Cobaias
transgênicas e sua relação com a saúde
humana
Ao
mesmo tempo em que a polêmica sobre uso de alimentos transgênicos
aumenta, nasce o primeiro camundongo transgênico brasileiro,
Christian. Ele foi criado por pesquisadores do Instituto de Biociências
da USP e da Faculdade de Zootecnia e Veterinária, da USP
para estudo da síndrome de Marfan, uma doença do tecido
conjuntivo que afeta o sistema esquelético ocular e cardiovascular.
Mas Christian não está sozinho: além de sua
ninhada, já possui outros companheiros, como Vítor
e sua ninhada, criados pelo Centro para o Desenvolvimento de Modelos
Experimentais em Medicina e Biologia (Cedeme) da Universidade Federal
de São Paulo (Unifesp). Eles vão auxiliar os pesquisadores
na busca da cura de várias doenças como câncer,
diabetes, hipertensão, aids e doenças cardíacas.
Os pesquisadores do Cedeme esperam uma economia de cerca de 90%
nos gastos com a compra de cobaias (que são cotadas em até
50 mil dólares o casal), uma vez que pretendem produzir animais
em número suficiente para os laboratórios nacionais.
A bióloga
Lygia da Veiga Pereira, coordenadora do laboratório de Genética
Molecular do Instituto de Biociências da USP, explica que
a capacidade de gerar camundongos com mutações em
qualquer gene de interesse, permite criar modelos de animais onde
é possível estudar as funções desses
genes, analisando o efeito da mutação no animal. Além
disso, explica Pereira, esses animais são modelos onde se
pode estudar a progressão e novas terapias para as doenças
genéticas humanas.
O
uso de animais como cobaias vem de muito longe. Estima-se que
desde o século XIX eles sejam usados na busca de solucionar
problemas de saúde do homem. O primeiro experimento desse
gênero realizado com sucesso foi feito em 1982 quando
o DNA de um rato foi introduzido em um camundongo. Atualmente,
os avanços na biologia molecular e na genética,
já permitem aos pesquisadores fabricar suas cobaias de
acordo com as necessidades do estudo que pretendem realizar. |
Christian,
que nasceu em agosto de 2001, foi criado com uma mutação
genética que provoca a síndrome de Marfan (SMF), doença
que afeta o sistema esquelético ocular e cardiovascular. A
maior causa de morte em pacientes com SMF é a ruptura da veia
aorta. A SMF tem uma freqüência de aproximadamente uma
a cada dez mil pessoas.
Lygia
Pereira explica que, devido à experiência de seu grupo
em trabalhar com DNA, foi desenvolvida uma linhagem de células
tronco embrionárias de camundongo contendo uma mutação
no gene da SMF (chamado de FBN1). Em seguida, o grupo da Faculdade
de Veterinária, coordenado pelo professor José Antonio
Visintin, ajudou a "transformar" as células mutadas
em um animal. Para a pesquisadora, as técnicas de manipulação
do genoma do camundongo "são instrumentos de pesquisa
poderosos que nos ajudam a destrinchar o desafio da era pós-genoma:
a função gênica, isto é, a função
específica de cada gene. Ter essas ferramentas de pesquisa
no Brasil permitirá que vários grupos as utilizem
para investigar seus problemas biológicos específicos,
dando ainda mais força às pesquisas em nosso país".
José
Antonio Visintin, responsável pela reprodução
dos camundongos, explica o procedimento na "criação"
de Christian: "os embriões são produzidos pela
superovulação das "camundongas" e três
dias após a superovulação e cobertura das fêmeas,
os embriões são recolhidos na fase de mórula
(veja foto). Essas mórulas têm a zona pelúcida
(camada externa) retirada e são colocadas junto com células
geneticamente modificadas e cultivadas por 24 horas. Depois as mórulas
são transferidas para as "camundongas" receptoras,
onde normalmente transferem-se 1015 embriões por receptora
e aguardam-se 21 dias (gestação) para o nascimento
dos filhotes transgênicos".
Já
Vítor, produzido pela Universidade Federal de São
Paulo (Unifesp), nasceu no dia 24 de dezembro de 2001, como informou
João Bosco Pesquero, coordenador do Laboratório de
Animais Transgênicos do Centro de Desenvolvimento de Modelos
Experimentais em Medicina e Biologia (Cedeme). O pesquisador explica
que Vítor foi criado utilizando a técnica que emprega
a microinjeção pronuclear com DNA, exógeno
(veja descrição do modelo logo abaixo). O camundongo
servirá como modelo para o estudo de doenças, tais
como diversos tipos de hipertensão, câncer, diabetes,
mal de Alzheimer e aids. Para isso, um gene relacionado ao estudo
da doença é manipulado.
Para
se gerar esse modelo, explica Pesquero, "é preciso primeiro
isolar o gene de interesse para injetá-lo posteriormente
no núcleo do embrião que será transgênico.
Após isolado e purificado, o transgene é levado ao
laboratório de micromanipulação e, através
de uma microagulha, é injetado no pró-núcleo
do embrião, logo após fusão de óvulo
e espermatozóide. Esse embrião é então
colocado de volta em uma mãe pseudo-grávida (que foi
cruzada com um macho estéril) para ter as condições
de se desenvolver em um animal. "Após o período
de gestação", continua Pesquero, "o animal
nasce e retiramos um pedacinho de tecido e verificamos a presença
do transgene no seu patrimônio genético. Se este gene
exógeno estiver presente, consideramos esse animal um animal
transgênico, isto é, ele será capaz de transmitir
essa informação aos seus descendentes".
Víitor
é o resultado de aproximadamente 3 anos de pesquisa para
a implantação do Laboratório de Animais Transgênicos
do Cedeme. Financiado pela Fapesp e com custo aproximado de US$
250 mil, a idéia inicial do projeto era implantar no Brasil
um laboratório que tivesse a capacidade de fornecer os modelos
experimentais transgênicos para pesquisadores de universidades
e também para a indústria.
Segundo
Pesquero "aspecto mais importante do nosso projeto não
está ligado a esse modelo em especial, Mas sim ao fato de
que serão usados nas pesquisas de outros laboratórios
associados, uma vez que esses modelos de animais transgênicos
(vide glossário) são
ferramentas essenciais para se estudar função de milhares
de novos genes que estão sendo descobertos no Projeto Genoma,
da Fapesp".
O Vítor
passa bem e já é pai de três ninhadas de camundongos.
Da primeira mãe nasceram seis filhotes, da segunda sete e
da terceira cinco. Esses animais serão analisados para verificar
a presença do transgene em seu genoma e posteriormente serão
acasalados para estabelecerem linhagens que serão usadas
em experimentos.
Segundo
informações do Ministério da Agricultura, de
1997 até 2000, foram emitidas autorizações
de importação de 3738 camundongos e 2425 ratos para
institutos de pesquisas e biotérios de faculdades no estado
de São Paulo. Não se tem informações
sobre importação de cobaias (preá ou porquinho-da-índia,
veja em Curiosidades, logo abaixo).
Mosquitos
Transgênicos
No
Laboratório de Mosquitos Geneticamente Modificados Departamento
de Parasitologia no Instituto
de Ciências Biomédicas da USP , sendo coordenadora
do Laboratório de Mosquitos Geneticamente Modificados, a
pesquisadora Margareth Capurro busca criar mosquitos transgênicos
para alcançar uma cura para a dengue, uma vez que o Aedes
aegypti já esta resistente ao "fumacê".
O objetivo final, explica Capurro "é a criação
de uma linhagem de mosquitos transgênicos incapazes de transmitir
a doença".
A pesquisadora
já desenvolveu genes híbridos (mistura de "pedaços"
de genes construídos em laboratório) que, ao serem
inseridos nos mosquitos, poderiam impedir a transmissão da
malária nas galinhas. Capurro iniciou suas pesquisas durante
o seu pós-doutoramento em Irvine, na Califórnia, onde
criou um gene sintético, com pedaços de genes de mosquitos
e de camundongos, programado para produzir um anticorpo que impedia
o plasmódio (protozoário que causa a malária)
de migrar para a saliva do mosquito. Nessa pesquisa conseguiu reduzir
em 99% o número de protozoários na saliva do mosquito.
Não
existem limites técnicos para as aplicações
da transgenia. Cientistas estão continuamente aperfeiçoando
as técnicas de "criação" de animais
transgênicos, principalmente no que diz respeito aos estudos
com o intuito de solucionar problemas da saúde humana. Apesar
da euforia, esse procedimento exige controle, pois ainda pouco se
sabe sobre os possíveis efeitos secundários nos animais
e em seus descendentes. A utilização de animais transgênicos,
criados especialmente para buscar a cura de doenças específicas,
vai ajudar também na diminuição de sacrifício
da vida animal em benefício da saúde humana.
Curiosidades |
*cobaia
como variação de cobaio; "pequeno mamífero
roedor (Cavia porcellus) conhecido vulgarmente como preá
ou porquinho-da-India".
Para os cientista a designação cobaia se estende
a ratos, camundongos e coelhos usados em laboratórios.
Em virtude de suas características biológicas,
a cobaia tornou-se um dos animais preferidos para experimentos
científicos na área biomédica, a tal ponto
que a palavra cobaia adquiriu uma acepção errônea,
de objeto de experiência passando a designar "qualquer
pessoa ou animal que se submete a experiências com fins
científicos". |
Para
saber mais |
- Jornal
da Escola Paulista de Medicina, Unifesp - http://www.unifesp.br/comunicação
Nesse site é possível encontrar notícias
atualizadas a respeito do desenvolvimento das pesquisas
com os animais transgênicos.
- No
site do Departamento de Biotecnologia da USP http://www.biotecnologia.com.br
- notícias e resumos de trabalho realizados nessa
área.
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