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Centro
de Alcântara funciona sem licença ambiental
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O problema é tão grave que a base funciona até hoje sem o Relatório de Impacto do Meio Ambiente (RIMA), uma exigência da constituição aprovada em 1988. O RIMA, preparado pela empresa Kohan-Saagoyen Consultoria & Sistemas , foi rejeitado pelo IBAMA em junho do ano passado. Entre as irregularidades apontadas por representantes da comunidade está o diagnóstico impreciso das características culturais das comunidades que vivem ao redor do CLA. "Não se pode relocar famílias sem em conta suas características étnicas e culturais", afima o antropólogo e estudioso da comunidade Alfredo Wagner Berno de Almeida. "A INFRAERO (que administra a base) não pode decidir pelo destino de comunidade seculares", acrescenta. Com aproximadamente 20 mil habitantes e distante 22 km de São Luiz, capital do estado do Maranhão, a cidade de Alcântara tem mais de 70% de sua população na área rural. Boa parte das terras plantadas pelas pessoas que ocupam a região do CLA são de uso comum, em um sistema que combina a propriedade individual e coletiva. Esse modo de organização tem garantido a sobrevivência de diferentes comunidades que ocupam a região. A primeira desapropriação de terras aconteceu em 1980, ainda durante o regime militar. O então governador biônico (indicado pelos militares) do estado do Maranhão, João Castelo, declarou de utilidade pública uma área de 52 mil hectares e a cedeu para o Ministério da Aeronáutica. "Houve destruição de roças e várias famílias mudaram-se para outros lugares, principalmente, para as periferias de São Luís e da sede do município deAlcântara", conta Luiz Fernando do Rosário Linhares, mestre em Políticas Públicas e coordenador executivo da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH). Além disso, Linhares conta sobre "pessoas que, injuriadas com a possibilidade de se retirarem dos territórios de onde nunca pensaram em sair, adoeceram e, consequentemente, faleceram." Houve muitos conflitos até 1983, quando um acordo entre os desapropriados e o Ministério da Aeronáutica removeu 312 famílias para sete agrovilas. Segundo Maria das Graças Gomes Amorim, diretora de políticas públicas da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), "a instalação da base espacial trouxe muitos problemas para a população de Alcântara, um deles foi o aumento da prostituição e da gravidez na adolescência, em razão da presença de firmas que prestam serviços para a base espacial".
Em 1986, o então presidente José Sarney alterou as bases daquele acordo, reduzindo a área destinada para cada família de assentados das agrovilas para 15 hectares. Essa área mínima, chamada de módulo rural, é menor do que a regulamentada para o resto do estado, que é de 35 hectares. Hoje, a área de segurança destinada ao CLA corresponde a mais de 50 % do município. Em 1991, o governo Collor aumentou em mais 10 mil hectares a área desapropriada. Segundo a SMDH, graças ao acordo de prestação de serviços aos Estados Unidos mais 504 famílias correm o risco de serem remanejadas para novas agrovilas. A entidade denuncia que, no ano passado, foram encontrados destroços de objetos lançados ao espaço no município de Humberto Campos, localizado em região fora da área de segurança e mais distante do que a capital São Luís. Consultada sobre o assunto, a assessoria de imprensa da Agência Espacial Brasileira confirmou a existência de destroços em uma área de mangue do município. Eles seriam parte de um Veículo Lançador de Satélites (VLS) lançado em 1999. Além da inexistência do RIMA, outras irregularidades no projeto da base de Alcântara são apontadas. As indenizações pagas aos antigos moradores teriam um valor muito baixo (por volta de 1500 reais para cada um), além de não terem sido pagas a aproximadamente 80% deles. Além disso, essas indenizações seriam incapazes de restaurar a situação de equilíbrio vivida anteriormente. Por isso, os representantes da comunidade estão exigindo medidas compensatórias como uma participação nos lucros obtidos, seguindo o exemplo de outros países em situações semelhantes, com participações que variam de 10 a 15% dos lucros. Desde o início da construção do CLA, no início da década de 80, formou-se um grupo professores universitários, juristas e sindicalistas que vêm auxiliando a comunidade na defesa de seus direitos sobre a terra. Esses pesquisadores estiveram presentes no I Fórum Social Mundial, que aconteceu no final de janeiro, em Porto Alegre, e apontam diversas características culturais da comunidade que não foram levadas em conta no processo de reassentamento. A região antigamente ocupada pelos moradores era um trecho do litoral. Apesar de serem lavradores, os moradores faziam uso intensivo da pesca como complemento alimentar e até mesmo para a venda. Além disso, havia um sistema extensivo de uso da terra, com roças que mudavam de lugar para que o solo pudesse "descansar". Com o reassentamento, e a consequente "individualização" de uma pequenas propriedades, o solo das agrovilas, que além de tudo é naturalmente bastante pobre, desgasta-se facilmente com o plantio feito sem intervalos. O tamanho do terreno destinado estaria causando problemas também para os filhos dos reassentados que, ao constituírem novas famílias, não tem lugar para morar e plantar. A quebra do antigo padrão de vida dos moradores, que tinham um sistema de troca equilibrada e alternavam-se entre entre roça e pesca, terrenos coletivos e familiares, tem levado muitos membros a caírem na marginalidade, até mesmo mudando-se para as periferias da capital do estado.
Segundo Alfredo Berno de Almeida, o sistema de uso comum da terra faz com que o controle desta não seja "exercido livre e individualmente por um grupo doméstico determinado, mas sim através de normas específicas instituídas para além do código legal vigente e acatadas de maneira consensual, nos meandros das relações sociais estabelecidas entre vários grupos familiares de pequenos produtores diretos que compõe a mesma unidade social". Buscando resistir às alterações em seu modo de vida, aproximadamente 3600 famílias ainda moram na área do CLA, convivendo cotidianamente com as atividades de lançamento de foguetes. "Sempre que programa o lançamento de foguetes, o CLA proíbe os trabalhadores de cultivarem as roças e de praticarem a pesca nas praias que incidem no chamado raio de perigo, por um período de aproximadamente trinta dias antes de qualquer lançamento", afirma o coodenador executivo da SMDH. Com o uso do CLA pelos Estados Unidos, a comunidade teme pela execução definitiva do plano de expansão do centro, com o deslocamento compulsório de comunidades que ainda vivem em áreas de praia. "O acordo estabelece áreas de exclusividade de lançamento aos EUA, que serão tratadas com vigilância e fiscalização mais rigorosas. Algumas estratégias de sobrevivência das comunidades atingidas (como por exemplo, o plantio de roças complementares fora dos limites das agrovilas e dentro dos domínios da Base Espacial) serão fatalmente eliminadas", prevê Linhares. |
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Atualizado em 10/02/2001 |
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