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             Hip 
              Hop fala contra o racismo e a desigualdade social  
             
              Muitas das manifestações culturais brasileiras estão 
              identificadas com a população negra. O samba, caboclinho, 
              maracatu, movimento Mangue Beat, capoeira e muitas outras são 
              lembradas como parte da grande contribuição dos negros 
              para a cultura nacional. Dentro dessa diversidade, o movimento Hip 
              Hop tem ganhado cada vez mais destaque no Brasil e atraído 
              muitos jovens, especialmente aqueles que moram nas periferias. 
            Não 
              é nada fácil entender o Hip Hop, que veio da periferia 
              nova iorquina para o Brasil no final da década de 1980, via 
              indústria fonográfica. É um movimento com várias 
              tendências internas, mas que pauta-se pela denúncia 
              da exclusão social e pela discussão de questões 
              relativas à história e à identidade dos negros. 
            Formado 
              por três elementos - o rap (música), o break (dança) 
              e o grafite (desenho) - ao chegar no Brasil ele foi influenciado 
              pela cultura local e adquiriu novos traços e novas formas 
              de manifestação. Em parte, por causa da influência 
              cultural local, o Hip Hop brasileiro diferencia-se do norte-americano. 
              "O brasileiro é muito melhor do que o americano, que 
              foi banalizado. Muitos representantes do Hip Hop lá fora 
              se venderam para o sistema. Eles não querem ver o bem do 
              povo deles, eles querem que o seu povo se mate para conseguir um 
              Nike, um carro... No Brasil, o Hip Hop é mais consciente, 
              quer ver o povo melhorar, prega a informação", 
              afirma Cibele Cristiane Rodrigues, militante do movimento. 
              
              Cibele 
              e Verônica, militantes do Hip Hop 
              Fotos: Márcia Tait 
             
            Não 
              é à toa que o Hip Hop tem ganhado cada vez mais militantes 
              e mais espaço no Brasil. Segundo Viviane Melo de Mendonça 
              Magro, psicóloga que estuda o movimento no Brasil, com ênfase 
              na questão de gênero, sua popularidade se deve ao fato 
              de ser um movimento enraizado nas experiências de jovens e 
              pessoas que vivem na periferia, além de ser muito organizado. 
              "As histórias do rap são histórias fictícias 
              ou reais de pessoas que vivem na periferia, baseadas na vivência 
              na periferia. Para elas, o Hip Hop é uma forma de resistência 
              e mudança da realidade", conta Viviane Magro. 
            No 
              Hip Hop brasileiro, exclusão social e preconceito racial 
              são evidenciados 
              Nos presídios, os rappers são muito populares. Por 
              causa das letras politizadas, que falam da realidade exclusão 
              social e do preconceito de cor, um show de rap dentro de um presídio 
              não é um show qualquer, mas uma manifestação 
              político-social.  
            Foi 
              isso o que aconteceu em uma visita do famoso rapper Mano Brown, 
              do Racionais MC, em junho de 2003, na Febem do Brás, em São 
              Paulo, mostrando a força do Hip Hop como movimento de emancipação 
              social. Os detentos sabiam todas as letras e se identificaram com 
              as músicas do rapper. 
               
              Além de buscar a construção de uma identidade 
              negra, que se posiciona fortemente contra o preconceito de cor, 
              é dada também ênfase ao marginalizado que vive 
              na periferia. "Para o Hip Hop, marginalizado é quem 
              vive na periferia. O que une é a desigualdade social, e a 
              maioria é negra" explica Magro. "Tanto os brancos 
              quanto os negros tem sua auto estima melhorada dentro do movimento 
              e se identificam através da exclusão social. ", 
              complementa. 
            A militante 
              Rodriguez reforça a idéia de busca por igualdade. 
              "Tentamos nem tocar nesse negócio de negritude, branquitude, 
              essa fita toda, porque o Hip Hop quer atingir uma classe social, 
              é para os desfavorecidos". Entretanto, Cibele salienta 
              que o movimento busca através das várias formas de 
              expressão evidenciar o histórico dos negros no Brasil. 
              "É importante que todos entendam que os negros são 
              excluídos porque foram escravizados". 
            Hip 
              Hop brasileiro é diferente do norte americano 
              Apesar de existir uma tendência de apropriação 
              de alguns símbolos de uma cultura negra internacionalizada 
              - como as roupas - dando a impressão de um movimento globalmente 
              mais uniforme, as muitas diferenças que separam brasileiros 
              e norte-americanos ajudam a determinar, no Brasil, um Hip Hop diferenciado. 
              Os próprios militantes brasileiros consideram o Hip Hop nacional 
              como um movimento muito mais crítico e politizado que o norte-americano. 
            "O 
              break, por exemplo, tem muita semelhança com a capoeira, 
              como já observaram os militantes do Hip Hop norte americano", 
              afirma Magro.  
            Devido 
              à influência cultural brasileira no movimento, só 
              o Hip Hop brasileiro tem rap com um pouco de samba, break parecido 
              com capoeira e grafites de cores nitidamente mais vivas. Segundo 
              a pesquisadora, essa mistura com elementos brasileiros é 
              motivo de orgulho para o Hip Hop brasileiro, que tende a uma valorização 
              crescente dos elementos nacionais em um movimento importado dos 
              EUA. 
              
              Grafites 
              na cidade de Campinas-SP 
              
              Grafites 
              na cidade de Campinas-SP  
            O 
              samba que influenciou o Hip Hop brasileiro 
              Toda a música brasileira é influenciada, de uma forma 
              ou de outra, pelo samba, que é definido por alguns historiadores 
              como uma dança típica brasileira originada do batuque 
              africano.  
            O sambista 
              Bruno Ribeiro, compositor e integrante do Núcleo de Sambistas 
              e Compositores do Cupinzeiro, afirma que o negro é a base 
              do samba brasileiro. "Sem o negro, o samba não existiria. 
              O aparecimento do samba está associado às comunidades 
              negras, sejam na Bahia ou no Rio de Janeiro" 
             
             
              
                
                  
                     
                      | O 
                    mistério do samba (Mundo Livre S/A)  
                   O 
                    samba não é carioca 
                    O samba não é baiano 
                    O samba não é do terreiro 
                    O samba não é africano 
                    O samba não é da colina 
                    O samba não é do salão 
                    O samba não é da avenida 
                    O samba não é carnaval 
                    O samba não é da tv 
                    O samba não é do quintal 
                    Como reza toda tradição 
                    É tudo uma grande invenção 
                    O samba não é emergente 
                    O samba não é da escola 
                    O samba não é fantasia 
                    O samba não é racional 
                    O samba não é da cerveja 
                    O samba não é da mulata 
                    O samba não é playboy 
                    O samba não é liberal 
                    Como reza toda tradição  
                    É tudo uma grande invenção  
                    Não tem mistério 
                    Não é do bicheiro 
                    Não é do malandro 
                    Não é canarinho 
                    Não e verde e rosa 
                    Não é aquarela 
                    Não é bossa nova 
                    Não é silicone 
                    Não é malhação 
                    O samba não é do Gugu 
                    O samba não é Faustão 
                    Não é do Gugu 
                    Não é do Faustão 
                    Sem mistério 
                	 | 
                     
                   
                 | 
               
             
           Por 
              razões históricas, e da mesma forma que o Hip Hop, 
              o samba ainda é uma manifestação cultural vista 
              com preconceito "Os brancos, a princípio, tratavam o 
              samba como caso de polícia. No começo do século 
              passado, os negros não podiam cantar e dançar dentro 
              de suas casas. Muito negro apanhou de polícia porque o samba 
              era proibido ou severamente reprimido. Era associado à feitiçaria 
              ou à perturbação da ordem pública. Até 
              hoje esse preconceito sobrevive na cabeça da elite brasileira", 
              diz Ribeiro. Como no Hip Hop e em outras manifestações 
              culturais brasileiras, o samba além de negros, tem também 
              muitos brancos, como o genial Noel Rosa "Mas a base de suas 
              referências culturais, contudo, é negra", lembra 
              Bruno.
            Segundo 
              o sambista, o papel dos negros no samba, atualmente, é muito 
              importante. "É preciso recuperar e preservar sua história 
              dentro do samba, pois a indústria cultural, a partir do momento 
              em que investe na criação de um gênero pop, 
              batizado de "pagode", tira toda a essência que havia 
              no samba para torná-lo palatável a uma classe média 
              consumidora e transformá-lo em mercadoria", adverte. 
              "Creio que o papel do negro, hoje, é estudar o seu passado 
              e defender as suas tradições, negando-se a vender 
              a história de seu povo por promessas de dinheiro e de fama. 
              O papel dos brancos que fazem samba é também lutar 
              em defesa dessa cultura, afinal, somos todos brasileiros e o samba 
              pode ser um grande unificador nacional". 
            Na 
              opinião de Ribeiro, gêneros musicais como o rap e o 
              samba não são incompatíveis "Se você 
              for em qualquer periferia do Brasil vai ver que os caras que gostam 
              de rap costumam fazer roda de samba no boteco da esquina, quando 
              chega o fim de semana. Não dá para falar em samba 
              apenas como produto musical. O samba é, antes de mais nada, 
              o encontro da comunidade, nasce quando um grupo de pessoas se reúne 
              em torno de uma mesa para cantar e tocar, enfim, para partilhar 
              alegria". 
            "Eu 
              me organizando posso desorganizar" 
              Movimentos como o Hip Hop mostram que as formas de expressão 
              cultural no Brasil podem ser usadas na luta contra a discriminação 
              racial e desigualdade social. Por isso, o Hip Hop tem dado muita 
              ênfase para as ações práticas e os militantes 
              têm se organizado nas periferias promovendo oficinas, informando 
              as pessoas e incentivando a luta. 
            Na 
              opinião da rapper Verônica, do grupo Cabelo Duro, apesar 
              da opinião contrária "e preconceituosa" 
              de sua família sobre o Hip Hop, valeu a pena se integrar 
              ao movimento. "Depois que eu comecei a ser militante percebi 
              o quanto minha vida sempre foi fudida, no sentido literal da palavra.. 
              Mas agora, eu sei que posso lutar para melhorar, agora eu sei que 
              eu tenho muitos direitos e que devo lutar por eles. Por ter entrado 
              no movimento, eu comecei a ter acesso a muitas informações, 
              que pessoas que eu conheço que não são do movimento 
              nunca tiveram. Eu não me vejo melhor do que minhas amigas 
              que seguiram uma vida mais tradicional, mas eu me vejo com mais 
              oportunidades porque tenho mais informação" . 
            Já 
              dizia Chico Science, também influenciado pelo Hip Hop pernambucano: 
              "eu me organizando posso desorganizar". O Hip Hop se organiza 
              cada vez mais e os seus militantes têm razão quando 
              definem o movimento como uma arma. 
            
              
                | 
                   Os 
                    negros e o samba no Brasil 
                   
                    Segundo Ribeiro, o samba é uma manifestação 
                    cultural relativamente recente, pois tornou-se canção 
                    popular somente no princípio do século XX. "Na 
                    Bahia, ele assumia a forma de canto religioso aliado aos instrumentos 
                    de percussão do candomblé. Na época em 
                    que os negros baianos desceram para o Rio de Janeiro em busca 
                    de trabalho nos portos, foram morar, sobretudo, na região 
                    da Central do Brasil, onde foram fundadas as casas das 'tias' 
                    baianas - senhoras negras ligadas ao candomblé que 
                    faziam encontros religiosos no quintal de casa, e esses encontros 
                    eram verdadeiras festas, regadas a comida, cachaça 
                    e batucada." Dentre essas "tias" baianas, destacou-se 
                    Tia Ciata, que morava na Rua Visconde de Itaúna, 117. 
                    Essa casa se tornou reduto de músicos cariocas como 
                    Pixinguinha, Donga e Sinhô, entre outros. Foi, provavelmente, 
                    dessa convivência do batuque africano com a canção 
                    popular, que o samba tal e qual o conhecemos hoje, começou 
                    a ser desenhado. Em 1917, tem-se o registro do primeiro samba 
                    gravado: "Pelo Telefone", de Donga, freqüentador 
                    da Tia Ciata, e do jornalista Mauro de Almeida. "Mas 
                    esse samba, embora trouxesse já uma base percusiva, 
                    mostrava muita influência do maxixe. A palavra "samba" 
                    vem, possivelmente, da palavra "semba", usada para 
                    designar a dança de umbigada, trazida pelos escravos" 
                    explica o sambista.  
                 | 
               
             
             
             
            (JS) 
            
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