Agricultura
Orgânica pode ser alternativa aos transgênicos
Produzir
alimentos livres de agrotóxicos e gerar relações
mais justas na venda e consumo de vegetais. Desafio que a agricultura
orgânica se propõe para oferecer uma alternativa ao
agronegócio tradicional. Para isso, agricultores do Brasil
precisam vencer obstáculos como a dificuldade de conseguir
sementes livres de tratamento químico ou manipulação
genética e de aproximação do consumidor final,
estreitando contatos para que um conheça as necessidades
do outro, premissa básica nesse tipo de produção.
Os resultados, para o produtor e para o consumidor podem ser compensadores.
A Agricultura
Orgânica é definida como a prática de produção
de alimentos sem o uso de insumos de origem sintética, respeitando
os ciclos da natureza. O manejo agrícola é baseado
no respeito ao meio ambiente e na preservação dos
recursos naturais. O produtor busca alternativas naturais para a
adubação, controle de pragas e recomposição
do solo. As relações humanas também são
levadas em conta neste tipo de produção: há
uma preocupação em estabelecer relações
de trabalho mais justas a partir do campo e em aproximar o consumidor
final do produtor.
O solo
é a base do produto orgânico e recebe atenção
especial: a terra é fertilizada com resíduos como
restos de vegetais, esterco, aparas, materiais que, decompostos,
fornecem nutrientes para as plantas. A palha é utilizada
como proteção contra ervas daninhas, evitando assim
o uso de herbicidas. A Embrapa Meio Ambiente, de Jaguariúna,
acompanha produtores orgânicos de cidades do Estado de São
Paulo, ensinando o manejo adequado do solo. "Na agricultura
orgânica é importante que a terra esteja equilibrada,
o que pede a diversificação dos extratos acrescentados",
explica o pesquisador da Embrapa Meio
Ambiente, Pedro Valarini. O esforço dos produtores é
compensado: até mesmo o tomate, produto difícil de
cultivar, mesmo na agricultura tradicional, pela sua baixa resistência
as pragas, apresenta bons resultados com a agricultura orgânica.
Algumas propriedades da região de Serra Negra, interior de
São Paulo, estão utilizando extrato de solo de mata
para pulverizar o solo e as plantas. "O solo de mata é
rico em microorganismos que ajudam a recompor o solo e são
inimigos naturais de outros que prejudicam a vegetação",
explica o pesquisador.
A produtividade
da agricultura orgânica é menor que a da agricultura
convencional e é necessário empregar mais pessoas
para o cuidado das plantações. Uma das dificuldades
dos produtores é encontrar sementes que se adaptem ao não
uso de insumos sintéticos. A venda de sementes "adaptadas"
garante também aos grandes conglomerados internacionais de
tecnologia agrícola a venda de seus insumos e herbicidas
aos agricultores que buscam uma produtividade cada vez maior. Esses
produtos muitas vezes são causa de graves intoxicações,
principalmente entre os produtores com menor grau de instrução,
que usam as substâncias de forma indiscriminada. A terra também
é afetada. O descarte de embalagens pode contaminar o solo
e a água.
A obtenção
de sementes sem tratamento químico é uma das partes
mais difíceis da agricultura orgânica. No Brasil há
poucas empresas que produzem sementes adaptadas ao cultivo orgânico.
Uma delas pertence a um assentamento do MST no Rio Grande do Sul.
"Muitos agricultores usam a semente tradicional, já
que é difícil obter a semente orgânica",
diz Pedro Valarini. O problema é maior para quem planta hortaliças.
Já a soja sem tratamento químico é mais fácil
de ser obtida, pois as sementes podem chegar limpas ao produtor
com maior facilidade.
Opção
viável para os pequenos
O medo da contaminação foi um dos motivos que levaram
a família de Kátia Ono, de Vargem, pequena cidade
a uma hora de Campinas, no interior paulista, a reduzir o uso de
agrotóxicos. Dona de uma pequena propriedade, a família
produzia hortaliças quando o filho caçula teve um
problema de saúde, que os médicos acreditavam ser
uma reação alérgica. O problema desapareceu
com a eliminação dos agrotóxicos da propriedade.
A agricultura orgânica apareceu como uma oportunidade de retomar
a produção agrícola, depois de um período
de dez anos em que não houve cultivo, o que ajudou na reestruturação
do solo. O uso de técnicas que o pai trouxe do Japão
e a orientação de agrônomos conhecidos da família
levaram à produção orgânica, sem o uso
de agrotóxicos, muito caros para a realidade da propriedade.
A propriedade
recebeu o selo de certificação há quatro anos
e vende seus produtos em Atibaia e Bragança Paulista. A luta
agora é para ganhar novos adeptos. Em Vargem eles são
os únicos produtores a trabalhar com agricultura orgânica:
"mas sabemos que tem muita gente com condições
de adotar a agricultura orgânica na região. No geral,
pequenos produtores que não usam insumos sintéticos
até mesmo porque não podem pagar por eles", afirma
Kátia. Oferecer oportunidades aos pequenos produtores é
um dos pontos fortes da agricultura orgânica. Alijados do
processo convencional, voltado para atender o mercado, os pequenos
agricultores podem restabelecer laços fortes com a terra,
fixando-se nela e obtendo preços justos por sua produção:
vegetais orgânicos chegam a custar 30% a mais que os convencionais,
e a demanda cresce cada dia no Brasil, principalmente nas grandes
cidades.
Consumidor
participativo
A
filosofia que envolve a agricultura orgânica coloca este modo
de produção como uma alternativa aos apelos do mercado
e da política econômica predominante, sem no entanto
desconsiderar sua viabilidade. O consumidor desses produtos procura
saúde, qualidade de vida e um contato respeitoso com a natureza.
Os grupos de consumidores são importantes: eles ajudam a
definir o preço dos produtos, conhecem as formas de produção
e sensibilizam-se com a sazonalidade dos produtos, entendendo que
não há como oferecer todos os vegetais durante o ano
todo. A convivência em grupo facilita também a troca
de informações visando a aumentar a qualidade de vida
de todos, selecionando produtos melhores ou definindo o que será
produzido. Alguns grupos influenciam até mesmo a certificação
das propriedades. "O consumidor que chega até nós
já tem um grau de informação. O desafio agora
é atingir as camadas mais pobres da sociedade, aquelas que
mais precisam fazer um elo entre alimentação e saúde,
entender a importância de preservarmos o meio ambiente e que
não tem acesso", reflete Katia.
Pedro
Valarini lembra que além da obtenção de sementes,
a distribuição é um fator preocupante para
os agricultores: "A produção orgânica possui
um valor agregado maior, mas os agricultores encontram dificuldades
em distribuir seus produtos. As grandes redes de supermercado garantem
a compra mas pagam o que querem, e as perdas (produtos não
vendidos) são arcadas pelo próprio produtor. Por isso
há o interesse em evitar essa intermediação
com o consumidor final".
Uma
propriedade na região de Petrópolis, Rio de Janeiro,
está vencendo o desafio. O Sítio
do Moinho tem 105 pessoas envolvidas no processo de produção,
embalagem e distribuição de seus produtos. O Sítio
atende as cidades de Petrópolis e Rio de Janeiro com a distribuição
de cestas semanais. Os consumidores podem pagar suas compras por
meio de boleto bancário e fazer suas encomendas por telefone
e pela Internet.
(A.S.)
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