As mil e uma utilidades de um líquido
negro que vale ouro
Todo final de dezembro, muitas casas estão recheadas de
brinquedos embaixo de uma árvore de natal, de garrafas de
refrigerantes nas geladeiras e de velas entre os arranjos de frutas
sobre a mesa. Ao consumir esses produtos, pouca gente imagina que
a parafina da vela e o plástico das garrafas e dos brinquedos
se originam do ouro negro extraído da terra e de águas
profundas: o petróleo. Além de literalmente mover
a economia, baseada em grande parte pelo transporte rodoviário
de mercadorias, através de seus derivados combustíveis,
o petróleo é a fonte inicial de matéria-prima
para toda uma cadeia produtiva que envolve indústrias dos
mais diversos setores.
O petróleo é um recurso mineral formado por uma grande
mistura de compostos. A partir do seu refino, são extraídos
diversos produtos, como gasolina, diesel, querosene, gás
de cozinha, óleo combustível e lubrificante, parafina
e compostos químicos que são matérias-primas
para as indústrias de tintas, ceras, vernizes, resinas, extração
de óleos e gorduras vegetais, pneus, borrachas, fósforos,
chicletes, filmes fotográficos e fertilizantes.
Será então que a alta do barril do petróleo
- matéria-prima inicial para tantos produtos finais de consumo
-, no mercado internacional, afetaria os preços de toda a
sua cadeia de derivados? "Afeta, obviamente, mas a intensidade
e a velocidade dependem de muitas coisas", diz o economista
Juarez Rizzieri, da Fundação Instituto de Pesquisas
Econômicas (Fipe-USP). Rizzieri, que é coordenador-adjunto
da equipe que mede o IPC (Índice de Preços ao Consumidor),
comenta: "O efeito maior e direto é sempre no combustível,
mas mesmo assim, a Petrobras e o governo sempre estudam antes de
repassar aumentos externos ou de câmbio". E em relação
aos produtos gerados a partir do petróleo, ele avalia: "Quanto
menor for o monopólio da Petrobras, menos pressão
de custo para a indústria e para a cadeia direta dos derivados".
A primeira etapa do refino do petróleo, que envolve quatro
fases, produz através da destilação por pressão
atmosférica, além dos combustíveis, a matéria-prima
básica para toda a cadeia de produção das resinas
plásticas: a nafta. A Petrobras
é a fornecedora exclusiva de nafta no Brasil, atendendo à
demanda com a produção de suas refinarias e com importações.
Segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP),
o país produziu, de janeiro a setembro de 2002, 42,5 milhões
de barris do produto e importou outros 12,6 milhões. A Petrobras
fornece a nafta para três centrais de matérias-primas
da indústria petroquímica: a Petroquímica União,
de São Paulo, a Copesul, do Rio Grande do Sul, e a Braskem
(antiga Copene), da Bahia. Essas centrais decompõem a nafta,
produzindo para a segunda geração das indústrias
do setor os petroquímicos básicos, como eteno, propeno,
benzeno e tolueno, e os petroquímicos intermediários,
como o cicloexano e o sulfato de amônia.
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Nafta,
produto incolor extraído do petróleo e matéria-prima
básica para a produção de plástico. |
"Na primeira etapa da decomposição, a nafta
vai para fornos de alta temperatura, onde é quebrada"
explica Jenner Bezerra, engenheiro químico da Braskem. "Depois,
os gases que saem dos fornos são levados para uma área
de compressão; por fim, é feita a separação
dos compostos em baixa temperatura, por colunas de destilação
ou fracionamento", continua. Um dos produtos dessa fase do
processo petroquímico, o eteno - nome comercial do etileno
(C2H4) - é matéria-prima para a produção
de polímeros como o polietileno tereftalado (PET) e o policloreto
de vinila (PVC), que por sua vez são fornecidos para as indústrias
transformadoras de plástico, para as mais diversas aplicações.
"Através de reatores de polimerização,
as moléculas de eteno reagem, se juntam e formam as cadeias
de polímeros", completa Bezerra.
A Braskem,
que produz 4,25 milhões de toneladas de petroquímicos
por ano e tem faturamento anual acima de R$ 7 bilhões, é
a maior petroquímica da América Latina e uma das cinco
maiores indústrias de capital privado do Brasil. Criada em
16 de agosto deste ano, após a aquisição da
Copene pelo grupo Odebrecht-Mariani, a empresa protagoniza uma situação
curiosa no Pólo Petroquímico de Camaçari (BA).
A Politeno,
maior produtora de polietilenos da região, que bateu recorde
de produção em julho, com 31,3 mil toneladas, depende
do aumento da oferta do eteno fornecido pela Braskem, para alimentar
seu projeto de expansão. A fornecedora da matéria-prima,
no entanto, além de ser uma das controladoras da Politeno,
com 35% de suas ações, é também sua
concorrente, produzindo cerca de 350 mil toneladas de polietilenos
por ano. Na produção de petroquímicos básicos,
a Braskem espera passar dos atuais 1,2 milhão de toneladas
de eteno por ano para 1,3 milhão em 2003. Mas esse aumento
pode não atender à demanda do Pólo de Camaçari,
pois além do plano de expansão da Politeno, a empresa
Dow Química está projetando, em parceria com a Basf,
a instalação de outra petroquímica na região,
com a estimativa de processamento anual de cerca de 100 mil toneladas
de eteno.
Os
polímeros produzidos pelas indústrias petroquímicas
formam diferentes tipos de resinas plásticas, cada qual voltada
para uma finalidade específica. As resinas produzidas pela
Politeno, por exemplo, são usadas pelas indústrias
de brinquedos, adesivos, caixas d'água, lonas, frascos de
soro, tampas para alimentos, embalagens para sorvetes, tampas para
refrigerantes, frascos para água sanitária, alvejantes
e desinfetantes, filmes para fraldas descartáveis e coletores
de lixo, entre outros.
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Alguns
produtos feitos com resina plástica |
As
principais matérias primas fornecidas pelas petroquímicas
para as indústrias transformadoras de plástico são
o polipropileno (PP), o policloreto de vinila (PVC), o polietileno
de alta densidade (PEAD), o polietileno de baixa densidade (PEBD)
e o polietileno tereftalado (PET). Um dos destaques do setor de
transformação é a Sinimplast,
uma das maiores indústrias de embalagens plásticas
do país. Em agosto deste ano, o presidente da empresa, que
faturou R$ 160 milhões em 2001, recebeu menção
honrosa como empreendedor de sucesso, durante o IV Seminário
do Setor Plástico do Grande ABC, promovido pela Associação
Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast).
A Sinimplast tem um portfolio de clientes bastante conhecidos
pelo consumidor de produtos de higiene e limpeza e de alimentos
em geral. A empresa transforma as resinas plásticas em embalagens
para produtos como o amaciante Confort e o detergente Minerva, da
Unilever, o ÁlcoolGel, da Copersucar, o Ajax e o Pinho Sol,
da Colgate-Palmolive, os shampoos Colorama, da L'Oréal, Palmolive,
da Colgate-Palmolive, e Vital Ervas, da Unilever, os desodorantes
Axe, Rexona, Impulse e Vinólia, da Unilever, o Toddy, da
Quaker, a maionese Cica, da Unilever, e o adoçante Zero Cal
e o Biotônico, da DM-Indústria Farmacêutica.
Dentro
da indústria do plástico, um dos principais mercados
é o de embalagens de polietileno tereftalado (PET). No Brasil,
esse segmento chega a crescer cerca de 10% a cada ano, e produziu
aproximadamente 360 mil toneladas de embalagens em 2001. No ano
passado, as indústrias de refrigerantes representaram 80%
do mercado de embalagens PET; as de água mineral, 10%; as
de óleo, 6%; e 4% tiveram outras aplicações.
As empresas do setor buscam investir em alta tecnologia para tentar
incluir no segmento das embalagens PET as cervejarias, que chegam
a vender cerca de 8 bilhões de litros de bebida por ano.
Mas os cervejeiros avisam: só entrarão nesse mercado
quando a embalagem PET garantir a validade de até 180 dias
da bebida em prateleira, a exemplo das embalagens de vidro e de
alumínio.
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