar módulos de treinamento em epilepsia, para multiplicar
esse conhecimento entre os vários profissionais envolvidos.
Atualmente, o que se tem, segundo explicou o coordenador do projeto
e neurologista da Unicamp, Li Li Min, em entrevista
à ComCiência, é um módulo com
quatro aulas teóricas e quatro práticas para médicos
e enfermeiros, como recomendado pelos protocolos técnicos
fornecidos pela Organização Mundial da Saúde
(OMS). A parte prática da campanha irá começar
com a residência médica de família e "será
muito interessante do ponto de vista de pesquisa, saber também
se a inserção do médico de família vai
apresentar uma maior eficácia no tratamento dos pacientes
com epilepsia, comparado com o posto de saúde convencional",
acrescentou Li Min.
(GB)
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