Empresas brasileiras se preocupam cada vez mais
em inovar
Reduzir custos, agilizar a produção, desenvolver um novo
produto que atenda às necessidades do mercado consumidor. Esses são alguns
exemplos do que se pode chamar de inovação. Ao contrário do que se pensa, as
empresas brasileiras têm se mostrado cada vez mais preocupadas com seu
potencial inovativo e até o Terceiro Setor, por meio de Organizações Não
Governamentais (ONGs), também inova. Porém, de acordo com especialistas, faltam
políticas públicas de fomento à
inovação gerada no setor produtivo privado.
"A inovação
destina-se a dar mais competitividade a uma tecnologia, ou descoberta
tecnológica, de um produto ou processo, ampliando a sua parcela de mercado e,
assim, agregando valor econômico e lucratividade", afirma Roberto
Nicolsky, presidente da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica, em artigo publicado
na revista ComCiência. Para Nicolsky, a
inovação permite que o país possa competir no mercado internacional e, por
conseqüência, exportar. "Isso amplia o mercado para os seus produtos e, assim,
propicia condições de um crescimento mais rápido da economia, isto é, do
Produto Interno Bruto (PIB)", explica.
De acordo com o pesquisador João
Furtado, da Unesp de Araraquara, o conceito de inovação é associado à
capacidade de empreender. (leia mais sobre o
assunto). A idéia foi assimilada, a partir dos anos 30, por
organizações, entes
coletivos e empresas que juntaram capacidade tecnológica e estratégia
empresarial. "A inovação está associada aos esforços das empresas para
construir espaços econômicos mais adequados, mais consistentes, capazes de
projetar o seu futuro", afirma.
Furtado
é o coordenador geral de um trabalho que mapeou os esforços tecnológicos das
pesquisas privadas realizadas por empresas nacionais e multinacionais e pelo
Terceiro Setor. Denominado Diretório da Pesquisa Privada (DPP), o trabalho
realizado por uma rede de pesquisadores de 12 instituições de pesquisa e
universidades brasileiras, abordou aproximadamente 500 empresas de 30 setores e
cerca de 60 ONGs para verificar a importância da tecnologia e da inovação em
suas estratégias corporativas.
"Fala-se muito em pesquisas realizadas nas universidades,
mas é preciso pensar também nas pesquisas feitas no setor privado e no chamado
Terceiro Setor", afirma Sérgio Queiroz, pesquisador do Departamento de Política
Científica e Tecnológica (DPCT), da Unicamp, um dos coordenadores do DPP.
Identificação da inovação
As empresas privadas brasileiras investem em pesquisa e
desenvolvimento (P&D) sobretudo para solucionar os seus problemas internos
e para responder às pressões dos mercado e à concorrência. Os pesquisadores do
DPP encontraram inovação e desenvolvimento tecnológico nas cidades grandes e
nas pequenas, nas empresas dos setores ditos de ponta e naquelas consideradas
tradicionais. "Empresas inovam pontualmente, se isso lhes é permitido, mesmo
que seja por um processo de concorrência fraco, tímido, emasculado das suas
principais armas", afirma Furtado. Mas as grandes empresas, como as
multinacionais, estão mais capacitadas para inovar, por estarem em um patamar
suficientemente elevado de capacidades industriais, comerciais e financeiras. (leia mais sobre o assunto)
Cada setor econômico possui uma percepção diferente sobre o conceito de inovação. "Quando se pergunta a uma empresa de um setor tradicional se ela inova, a resposta pode ser negativa, ao contrário de quando a pergunta é dirigida a uma empresa de um setor considerado inovador. Isso ocorre mesmo que ambas sejam inovadoras ou não inovadoras", afirma Furtado. Para ele, o principal resultado do trabalho foi encontrar inovação em setores cuja auto-imagem é de setor tradicional e não inovador, como em café ou leite, produtos do setor agroindustrial.
Financiamento direcionado
A identificação dos setores que mais
inovam é, para o pesquisador Sergio Salles Filho, do DPCT, também membro do
DPP, um modo eficaz de adequar as linhas de financiamento públicas e privadas à
realidade brasileira. "O mapeamento da inovação brasileira por setor dá
subsídios para conduzir as linhas de financiamento", diz Salles. "O objetivo do
DPP é estabelecer que tipos de financiamentos seriam mais apropriados para cada
tipo de atividade, para cada setor da economia", complementa o pesquisador.
Salles afirma que a inovação não
depende necessariamente de atividades de pesquisa e desenvolvimento. "Pesquisa
e desenvolvimento são atividades nobres, que nem todas as empresas fazem. As
atividades de P&D estão relacionadas a atividades de maior porte, de maior
retorno, de maior significado econômico afirma.
A inovação é, para Furtado, a
principal fonte renovável e sustentável de rendimentos diferenciados das
empresas. Em países com altas taxas de juros, como o Brasil, a principal fonte
de rendimentos das empresas são as aplicações financeiras e a intermediação
entre recursos externos e aplicações internas. "Quando as taxas de juros
estiverem em patamares aceitáveis para os padrões internacionais, a inovação e
o desenvolvimento tecnológico, que é a sua fonte renovável de energia, serão
mais do que uma alternativa entre outras, se tornarão um caminho em que as
empresas terão que buscar os rendimentos que os mercados ordinários não lhes
asseguram", afirma.
Terceiro Setor também inova
Apesar das ONGs desempenharem um papel de difusoras de
tecnologias existentes e de identificadoras e tradutoras de ciência, tecnologia
e inovação, ainda existe uma lacuna no conhecimento de como esse processo se
caracteriza. De acordo com a pesquisadora Sonia Paulino, do DPCT, as ONGs são
comumente ignoradas quando se fala de inovação. Paulino coordenou a parte do
trabalho do Diretório da Pesquisa Privada relacionada ao Terceiro Setor, em que
a participação no desenvolvimento de pesquisa científica e tecnológica e na
formação de recursos humanos foi analisada em cerca de 60 ONGs ambientais.
"O envolvimento das ONGs na obtenção de resultados de
ciência, tecnologia e inovação está ligado à busca pela desaceleração da
degradação ambiental, aumentando opções tecnologicamente viáveis para comunidades
locais em termos de alternativas de exploração econômica de recursos naturais",
explica Paulino. Para a pesquisadora, é preciso discutir sobre maneiras de
inserir, aproveitar e estimular as competências instaladas nas ONGs, em
estratégias de inovação. "Trata-se de respaldar a definição de mecanismos de
fortalecimento da articulação entre conhecimento e inovação, considerando temas
como o desenvolvimento do agronegócio e a exploração sustentável da
biodiversidade".
Na análise
sobre a capacidade das ONGs para realizar trocas com o ambiente externo, foram
ressaltadas as parcerias tanto para garantir a aquisição e adaptação de
conhecimentos externos, quanto para consumir ou captar recursos. "Enquanto as
parcerias com universidades e institutos de pesquisa foram citadas por 78% das
ONGs, nas parcerias com empresas esse número ficou em 44%; menor que a parceria
com instituições de pesquisa. Na maioria dos casos, a participação das empresas
envolveu aporte de recursos, vindo em seguida, a execução de tarefas e a
utilização de infra-estrutura e material", ressalta a pesquisadora.
Para Paulino, a
questão não se limita a medir a inovação nas ONGs, mas trata-se de uma
necessidade de se conhecer mais sobre os processos de acumulação, renovação e
disseminação do conhecimento científico e tecnológico. "O entendimento da
lógica a partir da qual são concretizados resultados de ciência, tecnologia e
inovação nas ONGs constitui pré-requisito obrigatório na formulação de ações de
fomento no sentido de conceber instrumentos capazes de mobilizar de maneira
eficaz as competências instaladas nas referidas organizações e concernentes a
diversos campos estratégicos para o desenvolvimento socioeconômico do país",
conclui a pesquisadora.
Resultados
práticos
O trabalho de mapeamento da
inovação continuará no Observatório de Estratégias para a Inovação (OEI),
batizado assim com base no conceito de inovação como parte de uma estratégia.
Contando com o mesmo grupo de pesquisadores do DPP, o OEI será uma ferramenta
de análise da realidade e de formulação, execução e acompanhamento das
políticas tecnológicas e de inovação nas empresas, nos setores, nos sistemas
locais de produção e agora também nas instituições de pesquisa. "Quanto mais as
políticas industrial e tecnológica forem ativas e quiserem ser rigorosas no uso
dos recursos, mais relevante será a colaboração do Observatório", conclui
Furtado.
As informações setoriais estão disponíveis em
relatórios no Portal do DPP. Os
resultados do trabalho realizado pelos pesquisadores do DPP serão apresentados
oficialmente no V Seminário de Economia Industrial, que será promovido pelo
Grupo de Estudos em Economia Industrial, nucleado na Universidade Estadual
Paulista (Unesp), de 11 a 14 de agosto, em Araraquara. Até o final do ano
deverá ser publicado um livro com os resultados do trabalho.
(SR)
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