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Gilberto Jannuzzi
As mudanças climáticas globais e seus efeitos nos ecossistemas brasileiros
Enéas Salati, Ângelo dos Santos e Carlos Nobre
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O papel do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas
Fábio Feldmann
Poema:
Paradoxo
Carlos Vogt
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  Mudanças Climáticas

As mudanças climáticas globais e seus efeitos nos ecossistemas brasileiros.

Enéas Salati, Ângelo Augusto
dos Santos e Carlos Nobre

Em 2002 o Ministério do Meio Ambiente através do PROBIO - Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira solicitou à FBDS e o CPTEC que implementassem o Projeto Mudanças Climáticas Globais e seus Impactos nos Ecossitemas Brasileiros. Além destas instituições, a equipe inicial é formada pelo Dep. de Botânica e o Dept. de Geografia, ambos, da UFRJ, o Dep. De Geografia da PUC/RJ, a Fundação de Estudos e Pesquisas Aquáticas (Fundspa) , a Divisão de Ciências Ambientais do CENA/USP. Com o andamento dos trabalhos outros grupos serão agregados à equipe inicial.

 

 

 

 

 

 

O clima, a biosfera e o ciclo do carbono
A distribuição e estrutura básicas dos ecossistemas têm uma história antiga onde as variáveis abióticas se associam a variáveis bióticas para produzir o padrão natural de distribuição da biodiversidade. A composição da biosfera resulta de um longo processo co-evoluído entre a parte viva do planeta e seu suporte físico, sendo que o clima aparece como a principal variável na distribuição da vegetação1. O papel do clima foi reconhecido desde o início do século XVII.

CO2 EM NÚMEROS :
- 80% do aquecimento global atual é devido a este gás.
- 97% do gás carbônico emitido em 1997 é proveniente das nações industrializadas através da queima de combustíveis fósseis para produção de energia.
- 80% de toda energia produzida é consumida por @ 25% da população mundial que vive nas nações industrializadas. Principal fator pelo qual os países em desenvolvimento esperam que as nações desenvolvidas sejam as primeira à promoverem cortes na emissão.
- 30% mais CO2 existem hoje na atmosfera terrestre do que na época da revolução industrial.

No século XIX o físico Arrhenius demonstrou que o gás carbônico (CO2) possui a propriedade de capturar e armazenar calor2. A concentração atmosférica dos gases de efeito estufa dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O), associados ao vapor d' água condicionam o balanço de energia planetária. Este efeito estufa natural atua como um cobertor térmico impedindo o esfriamento da terra. O aumento das concentrações antrópicas desses gases provoca o efeito estufa antrópico, objeto das preocupações ambientais mundiais.

Várias mudanças climáticas globais ocorreram ao longo da história evolutiva planetária induzindo novas organizações nos ecossistemas. As mudanças climáticas estão intimamente associadas ao ciclo do carbono e atualmente os níveis dos gases de efeito estufa, presentes na atmosfera, são os maiores dos últimos 42.000 anos3. Estudos demonstram a relação entre o aquecimento atmosférico, as mudanças climáticas globais e seus efeitos na distribuição dos ecossistemas4, levando a profundas alterações na atual composição da biodiversidade5.

Não restam dúvidas quanto ao aquecimento global, causado pelo acúmulo de gases de efeito estufa provenientes de emissões antrópicas, nos últimos 150 anos. Os resultados aceitos pelo Intergovernamental Panel on Climate Change IPCC6 desmentem qualquer afirmativa que as MCG seriam uma concepção teórica, de interesse acadêmico, superdimensionada por pressões políticas de grupos ambientalistas. Este, conclui definitivamente que:

  • O aquecimento global é devido sobretudo às atividades humanas que aumentam a concentração de Gases de Efeito Estufa e de aerossóis na atmosfera;
  • a composição química da atmosfera continuará se alterando ao longo do século XXI com efeitos persistentes por vários séculos;
    ü a temperatura média do planeta (medidas obtidas na superfície terrestre e marítima) aumentaram desde 1861, ao longo do século XX aumentaram em 0.6º C;
  • os modelos climáticos estimam que a temperatura global irá aumentar de 1.4 a 5.8º C neste século (2100), dependendo do esforço das nações para implementar políticas de mitigação de gases de efeito estufa;
  • a década de 90 foi a mais quente do século XX, talvez do milênio, sendo o ano de 1988 o que apresentou o maior pico de temperaturas globais;
  • a média do nível de todo o mar aumentou entre 0.1 a 0.2 m durante o século XX, com continuada tendência de aumento;
  • as geleiras, as calotas polares e a neve das montanhas continuam a derreter e diminuir suas áreas de cobertura.

As mudanças climáticas globais e as alterações na biosfera global
Vários episódios relacionam as MCG com alterações na biodiversidade. No Ártico a temperatura subiu 5ºC nos últimos 100 anos e desde 1978 suas geleiras diminuem a uma taxa de 3% por década. Os modelos climáticos prevêem que, em 2080, não haverá mais gelo durante os meses de verão, levando à extinção os ursos polares por fome7. As geleiras alpinas perderam metade de seu volume desde 1850, espécies características das baixas montanhas suíças migraram para alta montanha. Os estoques do salmão do Atlântico Norte serão destruídos quando a temperatura regional do oceano aumentar de 6ºC da média histórica. A diminuição no estoque de peixes levou a morte centenas de milhares de aves marinhas nas costas da Califórnia8.

O branqueamento dos recifes de corais, atestando sua morte, está ampliando a cada ano e estudos mostram uma correlação entre aumento da temperatura local dos oceanos e o branqueamento9.

O declínio de populações de anfíbios por todo o globo surge como um dos mais dramáticos eventos de destruição maciça da fauna. Respostas da biologia destes animais relacionadas com a respiração cutânea e fase aquática em seu ciclo reprodutivo fazem dos anfíbios um indicador de mudanças climáticas O pequeno sapo dourado (Bufo periglenes) exclusivo das montanhas de neblina da Costa Rica foi declarado extinto. Reproduzindo-se somente em uma especifica janela climática ocorreu que 30.000 indivíduos não se reproduziram devido à ausência de poças ocasionada pela estação muito seca de 1987 e somente 29 sobreviveram. Desde 1991 nenhum indivíduo foi encontrado Também o ataque do fungo chytridiomycosis infectando a pele dessecada dos sapos, ocasionou a extinção maciça de várias espécies das florestas tropicais australianas, centro e sul americanas e parte da América do Norte10..

A abordagem metodológica para identificar os impactos no ecossistema brasileiro das mudanças climáticas globais.
Para apontar as tendências de modificação dos ecossistemas brasileiros em resposta aos cenários futuros de mudanças climáticas globais o caminho metodológico abordado se divide em três níveis:

Caracterização do Clima Atual. O clima atual será definido através dos elementos do clima, de suas variações e índices integradores como o balanço hídrico calculado com os dados obtidos em estações climatológicas dispersas pelo território nacional. O resultado de cada ponto será lançado em um mapa do Brasil, em quadrículas com malha de 0,5º

Cenários Climáticos Futuros. Os cenários climáticos para os próximos 100 anos será definido através de cinco modelos climáticos globais a partir de três cenários de baixa, média e alta emissão de CO2 O resultado de cada ponto será lançado em um mapa do Brasil, em quadrículas com malha de 0,5º

O ponto metodológico mais sensível do projeto será a Análise dos Ecossistemas e da Biodiversidade. Este item será abordado considerando

Caracterização Biogeográfica dos Biomas. Consiste na caracterização dos principais tipos de biomas no Brasil (Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga e Pantanal). Para cada unidade, serão geradas uma série de mapas temáticos (geologia, solos, clima, hidrologia e relevo, vegetação e composição dos principais grupos de fauna). e um mapa síntese relacionando as características hidro-morfo-pedológicas e climáticas à vegetação.

Identificação dos Bioindicadores. Para cada bioma será identificada um núcleo representativo sendo a diversidade estrutural analisada criando uma tipologia de ecossistemas através da construção de bioindicadores de resposta funcional dos ecossistemas às condições climáticas extremas tais como esclerofilia, área foliar, caducidade, entre outros. Estes bioindicadores locais serão amarrados à NDVI. permitindo o uso de sensoriamento remoto, para todo o Brasil Relacionando o NDVI com as condições climáticas locais e com os bioindicadores será gerado um modelo de regressão produzindo um índice funcional que estabelece a relação entre as estratégias adaptativas e as condições climáticas na escala regional possibilitando a mudança de escala local (núcleo) para a regional. (ecossistema). .Através deste índice funcional será criado, para cada ecossistema, um mapa de resposta funcional que correlaciona a distribuição dos indicadores obtidos com os dados espectrais permitindo agilizar o mapeamento dos ecossistemas por sensoriamento remoto.

O impacto das MCG sobre os ecossistemas será obtido através do cruzamento dos principais produtos obtidos nestas etapas - mapas síntese dos biomas associando as características hidro-morfo-pedológicas e climáticas à vegetação -mapas dos NDVI para cada ecossistema - mapas de resposta funcional/ sensibilidade de habitats para cada núcleo- mapa do balanço hídrico para cada ecossistema e mapas dos cenários climáticos futuros.

Como resultado final teremos as tendências de alterações na distribuição dos biomas - obtida através do cruzamento entre o mapa síntese e os cenários climáticos futuros (1), bem como as tendência de alterações internas nos ecossistemas - obtida através do cruzamento dos cenários futuros com o mapa de resposta funcional (2) permitindo, também, uma quantificação de áreas de risco de perda de habitat (3).

Para os sistemas costeiros, uma metodologia um pouco diferenciada deverá ser utilizada, levando-se em consideração que o aumento médio do nível do mar será o mesmo, porém seus efeitos serão diferenciados em conseqüência das características da costa brasileira e da variação do nível das marés..

Principais tendências dos impactos das MCG sobre os ecossistemas brasileiros

O Brasil, com a sua dimensão continental, apresenta diversos ecossistemas que foram definidos e limitados ao longo do tempo, em decorrência das características climáticas, do solo, da topografia e da biodiversidade. Destacam-se a Região Amazônica, o Cerrado, o Nordeste Semi-Árido, a Mata Atlântica e o Pantanal.

Em alguns desses ecossistemas, a variabilidade climática já é suficiente para imprimir sinais significativos, não apenas nas condições naturais da biodiversidade, como também nas atividades sócio-econômicas. A Região Litorânea, por outro lado, abriga grande parte da população brasileira e possui áreas que serão alteradas significativamente com o aumento previsto do nível médio dos oceanos.

A dificuldade, até o momento, de se planejar ações compensatórias dos possíveis impactos das mudanças climáticas globais é a falta de conhecimento da intensidade dos impactos das alterações do clima nas regiões específicas. Dessa forma, os trabalhos a serem desenvolvidos visam especialmente o desenvolvimento de modelos regionais de mudanças climáticas, dentro do conhecimento já existente dos modelos de mudanças climáticas globais para os diferentes cenários de emissões dos gases de efeito estufa. Os estudos são complexos pois, em muitos casos, a alteração do balanço hídrico é devido a duas forças de transformação: uma relacionada a mudanças do uso da terra, urbanização, desmatamento; e a outra proveniente das mudanças climáticas do Planeta, decorrentes da alteração química da atmosfera terrestre pelo aumento das concentrações dos gases de efeito estufa.

Enéas Salati - Diretor de Projetos. Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável.
Ângelo Augusto dos Santos - Coordenador de Biodiversidade. Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável
Carlos Nobre - Diretor - Centro de Previsão de Tempo e Pesquisas Climáticas

Referências Bibliográficas
1. Sigman, D.M., Boyle. E.A. 2000. Glacial / Interglacial Variations in Atmosferic Carbon Dioxide. Nature 407, 859-869 pgs. [voltar]
2. Arrhenius, S.1896. On the Influence of Carbonic Acid in the Air upon the Temperature of Ground. Philosophical Magazine 41, 237. [voltar]
3. IPCC Climate Change 2001 -Impacts, Adaptations and Vulnearability. Contribution of Working Group II to the Third Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change. James. J. McCarthy, Osvaldo F. Canziani, Neil A . Leary, David, J. Dokken and Kasey S. White (eds.) . Cambridge Press. [voltar]
4. Salati, E., Nobre, C.A ., Santos, A . A ., 2001. Amazonian Deforestation: Regional ando global Issues. Amazoniana, XVI (3/4), 463-481. [voltar]
5. Malcon, J.R. Pitelka, L.F. 2000. Ecosystems & Global Climate Change: A Review of Potential Impacts on U.S. Terrestrial Ecosystems and Biodiversity. Pew Center on Global Climate Change. [voltar]
6. IPCC. Climate Change 2001- The Scientific Basis. Contribution of Working Group I to the Third Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change [voltar]
7. WWF The Polar Bear Tracker. 2002. Relatório concluído pela WWF com o apoio do Grupo de Especialistas em Ursos Polares da Comissão de Sobrevivência das Espécies da IUCN e do Norvegian Polar Institut, divulgado somente pelo site http://www.ngo.grida.no/polarbears/clima.html [voltar]
8. WWF. 2002. Mathews-Amos,A . and Ewann A. B. Turning up the Heat: How Global Warming Threatens Life in the Sea, , Marine Conservation Biology Institute, Seattle, USA, [voltar]
9. O'Neill, B.C. and Oppenheimer, M. 2002. Dangerous Climate Impacts and the Kyoto Protocol. Science 296:1971-72. [voltar]
10. Daszak, P.* Lee, B; Cunningham, A .A; Hyatt, A .D. Green, E. and Speare,R. 2002. Emerging Infectious Diseases and Amphibian Population Declines Report of CDC - Center for Diseases Control and Prevention. Atlanta. USA. [voltar]

 
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Atualizado em 10/08/2002
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