Investimento
em pesquisa de fármacos no Brasil ainda é pequeno
Apesar
de a produção de medicamentos no Brasil ter aumentado
nos últimos anos, segundo dados da Associação
Brasileira da Indústria Farmoquímica, o investimento
em pesquisa e desenvolvimento de fármacos continua incipiente.
Os recursos para pesquisa provêm basicamente das agências
federal e estaduais de fomento, embora alguns laboratórios
privados comecem a apostar em parcerias com as universidades, o
que poderá minimizar a defasagem do Brasil em relação
a outros países, quanto aos investimentos privados em P&D.
Alguns indícios fazem crer que o investimento em pesquisa
de fármacos está crescendo no país. Uma das
dificuldades, porém, para avaliar quantitativa e qualitativamente
esse investimento é a própria falta de dados sistematizados
específicos para o setor.
Estatísticas
da Coordenação de Programas de Pesquisa em Saúde
do CNPq, por exemplo, mostram apenas um panorama geral do investimento
da instituição por área de conhecimento. De
1998 a 2000, o investimento total do CNPq em Farmacologia, incluindo
bolsas de estudo e fomento à pesquisa, subiu de R$ 4,6 milhões
para R$ 5,6 milhões. Em farmácia, subiu de R$ 2,5
milhões para R$ 3,2 milhões. Grande parte da produção
de fármacos, no entanto, pode ter origem na pesquisa em Química,
uma das áreas que mais receberam recursos do CNPq, no ano
passado. O difícil é dizer quanto dos R$ 22,4 milhões
investidos em Química se destinaram ao desenvolvimento de
fármacos. Outra área que também pode gerar
produtos farmacológicos é a Bioquímica, que
recebeu R$ 11,1 milhões do CNPq em 2000. Grande parte do
incremento de investimento do CNPq se deve ao Programa de Apoio
a Núcleos de Excelência (Pronex), que em Farmacologia
e Bioquímica representa quase 50% dos recursos de fomento
à pesquisa.
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Apesar
desse incremento, alguns pesquisadores se queixam da falta de recursos
para a atividade de pesquisa. Segundo a coordenadora de pós-graduação
em Farmacologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Maria Consuelo Marques, os recursos para o Departamento de Farmacologia
da UFPR não ultrapassam R$ 10 mil por ano. "Esse financiamento
vem da própria universidade. O CNPq não financiou
os recém doutores emergentes na década de 90",
afirma. Ela diz que as pesquisas na universidade buscam, em geral,
desenvolver medicamentos mais baratos para doenças frequentes,
como as cardiovasculares, além de remédios específicos
para doenças tropicais. "Essas drogas mais baratas ou
de mercado restrito não são de interesse das multinacionais,
que já comercializam produtos muito lucrativos", diz
a pesquisadora. Apesar da queixa em relação ao apoio
a novos doutores, ela elogia o recém criado programa do CNPq
de fomento à pesquisa em fitoterápicos (veja notícia
na Com Ciência), pois ele "abre a perspectiva de incentivar
a integração entre universidade e empresa de forma
atrativa", declara.
A parceria
entre universidade e empresa vem sendo realizada também em
alguns projetos da Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado de São Paulo (Fapesp). Um deles, envolvendo o Instituto
de Ciências Biomédicas (ICB) da USP e a Aché
Laboratórios Farmacêuticos, contou com R$ 182 mil investidos
pela Fapesp e R$ 42 mil pela Aché, para a produção
de fármacos com ação antiinflamatória.
O mesmo ICB realizou um projeto para desenvolvimento de anti-hipertensivos
com os Laboratórios Biosintética, no qual a empresa
entrou com R$ 400 mil e a Fapesp não desembolsou nada. A
Fundação também possui um Programa de Inovação
Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe), que já financiou
projetos como o da Genosis Biotecnológica. Esta empresa recebeu
da Fapesp R$ 66 mil para pesquisar formulações farmacêuticas
ligadas à produção do hormônio de crescimento
humano. O presidente do Conselho Superior da Fapesp, Carlos Henrique
de Brito Cruz, diz que esse programa não só integra
universidade e empresa como estimula esta última a absorver
pesquisadores capazes de inovação e desenvolvimento
tecnológico. "A abertura da economia brasileira expôs
a empresa a uma competição internacional violentíssima,
o que a fez perceber que um dos ingredientes importantíssimos
da competitividade é a capacidade própria de desenvolver
tecnologia", afirma Cruz. Uma das exigências importantes
do Pipe é que o pesquisador principal tenha vínculo
empregatício com a empresa. "A sua lealdade tem que
ser com a empresa, o seu salário tem que vir da empresa",
explica Cruz.
Uma
das instituições onde a atividade de pesquisa, desenvolvimento
e produção de fármacos cresceu significativamente
nos últimos anos é o Instituto de Tecnologia em Fármacos
(Far-Manguinhos), laboratório público da Fundação
Oswaldo Cruz (Fiocruz), vinculado ao Ministério da Saúde.
Far-Manguinhos vendeu cerca de R$ 8 milhões em medicamentos
em 1997. Essa venda saltou para cerca de R$ 70 milhões em
1999, tendo como destaque os remédios anti-retrovirais comprados
pelo Ministério da Saúde para os pacientes soropositivos
(veja reportagem
especial na Com Ciência). A participação
dos laboratórios públicos brasileiros na produção
adquirida pelo governo federal, que em 1999 estava abaixo de 20%,
em 2000, passou dos 50%. No ano passado, o valor da receita de Far-Manguinhos,
incluindo venda de medicamentos e orçamento da União,
foi de R$ 109 milhões. No primeiro semestre de 2001, essa
receita já atingiu R$ 79 milhões. Em 2000, os gastos
com pesquisa e desenvolvimento tecnológico na Fiocruz representaram
26% das despesas totais em programas da instituição.
No
setor industrial, as cifras são de outra ordem, mas não
se sabe ao certo quanto é investido em P&D de fármacos.
O faturamento da indústria química de base com produtos
farmacêuticos caiu de US$ 7,6 bilhões, em 1998, para
US$ 5,6 bilhões, em 1999, repetindo este último desempenho
em 2000. Esse segmento da produção responde por 13%
do total faturado pelo setor. Já na indústria de química
fina, que produz princípios ativos e intermediários,
os fármacos representam 67% do faturamento total. Este, a
exemplo da indústria química de base, também
vem caindo nos últimos anos. O faturamento com farmoquímicos
caiu de US$ 598 milhões, em 1998, para US$ 551 milhões,
em 2000, e com produtos farmacêuticos, de US$ 10,31 bilhões,
em 1998 para US$ 7,48 bilhões, em 2000. Grande parte desse
faturamento é gasto em importações, e não
se sabe ao certo quanto é destinado para P&D. "A
impressão que temos é que esses investimentos no Brasil
são muito baixos", diz Rose Amanthéa, da Associação
Brasileira das Indústrias Químicas (Abiquim),
entidade que congrega cerca de 150 indústrias químicas
de grande, médio e pequeno portes. "A maioria das empresas
é multinacional, e elas costumam desenvolver seus produtos
lá fora", completa.
(RC)
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