|  
             A 
              trajetória inacabada de uma regulamentação 
             
              Cristina Maria do Amaral Azevedo e 
              Eurico de Andrade Azevedo  
            Recursos 
              genéticos e alteração de seu "status" de patrimônio da humanidade 
              Até a Convenção 
              sobre Diversidade Biológica  entrar em vigor , os recursos genéticos 
              eram considerados como um patrimônio da humanidade. Esta concepção 
              baseava-se no reconhecimento de que esses recursos deveriam estar 
              disponíveis para todo e qualquer propósito, já que serviam como 
              matéria prima para produtos que beneficiariam todas as populações. 
              O que era verdade. Principalmente no caso do fluxo de recursos genéticos 
              destinados a manter e melhorar certos alimentos e ao aumento da 
              produção/produtividade agrícola (Zazzali & Muller,1998).  
            Nas 
              últimas décadas, esse quadro foi alterado pela crescente apropriação 
              dos recursos genéticos por meio do patenteamento de processos ou 
              produtos desenvolvidos e, em alguns países, do patenteamento até 
              mesmo do recurso genético em si. Os fatores apontados como responsáveis 
              por essa mudança são: o desenvolvimento da biotecnologia acoplado 
              ao crescimento das indústrias baseadas em recursos genéticos (farmacêutica, 
              nutricional, química, agrícola etc.) e a ampliação do direito de 
              propriedade intelectual sobre outras áreas, como a farmacêutica, 
              exigida pela OMC 
              - Organização Mundial de Comércio. 
             
              Desse modo, os recursos genéticos passaram a ser mais valorizados, 
              principalmente pelos países detentores dos mesmos, levando-os a 
              uma mudança de atitude com relação ao controle de seu acesso e exploração, 
              ficando cada vez mais evidente o desequilíbrio de força e poder 
              entre os países detentores de biotecnologia e os detentores de biodiversidade. 
               
            Para 
              se ter uma idéia, dos 150 produtos farmacêuticos mais indicados 
              nos Estados Unidos, 57% contém ao menos um componente derivado, 
              direta ou indiretamente, de recursos genéticos, sem que nenhum retorno 
              significativo tenha sido observado aos países provedores destes 
              recursos (CI - Conservation 
              International, 1998).  
            A 
              atividade de pesquisa que visa encontrar, nos recursos biológicos, 
              matéria prima para a biotecnologia demanda tempo e dinheiro. As 
              empresas divulgam que estas pesquisas, além de serem de alto risco 
              - em cada 10.000 amostras, apenas uma demonstra utilidade - demandam 
              grandes investimentos. As cifras mencionadas são da ordem de US$ 
              20 a 300 milhões e demoram cerca de 10 a 15 anos.  
            Por 
              outro lado, quando se descobre algo promissor e se chega a desenvolver 
              um processo ou produto comercializável ou aproveitável industrialmente, 
              o retorno financeiro também não é pequeno. O mercado mundial da 
              indústria química e farmacêutica de derivados da biodiversidade 
              movimenta cerca de US$ 200 bilhões por ano. Atribui-se, portanto, 
              à necessidade de alto investimento e de tecnologia de ponta o fato 
              de serem as pesquisas, nesta área, realizadas por empresas multinacionais, 
              universidades e institutos de pesquisa sediados em países ricos. 
               
            No 
              início das discussões sobre a elaboração de um tratado internacional 
              objetivando a conservação da biodiversidade, vislumbrou-se a oportunidade 
              de diminuir a desigualdade entre o "norte" e o "sul", reconhecendo 
              a soberania dos países sobre seus recursos biológicos e genéticos 
              e responsabilizando-os pela regulamentação da sua exploração.  
            A 
              partir daí, a regulamentação do acesso a recursos genéticos tem 
              sido tratada como um instrumento para garantir a distribuição dos 
              benefícios gerados a partir da sua exploração e, com isto, contribuir 
              para a conservação da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade 
              e o desenvolvimento.  
            Segundo 
              Zazzali & Müller (1998), três são os princípios que devem fundamentar 
              o acesso aos recursos genéticos, a saber: a) o acesso será determinado 
              por acordo mútuo; b) o acesso será sujeito ao consentimento prévio 
              fundamentado; c) os benefícios provenientes da exploração dos recursos 
              deverão ser distribuídos justa e eqüitativamente. 
             A 
              regulamentação do acesso a recursos genéticos no Brasil 
              A primeira iniciativa brasileira no sentido de disciplinar o acesso 
              aos recursos genéticos partiu da Senadora Marina Silva, do PT-Acre, 
              em 1995. O PL 306/95, de sua autoria, foi bastante debatido em reuniões 
              organizadas para esse fim com a participação da sociedade, representada 
              por ONGs, setor privado, universidades e governos estaduais. Após 
              sua ampla discussão no Senado, o Senador Osmar Dias (PSDB/PR) ofereceu 
              substitutivo, que foi aprovado por aquela Casa e encaminhado à Câmara 
              dos Deputados no final de 1998.  
            Paralelamente, 
              o Deputado Jacques Wagner (PT-BA) encaminhou à Câmara de Deputados 
              um Projeto de Lei (PL 4.579/98) cujo texto resgatava alguns aspectos 
              da proposta original da Senadora Marina Silva e incorporava críticas 
              provenientes do debate dessa proposta.  
            Ainda 
              nesse mesmo ano, o Executivo Federal, com base em estudo elaborado 
              por um grupo interministerial, especialmente criado para este fim 
              e coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, remeteu à Câmara 
              dos Deputados um Projeto de Lei e uma Proposta de Emenda Constitucional 
              (PL 4.751/98 e PEC no 618/98).  
            Foram 
              constituídas duas comissões especiais na Câmara, a primeira para 
              analisar os três Projetos de Lei existentes e a segunda para analisar 
              a Proposta de Emenda Constitucional. Aquela não chegou a iniciar 
              seus trabalhos; esta apenas promoveu a realização de depoimentos 
              de várias pessoas envolvidas com o tema.  
            Em 
              junho de 2000, a imprensa noticiou o estabelecimento de um contrato 
              de exploração de recursos genéticos existentes na Amazônia Legal 
              entre a empresa multinacional Novartis e a organização social Bioamazônia. 
              A Bioamazônia foi designada pelo governo federal, por meio do Ministério 
              do Meio Ambiente, para gerir o Probem - Programa Brasileiro de Ecologia 
              Molecular para o Uso Sustentável da Biodiversidade da Amazônia. 
              Esse contrato foi suspenso em razão de pontos controversos levantados 
              a respeito de sua legalidade, tendo em vista a inexistência de uma 
              lei federal que regulamentasse essa matéria (Azevedo et al, 2001). 
               
            Diversas 
              ONGs, universidades e outros setores da sociedade civil pediram 
              para que fosse acelerado o processo de tramitação dos Projetos de 
              Lei e de Emenda Constitucional na Câmara de Deputados. Porém, tais 
              reclamos foram ignorados e, em 29 de junho de 2000, a Presidência 
              da República editou, quase nos mesmos termos do seu Projeto de Lei, 
              a Medida Provisória no 
              2.052 (atualmente sob o no 2.126 ) [1].  
            Esta 
              Medida Provisória foi reeditada mensalmente sem alterações até 26 
              de abril de 2001. Durante esses dez meses o Governo Federal, principalmente 
              os Ministérios do Meio Ambiente e da Ciência e Tecnologia, recebeu 
              centenas de mensagens pedindo esclarecimentos, uma vez que o texto 
              legal, ao atribuir a um Conselho Interministerial - a ser criado 
              - a competência para autorizar e fiscalizar o acesso aos recursos 
              genéticos, na prática impediu as pesquisas que envolviam acesso 
              a recursos genéticos e a remessa de material biológico para o exterior. 
               
            Com 
              relação a todas as propostas para regulamentação acima mencionadas, 
              merece destaque o consenso quanto a exclusão dos recursos genéticos 
              humanos e do intercâmbio tradicional desses recursos como objetos 
              dessa regulamentação, explicitados tanto no PL306/95 e na MP 2.126-12. 
             Pontos 
              controversos da regulamentação nacional - breve comparação entre 
              o substitutivo do PL306/95 e a MP 2.126-12 
              Em primeiro lugar, convém advertir que, entre o Projeto de Lei da 
              Senadora Marina Silva e a última Medida Provisória editada pela 
              Presidência da República, decorreu um prazo relativamente longo: 
              seis anos. Durante esse tempo, realizaram-se estudos, simpósios, 
              seminários e encontros de especialistas para debater o tema, tanto 
              em nível nacional como internacional. É evidente que esse material, 
              de uma forma ou de outra, sempre aflora nos textos mais recentes. 
              Cabe àquela Senadora e a seus assessores o mérito de haverem iniciado 
              o processo. 
             Terminologia 
              utilizada: recursos genéticos ou patrimônio genético? 
              O PL 306/95 incorpora o termo e o conceito de "recursos genéticos" 
              adotados pela Convenção sobre Diversidade Biológica, o que facilita 
              o entendimento da matéria, visto que a Convenção tem força de lei 
              no Brasil e nos 174 países que a ratificaram.  
            A 
              Medida Provisória utiliza o termo "patrimônio genético", constante 
              da Constituição Federal de 1988, no art. 225, § 1º, inciso 
              V [2]. À primeira vista, por esse termo já 
              estar incorporado na Carta Magna, poderia parecer mais adequado 
              à compreensão. Isto, porém, não ocorre quando se analisam as definições 
              adotadas. A definição de patrimônio genético como informação 
              e não como matéria, desvia a regulamentação para um objeto 
              intangível, o que "pode causar divergências em sua interpretação. 
              Isto decorre do fato de que a atividade de pesquisa inicia-se com 
              a coleta de material biológico, conservado in situ ou ex 
              situ, e prossegue em laboratórios, onde, então sim, será acessado 
              o componente do patrimônio genético" (Azevedo et al, 2001). 
             Natureza 
              Jurídica dos recursos genéticos: 
              A polêmica a respeito desse tema gira em torno da questão: como 
              garantir a soberania nacional sobre esses recursos, de maneira democrática, 
              permitindo a participação dos respectivos detentores na concessão 
              do acesso aos mesmos e a repartição do benefícios decorrentes de 
              sua exploração? [3] 
             
              O PL 306/95 considera os recursos genéticos como "bens públicos 
              de uso especial". A definição do Código 
              Civil para bens públicos não é compatível com o objeto em questão, 
              motivo pelo qual deve ser afastado esse conceito.  
            O 
              Governo Federal, inicialmente, por meio da Proposta de Emenda Contitucional, 
              pretendia inserir o patrimônio genético no rol dos bens do patrimônio 
              da União. Esta idéia estava evidenciada no PL 4.751/98 e nas dez 
              primeiras edições da Medida Provisória, que consideravam a União 
              parte necessária nos contratos de exploração do patrimônio genético. 
              Talvez pela dificuldade de se aprovar uma Emenda Constitucional, 
              a nova versão da Medida Provisória redirecionou o problema. Não 
              explicita qual a natureza jurídica dos recursos genéticos e a União 
              - embora reserve a competência para a autorização do acesso - só 
              é parte integrante dos contratos, quando o acesso se der em áreas 
              de sua propriedade.  
            Diante 
              disso, pode-se considerar tais bens como de relevante interesse 
              público, como o conceitua Meirelles (2001: 540) "o patrimônio genético 
              poderia ser considerado um bem de relevante interesse público, assim 
              como as florestas que, sem deixarem de acompanhar a propriedade 
              do solo, submetem-se a um regime jurídico rigoroso para o seu aproveitamento". 
             Atribuições 
              Institucionais e Instrumentos  
              O grande desafio com relação a este aspecto está em permitir um 
              controle social, sem que este se traduza em um processo altamente 
              burocrático levando a custos de transação proibitivos.  
            O 
              PL 306/95 prevê a criação pelo Poder Executivo de uma "Comissão 
              de Recursos Genéticos", representativa da sociedade, que referendaria 
              as autorizações concedidas por um órgão da administração direta. 
              Prevê ainda a instituição de "agências de acesso", que atuariam 
              como intermediárias entre os detentores dos recursos genéticos e 
              os interessados na sua exploração. Com relação aos instrumentos 
              a serem adotados, foram previstos diversos tipos de contratos, principais, 
              acessórios, conexos e provisórios; além de explicitar quais as informações 
              necessárias para se requerer o acesso e qual o conteúdo mínimo indispensável 
              para cada tipo de contrato.  
            Como 
              se pode observar, o PL, ao priorizar a garantia do controle social 
              e propor diferentes instrumentos conforme as partes envolvidas, 
              incorporou ao texto da lei detalhes que tornam a concessão das autorizações 
              bastante burocratizada, dificultando a rapidez e a compreensão do 
              procedimento.  
            A 
              Medida Provisória adota outra postura ao apresentar um texto mais 
              conciso, conferindo à União a competência para a normatização, autorização 
              e fiscalização do acesso e da exploração dos recursos genéticos. 
              Com isso, entretanto, afastou a participação de outros setores da 
              sociedade também envolvidos com a questão. 
            Esta 
              Medida Provisória cria, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, 
              o "Conselho de Gestão do Patrimônio Genético", o qual, diferentemente 
              daquele proposto pelo PL306/95, é composto apenas por representantes 
              da Administração Pública Federal. Este Conselho tem, entre outras 
              atribuições, a de deliberar sobre o credenciamento de instituições 
              públicas que deverão analisar os requerimentos e emitir as autorizações, 
              tanto para o acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional, 
              quanto para a sua remessa a outra instituição.  
            Além 
              disso, o referido diploma contempla o "contrato de utilização do 
              patrimônio genético e de repartição de benefícios" e o "termo de 
              transferência de material".  
            Vale 
              destacar que, a partir da versão de 25 de abril de 2001, diferentemente 
              das anteriores, a exigência da assinatura do contrato, previamente 
              ao acesso à amostra do patrimônio genético e ao conhecimento tradicional 
              associado, só ocorrerá 'quando houver perspectiva de uso comercial'. 
              Tal condicionante enfraquece sobremaneira a garantia do cumprimento 
              da lei já que, como enfatiza Latour (1994) "os dois conjuntos que 
              supostamente ilustravam, até agora, uma pesquisa dita fundamental 
              e uma pesquisa aplicada transformaram-se profundamente, a ponto 
              de ser impossível, hoje, distingui-los". Desse modo, a identificação 
              da perspectiva de uso comercial fica sujeita a uma interpretação 
              subjetiva, podendo frustrar os direitos dos detentores dos recursos 
              genéticos e do conhecimento tradicional associado. 
             
              Como foi ressaltado anteriormente, na atual versão da MP a União 
              só é parte no contrato, quando for proprietária da área onde se 
              encontra o patrimônio genético. Estão previstas também as cláusulas 
              essenciais do contrato , entre as quais o foro no Brasil, para dirimir 
              as questões dele resultantes. Não se justifica, contudo, a restrição 
              contida no parágrafo único desse artigo, pois o regime jurídico 
              de direito público não deve reger somente os contratos em que a 
              União for parte, mas também quando Estados e Municípios o forem. 
             Medidas 
              preventivas ao dano ambiental e cultural 
              Enquanto o PL 306/95 adota claramente o princípio da precaução [4], 
              prevendo a adoção de medidas destinadas a impedir o dano, tanto 
              no que diz respeito à biodiversidade, quanto em relação à integridade 
              cultural das comunidades tradicionais e povos indígenas, a MP não 
              o faz. Pelo contrário, medidas de prevenção só serão adotadas se 
              existir "evidência científica consistente [5]" 
              de perigo de dano grave e apenas com relação à biodiversidade, nada 
              explicitando quanto à possíveis danos às culturas tradicionais. 
             Proteção 
              ao conhecimento tradicional associado  
              Esse é um dos pontos mais controversos dessa matéria e sobre ele 
              há uma razoável produção analítica por parte de advogados e sociólogos 
              (v.g. Santilli,2001 e Santos,2001). Neste artigo, identificaremos 
              apenas as principais questões levantadas.  
            O 
              etnoconhecimento, embora não seja reconhecido como parte integrante 
              da ciência ocidental contemporânea, tem sido por ela utilizado e 
              apropriado. A questão é: como proteger esse conhecimento, que obedece 
              à uma lógica tão diferente da ciência? Por meio dos instrumentos 
              ortodoxos do direito de propriedade intelectual? Ou por meio de 
              um regime sui generis de proteção aos direitos intelectuais 
              coletivos, como sugerem os autores acima citados?  
            Segundo 
              Lima (1998), embora o PL 306/95 declare que o conhecimento tradicional 
              seja inalienável, impenhorável e imprescritível, abre a possibilidade 
              de reconhecimento de direitos de propriedade intelectual. Não obstante, 
              é evidente a intenção de proteger o conhecimento tradicional e de 
              garantir aos povos indígenas e comunidades tradicionais o direito 
              de negar o acesso tanto ao conhecimento, como aos recursos genéticos 
              existentes em seus territórios, pois institui o consentimento prévio 
              fundamentado.  
            O 
              Executivo Federal avançou um pouco neste tema. Não havia, por exemplo, 
              no PL 4.751/98 menção à legitimidade para proteção dos conhecimentos 
              tradicionais e tampouco à proibição de obtenção de direitos de propriedade 
              intelectual sobre inovações produzidas, com base em conhecimento 
              tradicional (Lima, 1998). Também não era dada aos povos indígenas 
              e comunidades tradicionais o direito de anuir sobre o ingresso em 
              seus territórios para a realização do acesso aos recursos genéticos 
              e conhecimento tradicional (Santilli,2001).  
            A 
              Medida Provisória reconhece, em termos, o direito de as 'comunidades 
              indígenas e locais' decidirem sobre o uso de seus conhecimentos 
              tradicionais associados ao patrimônio genético. Com a nova versão 
              da MP é instituída a anuência prévia da comunidade indígena à autorização 
              de acesso e de remessa. Mas, como bem observa Hathaway (2001) "..é 
              um avanço sim, mas limitado, uma vez que todas as outras comunidades 
              tradicionais continuam desprotegidas... e uma vez que está prevista 
              a dispensa desta anuência no caso de relevante interesse público". 
               
            Outrossim, 
              a Medida Provisória mantém a tendência do Executivo em considerar 
              cabível a utilização do direito de propriedade intelectual neste 
              tema. Pois, apesar de reconhecer que o conhecimento tradicional 
              poderá ser de titularidade da comunidade, afirma que a proteção 
              a este conhecimento não 'afetará, prejudicará ou limitará direitos 
              relativos à propriedade intelectual'.  
            Conclusão 
              Voltando ao título deste artigo, este é um breve relato do processo 
              - ainda inacabado - da regulamentação federal, no Brasil, do acesso 
              aos recursos genéticos, ou patrimônio genético, e ao conhecimento 
              tradicional associado. Inacabado porque o texto legal em vigor, 
              a MP 2.126-12, possui validade por 30 dias. Provavelmente será reeditado 
              mensalmente, até que seja aprovado pelo Congresso Nacional, que 
              poderá efetuar as alterações que desejar. Assim, nada garante ainda 
              um ambiente institucional seguro para a realização de bioprospecções. 
              Infelizmente não há, a curto prazo, indícios de que seja retomada 
              a discussão, mais democrática, dos projetos de lei existentes na 
              Câmara dos Deputados; ou que seja elaborado um projeto de conversão 
              dessa Medida Provisória em lei, o que garantiria uma base consensual 
              maior para a regulamentação da matéria.  
            Cristina 
              Maria do Amaral Azevedo é bióloga, mestre e doutoranda do 
              Programa de pós-graduação em Ciência Ambiental da USP. Eurico de 
              Andrade Azevedo é professor de Direito Administrativo e advogado 
              em São Paulo.  
            [1] 
              Este artigo foi escrito utilizando-se a 11a versão da MP 2.126, 
              de 26/4/2001. Em 25 de Maio, foi publicada a 12ª versão, que 
              apresenta no geral apenas alterações no formato do texto legal - 
              alíneas e incisos. Há porém um parágrafo novo (11º) do Inciso 
              V, art.16. Este trata das exigências para coleta, por parte de instituições 
              detentoras de Autorização Especial de Acesso e Remessa. 
              [2] Embora este termo apareça no contexto apenas de preservação 
              e não de exploração.  
              [3] Os recursos genéticos encontram-se em material biológico existente 
              em propriedades privadas ou públicas (federais, estaduais e municipais), 
              em territórios indígenas e áreas pertencentes a comunidades tradicionais. 
                
              [4] "O princípio da precaução foi elevado à categoria de regra do 
              direito internacional ao ser incluído na Declaração do Rio, resultado 
              da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento-RIO/02" 
              (Rios, 2001: 90)  
              [5] Enquanto o "Princípio da Precaução" prevê a não concessão de 
              autorização ou a suspensão de determinada atividade, quando houver 
              algum risco de dano; o "Princípio do Risco", adotado pela MP, exige 
              a evidência consistente de perigo de dano, como requisito para que 
              atitudes preventivas sejam adotadas. Como se sabe, muito tempo pode 
              ser necessário para que a ciência possa fornecer estas evidências 
              - haja visto o caso da 'vaca louca'. 
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