O ritual dos 500 anos como objeto de pesquisa
   
 
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O Brasil em português de Portugal:
Jesiel de Oliveira Filho

Histórias & Personagens:
Zélio Alves Pinto

Poema
 


Os eventos de comemoração dos 500 anos do descobrimento do Brasil não foram somente uma boa oportunidade para o lançamento de projetos de recuperação da memória histórico-cultural do país. Alguns pesquisadores tiveram como objeto de estudo as próprias iniciativas de comemoração e os protestos que a data gerou em todo o país.

Eneida Cunha - V Centenário foi um campo fértil para a relexão sobre os processos identitários

Reunidos sob a coordenação da professora Eneida Leal Cunha, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), diversos pesquisadores vem trabalhando, desde 1998, na análise e na catalogação de toda a cobertura que a imprensa brasileira e portuguesa realizou durante as comemorações do V Centenário do Brasil. Para o projeto intitulado Reconfigurações do Imaginário e Reconstruções de Identidades: produções simbólicas e relações político-culturais contemporâneas que (re)articulam Brasil e Portugal foram estudados os jornais brasileiros Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e A Tarde; os jornais portugueses Público e Jornal de Letras, Artes & Idéias; além das revistas brasileiras Veja, Isto é e Época. O material analisado vai do primeiro dia de 1998 até o final do ano 2000.

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Segundo Cunha, as comemorações do V Centenário criaram uma "sobredeterminação de investimentos políticos, econômicos, culturais e analíticos", sendo um "campo fértil para a reflexão sobre as reconstruções da identidades e do pertencimento que se expõe". Para ela, "ambíguas e muitas vezes tensas relações e imaginações comuns e recíprocas" se dão entre um "Estado-nação de formação pós-colonial" e um "Estado-nação de (peculiar) formação imperial".

O grupo de pesquisa de Cunha integra o Centro de Estudos de Migrações Internacionais (CEMI), centro de pesquisa com financiamento do programa Pronex, e integra o projeto integrado "Identidades: reconfigurações de cultura e política". Além da leitura dos periódicos fazem parte da análise dos pesquisadores depoimentos do público "comum", não-especializado. Cunha, por exemplo, realizou entrevistas com diversas personalidades portuguesas.

O imaginário português sobre o Brasil foi igualmente objeto de estudo do projeto. Segundo Jesiel de Oliveira Filho, bacharel em Letras que estudou os jornais portugueses, "a imagem do Brasil no Portugal de hoje, embora marcada por uma série de estereótipos que reportam-se ao passado colonial, está imbricada igualmente com todo um 'imaginário de exportação' do Brasil contemporâneo, com a questão da imensa comunidade portuguesa residente no Brasil, com as novas auto-imagens portuguesas derivadas da integração do país à União Européia e com o gravíssimo problema da imigração de "terceiro-mundistas" para a Europa".

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Jesiel Filho compara ainda a visão da elite brasileira sobre o que é o Brasil com os colonizadores portugueses de 300 anos atrás. "Nas nossas elites, certamente perdura um 'espírito' de dominação e de exploração que guarda terríveis semelhanças com o ímpeto colonizador dos portugueses do passado", afirma.

Eventos como o dos 500 anos são uma boa oportunidade de pesquisa, são momentos em que um ritual é encenado. Para Jesiel Filho, as comemorações constituem momentos de intensa reescrita da nacionalidade. "O 'trabalho da memória' suscitado pela comemorações repercute fortemente sobre a construção das narrativas identitárias, daí que o próprio Estado realize tantos investimentos que não se limitam apenas à lógica do 'pão e circo': trata-se de um esforço para aproveitar o momento e disseminar uma certa idéia de nação de acordo com objetivos nitidamente 'pedagógicos'".

Manifestações culturais como a música também foram objeto de estudo do grupo. Daniela Silva, estudante de comunicação, deteve-se sobre o rap, gênero misical contestador e quase sempre ligado às periferias brasileiras. "O discurso sobre o Brasil, feito pelo rap, guarda diferenças em relação aos amplamente veiculados, mais audíveis, detentores de espaços mass-midiáticos. Eles não usam os elementos recorrentes nas comemorações dos 500 anos. Alguns se referem aos indígenas para lembrar o genocídio e não para reiterar a idéia de 'encontro' ou 'comunhão'", ressalta a pesquisadora.

O grupo de pesquisadores da UFBA realizou também diversos debates abertos tematizando as comemorações/protestos dos 500 anos. No último, que recebeu o título Porto Seguro??? realizado em maio do ano passado, foi exibido um vídeo que documentou a violência policial em Coroa Vermelha durante as "festividades" do V Centenário. Participaram deste debate Eliana Chiossi, do Instituto de Letras da UFBA, os antropólogos Luis Nicolau e Pedro Agostinho, e o jornalista Jean Wyllis, que denunciou a censura do jornal Correio da Bahia - cujo proprietário é o senador Antônio Carlos Magalhães - a sua matéria que relatava as ocorrências de Coroa Vermelha.

Para este ano deverão ocorrer novos debates entre os meses de abril e maio. "O debate do ano passado teve uma expressiva participação do público, inclusive gente fora do circuito acadêmico e provocou uma grande comoção a exibição do vídeo", relata Jesiel Filho. Segundo ele, os debates tiveram uma acolhida acima do esperado e constituem um produtivo retorno imediato da pesquisa para a sociedade.

   
           
     

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Atualizado em 10/04/2001

   
     

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