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              Luta 
              pelos genéricos tem quase dez anos 
            Para 
              que os medicamentos genéricos se tornassem uma realidade 
              concreta, foi necessária a prescrição de um 
              conjunto de normas e regras, resultantes de um processo que está 
              em andamento há vários anos. Hoje, o ministro José 
              Serra, amparado em vários instrumentos legais, vem colhendo 
              os frutos de ações e decisões de políticas 
              públicas continuadas, que não buscaram apenas resultados 
              de curto prazo, mas procuraram sedimentar, em bases mais permanentes, 
              tanto a oferta (incentivo à produção, abreviação 
              dos processos de registro), quanto a demanda (campanhas publicitárias 
              para informar os usuários da existência dos substitutos 
              genéricos) pelos genéricos. 
            Em 
              1991, o deputado Eduardo Jorge (PT-SP) apresentou o Projeto de Lei 
              2.022 à Câmara dos Deputados, propondo os genéricos. 
              A proposta era a proibição do uso de marca comercial 
              ou de fantasia nos produtos farmacêuticos, que obrigava a 
              utilização do nome genérico nos remédios 
              comercializados no país. 
            Eduardo 
              Jorge em sua justificação, diz que "a Organização 
              Mundial de Saúde (OMS) recomenda o emprego do nome genérico 
              para cada medicamento, isto é, a denominação 
              científica abreviada baseada no ingrediente ativo utilizado. 
              Os medicamentos genéricos podem ser adquiridos a um preço 
              muito mais baixo. Por outro lado, uma só denominação 
              vinculada ao ingrediente ativo é facilmente reconhecível 
              e aumenta a segurança na prescrição e na administração 
              de medicamentos. Nos EUA, com a utilização do nome 
              genérico tem se verificado este fato de barateamento do custo 
              dos medicamentos. Estima-se que em 1989 houve uma economia de 236 
              milhões de dólares para os consumidores americanos. 
              Outros países como Indonésia e Filipinas tem adotado 
              legislação rigorosa na adoção do nome 
              genérico". 
            As 
              experiências de alguns países demonstram que as políticas 
              de regulação de medicamentos visam tanto fomentar 
              a concorrência, quanto garantir o acesso da população 
              aos medicamentos a um menor custo. Algumas políticas adotadas 
              tem gerado efeito no curto prazo, outras ainda estão sob 
              avaliação ou têm produzido resultados inferiores 
              aos esperados. Mas no geral, o que se verifica, é que é 
              preciso um razoável espaço de tempo para que haja 
              uma implantação positiva dessa sistematização, 
              no Brasil não foi diferente.  
            O projeto 
              original teve uma longa tramitação na Câmara 
              dos Deputados, passando por várias Comissões e recebendo 
              várias emendas e substitutivos, até chegar à 
              votação no plenário em novembro de 1998, quando 
              foi transformado em norma jurídica após a sanção 
              do presidente, em fevereiro do ano seguinte. 
            No 
              transcorrer dos trâmites legislativos, o processo teve um 
              reforço, com a semente plantada pelo ministro da saúde 
              Jamil Haddad, durante o governo Itamar Franco. Foi uma alteração 
              em uma lei de 1973, que tornou obrigatória a utilização 
              dos nomes genéricos em todas as prescrições 
              de profissionais autorizados e do Sistema Único de Saúde 
              (SUS). A alteração dispôs que somente seria 
              aviada a receita médica que contivesse a denominação 
              genérica do medicamento prescrito. Estipulou ainda que todos 
              os medicamentos constassem, em suas embalagens, o nome do genérico. 
              O uso da denominação genérica seria obrigatório 
              nos registros e autorizações relativos à produção, 
              fracionamento, comercialização e importação 
              de medicamentos. 
            Itamar 
              Franco deu um prazo de 180 dias para que as entidades públicas 
              e privadas se adaptassem às essas normas, mas a disposição 
              não foi cumprida.  
            Algum 
              tempo depois, um amplo processo de discussão promovido pelo 
              Conselho Nacional de Saúde (CNS), culminou com a realização 
              da Oficina de Trabalho sobre Diretrizes para uma Política 
              de Medicamentos Genéricos, em março de 1998. Dela 
              resultou um documento que fundamentou uma deliberação 
              sobre os genéricos.  
            Assim, 
              o Conselho Nacional de Saúde, em maio do mesmo ano, aprovou 
              as diretrizes da Política de Medicamentos Genéricos 
              e estabeleceu os instrumentos e mecanismos para a sua implementação. 
            A constatação 
              de que importantes países europeus, como o Reino Unido, a 
              França e a Alemanha, assim como, o Canadá, os Estados 
              Unidos e o Japão, conseguiram ampliar seus programas de assistência 
              farmacêutica, a partir do crescimento da participação 
              dos medicamentos genéricos no mercado farmacêutico, 
              foi importante para o desenvolvimento da produção 
              dos genéricos no Brasil.  
            A "Lei 
              dos Genéricos", de fevereiro de 1999, estabeleceu o 
              medicamento genérico e dispôs sobre a utilização 
              de nomes genéricos em produtos farmacêuticos. Para 
              tanto, foi necessário alterar e aperfeiçoar uma lei 
              de 1976, editada pelo presidente militar Ernesto Geisel, que estipula 
              as normas de vigilância sanitária para os medicamentos, 
              drogas, insumos farmacêuticos e correlatos, a chamada "Lei 
              de Similares".  
            O poder 
              executivo federal ficou autorizado então a promover medidas 
              especiais relacionadas com o registro, a fabricação, 
              o regime econômico-fiscal, a distribuição e 
              a dispensação - ato de fornecimento ao consumidor 
              de drogas e medicamentos de modo remunerado ou não - de genéricos, 
              visando estimular sua adoção e uso no país. 
            Outra 
              medida importante trazida por esta lei, foi disciplinar que os medicamentos 
              genéricos teriam preferência sobre os demais, em condições 
              de igualdade de preços, nas aquisições de medicamentos, 
              sob qualquer modalidade de compra, no âmbito do SUS. 
            De 
              acordo com a lei, o medicamento genérico é aquele 
              que: tem a mesma função que o medicamento de referência 
              (o medicamento inovador); que possui uma biodisponibilidade compatível; 
              que é atestado por testes de bioequivalência feitos 
              somente por laboratórios credenciados; e que tem a forma 
              farmacêutica, dosagem e posologia idênticas às 
              do medicamento de referência. O nome genérico é 
              o nome do princípio ativo do medicamento. 
            O decreto 
              de setembro de 1999, que regulamentou a Lei dos Genéricos, 
              instituiu que deveriam constar a terminologia da Denominação 
              Comum Brasileira (DCB) obrigatoriamente, nas embalagens, rótulos, 
              bulas, prospectos, textos, ou qualquer outro tipo de material de 
              divulgação e informação médica 
              referente a medicamentos. Na sua falta, deveria constar a Denominação 
              Comum Internacional (DCI). Essas terminologias são as denominações 
              do fármaco ou princípio farmacologicamente ativo aprovadas 
              pelo órgão federal responsável pela vigilância 
              sanitária ou pela OMS. 
            Compete 
              a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), 
              fiscalizar produtos, substâncias e serviços de interesse 
              para a saúde.  
            O controle 
              sobre os medicamentos é feito pela Anvisa, que é uma 
              autarquia sob regime especial (caracterizada pela independência 
              administrativa, estabilidade de seus dirigentes e autonomia financeira), 
              vinculada ao Ministério da Saúde. Todo medicamento 
              tem que ter registro e obedecer todos os parâmetros traçados 
              pela agência. A Anvisa estabelece que o registro de medicamento 
              com denominação exclusivamente genérica terá 
              prioridade sobre o dos demais. 
            Os 
              medicamentos genéricos já fizeram grandes avanços 
              e continuam a conquistar os consumidores. Um fator importante para 
              isso é a credibilidade adquirida pelos genéricos, 
              a partir do momento em que sua qualidade foi garantida pelos testes 
              oficiais de bioequivalência e bioabsorção. 
            Exemplo 
              internacional 
            De 
              acordo com a economista Elba Lima Rêgo, que fez um estudo 
              para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social 
              (BNDES), intitulado, Políticas de Regulação 
              do Mercado de Medicamentos: A Experiência Internacional, "muitos 
              países têm adotado políticas agressivas de promoção 
              dos genéricos como forma de propiciar à população 
              remédios a preços mais acessíveis e de reduzir 
              os gastos com assistência farmacêutica". Nos Estados 
              Unidos, primeiro país a adotar essas políticas, os 
              genéricos têm entrado no mercado em média três 
              meses após a expiração da patente. 
            Em 
              1984, o Congresso Americano aprovou o Drug Price Competition and 
              Patent Term Restauration Act (conhecido como Lei Waxman-Hatch), 
              que, através da Abbreviated New Drug Application, isentou 
              os produtores de genéricos de repetir todos os estudos para 
              a comprovação de segurança e eficácia 
              exigidos para os medicamentos originais, introduzindo os testes 
              de bioequivalência. Ao mesmo tempo, também eliminou 
              a proibição de substituição de medicamentos 
              prescritos e aumentou a duração efetiva das patentes. 
               
            A duração 
              da proteção propiciada pelas patentes havia sido reduzida 
              na prática devido aos testes mais rigorosos exigidos pelo 
              Food and Drugs Administration (FDA) para a certificação 
              de novas drogas. A patente é registrada antes da realização 
              dos testes, o que reduz o tempo em que ela é efetivamente 
              aproveitada. 
            Nos 
              anos 90, com a expansão do mercado de genéricos impulsionado 
              pela atuação dos seguradores privados, várias 
              empresas farmacêuticas americanas produtoras de remédios 
              de marca passaram a produzir genéricos e/ou adquiriram participação 
              em produtores independentes.  
            A experiência 
              internacional parece indicar que têm obtido mais êxito 
              na promoção de genéricos os países onde 
              as ações para influenciar o comportamento dos médicos 
              não se limitam a campanhas informativas. Elas têm que 
              envolver algum tipo de responsabilização daqueles 
              que prescrevem as receitas. 
            Os 
              genéricos já são importantes em termos de prescrição 
              nos Estados Unidos, no Canadá, na Dinamarca, na Alemanha, 
              na Holanda e na Grã-Bretanha. Na definição 
              das políticas nacionais, a experiência internacional 
              tem contribuições importantes a dar, desde que filtradas 
              pela realidade brasileira. "Não se trata de reproduzir 
              aqui de forma acrítica o que tem dado certo em outros países, 
              mas de aprender com os erros e os acertos dos que vem há 
              anos aperfeiçoando instrumentos de regulação", 
              afirma Rêgo. 
            Embora 
              ainda falte um longo caminho a percorrer para que os genéricos 
              atinjam no Brasil o nível de aceitação e difusão 
              de outros países, parece não haver mais dúvida 
              de que isso é apenas uma questão de tempo, desde que, 
              o governo não esmoreça em sua política de apoio 
              e promoção a esse tipo de medicamento. 
            O aumento 
              da oferta de genéricos é um poderoso instrumento para 
              forçar a baixa dos preços dos medicamentos. Entretanto, 
              na opinião da procuradora Lenir Santos, do Instituto de Direito 
              Sanitário Aplicado (Idisa), "muito mais poderia ser 
              feito, porque a lei prevê o monitoramento dos preços 
              pelo Ministério da Saúde. Assim, o MS, ao lado de 
              outras normas, tem o poder de controlar os preços dos medicamentos 
              para que não ocorram aumentos abusivos, mas ele não 
              o usa. Não estamos falando em tabelamento, mas sim, no acompanhamento 
              dos preços, a fim de não permitir preços abusivos 
              em detrimento da saúde da população". 
              Segundo ela, o preço é formado por diversos elementos 
              (insumos, mão-de-obra, tecnologia, lucro etc), podendo o 
              poder público, sem interferir na liberdade da iniciativa 
              privada e na livre concorrência, monitorar, em nome do princípio 
              da dignidade humana e do direito à saúde, a formação 
              do preço dos medicamentos.  
            De 
              acordo com Santos, o direito à saúde pressupõe 
              a possibilidade de as pessoas poderem adquirir o medicamento essencial 
              à recuperação de sua saúde. "A 
              constituição, em seu artigo 197, considerou como de 
              relevância pública as ações e serviços 
              de saúde. É o único serviço considerado 
              de relevância pública pelo texto constitucional. Isto 
              confere ao Poder Público, um enorme poder para regulamentar, 
              fiscalizar e controlar os preços dos medicamentos. O direito 
              à saúde não é uma dádiva governamental, 
              mas sim, um dever ditado pela constituição. Além 
              do mais, a população paga impostos e em conseqüência, 
              deve exigir do Estado a efetividade de seus direitos", alerta 
              a procuradora.  
            Ainda 
              na avaliação de Lenir, "não obstante, 
              a legislação sobre os genéricos é boa 
              e suficiente. O necessário já está estabelecido". 
              Para ela, é preciso fiscalizar o cumprimento da lei e punir 
              aqueles que a desrespeitarem. "A permanente fiscalização 
              ajuda a corrigir falhas, punir os infratores e garantir eficácia 
              à lei. A vontade política de cumprir a lei é 
              o fundamental. Não basta existir a lei, é preciso 
              torná-la efetiva". 
            (MP) 
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