Editorial:

As cidades e os muros
Carlos Vogt

Reportagens:
Prós e contras da revitalização urbana
Enfim o Estatuto da Cidade
Programa Habitat procura desenvolver a qualidade de vida nas cidades
Ocupações revelam déficit habitacional
Fórum Social propõe uma outra cidade possível
Novas metrópoles, velhos problemas
Conflitos entre centro e periferia
Qualidade das águas é cada vez pior
Lixo é problema ambiental com agravantes sociais
Transporte em São Paulo: conflitos e soluções
Poluição sonora piora ambiente urbano
Preservação ambiental: destino alternativo para o litoral sul de São Paulo?
Cidade tenta unir tecnologia com inclusão social
Educação para uma nova cidade
Brasília contrastes de uma cidade planejada
Vilas significaram distância entre patrões e operários
Artigos:
Dimensões da tragédia urbana
Ermínia Maricato

Aprovação do Estatuto da Cidade
Geraldo Moura

O passado nas cidades do futuro
Cristina Meneguello
"As cidades nos países subdesenvolvidos" em um mundo globalizado
Tatiana Schor
Cidades e seus fragmentos
Rogério Lima
Cidade, língua, escolae a violência dos sentidos
Cláudia Pfeiffer
A cidade como objeto de estudo
Maria Josefina Gabriel Sant'Anna
Poema:
Manual do novo peregrino
Carlos Vogt
 
Bibliografia
Créditos

 

 

Brasília: contrastes de uma cidade planejada

A partir de dois traços, em forma de cruz, no branco do papel, iniciou-se o esboço de um projeto urbanístico que entrou para a história. O desenho de um avião, em seguida, foi o ponto de partida para a planta da cidade. Após a sua construção, a cabine do piloto dessa aeronave, passou a abrigar os poderes que comandam o país. Em 1987, ela se tornou a primeira cidade moderna do mundo a ser tombada pela Unesco como Patrimônio Histórico da Humanidade.

Primeiros traços do projeto de Lúcio Costa

Tanto o projeto urbanístico de Lúcio Costa quanto a moderna arquitetura dos edifícios desenhados por Oscar Niemeyer conferem a Brasília características que não encontram paralelo em qualquer outra cidade do mundo. De automóvel, é possível atravessar toda a sua extensão, a partir da entrada Sul até o final da Asa Norte, sem pegar um único sinal de trânsito sequer. De cada ponto desse trajeto totalmente arborizado, vê-se a linha do horizonte: a cidade é plana e os edifícios residenciais têm, no máximo, seis andares. Além disso, o ar de Brasília é puro, pois não há indústrias pesadas ao seu redor.

Mas essa qualidade de vida, desfrutada por quem habita o Plano Piloto, tem um custo alto para a maioria da população, que mora nas periferias. Enquanto a cidade possui cerca de um automóvel para cada duas pessoas (maior índice do país), o seu transporte coletivo leva pouco mais do que um passageiro por quilômetro percorrido de linhas de ônibus, número que chega a ser quatro vezes menor do que o de cidades de mesmo porte. Esse baixo índice, que torna a tarifa de ônibus em Brasília uma das mais caras do país, se deve à grande distância entre as cidades-satélites, onde vive cerca de 90% da população do Distrito Federal, e o Plano Piloto, que concentra 77% dos postos de empregos do DF, segundo levantamento feito pelo Ministério do Trabalho, em 1999.

Arquitetura de Niemeyer

Os modernos edifícios do poder público, em Brasília, são apenas uma pequena parte da mundialmente conhecida obra do arquiteto Oscar Niemeyer. Seu trabalho tem os traços da arquitetura moderna lançada pelo francês Le Corbusier, que ele conheceu no Rio de Janeiro, no escritório de Lúcio Costa, onde iniciou sua carreira profissional. Niemeyer participou do projeto de reconstrução de Berlim após a guerra, e desenhou edifícios que se tornaram cartões postais de diversas cidades brasileiras, como a Igreja de São Francisco, na Pampulha, em Belo Horizonte, e o Memorial da América Latina, em São Paulo. O arquiteto foi chefe do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Novacap, empresa responsável pela construção de Brasília. Na capital, ele desenhou os edificios da Praça dos Três Poderes, da Esplanada dos Ministérios, incluíndo o Palácio do Itamaraty, além do Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente, e do edifício do Minhocão, na Universidade de Brasília.

Congresso Nacional
Palácio do Planalto
Palácio da Alvorada
Catedral de Brasília

 

Esses dados fazem parte de um estudo feito por pesquisadores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), sobre a ocupação territorial do DF. O estudo mostra que o processo de periferização, que em outras grandes cidades se deu por pressões do mercado imobiliário, no DF foi instituído pelo próprio governo. "O processo de implantação dos núcleos urbanos foi extremamente segregacionista desde a sua origem", afirma Frederico de Holanda, um dos responsáveis pela pesquisa.

O estudo revelou que, segundo estatísticas da Companhia de Desenvolvimento do Planalto Central (Codeplan), desde a construção da capital, a população do DF é maior nas cidades-satélites do que no Plano Piloto. Milhares de migrantes que foram para a região trabalhar na construção da capital, se alojaram, na época, nas imediações da Cidade Livre, atual Núcleo Bandeirante. Em 1958, uma parte dos operários foi convencida por assistentes sociais a se mudar para os loteamentos da primeira cidade-satélite que surgia: Taguatinga, a 20 Km do Plano Piloto. Pouco mais de uma década depois, com a Campanha de Erradicação de Invasões (CEI) criada pela administração de Brasília, surgia ao lado de Taguatinga aquela que seria a maior cidade-satélite do DF: Ceilândia. "A remoção dos moradores de várias favelas deu origem a essa cidade", conta Holanda. No censo de 1980, Ceilândia já possuía uma população maior que a do Plano Piloto.

Cidade Livre, atual Núcleo Banderante

 

"A configuração urbana do DF caracterizou-se como um modelo de ocupação muito menos compacto, muito menos denso", afirma Patrícia Melasso Garcia, outra pesquisadora da UnB envolvida no estudo. "As cidades criadas pelo poder público localizavam-se distantes do centro", ela diz. Os pesquisadores da UnB mencionam o documento Brasília Revisitada, escrito por Lúcio Costa em 1987, no qual o próprio urbanista, que projetou uma área de expansão na cidade-satélite do Guará, entre Taguatinga e o Plano Piloto, reconhece as consequências sociais da concentração populacional nas cidades-satélites. "A longa distância entre as satélites e o Plano Piloto isolou dois terços de sua população metropolitana que reside nos núcleos periféricos, além de gerar problemas de custo para o transporte coletivo", admite Lúcio Costa em seu texto.

(RC)

 

Misticismo

Com pirâmides que lembram a antiguidade egípcia, como o Teatro Nacional e o Templo da Boa Vontade, Brasília é cercada por misticismo desde a sua criação. Às margens do lago Paranoá, construído artificialmente para amenizar a baixa umidade da capital, há a inscrição de uma profecia atribuída a Dom Bosco, padre italiano fundador da Ordem dos Salesianos, em 1859. Na Ermida que leva o seu nome, o texto da profecia de Dom Bosco diz que "entre os paralelos de 15º e 20º, partindo de um ponto onde se formava um lago, surgirá a terra prometida". Brasília, situada nas proximidades do paralelo de 15º, é tida pelos místicos da cidade como a "terra prometida", vislumbrada por Dom Bosco.

Além da mística em torno de sua criação, Brasília também é o centro de uma região ecumênica. No entorno da capital, há duas grandes comunidades de sincretismo religioso: a Cidade Eclética, em Santo Antônio do Descoberto, onde vivem 1.500 pessoas, e o Vale do Amanhecer, perto de Planaltina, que existe há mais de 30 anos. Na saída para a BR-040, há também a Cidade da Paz, que abriga a Universidade Holística Internacional de Brasília.

 

 

Atualizado em 10/03/2002

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