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Projeto
apresentou propostas para a construção de outros 500
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Já em 1998, o Projeto Brasil Outros 500 começou a ser delineado por entidades ligadas aos movimentos sociais, que criaram o Movimento Brasil: 500 anos de Resistência Indígena, Negra e Popular. Entre as entidades estavam o Conselho Indigenista Missionário (Cimi); a Central Única dos Trabalhadores (CUT); o Movimento Negro Unificado (MNU); a Coordenação Nacional de Entidades Negras (Conen); a Central de Movimentos Populares (CMP); a Comissão Pastoral da Terra (CPT); o Conselho de Articulação dos Povos e Organizações do Brasil (Capoib); o Comitê 500 anos de resistência indígena, negra e popular; entre outros. Mas o projeto só começou a ser posto em prática no início de 2000. Essas entidades organizaram, por todo o país, debates sobre temas estratégicos para a questão da desigualdade social, como as relações de gênero, as relações das ONGs com a sociedade com o governo e os direitos humanos, e a preservação de direitos dos negros, índios, mulheres e trabalhadores. Para cada temática foi feita uma discussão e, depois, cada movimento partiu para rever a sua própria atuação. Segundo Saulo Feitosa, vice-presidente do Cimi, a demarcação das terras indígenas e a reforma agrária foram temas bastante discutidos pelas entidades. "A desigualdade social que se apresenta hoje no país está ligada à própria formação do estado brasileiro. A estrutura agrária, por exemplo, definida ainda em tempos coloniais, é responsável pela desigualdade e pela violência no campo", afirma Feitosa. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (www.ibge.gov.br) computou no último censo, 741 aldeias, mas na listagem do governo constam apenas 563. Segundo Feitosa, o governo federal não reconhece por exemplo, os 200 mil índios que vivem nos centros urbanos, em comunidades organizadas, mantendo um referencial de grupo e suas tradições. Ele cita como exemplo a comunidade Pankararu, que congrega 900 índios vivendo em um conjunto habitacional na capital paulista. Eles moram em um centro urbano, trabalham como qualquer outro cidadão brasileiro, mas quando voltam para casa - um conjunto habitacional vertical - encontram a comunidade nos moldes que encontrariam nas aldeias. "Esse resgate dos índios que estão longe das aldeias foi feito dentro do Projeto Brasil Outros 500 e a realidade do índio urbano, que quer ser identificado como índio, foi exposta". O vice-presidente do Cimi ressalta ainda que, assim como os Pankararu, nos últimos 30 anos, 43 povos ressurgiram e têm buscado o reconhecimento de sua identidade, de sua cultura, a demarcação de suas terras e os seus direitos como cidadãos brasileiros. Em caravanas saídas de todas as partes do Brasil, com a participação de 150 povos, os índios fizeram a Marcha Indígena 2000, até chegarem em Coroa Vermelha , onde foi realizada a Conferência dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil, no dia 21 de abril. Com o apoio das entidades ligadas ao Projeto Outros 500, e prefeituras municipais, a Marcha passou por Brasília (DF), Goiânia (GO), Cuiabá (MT), Imperatriz (MA), Belém (PA), Rio Branco (AC), Manaus (AM), sempre levando as propostas elaboradas para a construção dos próximos 500 anos. Feitosa destacou a importância da marcha para a união dos povos indígenas. Alguns deles, que tem pouco contato com o não-índio, não falam o português, e não têm imunidade à algumas doenças, estiveram juntos de outros, que vivem em centros urbanos, adaptados à vida das grandes cidades. Sobre o envolvimento da sociedade com o projeto, o vice-presidente do Cimi afirmou que em determinados municípios os índios foram recebidos por mais de 20 mil pessoas. Foi o caso de Bom Jesus da Lapa (BA). "Em Vitória da Conquista (BA), 30 mil pessoas participaram da manifestação organizada pelo Movimento de Resistência Indígena, Negra e Popular, constituído pelos participantes do Projeto Outros 500". "O projeto ajudou a fortalecer outros movimentos sociais, como o movimento negro", revela Lajara Janaína, representante da Casa Laudelina de Campos Melo, organização de Campinas (SP), de mulheres negras, que lutam pelos seus direitos. Para ela, o ano passado foi um ano de debates sobre os anos de exploração dos negros desde a sua chegada ao Brasil, e o projeto deu visibilidade a essas e outras questões ligadas às minorias, que tiveram papel ativo na construção da história do Brasil. O movimento negro saiu fortalecido com esses debates e, segundo Lajara, o projeto não parou nisso, pois ainda há discussões dentro do movimento sobre como o governo e a sociedade em geral irão oferecer, nos próximos 500 anos, maiores oportunidades de trabalho, saúde e educação para a comunidade negra.
Para o deputado estadual Emídio de Souza, vice-líder da bancada do Partido
dos Trabalhadores (PT) na Assembléia
Legislativa do Estado de São Paulo e membro da Comissão dos Direitos
Humanos, o Projeto Outros 500 foi muito significativo para despertar
a cidadania, trazendo à tona o que realmente foi a colonização do Brasil
e a dominação que se sofre até hoje. Para ele, o projeto foi importante
para aumentar o nível de consciência do processo de dizimação dos índios,
da segregação dos negros e das mulheres. A questão da discriminação dos negros, das mulheres e dos pobres precisa ser revista e o projeto deu maior visibilidade a essa problemática, mostrando também aos movimentos sociais que é preciso maior organização e mobilização. Para o deputado, a Comissão dos Direitos Humanos deve se organizar melhor para trabalhar mais ativamente com todos os segmentos da sociedade. Ele reconhece que hoje está mais voltada ao tema penitenciário, mas tem que voltar a discutir essas outras questões de ordem social que este ano estão à deriva. Apesar de o Governo tentar fazer das comemorações dos 500 anos do descobrimento, um evento onde se mostrasse uma identidade nacional mais ampla, o que o Projeto Outros 500 mostrou foi que essa visão está bastante distante da realidade. Os contrastes em relação às diferenças sociais ficaram mais evidentes, levando as minorias - índios, negros, mulheres, trabalhadores sem terra, desempregados, todos cidadãos brasileiros - a produzir um movimento à parte das comemorações oficiais para se apresentarem à sociedade brasileira. Manifesto serviu de base para projeto O manifesto Brasil: 500 anos de Resistência Indígena, Negra e Popular é um documento que foi elaborado por entidades ligadas aos movimentos sociais que traz em seu conteúdo, além das orientações para o movimento de mesmo nome, uma retomada da história dos 500 anos do descobrimento do Brasil, realçando as vitórias das lutas das minorias.
O documento retoma, de forma bastante resumida, a história dos 500 anos do descobrimento, desde a chegada dos portugueses até os dias de hoje. Porém, o movimento procurou fazer uma nova leitura dessa história, destacando as derrotas e vitórias das lutas de classes que são, na opinião das entidades que participaram do movimento, a verdadeira razão para comemorar os 500 anos do descobrimento. Além de fazer uma crítica às formas de dominação que marcaram os últimos 500 anos, o manifesto propõe ações que deveriam ser tomadas para que o movimento conseguisse atingir os objetivos de refletir e celebrar a resistência indígena, negra e popular na história brasileira. As propostas apresentadas no manifesto serviram para orientar as atividades do Projeto Brasil Outros 500, entre elas a marcha indígena, as atividades culturais, o engajamento do maior número possível de movimentos sociais ao projeto, de forma a permitir que em todo o país houvessem atividades culturais e de reflexão que tivessem como referência a questão dos 500 anos. A articulação desse movimento com as lutas sociais já existentes em âmbito local e nacional foi muito importante para o êxito do Projeto Brasil Outros 500 e também estava entre as propostas do manifesto. |
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Atualizado em 10/04/2001 |
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