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Os dragões
dominam o espaço: |
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Alberto
Betzler
Podemos dizer que a utilização de foguetes pelo chineses começou no ano de 904 d.C. quando a cidade de Tzu T'ung estava cercada por um exército de 100.000 soldados mongóis. Os seus aterrorizados moradores esperavam o pior, quando o inimigo lançou um ataque frontal devastador. O comandante de defesa da cidade, Chang Yung, ordenou o início de um contra-ataque aos mongóis com uma chuva de pedras e flechas de fogo. Não se sabe exatamente se o relato se refere a verdadeiros foguetes, movidos a pólvora negra, ou apenas flechas com panos em chamas. O fato é que os foguetes militares foram amplamente utilizados à partir do século XIII. Diversos cronistas da época mencionavam que o terrível som produzido por esses projéteis parecia sacudir o céu. O efeito do uso destes foguetes, dotados de flechas ou lanças com setas envenenadas, era tanto psicológico quanto destrutivo, pois estas setas tinham um alcance muitíssimo superior ao das que eram arremessadas pelos mais fortes guerreiros. Já no século XX, entre 1935 e 1936, os primeiros passos para o programa espacial chinês foram dados quando o jovem Tsien Hsue-shen ganhou sucessivas bolsas de estudos em centros de pesquisa como MIT e CalTech. Nesta última instituição Tsien permaneceu perto de 20 anos, começando como aluno e conseguindo, por fim, a cadeira de professor Goddard, um título que o caracteriza como um dos mais importantes pesquisadores em ciências espaciais dos EUA. Um de seus mais interessantes trabalhos desta época foi um funcional veículo transcontinental movido a propulsão - foguete. Seu foguete de 22 toneladas poderia transportar dez passageiros de Nova York a Los Angeles em 45 minutos. O lançamento do veículo ocorreria na vertical, com o funcionamento por 60 segundos do motor, que levaria a nave a uma velocidade de 14.740 km/h e uma altitude de 160 km. Seu pouso seria na horizontal, como um avião comum, a uma velocidade de 240km/h. Pelo pioneirismo e realismo de seu projeto, Tsien é considerado o pai do espaçoplano, que é um veículo capaz de ir ao espaço e pousar como um avião comum. A materialização indireta deste projeto foi o X-20, um espaçoplano militar que foi testado com sucesso na década de 1960. Estas naves foram as precursoras dos ônibus espaciais, amplamente utilizados pelos norte-americanos e testados pelo soviéticos e europeus.
Com a caça aos comunistas iniciada pelo senador norte-americano Joseph Mccarthy em 1950, Tsien foi impedido de trabalhar no CalTech e nos próximos cinco anos seu destino ficou nas mãos de dois grupos da burocracia do governo norte-americano. Uma facção do governo acreditava que ele deveria ser imediatamente deportado de volta para a China, por ser considerado como um potencial espião, e outro grupo defendia sua permanência nos EUA, devido ao seu grande conhecimento da tecnologia dos mísseis norte-americanos. Em setembro de 1955, Tsien foi deportado e, imediatamente, após sua chegada à China, foi incorporado ao programa de mísseis daquele país. Uma de suas metas foi iniciar o projeto de desenvolvimento dos futuros mísseis balísticos Dong Feng (DF-1, DF-2 e DF-3).
O início da construção do centro de lançamentos de Jiuquan, já em julho de 1956, sinalizou a importância dada ao projeto pelo governo chinês. Outra importante contribuição foi dada em outubro de 1957, quando a China assinou um tratado com a União Soviética para transferência de tecnologia de mísseis e bombas nucleares. Neste período foram criadas as fábricas de mísseis de Shenyang e Nancheng, que se destinavam a construir veículos baseados nos desenhos fornecidos pelos técnicos soviéticos, além de projetos chineses. Por não transferir tecnologia para confecção de bombas atômicas, entre outros motivos, a China rompeu com a URSS em 23 de agosto de 1960. Cerca de um mês após o rompimento, foi lançado de Jiuquan o primeiro míssil fabricado na China, que nada mais era que uma cópia de um foguete soviético R2. Nesta mesma época, como uma forma de demonstrar independência tecnológica, Tsien foi incumbido de retomar o projeto de construir veículos capazes de levar bombas atômicas a distâncias de 10.000 km. O objetivo desta iniciativa era construir a versão intercontinental do míssil Dong Feng (DF-3). Um dos primeiros êxitos ocorreu em 27 outubro de 1966, quando um DF-2 foi lançado da localidade de Shaunchengtzu, viajando 800 km até Lop Nor, onde uma bomba nuclear de 20 kton, alojada na ogiva do míssil, foi detonada. O primeiro lançamento bem sucedido do DF-3 ocorreu no mesmo ano e de variantes deste projeto surgiu o Longa Marcha-1 ou CZ-1, o primeiro de uma série de poderosos lançadores espaciais criados pelos chineses. Com o domínio da tecnologia de foguetes balísticos para o transporte de armas de destruição em massa, o programa espacial chinês começou a se voltar para o lançamento de satélites com finalidades variadas. Após alguns testes, em 24 de abril de 1970 um CZ-1 colocou em órbita o primeiro satélite chinês: o China 1 DFH ou Mao 1. Nos anos de 1974, 1975, 1976 e 1978, os chineses lançaram uma série de veículos denominados satélites recolhíveis de teste ou Fanshui Shi Weixing, que, segundo analistas ocidentais, poderiam ser protótipos de um hipotética nave tripulada. Esta idéia foi confirmada em 1979 quando Jen Hsin-Min, então diretor da agência espacial chinesa, revelou que seu país estava não só trabalhando em uma cápsula espacial tripulada como também em uma estação do tipo SkyLab. Outras declarações em relação aos reais objetivos do programa espacial tripulado foram feitas em dezembro de 1980 por Wang Zhuanshan. O secretário-geral da Sociedade de Pesquisa Espacial da Nova China e engenheiro-chefe do Centro Espacial da Academia Chinesa de Ciências declarou que o lançamento e recolhimento de astronautas já não era mais um problema, mas deveria ser deixada para outro momento, em função do seu elevado custo. Wang foi formalmente desmentido em janeiro do ano seguinte, quando o governo chinês liberou imagens de astronautas em treinamento e de um foguete civil da série Feng Bao (vento forte ou tempestade), provavelmente destinado a lançar uma nave tripulada. Desde o final dos anos 1970, a idéia do vôo tripulado tinha sido deixada em um segundo plano até 1984, quando, por parte de uma iniciativa diplomática, o presidente Reagan propôs que o vôo do primeiro astronauta chinês poderia ocorrer em um ônibus espacial. Em 1986, o jornal Diário do Povo divulgou que tinha sido reiniciada a seleção e treinamento de astronautas, mesmo ainda prevalecendo a idéia de que o projeto tinha custos muito elevados. Apesar da aparente incongruência, neste período, os chineses lançaram diversos satélites recolhíveis com a intenção de testar os equipamentos a serem usados em sua nave tripulada, além de realizar experiências em um ambiente de microgravidade e reconhecimentos fotográficos. Eventos de grande relevância para a astronáutica chinesa ocorreram em 1990, quando lançadores CZ-3 colocaram em órbitas geoestacionárias os primeiros satélites de comunicações: o China 26 e o comercial de Hong Kong Asiasat-1. Este lançamento mostrou a confiabilidade dos foguetes chineses e, após o lançamento da inovadora FSW 13, a agência oficial de notícias Xinhua informou que este feito era de grande significado para a expansão da exploração científica e experimentação tecnológica da China, bem como para o desenvolvimento da tecnologia para transportar pessoas ao espaço. A experiência adquirida com o lançamento de foguetes Longa Marcha e satélites recolhíveis capacitou os técnicos chineses a retomarem um projeto iniciado em 1978, o 921. O projeto 921 é a síntese dos resultados obtidos com os FSW e a parceria feita com a Rússia nos anos 1990. A nave idealizada para o projeto 921 tem design e dimensões muito semelhantes aos da Soyuz A, de 1962. A principal diferença entre os veículos está na existência de um grande conjunto de células solares que são capazes de gerar cerca de 1,5 kW de energia elétrica. Esta potência é pelo menos três vezes superior à gerada pela Soyuz e maior que a do módulo principal da estação russa Mir. Outra característica desta nave é sua divisão em três partes: módulo orbital, cápsula e módulo de serviço. O módulo de serviço é a parte da nave onde ficam as baterias e os propulsores para manobras orbitais. A cápsula é a região destinada a alojar os astronautas ou os equipamentos científicos que retornaram a Terra e o módulo orbital é uma parte da nave que pode permanecer em órbita para realização de tarefas variadas. O primeiro vôo do projeto 921-1, batizado pelo presidente Jiang Zemin de Shenzhou (Navio dos Deuses, Nave Divina ou Mecanismo Divino), teve seu início às 6:30 h da manhã, hora de Pequim, do dia 20 de novembro de 1999 (19/11/1999 - 22:30 Tempo Universal, UT). A espaçonave foi colocada em uma órbita de 196,3 km x 324,4 km e a uma inclinação de 42,6 graus em relação ao equador. Outros dois objetos (último estágio do foguete e fragmentos) foram também detectados em órbitas próximas por estações terrestres. A Shenzhou foi controlada a partir do novo Centro de Controle e Direção Aeroespacial. As imagens liberadas sugerem que este vôo foi controlado a partir de um centro de alta sofisticação tecnológica. Análises da trajetória da nave indicaram que não houve tentativas de manobras e que, por uma razão não revelada, os painéis solares não foram estendidos. Às 18:49 UT, o navio de acompanhamento Yuanwang-3, ancorado na costa da Namíbia, recebeu os sinais da Shenzhou e enviou um comando para acionar os retrofoguetes para saída de órbita. A espaçonave saiu do alcance do navio após nove minutos quando a nave passou sobre a África, indo em direção à costa da Península Arábica, Paquistão, e finalmente reentrado na atmosfera no Tibet. Após a reentrada, um pára-quedas foi aberto a uma altitude de 30 km e, a cerca de 1,5 m sobre o solo, os foguetes da cápsula dispararam para amenizar o choque. A cápsula pousou em 41 graus N, 105 graus E, (a 415 km de distância de sua plataforma de lançamento e 110 km a noroeste de Wuhai, Mongólia Interior), às 3:41h da manhã de 1 de novembro, hora de Pequim (20 de novembro 19:41 UT). A espaçonave completou 14 órbitas sobre a Terra em 21 horas e 11 minutos. O segundo vôo da série Shenzhou ocorreu em 10 de janeiro de 2001. A nave foi lançada à 01:00:03, hora de Pequim, recebendo a designação internacional 2001-001. Dez minutos depois do lançamento, a Shenzhou 2 se separou do segundo estágio do lançador CZ-2F, entrando em uma órbita de 197 km x 335 km e com uma inclinação de 42,58 graus. Diversos relatos de observações da nave foram divulgados pela internet: Paul Maley, de Houston (Texas, EUA) mencionou que conseguiu ver a nave usando binóculos, cerca de seis horas e meia depois do lançamento. A estimativa feita por este observador era que o artefato apresentava uma magnitude entre 2 e 3,5, perfeitamente visível a olho nu. Com a nave em órbita, a imprensa chinesa começou a chamar a Shenzhou 2 de primeira nave não tripulada, se comparada com a Shenzhou-1 que era uma espaçonave experimental. Esta diferença foi atribuída ao fato da Shenzhou-2 estar equipada com a grande maioria com sistemas operacionais de uma nave que transportaria astronautas. Em 11 de janeiro, o Comando Espacial dos Estados Unidos (USSPACECOM) reportou que Shenzhou 2 tinha passado para uma órbita com perigeu mais elevado (329 km) e que mais manobras poderiam ser esperadas. Neste mesmo dia, as autoridades chinesas divulgaram que a nave não estava executando apenas um vôo de testes, mas também diversas experiências e observações científicas. O número de experimentos anunciados era de 64, dos quais 15 estavam dentro da cápsula, 12 no módulo orbital e 37 instalados em um segmento anexo ao casco da nave. A carga útil incluía equipamentos destinados a ensaios com microgravidade, como o crescimento de cristais; experiências com 19 espécies de animais e plantas, detectores de raios cósmicos; etc. Devido à enorme complexidade e número de tarefas executadas, esta missão foi considerada a mais importante na história da astronáutica chinesa. Após 6 dias 18 horas e 21 minutos, a cápsula retornou à Terra no dia 16 de janeiro às 19:22 hora de Pequim (11:22 UT) pousando na Mongólia Interior. Boatos posteriores ao pouso foram lançados em relação à integridade da cápsula devido à não liberação de imagens ou informes. Este rumores foram desmentidos pelas autoridades chinesas em 02 de fevereiro, com um curto "não aconteceu nada de errado". Segundo estimativas não oficiais, o módulo orbital permanecerá em órbita por seis meses, o que também pode ser sugerido pela elevação de sua órbita para 388 km x 404 km. Declarações de 21 de janeiro feitas por Wang Yongzhi, membro da academia de ciências da China, revelaram que os testes feitos com a Shenzhou-2 e o módulo orbital constituíam a primeira fase de um projeto que visa a construir uma estação espacial (projeto 921-2). A primeira fase seria o domínio da técnica do vôo espacial, que seria completada com o uso da Shenzhou em uma missão tripulada. Atividades de astronautas fora da nave (EVA), com a construção de um laboratório orbital e a técnica de acoplamentos entre veículos seriam as metas seguintes. A fase final seria a construção de uma estação espacial de grande porte. Se a China se tornar o terceiro país a mandar homens para o espaço, qual seria o nome mais adequado chamar os tripulantes de suas espaçonaves ? Astronauta, termo criado pelos norte-americanos, ou cosmonauta, conforme usado pelos soviéticos e atuais russos? Um sugestão para este impasse foi dada em 1998, por Chiew Lee Yih. Ele propôs usar a palavra chinesa Taikong, que significa espaço ou cosmos, para criar o sufixo taiko que é similar em significado a astro e cosmo. Com uso de taiko + nauta criamos a palavra taikonauta. Por outro lado, se retirarmos o g de Taikong, obtemos Taikon, que tem uma pronúncia mais fácil e próxima da palavra Taikon ren que significa homem espacial. Estação Espacial Em abril de 1992, as lideranças chinesas decidiram que um programa espacial tripulado poderia ser levado adiante. O Conselho de Estado determinou que uma nave tripulada deveria ser lançada no novo milênio para estabelecer a posição da China como uma das grandes potências mundiais. O programa espacial nacional tripulado chinês recebeu o nome de projeto 92 e a sua parte inicial, o 921-1, deveria ser uma nave tripulada como primeiro vôo programado para outubro de 1999. O segundo estágio, 921-2, seria a de uma estação espacial tripulada. O terceiro, 921-3, seria um moderno sistema de transporte de passageiros e carga da Terra ao espaço, usando um veículo alado, com previsão para estar operacional em 2020. Para lançar as espaçonaves 921-1 e 921-2 , um novo foguete movido a oxigênio e querosene foi proposto. O uso destas duas substâncias eliminaria o uso de combustíveis tóxicos comuns nos lançadores da série CZ-2. Outra sugestão apresentada foi usar um aglomerado de pequenos foguetes idênticos ao primeiro estágio (lançador Tipo C) que possibilitaria colocar em órbita cargas úteis muito massivas, como um laboratório orbital. O projeto original do módulo principal da estação espacial 921-2 teria uma massa total de 20 toneladas, um comprimento de 15 m e diâmetro de 4,2m. O módulo estaria equipado com 5 portas para acoplagem de novos módulos de, uma maneira muito parecida com a usada na Mir. Este recurso pode ser empregado para criar um complexo espacial de dimensões consideráveis. Os painéis solares da estação planejada teriam um comprimento de 22 metros. Chineses na Lua Com a esperada
obtenção dos objetivos do programa 921, em 2000 cientistas chineses começaram
a discutir planos ambiciosos, como a construção de uma base lunar. Em
Hanover, como peça central do pavilhão chinês, foram colocados dois astronautas
(ou taikonautas!) afixando a bandeira da República Popular na superfície
lunar. Em 4 de outubro de 2000, a Associated Press noticiou que Zhuang
Fenggan, vice-diretor da associação chinesa de ciências, declarou que
um dia os chineses poderiam criar um base permanente na Lua com a intenção
minerar o solo em busca de He-3 (destinado a abastecer as futuras usinas
de fusão nuclear terrestres). Estas idéias podem se tratar muito mais
de sonhos de acadêmicos que de um programa fundamentado, mas sinalizam
o que poderemos esperar do século XXI.
Alberto Betzler é astrônomo e integra a SkyView - Astronomia e Ciências Integradas, uma empresa de divulgação científica do Rio de Janeiro |
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Atualizado em 10/02/2001 |
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