Novas
metrópoles enfrentam velhos problemas
A industrialização
do país, após a era JK, promoveu um crescente processo
de urbanização e consequente aumento das principais
cidades brasileiras. Em 1950, apenas São Paulo e Rio de Janeiro
tinham mais de 1 milhão de habitantes. Em quatro décadas,
13 cidades do Brasil atingiram esse patamar. Com o aumento do tamanho
das cidades, surgiram novas metrópoles. Além da região
metropolitana de São Paulo, que abrange 39 municípios,
e do Rio de Janeiro, que engloba 21 cidades, existem hoje, no Brasil,
outras dez grandes metrópoles. Juntas, elas abrigam 33,6%
da população brasileira.
Saúde
Um
dos problemas enfrentados pelos grandes centros metropolitanos é
a alta demanda pela sua infra-estrutura hospitalar. Na região
de Campinas (SP), por exemplo, as prefeituras de muitas cidades
investem na compra de ônibus e ambulâncias para o transporte
de usuários do sistema público de saúde, que
são atendidos no Hospital de Clínicas da Unicamp.
A cidade de Campinas, a 100 km da capital do estado, é o
centro econômico da quinta maior metrópole do país
em número de municípios: são 17 ao seu redor.
Na
cidade de São Paulo, a demanda pela infra-estrutura na área
de saúde adquire escala geométrica. Na capital paulista
havia, em 1999, 145 hospitais particulares, 37 estaduais e 17 municipais.
Apesar de a Organização Mundial de Saúde (OMS)
estabelecer como padrão aceitável o número
de 4,5 leitos para cada mil habitantes, São Paulo tinha naquele
ano apenas 3,7. E isso, contando apenas a população
da capital, que atende a demanda de grande parte da sua região
metropolitana.
No
ABC paulista, onde a demanda de municípios vizinhos com menos
estrutura também é grande, o número de leitos
em hospitais públicos aumentou 73%, de 1990 a 1997. Mesmo
assim, apenas São Caetano do Sul possui o número de
leitos recomendado pela OMS. Segundo o Datasus, os municípios
de Santo André, São Bernardo do Campo e Diadema possuem
em média 1,7 leitos para cada mil habitantes.
"Não
é possível pensar em atendimento equânime das
necessidades de saúde na metrópole, sem incorporar
as questões desencadeadas por seu processo de conformação
espacial e suas dinâmicas social, econômica e política",
afirmam as pesquisadoras Aylene Bousquat e Vânia Barbosa do
Nascimento, da Faculdade de Medicina do ABC.
Habitação
Outro
grande problema das metrópoles brasileiras diz respeito justamente
à ocupação espacial: o da habitação.
Segundo a Prefeitura Municipal de São Paulo, entre 1973 e
1987, enquanto a população total do município
cresceu 60%, o número de residentes em favelas aumentou mais
de 100%. Em 1996, 7,61% dos paulistanos residia em favelas. No Rio
de Janeiro, de acordo com o IBGE, os favelados passaram de 7,13
% da população, em 1950, para 17,57%, em 1991.
O arquiteto
e urbanista peruano Eduardo Neira Alva, que foi professor visitante
da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e é autor do livro
Metrópoles (In)sustentáveis, observa que nas
últimas cinco décadas, os assentamentos periféricos
têm aumentado consideravelmente a sua área de ocupação
nas metrópoles latino-americanas. No Rio de Janeiro, as favelas
representam 35% da área total da cidade. Em Caracas e Santiago
do Chile, esse número chega a 40%; e em Lima, a 50%. "A
polarização social criou um verdadeiro apartheid,
que representa a maior das dificuldades para o desenvolvimento sustentável
dentro das cidades", diz Alva.
Essa
polarização social é também analisada
em um estudo dos pesquisadores do Instituto
de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ), Luiz
Cesar de Queiroz Ribeiro e Luciana Corrêa do Lago. Com base
em dados estatísticos do IBGE, de 1991, eles avaliam a distância
social entre moradores das favelas e dos bairros, no Rio de Janeiro.
O estudo revela que enquanto 63,2% da população dos
bairros possui pelo menos oito anos de estudo, 74,2% dos residentes
em favelas estudaram no máximo sete anos. Nos postos de emprego,
34,5% dos moradores de bairro são trabalhadores de classe-média,
23,1% são proletários do setor terciário, 13%
são trabalhadores de elite e 12,4% são operários.
Nas favelas, 33,5% são proletários do setor terciário,
27,8% são operários, 17,1% estão em sub-empregos
e 15,2% são trabalhadores de classe-média.
Perspectivas
Para
a jornalista carioca Ana Lúcia Vieira de Azevedo, uma das
colaboradoras do livro Metrópoles (In)sustentáveis,
a sustentabilidade das metrópoles só será possível
com a descentralização da política urbana.
"Cada bairro ou micro-região deveria ser uma estrutura
administrativa com razoável autonomia", ela diz. Segundo
Azevedo, essa autonomia seria suficiente para identificar, gerir
e solucionar mais rapidamente os problemas da micro-região.
Eduardo
Alva, no entanto, diz que a descentralização e a participação
nas decisões têm que ser conquistadas pelas comunidades
locais. "Existem alguns exemplos, como a Associação
dos Moradores da Rua Lauro Müller e Adjacências, no Rio
de Janeiro, em que comunidades de diferentes tamanhos e em diferentes
formas, conseguiram exercer sua capacidade criadora, integrada dentro
de um sistema político", afirma o urbanista.
Já
a pesquisadora Regina Maria Prosperi Meyer, do Centro
de Estudos da Metrópole, ligado à USP, diz que
as políticas públicas nas metrópoles têm
que abranger todos os municípios envolvidos. "O projeto
desenvolvido em escala metropolitana é sempre impulsionado
e sustentado por questões abrangentes, que só encontrarão
respostas efetivas nessa escala", declara Meyer.
(RC)
|