Editorial:

Fármacos e Medicamentos: Urgências
Carlos Vogt

Reportagens:
Genéricos são a linha de frente da política de medicamentos
Instrumentos de regulamentação dos genéricos
Descentralização na distribuição de medicamentos enfrenta falta de estrutura
Luta contra a Aids terá de buscar novas formas de financiamento
Aids nos países pobres: lições da experiência brasileira
Poder das
multinacionais inibe a indústria brasileira
Inovação e fomento à indústria estão entre os principais desafios
Fundação produz medicamentos de qualidade para a população carente
Falta de garantia faz Ministério acabar
com os similares
Investimento em pesquisa de fármacos
no Brasil ainda é pequeno
A questão das
patentes na política brasileira de fármacos
Conhecimento tradicional e direito à propriedade intelectual
Fitoterápiocos: o mito
do natural
Artigos:
Aproveitamento das inovações farmacêuticas no Brasil
Antônio Camargo

Fitoterápicos: alternativa para o Brasil
Lauro Barata

Cronofarmacologia e Melatonina - o hormônio que marca o escuro
Regina Pekelmann Markus
Farmacologia perde integração com a cultura
Ulisses Capozoli
Notícias e "notícias" na comunicação pública da saúde
Isaac Epstein
Inovação e Gestão em um Mundo Globalizado
Antônio Buainain
Sergio Paulino de Carvalho

Acesso aos antiretrovirais na América Central
Eloan Pinheiro
Fernanda Macedo
Cristina D'Almeida

Poema
Bibliografia
Créditos

Poder das multinacionais inibe a indústria brasileira, mas fitoterápicos podem ser uma solução.

A indústria farmacêutica mundial, que tem um faturamento anual de US$ 300 bilhões, é a que mais investe em pesquisa e desenvolvimento (P&D) injetando US$ 36 bilhões ao ano nessa atividade. No maior mercado farmacêutico do mundo, os EUA, essa indústria aplicou, em 2000, cerca de 21% de seu faturamento em P&D, enquanto que a indústria de informática investiu cerca de 10,5%, a de produtos elétricos e eletrônicos cerca de 8,4%, a de telecomunicações 5,3% e a aeroespacial e de defesa 3,8%, segundo dados da Pharmaceutical Research Manufacturers of America (PhRMA).

No Brasil, a Aché, maior indústria farmacêutica nacional, que tem faturamento anual médio de R$500 milhões, investiu cerca de R$ 400 milhões em pesquisa de novos produtos nos últimos quatro anos. Já a Roche, laboratório farmacêutico suíço, investiu, em 1994, US$ 500 milhões na produção do Xenical, remédio que combate a obesidade. Destes, US$ 300 milhões foram gastos apenas em testes clínicos, como lembra Alexis González, autor de uma dissertação sobre a indústria farmacêutica, defendida na Unicamp.

De fato, o custo de produção de uma inovação farmacêutica não pára de crescer. Uma das causas são as exigências quanto aos testes clínicos. A Food and Drug Administration (FDA), órgão do governo americano que autoriza a venda de uma nova droga, tem exigido testes clínicos (em humanos) cada vez mais rigorosos que implicam no uso de um número cada vez maior de amostragens. Trinta testes clínicos eram necessários entre 1977 e 1984. Esta quantidade dobrou de 1989 até 1992. Além disso, exige-se a aplicação de tecnologias cada vez mais avançadas, que elevam a complexidade dos testes e os custos de investimento. Recentemente, a FDA determinou, por exemplo, que, para medicamentos de uso pediátrico, passassem a ser feitos testes clínicos em crianças com vistas a aumentar sua segurança. Até então novos medicamentos só eram testados em adultos.

Em busca de aumentar a rentabilidade e o poder de investimento em P&D, as grandes corporações farmacêuticas passaram, desde meados dos anos 80, por sucessivas fusões e/ou aquisições de empresas menores (veja tabela), processo que põe em situação cada vez mais difícil as empresas farmacêuticas nacionais.

Fusões e Aquisições farmacêuticas na década de 90
Ano
Fato
Laboratórios envolvidos
1993
Aquisição
Merck comprou a distribuidora de medicamentos Medco Containment Services
1994
Aquisição
American Home Products (EUA) comprou a American Cyanamid (EUA) por US$ 10 bilhões
1995
Aquisição
Glaxo (UK) comprou a Wellcome (UK) por US$ 14,9 bilhões
1996
Fusão
Pharmacia Aktiebolag (Suíça) e Pharmacia & Upjohn (US)
1996
Fusão
Sandoz (Suíça) e Ciba (Suíça) formando a Novartis
1997
Aquisição
F. Hoffman-la Roche (Suíça) comprou Boehringer Manheim (Alemã) por US$ 11 bilhões
1999
Fusão
Astra AB (Suíça) e Zeneca (UK) fromando a AstraZeneca (UK)
1999
Fusão
Hoechst Marion Roussel (Alemã) e Rhône-Poulenc (França) fromando a Aventis (Alemanha)
1999
Fusão
Monsanto com a Pharmacia & Upjohn
2000
Aquisição
Pfizer (EUA) comprou a Warner-Lambert por US$90 bilhões
2001
Fusão
Glaxo Wellcome com a SmithKline Beecham
Fonte: Tese de mestrado de Alexis González, 1999; Pfeizer e Abifarma

As onze maiores indústrias (veja quadro) deste setor respondiam, em 2000, por 48.9% do mercado, em comparação com 36.1% três anos atrás. Embora estas empresas estejam, em princípio, competindo, os submercados (definidos por diferentes classes farmacêuticas: antibióticos, antiinflamatórios, cardiovasculares, hormônios e outros) em que elas atuam são pouco competitivos, pois não há muita variedade de medicamentos em cada classe. Além disso, várias marcas de medicamentos já cativaram a confiança dos médicos, farmacêuticos e dos consumidores, o que torna a sua substituição mais difícil.

Maiores Indústrias (1999)
Origem
Participação (em%)
GlaxoSmithKline
Reino Unido
7.3
Pfizer
EUA
6.6
Merck & CO
EUA
5.1
AstraZeneca
Inglaterra
4.8
Aventes
França/Alemanha
4.3
Bristol-Myers Squibb
EUA
3.9
Novartis
Suíça
3.8
Roche
Suíça
3.6
Joknson & Johnson
EUA
3.5
Eli Lilly
EUA
3.0
Pharmacia
Inglaterra/EUA
3.0
Total das 11 maiores
48.9
Fonte: Panorama Setorial 2000

Contando com o monopólio permitido pelas patentes de medicamentos, as multinacionais praticam uma política de altos preços, ainda que haja variações ao redor do mundo. Isso acontece por razão de diferenças no custo de vida local, na prática médica, volume do produto, taxas de importação e exportação, impostos, termo de patente e sua data de expiração, economia local, oferta e demanda, atuação do governo e muitas outros fatores que devem ser levados em conta. O preço médio de medicamentos no Brasil, em 1999, era de US$ 4.76, na Argentina US$ 9.82, na Alemanha US$ 11.74, nos Estados Unidos US$ 13.51 e no Japão alcançou elevados US$ 48.

Com a nova Lei de Patentes brasileira, em vigor desde 1996, (veja reportagem sobre patentes) empresas nacionais passaram a buscar associações com as indústrias estrangeiras na área de P&D (além de produção e marketing), como é o caso da Aché, que vem investindo em alianças com empresas farmacêuticas multinacionais para introduzir medicamentos inovadores nos mercados brasileiro e latino-americano. Além disso, as empresas têm buscado, pouco a pouco, fazer parcerias com universidades e centros de pesquisa, para o desenvolvimento de produtos de biotecnologia e fitomédicos.

A produção de genéricos e de fitofármacos parece ser o grande filão para a indústria nacional. O segundo, sobretudo, permite explorar os recursos da vasta biodiversidade brasileira. Embora com altos custos de investimento, ele representa um nicho que ainda está para ser explorado mundialmente. Apenas 5% da indústria farmacêutica mundial é representada pelos fitofármacos (leia artigo sobre o tema). Conforme comenta o Diretor Geral da Aché, José Eduardo Bandeira de Mello, "a biotecnologia e a fitoterapia são o futuro da indústria farmacêutica e o Brasil tem um enorme potencial para se desenvolver nessas áreas".

(GB)

Atualizado em 10/10/2001

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