Reduzindo
a Carga Econômica da Epilepsia
Dominic
Heaney e Ley Sander
Traduzido por Leonardo Bonilha
Epilepsia
é uma das doenças neurológicas graves mais
comuns. Sua alta prevalência é estimada em cerca 160
doentes em 100,000 pessoas e até 5% da população
sofre crises epiléticas em algum momento durante a vida [1].
A prevalência de epilepsia é similar em todo o mundo
e isso sugere que 85% das 50 milhões de pessoas com epilepsia
vivam em países em desenvolvimento [2].
A compreensão da carga financeira associada a esta doença
permite que as pessoas com epilepsia sejam tratadas de forma otimizada
e custo-efetiva.
Epilepsia resulta em custos econômicos significativos não
apenas devido à sua alta incidência e prevalência,
mas também porque é uma doença crônica,
que na maioria dos casos pode ser apenas tratada quanto aos seus
sintomas. A capacidade das pessoas com epilepsia para o trabalho
pode ser afetada e indivíduos doentes sofrem significativa
carga social e psicológica [3]. Embora
até 80% das pessoas com epilepsia possam ter suas crises
completamente controladas com medicação antiepilética,
o potencial para novas crises persiste e a maioria dos pacientes
necessita de tratamento por vários anos.
Sistemas
de Saúde em todo o mundo estão lutando para lidar
com o custo de tratar epilepsia. Novas drogas, novas técnicas
diagnósticas tais como ressonância magnética
e vídeo-telemetria, e serviços multidisciplinares
para avaliar pacientes em programas cirúrgicos, são
caros. Dentro desse contexto, pesquisadores começaram a considerar
questões tais como quanto gastar com epilepsia e se resultados
similares não poderiam ser obtidos com recursos diferentes.
Os
problemas envolvendo o custo ascendente do tratamento de epilepsia
são magnificados em países em desenvolvimento onde
recursos de saúde são mais escassos. Embora haja excelentes
centros de neurologia e neurocirurgia distribuídos na América
do Sul e na América Central, esses tendem a se concentrar
em grandes cidades. Sistemas de seguro de saúde tendem a
ser menos desenvolvidos do que na Europa ou na América do
Norte, e vários pacientes que poderiam se beneficiar com
tratamento são incapazes de recebê-lo. Esta "falha"
no tratamento é devida em parte a fatores econômicos
tais como à renda relativamente baixa de grande parte da
população [4], embora fatores
políticos, sociais e organizacionais sejam altamente relevantes.
Métodos
de economia de saúde e bem-estar podem ser usados para a
abordagem do problema de como lidar da melhor forma com as complexas
questões sociais associadas ao tratamento de epilepsia [5].
Durante os últimos anos, várias avaliações
econômicas foram realizadas, as quais utilizaram métodos
para estabelecer a carga econômica de epilepsia para serviços
de saúde e comparar a relação custo-benefício
de programas de tratamento com drogas anti-epiléticas com
programas de tratamento cirúrgico [6].
Este
artigo demonstra os conceitos fundamentais que suportam a avaliação
econômica de epilepsia, com referência a várias
publicações relevantes. A importância de identificar
custos e economias apropriados está destacada antes de se
considerar como o investimento em serviços de epilepsia pode
produzir retorno justificável. Por fim, a relação
custo-benefício de novas drogas é considerada em referência
aos métodos a que podem ser comparadas.
Definindo
o custo da epilepsia
Assim como o impacto clínico da epilepsia e seus tratamentos
podem ser medidos de várias maneiras, seu impacto financeiro
é similarmente amplo e abrangedor.
Para
quantificar o impacto financeiro de qualquer doença, avaliações
econômicas devem definir a perspectiva pela qual os gastos
são calculados. Em vários países desenvolvidos,
os pacientes raramente pagam diretamente por tratamento, mas recebem
cuidados de saúde pagos por esquemas nacionais de seguro.
Da perspectiva do paciente, os cuidados de saúde custam pouco
ou nada além de taxas pessoais ou co-pagamentos realizados
por medicação ou serviços hospitalares. Conseqüentemente,
análises econômicas na Europa e na América do
Norte em geral se confinam à perspectiva da maior seguradora
de saúde. Os serviços de saúde não são
organizados dessa forma em países menos desenvolvidos, onde
os pacientes pagam pela maioria ou por todo tratamento anti-epilético
que recebem [7;8]. Nesses países é
apropriado considerar uma perspective mais ampla que inclua os pagamentos
efetuados pelos pacientes.
De
qualquer perspectiva em que o custo de uma doença for analisado,
custos e economias são categorizados em termos de sua relação
com o tratamento. A classificação mais utilizada é
aquela que distingue entre custos diretos, custos de produtividade
e custos intangíveis [9].
Custos
diretos
Custos e economias diretos são aqueles que surgem em relação
direta com a doença e seu tratamento. Recursos de cuidado
de saúde são descritos como custos médicos
diretos tais como pagamentos de consultas ambulatoriais, medicações,
admissões hospitalares ou exames laboratoriais. Gastos não
médicos tais como pagamentos com transporte ou cuidado de
crianças, que surgem quando o paciente recebe tratamento,
são descritos como custos diretos não médicos.
Pacientes ainda incorrem em grandes despesas ao viajar para obter
tratamento quando os serviços de saúde estão
concentrados em grandes cidades, o que é usual em países
em desenvolvimento.
Custos
e economias diretas são facilmente compreendidas em termos
de valor monetário. Está claro que na maioria dos
sistemas de saúde, os itens são trocados por dinheiro,
por exemplo, quando remédios são comprados de indústrias
farmacêuticas ou quando hospitais empregam funcionários
e compram equipamentos para prover serviços de saúde.
Avaliações econômicas utilizam preços
e taxas definidas para estes bens e serviços ao calcular
o custo geral de um tratamento ou de um programa.
Custos
de Produtividade (Custos indiretos)
Os efeitos da doença e de seu tratamento no tempo dos pacientes
é usualmente aferido em termos de seus efeitos na produtividade
do ambiente de trabalho. Epilepsia pode reduzir a produtividade
se pacientes realizam pior seus trabalhos, tiram folgas ou ficam
desempregados. Mortalidade prematura também pode ser considerada
em termo de seus efeitos na força de trabalho. Estes custos
são descritos como custos indiretos - embora este termo seja
ambíguo, pois em contabilidade custos indiretos referem-se
aos custos inerentes à administração de negócios.
Na
maioria das avaliações econômicas, custos de
produtividade são estimados em termos do valor médio
do tempo de trabalho perdido. Este processo tem seu fundamento no
método do capital humano[10]. Na sua
forma original, o método do capital humano avalia a vida
do indivíduo de acordo com seus ganhos futuros. Este método
também é aplicado para avaliar os efeitos de doenças
temporárias na habilidade individual de se realizar um trabalho.
Por exemplo, o custo da perda de dez dias de trabalho devido à
epilepsia seria avaliado como equivalente à perda da média
de ganho de dez dias por aquele trabalhador.
O trabalho
é mais dificilmente avaliado quando não é atrelado
a um emprego. Por exemplo, cuidados do lar ou cuidados de crianças
são importantes para os indivíduos envolvidos e para
e economia geral, mas são raramente pagos com uma transação
financeira. No mundo em desenvolvimento. Um grade número
de pessoas vive em áreas isoladas ou rurais onde o trabalho
pode não ser ligado a um emprego. Nestes casos ou um valor
arbitrário é definido, ou taxas "sombra"
de pagamentos são utilizadas - baseadas em preços
cobrados por trabalhadores empregados para realizarem tarefas similares.
Embora tenha sido demonstrado que o método do capital humano
tenha falhas teóricas, ele é relativamente fácil
de ser aplicado e tem sido utilizado para estimar o impacto financeiro
da epilepsia no ambiente de trabalho em vários estudos [11].
Gastos
intangíveis
Gastos e economias intangíveis surgem devido ao senso de
bem-estar associado com a melhor saúde e vice-versa. São
descritos como intangíveis porque são difíceis
de serem medidos. Em doença crônica como epilepsia,
que é geralmente estigmatizada socialmente, estes gastos
são provavelmente significativos. Infelizmente, não
há consenso sobre método para avaliar o valor financeiro
de melhor saúde ou bem-estar em epilepsia. Estimativas contingenciais
tais como disposição para pagar por tratamento e resultados
podem ser usados para estimar tais custos pela perspectives dos
pacientes, mas estas técnicas não foram utilizadas
amplamente em serviços de saúde [12].
Custos
e economias: o impacto de se investir em serviços de epilepsia
Entender a diferença entre custos e benefícios diretos,
indiretos e intangíveis permite a compreensão dos
benefícios de se investir em serviços de epilepsia.
Serviços de cirurgia de epilepsia são um bom exemplo.
Programas
de cirurgia de epilepsia apresentaram àqueles que fornecem
fomento financeiro a programas de saúde escolhes precisas
sobre quanto investir em serviços de epilepsia. Vários
estudos econômicos consideraram os custos da cirurgia de epilepsia
e os compararam com o tratamento clínico [13-15].
Estes estudos demonstraram que apesar do alto custo da avaliação
pré-cirúrgica e da cirurgia, os benefícios
obtidos em termos de melhora clínica e menor demanda por
medicamentos e serviços ultrapassam os custos, em longo prazo.
Os resultados destes estudos podem ser usados para justificar a
expansão de programas de cirurgia.
No
entanto, é inevitável que o investimento em serviços
e tratamento de epilepsia possa envolver aumento geral em serviços
médicos diretos - ao menos em curto prazo - mesmo quando
a doença do paciente estiver mais controlada e forem necessárias
revisões menos freqüentes. No entanto, um motivo econômico
mais geral para investir em cuidados de saúde envolve a consideração
de benefícios obtidos não apenas pela perspectiva
de serviços de saúde, mas também como da economia
como um todo. Pessoas com epilepsia melhor controlada são
provavelmente mais capazes de trabalhar e contribuir para sua riqueza
e para riqueza de seus países, então produzindo economia
indireta. Benefícios econômicos também se influenciam
pelos fatores "intangíveis" da boa saúde.
É
possível obter resultados de saúde similares de forma
mais barata?
Métodos
econômicos de saúde podem também ser aplicados
para comparar os custos e resultados de formas diferentes de tratamento.
A maioria destes estudos têm sido estudos de relação
custo-benefício comparando novas drogas antiepiléticas,
onde a razão de benefícios clínicos sobre custos
extras é calculada para diferentes tratamentos.
O uso
indiscriminado de novas drogas antiepiléticas caras é
controverso. Novas drogas, tais como lamotrigina, gabapentina e
topiramato, são várias vezes mais caras que terapias
estabelecidas tais como fenobarbital, fenitoína e carbamazepina,
e a relação custo-benefício destes tratamentos
tem sido questionada. Em epilepsia recém-diagnosticada, a
escolha pelo médico da droga antiepilética pode ter
implicações financeiras significativas, pois uma vez
estabelecida uma droga particular, grande parte dos pacientes não
a troca e permanece com seu uso por vários anos. Pacientes
com epilepsia refratária são freqüentemente tratados
com várias drogas antiepiléticas concomitantemente,
e a relação custo-benefício da politerapia
comparada a monoterapia pode ser relevante. Ainda, outras questões
econômicas envolvem o uso de medicações genéricas
ou de marca.
Um
pequeno número de estudos foi realizado sobre relação
custo-benefício que deixou explícitos os custos do
uso de diferentes drogas anti-epiléticas [16].
No caso de epilepsia recém diagnosticada, é claro
que o uso de novas drogas antiepiléticas tais como lamotrigina,
resulta em custos de saúde significantemente maiores, apesar
de seu perfil diferente de efeitos colaterais e menor necessidade
de monitorização clínica e laboratorial. As
conclusões dos estudos sobre epilepsia crônica são
menos claras, primariamente devido a dificuldades metodológicas
envolvendo o modelamento econômico de epilepsia refratária
ao tratamento.
Conclusão
Vários fatores econômicos entram em jogo quando se
trata de epilepsia e seus tratamentos. Através do mundo,
os recursos disponíveis para tratar epilepsia são
escassos e pesquisas sobre economia de saúde é essencial
para assegurar que orçamentos limitados sejam usados de forma
racional e custo-efetiva. Várias formas de pesquisa econômica
foram realizadas para (i) identificar o custo de epilepsia em termos
de recursos devotados para tratar pessoas com esta doença,
(ii) quantificar os benefícios da cirurgia de epilepsia em
termos financeiros, e (iii) avaliar novas drogas antiepiléticas
em várias circunstâncias clínicas, notadamente
epilepsia recém-diagnosticada. Está claro que epilepsia
representa uma carga econômica significativa, mas que economia
em longo prazo pode surgir com programas de cirurgia de epilepsia
e com o uso de drogas antiepiléticas estabelecidas ao contrário
de novas medicações. Outras questões importantes
sobre as barreiras econômicas para reduzir a falha no tratamento
de epilepsia ao redor do mundo e a relação custo-benefício
de serviços médicos de epilepsia comparados a serviços
para outras doenças têm recebido menos atenção.
Dominic
Heaney e Ley Sander são
professores do Department
of Clinical and Experimental Epilepsy, Institute of Neurology, University
College London.
Referências
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