Mudanças
Climáticas, Sociedade Civil e o papel desempenhado pelo Fórum
Brasileiro de Mudanças Climáticas
Fábio
Feldmann
A
sociedade civil, entendida como espaço de participação,
independente do Estado ou do mercado, tem fornecido o arcabouço
e instrumental apropriados, por meio de suas organizações,
para que a geração de demandas dos atores comprometidos
com as causas públicas ou interesses coletivos seja canalizada
por outras vias que não as tradicionais formas de articulação
política, cujo principal exemplo são os partidos.
Partindo-se dessa premissa e reconhecendo-se a importância
de uma sociedade civil "forte" e organizada em torno dos
principais temas de nossa época, pode-se compreender a fundamentação
do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas
- FBMC e o papel que ele tem a desempenhar diante do cenário
que se apresenta no país para o tema das mudanças
climáticas.
Transcorrida
a primeira etapa da atuação do Fórum Brasileiro
de Mudanças Climáticas, atingimos um ponto que nos
permite avaliar de forma clara nossas realizações
e desafios. Estamos convictos - e a percepção compartilhada
pelos diversos setores sociais e governamentais nos autoriza a dizê-lo
- que o FBMC constitui-se uma instância privilegiada para
o estímulo ao debate, assim como para facilitar a incorporação
das questões sobre mudanças climáticas nas
diversas etapas das políticas públicas, de modo a
permitir uma participação cada vez maior dos atores
sociais, o aumento da consciência social sobre os desafios
que se apresentam e a resposta dos órgãos do governo
coordenada com os anseios da sociedade.
O
lançamento das Câmaras Temáticas do FBMC, abrangendo
um amplo espectro das questões associadas às mudanças
climáticas, desde os aspectos econômicos e sociais,
assuntos jurídicos, comunicação, educação
e informação, até biodiversidade, recursos
hídricos e energias renováveis, representa um esforço
para a criação de um veículo privilegiado para
as discussões sobre as questões relativas às
mudanças climáticas e seus impactos sobre o país.
Considerando-se o déficit na produção do conhecimento
e na difusão de informações sobre o tema, as
Câmaras Temáticas constituem um fórum para o
debate em suas áreas de atuação e serão
importantes loci para a troca de experiências e projetos
inovadores, além de tornarem-se instância de articulação
entre os atores governamentais, empresariais e sociais, contribuindo,
assim, para a transparência na tomada de decisão, o
acesso à informação e o envolvimento da sociedade
civil, a partir da consolidação dessa iniciativa.
De acordo com alguns analistas, o Protocolo de Quioto pode ser considerado
um dos instrumentos mais avançados que a comunidade internacional
já acordou, haja visto seus mecanismos econômicos e
os compromissos expressos em metas quantitativas que vinculam as
Partes. Internamente, a recente promulgação da ratificação
do Protocolo de Quioto pelo governo brasileiro é um marco
na trajetória que esse tema vem desenvolvendo no país
e confere novo impulso ao processo de incorporação
do regime internacional de mudanças climáticas no
Brasil. Venho sempre ressaltando que no século XXI as implicações
e desdobramentos das mudanças climáticas, bem como
o tratamento a ser dado a tais questões serão de importância
estratégica e, portanto, faz-se necessário um desenho
institucional que contemple os múltiplos aspectos envolvidos,
principalmente a interface com a sociedade civil, e é nesse
contexto que foi criado o Fórum Brasileiro de Mudanças
Climáticas, e que vem sendo realizado o seu trabalho.
Um
exemplo ilustrativo da forma de atuação do Fórum
é o lançamento do Inventário Nacional de Emissões
pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Sendo o Inventário
uma das partes que compõem a Comunicação Nacional
Brasileira à Convenção do Clima, o FBMC foi
um dos maiores incentivadores da transparência no processo
de elaboração e da iniciativa de se submeter os relatórios
a representantes da sociedade civil, para receber suas críticas
e sugestões. Com a disponibilização dos dados
atualizados a respeito das emissões antrópicas nacionais,
espera-se traçar um diagnóstico da situação
presente e colher subsídios que fundamentem uma discussão
aberta sobre a situação do Brasil no rol das emissões
globais e, diante do novo quadro, os próximos passos a serem
dados.
Em
que pese as complexidades inerentes ao tema das mudanças
climáticas, os aspectos científicos que subsidiam
as discussões internacionais e as considerações
acerca das diversas disciplinas relacionadas, tem-se claro que as
variáveis, causas e conseqüências das mudanças
climáticas, estão firmemente incorporadas à
realidade quotidiana dos cidadãos. Em outras palavras, quando
se fala em mudanças climáticas, leia-se, por exemplo,
a interface existente com os padrões de consumo, a eficiência
energética, o uso racional dos recursos naturais, o modo
como o lixo é deposto, o veículo que se utiliza e
a forma de organização do trânsito, etc. Assim,
tratando a questão sob essa ótica, trazemos para a
vida diária e para as preocupações de cada
indivíduo um tema que, a primeira vista, parecia estar desvinculado
da "micro-esfera" e distante do dia-a-dia.
Como
Secretário Executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças
Climáticas, tendo exercido atividades na área ambiental
e, especificamente, acompanhado a evolução das negociações
sobre mudanças climáticas e seus desdobramentos desde
1992, pude constatar o fortalecimento da legitimidade em torno do
tema, assim como a contribuição que o FBMC vem prestando,
o que inclui o trabalho de conscientização pública,
embasado pelo conceito de "cidadania planetária",
ou seja, a noção de que fazemos parte de uma mesma
humanidade e que, portanto, as responsabilidades de cada cidadão,
independentemente de nacionalidade ou outras identidades devem "somar-se"
em prol da sustentabilidade do planeta.
Imbuído
deste espírito, e cumprindo seu mandato, o FBMC reitera o
compromisso de ampliar o espaço que as mudanças climáticas
ocupam na agenda brasileira, empreendendo ações que
visam tornar o tema mais permeável, apresentando-o a vastas
parcelas da população e, sobretudo, envolver a sociedade
civil, as ONGs e o empresariado nas decisões sobre mudanças
climáticas em curso nas instâncias governamentais.
Fabio
Feldmann é Secretário Executivo do Fórum Brasileiro
de Mudanças Climáticas
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