Aplicações
tecnológicas dependem de investimentos privados
Amparada
pelos conhecimentos da física, química, biologia e
engenharia, a área de nanotecnologia e a nanociência
(N&N) promete aplicações futuras em muitos setores
da vida cotidiana. No Brasil, ainda está engatinhando. Precisa
de mais "atores" e mais investimentos para prosperar e
alcançar o estágio em que já se encontra em
outros países. Até agora, apenas o governo federal
tem investido em redes de pesquisa. Faltam incentivos para que a
indústria brasileira compreenda a importância de se
investir em pesquisa e desenvolvimento (P&D) para que a nanotecnologia
seja impulsionada. "O empresário brasileiro não
tem cultura de pesquisa, desenvolvimento e inovação",
lamenta Edison Zacarias da Silva, físico da Unicamp que faz
parte de uma das redes financiadas pelo governo federal.
Por
enquanto, existem algumas iniciativas do governo com o intuito de
potencializar a pesquisa em N&N no Brasil. Entre elas está
uma primeira tentativa de atender aos anseios da comunidade científica.
Em 2000, o CNPq, órgão do Ministério de Ciência
e Tecnologia, elaborou o Programa Nacional de Nanociências
e Nanotecnologia que contou, inicialmente, com o auxílio
de 32 pesquisadores, e do qual resultou um "mapa" dos
cientistas que, no ano de 2000, já atuavam na área
de nanociência e nanotecnologia. Dentre os cientistas, 99
trabalhavam com física, 51 com engenharia, 16 com química,
14 com biologia e 9 com farmácia. A intenção
era traçar um plano de ação para definir os
rumos da tecnologia no país. Foi feita, então, uma
divisão por áreas que deveriam ser consideradas prioritárias,
resultando em 6 segmentos: o primeiro composto por nanodispositivos,
nanosensores e nanoeletrônica (25 grupos); materiais nanoestruturados
(39 grupos); nanobiotecnologia e nanoquímica (15 grupos);
processos em nanoescala com impacto e aplicações em
meio-ambiente e agricultura (7 grupos); energia (2 grupos) e, por
fim, o da nanometrologia (1 grupo).
A partir
de fevereiro de 2002foram criados, então, 4 redes, que juntas
envolvem cerca de 40 instituições de pesquisa do Brasil,
6 do exterior, além de duas empresas - a France Telecom e
a brasileira PQSD-Ponto Quântico Sensores e Densímetros.
As redes estão dispostas nas instalações da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na Unicamp, e as outras
duas na Universidade Federal de Pernambuco. Juntas, elas receberam
R$ 3 milhões para os próximos dois anos, ou algo em
torno de R$ 700 mil para cada. É um investimento tímido,
considerando que há, aproximadamente, 200 pesquisadores envolvidos
em cada centro. Sem contar que, apenas para efeito comparativo,
os Estados Unidos investiram, só em 2002, US$ 604 milhões,
com expectativas de atingir US$ 710 milhões em 2003.
Com
a falta de recursos, é fácil ter uma idéia
do que foi possível fazer. Segundo apurou-se, até
agora, esses recursos foram usados apenas para a realização
de encontros destinados à orientação dos trabalhos.
Alguns dos participantes das redes acreditam que não haja,
no momento, evidências claras sobre a continuidade do financiamento,
tudo vai depender do próximo governo.
Outra
iniciativa por parte do governo brasileiro, via Ministério
da Ciência e Tecnologia, é o Instituto do Milênio
em Nanotecnologia. Coordenado pelo físico Alaor Chaves (veja
artigo nesta edição), da Universidade Federal de Minas
Gerais, o instituto foi aprovado em janeiro de 2002, sendo formado
por pesquisadores de 21 instituições brasileiras e,
segundo estimativa de Chaves, já deve ter recebido do CNPq
investimentos de cerca de R$ 2 milhões. O Instituto irá
pesquisar vários sistemas nanoestruturados, reconhecidos
como prioritários para o desenvolvimento tecnológico
em microeletrônica, optoeletrônica, fotônica,
telecomunicações e bioengenharia.
O MCT
solicitou um estudo da viabilidade de criação de um
Centro Nacional de Referência em Nanotecnologia ao físico
Cylon Gonçalves da Silva, físico e ex-diretor do Laboratório
Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) (veja artigo "O que
é nanotecnologia?"). O Centro ainda não foi criado,
aguardando as definições do próximo governo.
Gonçalves da Silva explica que a diferença entre uma
iniciativa e outra é que "as redes têm seu foco
principal nas pesquisas básicas e no treinamento dos recursos
humanos e, embora se ocupem da questão de inovação,
não possuem instrumentos institucionais e financeiros para
a exploração de seus resultados. O Centro viria preencher
esta lacuna, isto é, a aplicação dos resultados
das pesquisas acadêmicas na forma de uma secretaria executiva,
responsável pela articulação dos esforços
do país na área".
Até
o momento, a preocupação tem sido somente qualificar
recursos humanos nas universidades, mas ainda é preciso convencer
empresários da importância em se investir em P&D.
A Fapesp tem tentado estabelecer esta mentalidade com incentivos
para projetos conjuntos entre a universidade e empresa, a exemplo
do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas
Empresas (Pipe) e o de Parcerias de Inovação Tecnológica
(Pite).
Algumas
áreas específicas têm um maior potencial para
receberem os benefícios das inovações da N&N.
"A pesquisa de novos materiais e a simulação
e modelamento têm chance de contribuir para novas aplicações,
aliadas à física experimental. Sou otimista de que
coisas interessantes poderão vir. A agroindústria
e a indústria farmacêutica certamente vão receber
os primeiros benefícios", diz o físico Zacarias
da Silva.
Também
está otimista o pesquisador do departamento de química
da UFMG, Rochel Montero Lago: "a área de N&N tem
caminhado e acredito que as expectativas sejam de um razoável
desenvolvimento nos próximos anos". Para isso, no entanto,
será necessário um planejamento estratégico
de investimentos em P&D à longo prazo, por períodos
longos como uma década, como sugere Eronides Felisberto da
Silva Junior, coordenador da Rede Cooperativa para Pesquisa em Nanodispositivos
Semicondutores e Materiais Nanoestruturados da UFPE. Atualmente,
não existe previsão quanto aos investimentos que serão
feitos no futuro.
Os
laboratórios acadêmicos vêm cumprindo o
seu papel. Nas áreas de física, química
e biologia o trabalho é intenso na busca pelo conhecimento,
afirma Adalberto Fazzio, físico da USP. Entretanto,
conclui, "não é nossa competência
pensar no mercado".
A
nanoeletrônica é uma das fronteiras do conhecimento.
Para Fazzio, é nela que se pode esperar uma grande
revolução, já que o paradigma dos dispositivos
atuais baseados no silício já alcançou
seu limite extremo de miniaturização. Segundo
ele, a nanoeletrônica só vem sendo desenvolvida
na área acadêmica, mesmo em nível internacional.
Um
avanço considerável no estudo de nanoeletrônica
foi feito em pesquisa com nanofios de ouro, considerados estratégicos
para a fabricação de componentes para a próxima
geração de computadores (veja artigo sobre o
Nanocomputador Quântico), mais eficientes, menores e
mais baratos do que os atuais, que utilizam silício.
O estudo, desenvolvido pelos pesquisadores Edison Zacarias
da Silva, da Unicamp, Antonio José Roque da Silva,
do Instituto de Física da USP e Fazzio, foi destaque
na revista científica Physical Review Letters, de 17
de outubro de 2001.
Para
Walter José Botta Filho, do Departamento de Engenharia
de Materiais da Universidade Federal de São Carlos,
coordenador do Laboratório de Metais Amorfos e Nanocristalinos,
o Brasil só começou a se preocupar com a área
de N&N no ano passado, com a criação das
redes. Botta lembra que em agosto 2003 acontecerá o
X International Symposium on Metastable, Mechanically Alloyed
and Nanocrystalline Materials - um evento Internacional que
tratará de materiais nanocristalinos metaestáveis
e ligas preparadas por métodos mecânicos. Mais
informações podem ser encontradas no site
do evento.
|
(LO)
(GB)
|