Sistemas
de transporte em São Paulo: conflitos x soluções
Equacionar
o problema do transporte nas grandes metrópoles mundiais
sempre foi um desafio para governantes e técnicos do setor.
A crescente expansão das atividades industriais, a ocupação
desordenada do espaço territorial e o aumento da população
que busca empregos e novas perspectivas, aliado à falta de
um planejamento ordenado de crescimento, provocam desequilíbrios
na rotina diária de milhares de pessoas. O Brasil experimenta
atualmente os resultados da opção que fez, nos anos
50, pelo transporte rodoviário em detrimento do transporte
ferroviário. A instalação de um parque industrial
automobilístico, principalmente na região de São
Paulo, alavancou esse processo e marcou um momento de desenvolvimento
e modernidade no país. Considerado o estado mais rico e mais
produtivo do Brasil, São Paulo ilustra bem o quadro de conflitos
no setor de transporte. Porém, são evidentes os esforços
realizados no sentido de amenizar o cenário caótico
em que se encontra.
Regiões
metropolitanas
São
Paulo
O estado
de São Paulo conta com três grandes regiões
metropolitanas: a Região Metropolitana de São Paulo
(RMSP), Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS) e
a Região Metropolitana de Campinas (RMC). Juntas, elas concentram
21,5 milhões de habitantes e 23% do PIB nacional.
A RMSP,
que é a mais antiga de todas, foi criada em 1973. É
constituída por 39 municípios, totalizando 17 milhões
de habitantes. Segundo dados da Secretaria
dos Transportes Metropolitanos do Estado de São Paulo,
houve uma retomada do crescimento do sistema metro-ferroviário
na Grande São Paulo. A Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
(CPTM) registrou, nos dois últimos anos, um aumento de 15%
ao ano no volume de passageiros. O metrô, também nos
dois últimos anos, teve aumento de 4% e 6%, respectivamente,
no volume total de pessoas transportadas. Esses dois sistemas transportam
diariamente 3,6 milhões de passageiros, o que significa mais
de 40% do volume de transporte público da região metropolitana.
Paralelamente, foi verificada uma queda do número de passageiros
dos ônibus metropolitanos, dos inter-municipais e municipais.
Segundo Jurandir Fernandes, secretário dos Transportes Metropolitanos
de São Paulo, esses dados são muito animadores, pois
significa que o sistema metro-ferroviário tem qualidade,
conforto e preços acessíveis.
Campinas
Com
seis meses de vida, a Região Metropolitana de Campinas (RMC)
já discute com o governo de São Paulo a criação
de um corredor de ônibus entre Campinas e Sumaré, Hortolândia
e Monte Mor. As conversas com prefeitos e empresários das
cidades da RMC visam a elaborar um plano diretor para obter financiamento
do Banco Mundial. Jurandir
Fernandes considera esse processo um grande avanço. "Antes
não havia nenhum agente catalisador, ninguém tratava
dessa matéria. Um prefeito de qualquer uma dessas cidades
não tinha autoridade para tratar disso globalmente, nem era
atendido pelo Banco Mundial", afirma o secretário.
Investimentos
no transporte público
O Estado
de São Paulo é, hoje, qualificado internacionalmente
para a obtenção de empréstimos de que necessita
para melhorar seu sistema de transportes. Porém, o Estado
enfrenta dificuldades para obter empréstimos já que
é o governo federal quem faz o controle da capacidade de
endividamento de cada unidade da federação. Conforme
Fernandes, "esse é um problema, pois a gestão
Covas-Alckmin encontrou o Estado de São Paulo com dívidas
altíssimas e foi obrigado a renegociar dívidas da
ordem de R$ 35 bilhões, que ainda estão sendo pagas.
Isso dificulta a obtenção de recursos".
Apenas
na obra do Rodoanel, salienta o secretário, o Estado contou
com investimentos a fundo perdido do governo federal, pois a obra
é considerada de impacto nacional. Em janeiro desse ano,
houve também a aprovação de um empréstimo
do Banco Mundial, no valor de U$ 209 milhões, para a construção
da Linha 4 do Metrô de São Paulo. Essa linha deverá
atender mais de um milhão de pessoas por dia e promoverá
a integração modal e de tarifas entre ônibus,
metrô e trens, minimizando o custo geral do transporte e beneficiando
os usuários de baixa renda do sistema.
Crescimento
da frota de veículos
Apesar
de todas as medidas adotadas para a melhoria do transporte público,
é preocupante a situação do transporte individual.
Ao longo dos anos, devido à péssima situação
do transporte coletivo urbano e às facilidades para aquisição
de veículo próprio, o número de veículos
por habitante cresceu de maneira assustadora.
Trabalho
publicado por Alfesio Braga, Luiz Alberto Amador Pereira e Paulo
Hilário Nascimento Saldiva, da Faculdade de Medicina da USP,
intitulado Poluição Atmosférica e seus Efeitos
na Saúde Humana constatou que as duas principais fontes
de emissão de poluentes da RMSP são as indústrias
e a frota de veículos automotores que circulam pela cidade.
Essa frota é estimada em mais de 4,3 milhões de veículos
automotores. A proporção do número de carros
por habitante cresceu de 1/40 na década de quarenta, para
quase 1/2 nos anos noventa. Ocorre que, nesse período, a
malha viária não acompanhou ess crescimento. A desproporção
entre número de veículos circulantes e a malha viária
destinada a escoar uma frota veicular crescente, fez com que a cidade
de São Paulo enfrente aumento progressivo de congestionamentos
(veja a íntegra do documento
em pdf).
Ainda
segundo os autores, o cenário acima pode levar a dois caminhos:
restrição à circulação de veículos,
necessariamente acompanhada de um aumento da qualidade e acesso
ao transporte público, ou realização de grandes
obras viárias. Eles fazem uma comparação interessante
entre uma grande cidade poluída e um organismo doente. Frente
ao entupimento difuso das "artérias" (as ruas de
uma grande cidade), a opção é sempre uma ponte
de safena. No entanto, afirmam os autores, os cardiologistas somente
prescrevem uma ponte coronariana quando certificam-se de que o território
vascular situado após a ponte é normal. Este cuidado
quase nunca é tomado pelos "planejadores" urbanos,
que somente deslocam o local do estreitamento para mais adiante.
Na
visão do secretário Jurandir Fernandes, o comportamento
do trânsito é muito parecido com o dos vasos comunicantes.
"Existe até um modelo matemático desenvolvido
nos anos 70 e que está em vigor até hoje. À
medida que se chega a um ponto insuportável, as pessoas buscam
alternativas. Muitos deixam o carro e passam a utilizar o metrô.
Com isso, acaba o congestionamento, outros percebem e voltam a utilizar
o carro. Ou seja, existe um equilíbrio", afirma. "Isto
desfaz a ilusão de que quanto mais se constrói metrô,
mais se diminui o número de carros nas ruas. Porém,
o conforto existirá. Por exemplo, Paris tem 550 quilômetros
de metrô e 3 milhões de habitantes. São, aproximadamente,
450 estações de metrô e nem por isso deixa de
existir congestionamento. As pessoas vão se alinhando conforme
suas necessidades e conseqüentemente o sistema vai ficando
mais racional. À medida que o tempo passa as pessoas vão
aprendendo a utilizar o sistema de transportes e o espaço
público de uma forma racional, evitando custos de congestionamento,
poluição e acidentes", conclui.
(JB)
Para
saber mais
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Francisco
Salvador Veríssimo. Vida Urbana - A Evolução
do Cotidiano da Cidade. Rio de Janeiro: Ediouro, 2001. |
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