Editorial:

As cidades e os muros
Carlos Vogt

Reportagens:
Prós e contras da revitalização urbana
Enfim o Estatuto da Cidade
Programa Habitat procura desenvolver a qualidade de vida nas cidades
Ocupações revelam déficit habitacional
Fórum Social propõe uma outra cidade possível
Novas metrópoles, velhos problemas
Conflitos entre centro e periferia
Qualidade das águas é cada vez pior
Lixo é problema ambiental com agravantes sociais
Transporte em São Paulo: conflitos e soluções
Poluição sonora piora ambiente urbano
Preservação ambiental: destino alternativo para o litoral sul de São Paulo?
Cidade tenta unir tecnologia com inclusão social
Educação para uma nova cidade
Brasília contrastes de uma cidade planejada
Vilas significaram distância entre patrões e operários
Artigos:
Dimensões da tragédia urbana
Ermínia Maricato

Aprovação do Estatuto da Cidade
Geraldo Moura

O passado nas cidades do futuro
Cristina Meneguello
"As cidades nos países subdesenvolvidos" em um mundo globalizado
Tatiana Schor
Cidades e seus fragmentos
Rogério Lima
Cidade, língua, escolae a violência dos sentidos
Cláudia Pfeiffer
A cidade como objeto de estudo
Maria Josefina Gabriel Sant'Anna
Poema:
Manual do novo peregrino
Carlos Vogt
 
Bibliografia
Créditos

 

 

Novas metrópoles enfrentam velhos problemas

A industrialização do país, após a era JK, promoveu um crescente processo de urbanização e consequente aumento das principais cidades brasileiras. Em 1950, apenas São Paulo e Rio de Janeiro tinham mais de 1 milhão de habitantes. Em quatro décadas, 13 cidades do Brasil atingiram esse patamar. Com o aumento do tamanho das cidades, surgiram novas metrópoles. Além da região metropolitana de São Paulo, que abrange 39 municípios, e do Rio de Janeiro, que engloba 21 cidades, existem hoje, no Brasil, outras dez grandes metrópoles. Juntas, elas abrigam 33,6% da população brasileira.

Saúde

Um dos problemas enfrentados pelos grandes centros metropolitanos é a alta demanda pela sua infra-estrutura hospitalar. Na região de Campinas (SP), por exemplo, as prefeituras de muitas cidades investem na compra de ônibus e ambulâncias para o transporte de usuários do sistema público de saúde, que são atendidos no Hospital de Clínicas da Unicamp. A cidade de Campinas, a 100 km da capital do estado, é o centro econômico da quinta maior metrópole do país em número de municípios: são 17 ao seu redor.

Na cidade de São Paulo, a demanda pela infra-estrutura na área de saúde adquire escala geométrica. Na capital paulista havia, em 1999, 145 hospitais particulares, 37 estaduais e 17 municipais. Apesar de a Organização Mundial de Saúde (OMS) estabelecer como padrão aceitável o número de 4,5 leitos para cada mil habitantes, São Paulo tinha naquele ano apenas 3,7. E isso, contando apenas a população da capital, que atende a demanda de grande parte da sua região metropolitana.

No ABC paulista, onde a demanda de municípios vizinhos com menos estrutura também é grande, o número de leitos em hospitais públicos aumentou 73%, de 1990 a 1997. Mesmo assim, apenas São Caetano do Sul possui o número de leitos recomendado pela OMS. Segundo o Datasus, os municípios de Santo André, São Bernardo do Campo e Diadema possuem em média 1,7 leitos para cada mil habitantes.

"Não é possível pensar em atendimento equânime das necessidades de saúde na metrópole, sem incorporar as questões desencadeadas por seu processo de conformação espacial e suas dinâmicas social, econômica e política", afirmam as pesquisadoras Aylene Bousquat e Vânia Barbosa do Nascimento, da Faculdade de Medicina do ABC.

Habitação

Outro grande problema das metrópoles brasileiras diz respeito justamente à ocupação espacial: o da habitação. Segundo a Prefeitura Municipal de São Paulo, entre 1973 e 1987, enquanto a população total do município cresceu 60%, o número de residentes em favelas aumentou mais de 100%. Em 1996, 7,61% dos paulistanos residia em favelas. No Rio de Janeiro, de acordo com o IBGE, os favelados passaram de 7,13 % da população, em 1950, para 17,57%, em 1991.

O arquiteto e urbanista peruano Eduardo Neira Alva, que foi professor visitante da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e é autor do livro Metrópoles (In)sustentáveis, observa que nas últimas cinco décadas, os assentamentos periféricos têm aumentado consideravelmente a sua área de ocupação nas metrópoles latino-americanas. No Rio de Janeiro, as favelas representam 35% da área total da cidade. Em Caracas e Santiago do Chile, esse número chega a 40%; e em Lima, a 50%. "A polarização social criou um verdadeiro apartheid, que representa a maior das dificuldades para o desenvolvimento sustentável dentro das cidades", diz Alva.

Essa polarização social é também analisada em um estudo dos pesquisadores do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ), Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro e Luciana Corrêa do Lago. Com base em dados estatísticos do IBGE, de 1991, eles avaliam a distância social entre moradores das favelas e dos bairros, no Rio de Janeiro. O estudo revela que enquanto 63,2% da população dos bairros possui pelo menos oito anos de estudo, 74,2% dos residentes em favelas estudaram no máximo sete anos. Nos postos de emprego, 34,5% dos moradores de bairro são trabalhadores de classe-média, 23,1% são proletários do setor terciário, 13% são trabalhadores de elite e 12,4% são operários. Nas favelas, 33,5% são proletários do setor terciário, 27,8% são operários, 17,1% estão em sub-empregos e 15,2% são trabalhadores de classe-média.

Perspectivas

Para a jornalista carioca Ana Lúcia Vieira de Azevedo, uma das colaboradoras do livro Metrópoles (In)sustentáveis, a sustentabilidade das metrópoles só será possível com a descentralização da política urbana. "Cada bairro ou micro-região deveria ser uma estrutura administrativa com razoável autonomia", ela diz. Segundo Azevedo, essa autonomia seria suficiente para identificar, gerir e solucionar mais rapidamente os problemas da micro-região.

Eduardo Alva, no entanto, diz que a descentralização e a participação nas decisões têm que ser conquistadas pelas comunidades locais. "Existem alguns exemplos, como a Associação dos Moradores da Rua Lauro Müller e Adjacências, no Rio de Janeiro, em que comunidades de diferentes tamanhos e em diferentes formas, conseguiram exercer sua capacidade criadora, integrada dentro de um sistema político", afirma o urbanista.

Já a pesquisadora Regina Maria Prosperi Meyer, do Centro de Estudos da Metrópole, ligado à USP, diz que as políticas públicas nas metrópoles têm que abranger todos os municípios envolvidos. "O projeto desenvolvido em escala metropolitana é sempre impulsionado e sustentado por questões abrangentes, que só encontrarão respostas efetivas nessa escala", declara Meyer.

(RC)

 

Atualizado em 10/03/2002

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