Brasília:
contrastes de uma cidade planejada
A partir
de dois traços, em forma de cruz, no branco do papel, iniciou-se
o esboço de um projeto urbanístico que entrou para
a história. O desenho de um avião, em seguida, foi
o ponto de partida para a planta da cidade. Após a sua construção,
a cabine do piloto dessa aeronave, passou a abrigar os poderes que
comandam o país. Em 1987, ela se tornou a primeira cidade
moderna do mundo a ser tombada pela Unesco como Patrimônio
Histórico da Humanidade.
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Primeiros
traços do projeto de Lúcio Costa |
Tanto
o projeto urbanístico de Lúcio Costa quanto a moderna
arquitetura dos edifícios desenhados por Oscar Niemeyer conferem
a Brasília características que não encontram
paralelo em qualquer outra cidade do mundo. De automóvel,
é possível atravessar toda a sua extensão,
a partir da entrada Sul até o final da Asa Norte, sem pegar
um único sinal de trânsito sequer. De cada ponto desse
trajeto totalmente arborizado, vê-se a linha do horizonte:
a cidade é plana e os edifícios residenciais têm,
no máximo, seis andares. Além disso, o ar de Brasília
é puro, pois não há indústrias pesadas
ao seu redor.
Mas
essa qualidade de vida, desfrutada por quem habita o Plano Piloto,
tem um custo alto para a maioria da população, que
mora nas periferias. Enquanto a cidade possui cerca de um automóvel
para cada duas pessoas (maior índice do país), o seu
transporte coletivo leva pouco mais do que um passageiro por quilômetro
percorrido de linhas de ônibus, número que chega a
ser quatro vezes menor do que o de cidades de mesmo porte. Esse
baixo índice, que torna a tarifa de ônibus em Brasília
uma das mais caras do país, se deve à grande distância
entre as cidades-satélites, onde vive cerca de 90% da população
do Distrito Federal, e o Plano Piloto, que concentra 77% dos postos
de empregos do DF, segundo levantamento feito pelo Ministério
do Trabalho, em 1999.
Arquitetura
de Niemeyer
Os
modernos edifícios do poder público, em Brasília,
são apenas uma pequena parte da mundialmente conhecida
obra do arquiteto Oscar Niemeyer. Seu trabalho tem os traços
da arquitetura moderna lançada pelo francês Le
Corbusier, que ele conheceu no Rio de Janeiro, no escritório
de Lúcio Costa, onde iniciou sua carreira profissional.
Niemeyer participou do projeto de reconstrução
de Berlim após a guerra, e desenhou edifícios
que se tornaram cartões postais de diversas cidades
brasileiras, como a Igreja de São Francisco, na Pampulha,
em Belo Horizonte, e o Memorial da América Latina,
em São Paulo. O arquiteto foi chefe do Departamento
de Arquitetura e Urbanismo da Novacap, empresa responsável
pela construção de Brasília. Na capital,
ele desenhou os edificios da Praça dos Três Poderes,
da Esplanada dos Ministérios, incluíndo o Palácio
do Itamaraty, além do Palácio da Alvorada, residência
oficial do presidente, e do edifício do Minhocão,
na Universidade de Brasília.
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Congresso
Nacional
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Palácio
do Planalto
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Palácio
da Alvorada
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Catedral
de Brasília
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Esses
dados fazem parte de um estudo feito por pesquisadores da Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB),
sobre a ocupação territorial do DF. O estudo mostra
que o processo de periferização, que em outras grandes
cidades se deu por pressões do mercado imobiliário,
no DF foi instituído pelo próprio governo. "O
processo de implantação dos núcleos urbanos
foi extremamente segregacionista desde a sua origem", afirma
Frederico de Holanda, um dos responsáveis pela pesquisa.
O estudo
revelou que, segundo estatísticas da Companhia de Desenvolvimento
do Planalto Central (Codeplan), desde a construção
da capital, a população do DF é maior nas cidades-satélites
do que no Plano Piloto. Milhares de migrantes que foram para a região
trabalhar na construção da capital, se alojaram, na
época, nas imediações da Cidade Livre, atual
Núcleo Bandeirante. Em 1958, uma parte dos operários
foi convencida por assistentes sociais a se mudar para os loteamentos
da primeira cidade-satélite que surgia: Taguatinga, a 20
Km do Plano Piloto. Pouco mais de uma década depois, com
a Campanha de Erradicação de Invasões (CEI)
criada pela administração de Brasília, surgia
ao lado de Taguatinga aquela que seria a maior cidade-satélite
do DF: Ceilândia. "A remoção dos moradores
de várias favelas deu origem a essa cidade", conta Holanda.
No censo de 1980, Ceilândia já possuía uma população
maior que a do Plano Piloto.
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Cidade
Livre, atual Núcleo Banderante
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"A
configuração urbana do DF caracterizou-se como um
modelo de ocupação muito menos compacto, muito menos
denso", afirma Patrícia Melasso Garcia, outra pesquisadora
da UnB envolvida no estudo. "As cidades criadas pelo poder
público localizavam-se distantes do centro", ela diz.
Os pesquisadores da UnB mencionam o documento Brasília Revisitada,
escrito por Lúcio Costa em 1987, no qual o próprio
urbanista, que projetou uma área de expansão na cidade-satélite
do Guará, entre Taguatinga e o Plano Piloto, reconhece as
consequências sociais da concentração populacional
nas cidades-satélites. "A longa distância entre
as satélites e o Plano Piloto isolou dois terços de
sua população metropolitana que reside nos núcleos
periféricos, além de gerar problemas de custo para
o transporte coletivo", admite Lúcio Costa em seu texto.
(RC)
Misticismo
Com
pirâmides que lembram a antiguidade egípcia,
como o Teatro Nacional e o Templo da Boa Vontade, Brasília
é cercada por misticismo desde a sua criação.
Às margens do lago Paranoá, construído
artificialmente para amenizar a baixa umidade da capital,
há a inscrição de uma profecia atribuída
a Dom Bosco, padre italiano fundador da Ordem dos Salesianos,
em 1859. Na Ermida que leva o seu nome, o texto da profecia
de Dom Bosco diz que "entre os paralelos de 15º
e 20º, partindo de um ponto onde se formava um lago,
surgirá a terra prometida". Brasília, situada
nas proximidades do paralelo de 15º, é tida pelos
místicos da cidade como a "terra prometida",
vislumbrada por Dom Bosco.
Além
da mística em torno de sua criação, Brasília
também é o centro de uma região ecumênica.
No entorno da capital, há duas grandes comunidades
de sincretismo religioso: a Cidade Eclética, em Santo
Antônio do Descoberto, onde vivem 1.500 pessoas, e o
Vale do Amanhecer, perto de Planaltina, que existe há
mais de 30 anos. Na saída para a BR-040, há
também a Cidade da Paz, que abriga a Universidade
Holística Internacional de Brasília.
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