Editorial:

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Inconcluso
Carlos Vogt
 
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Cobaias transgênicas e sua relação com a saúde humana

Ao mesmo tempo em que a polêmica sobre uso de alimentos transgênicos aumenta, nasce o primeiro camundongo transgênico brasileiro, Christian. Ele foi criado por pesquisadores do Instituto de Biociências da USP e da Faculdade de Zootecnia e Veterinária, da USP para estudo da síndrome de Marfan, uma doença do tecido conjuntivo que afeta o sistema esquelético ocular e cardiovascular. Mas Christian não está sozinho: além de sua ninhada, já possui outros companheiros, como Vítor e sua ninhada, criados pelo Centro para o Desenvolvimento de Modelos Experimentais em Medicina e Biologia (Cedeme) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Eles vão auxiliar os pesquisadores na busca da cura de várias doenças como câncer, diabetes, hipertensão, aids e doenças cardíacas. Os pesquisadores do Cedeme esperam uma economia de cerca de 90% nos gastos com a compra de cobaias (que são cotadas em até 50 mil dólares o casal), uma vez que pretendem produzir animais em número suficiente para os laboratórios nacionais.

A bióloga Lygia da Veiga Pereira, coordenadora do laboratório de Genética Molecular do Instituto de Biociências da USP, explica que a capacidade de gerar camundongos com mutações em qualquer gene de interesse, permite criar modelos de animais onde é possível estudar as funções desses genes, analisando o efeito da mutação no animal. Além disso, explica Pereira, esses animais são modelos onde se pode estudar a progressão e novas terapias para as doenças genéticas humanas.

O uso de animais como cobaias vem de muito longe. Estima-se que desde o século XIX eles sejam usados na busca de solucionar problemas de saúde do homem. O primeiro experimento desse gênero realizado com sucesso foi feito em 1982 quando o DNA de um rato foi introduzido em um camundongo. Atualmente, os avanços na biologia molecular e na genética, já permitem aos pesquisadores fabricar suas cobaias de acordo com as necessidades do estudo que pretendem realizar.

Christian, que nasceu em agosto de 2001, foi criado com uma mutação genética que provoca a síndrome de Marfan (SMF), doença que afeta o sistema esquelético ocular e cardiovascular. A maior causa de morte em pacientes com SMF é a ruptura da veia aorta. A SMF tem uma freqüência de aproximadamente uma a cada dez mil pessoas.

Lygia Pereira explica que, devido à experiência de seu grupo em trabalhar com DNA, foi desenvolvida uma linhagem de células tronco embrionárias de camundongo contendo uma mutação no gene da SMF (chamado de FBN1). Em seguida, o grupo da Faculdade de Veterinária, coordenado pelo professor José Antonio Visintin, ajudou a "transformar" as células mutadas em um animal. Para a pesquisadora, as técnicas de manipulação do genoma do camundongo "são instrumentos de pesquisa poderosos que nos ajudam a destrinchar o desafio da era pós-genoma: a função gênica, isto é, a função específica de cada gene. Ter essas ferramentas de pesquisa no Brasil permitirá que vários grupos as utilizem para investigar seus problemas biológicos específicos, dando ainda mais força às pesquisas em nosso país".

José Antonio Visintin, responsável pela reprodução dos camundongos, explica o procedimento na "criação" de Christian: "os embriões são produzidos pela superovulação das "camundongas" e três dias após a superovulação e cobertura das fêmeas, os embriões são recolhidos na fase de mórula (veja foto). Essas mórulas têm a zona pelúcida (camada externa) retirada e são colocadas junto com células geneticamente modificadas e cultivadas por 24 horas. Depois as mórulas são transferidas para as "camundongas" receptoras, onde normalmente transferem-se 1015 embriões por receptora e aguardam-se 21 dias (gestação) para o nascimento dos filhotes transgênicos".


Já Vítor, produzido pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), nasceu no dia 24 de dezembro de 2001, como informou João Bosco Pesquero, coordenador do Laboratório de Animais Transgênicos do Centro de Desenvolvimento de Modelos Experimentais em Medicina e Biologia (Cedeme). O pesquisador explica que Vítor foi criado utilizando a técnica que emprega a microinjeção pronuclear com DNA, exógeno (veja descrição do modelo logo abaixo). O camundongo servirá como modelo para o estudo de doenças, tais como diversos tipos de hipertensão, câncer, diabetes, mal de Alzheimer e aids. Para isso, um gene relacionado ao estudo da doença é manipulado.


Para se gerar esse modelo, explica Pesquero, "é preciso primeiro isolar o gene de interesse para injetá-lo posteriormente no núcleo do embrião que será transgênico. Após isolado e purificado, o transgene é levado ao laboratório de micromanipulação e, através de uma microagulha, é injetado no pró-núcleo do embrião, logo após fusão de óvulo e espermatozóide. Esse embrião é então colocado de volta em uma mãe pseudo-grávida (que foi cruzada com um macho estéril) para ter as condições de se desenvolver em um animal. "Após o período de gestação", continua Pesquero, "o animal nasce e retiramos um pedacinho de tecido e verificamos a presença do transgene no seu patrimônio genético. Se este gene exógeno estiver presente, consideramos esse animal um animal transgênico, isto é, ele será capaz de transmitir essa informação aos seus descendentes".

Víitor é o resultado de aproximadamente 3 anos de pesquisa para a implantação do Laboratório de Animais Transgênicos do Cedeme. Financiado pela Fapesp e com custo aproximado de US$ 250 mil, a idéia inicial do projeto era implantar no Brasil um laboratório que tivesse a capacidade de fornecer os modelos experimentais transgênicos para pesquisadores de universidades e também para a indústria.

Segundo Pesquero "aspecto mais importante do nosso projeto não está ligado a esse modelo em especial, Mas sim ao fato de que serão usados nas pesquisas de outros laboratórios associados, uma vez que esses modelos de animais transgênicos (vide glossário) são ferramentas essenciais para se estudar função de milhares de novos genes que estão sendo descobertos no Projeto Genoma, da Fapesp".

O Vítor passa bem e já é pai de três ninhadas de camundongos. Da primeira mãe nasceram seis filhotes, da segunda sete e da terceira cinco. Esses animais serão analisados para verificar a presença do transgene em seu genoma e posteriormente serão acasalados para estabelecerem linhagens que serão usadas em experimentos.

Segundo informações do Ministério da Agricultura, de 1997 até 2000, foram emitidas autorizações de importação de 3738 camundongos e 2425 ratos para institutos de pesquisas e biotérios de faculdades no estado de São Paulo. Não se tem informações sobre importação de cobaias (preá ou porquinho-da-índia, veja em Curiosidades, logo abaixo).

Mosquitos Transgênicos
No Laboratório de Mosquitos Geneticamente Modificados Departamento de Parasitologia no Instituto de Ciências Biomédicas da USP , sendo coordenadora do Laboratório de Mosquitos Geneticamente Modificados, a pesquisadora Margareth Capurro busca criar mosquitos transgênicos para alcançar uma cura para a dengue, uma vez que o Aedes aegypti já esta resistente ao "fumacê". O objetivo final, explica Capurro "é a criação de uma linhagem de mosquitos transgênicos incapazes de transmitir a doença".


A pesquisadora já desenvolveu genes híbridos (mistura de "pedaços" de genes construídos em laboratório) que, ao serem inseridos nos mosquitos, poderiam impedir a transmissão da malária nas galinhas. Capurro iniciou suas pesquisas durante o seu pós-doutoramento em Irvine, na Califórnia, onde criou um gene sintético, com pedaços de genes de mosquitos e de camundongos, programado para produzir um anticorpo que impedia o plasmódio (protozoário que causa a malária) de migrar para a saliva do mosquito. Nessa pesquisa conseguiu reduzir em 99% o número de protozoários na saliva do mosquito.

Não existem limites técnicos para as aplicações da transgenia. Cientistas estão continuamente aperfeiçoando as técnicas de "criação" de animais transgênicos, principalmente no que diz respeito aos estudos com o intuito de solucionar problemas da saúde humana. Apesar da euforia, esse procedimento exige controle, pois ainda pouco se sabe sobre os possíveis efeitos secundários nos animais e em seus descendentes. A utilização de animais transgênicos, criados especialmente para buscar a cura de doenças específicas, vai ajudar também na diminuição de sacrifício da vida animal em benefício da saúde humana.

(LO)

Curiosidades
*cobaia como variação de cobaio; "pequeno mamífero roedor (Cavia porcellus) conhecido vulgarmente como preá ou porquinho-da-India".
Para os cientista a designação cobaia se estende a ratos, camundongos e coelhos usados em laboratórios.
Em virtude de suas características biológicas, a cobaia tornou-se um dos animais preferidos para experimentos científicos na área biomédica, a tal ponto que a palavra cobaia adquiriu uma acepção errônea, de objeto de experiência passando a designar "qualquer pessoa ou animal que se submete a experiências com fins científicos".

Para saber mais
  • Jornal da Escola Paulista de Medicina, Unifesp - http://www.unifesp.br/comunicação
    Nesse site é possível encontrar notícias atualizadas a respeito do desenvolvimento das pesquisas com os animais transgênicos.
  • No site do Departamento de Biotecnologia da USP http://www.biotecnologia.com.br - notícias e resumos de trabalho realizados nessa área.


Atualizado em 10/05/2002

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