Editorial:
Ciência, Tecnologia e Inovação: desafios e contraponto
Carlos Vogt
Reportagens:
MCT busca construir agenda para a ciência brasileira
Sistema de C & T é gerido por diversas instituições
Fundos garantem injeção de novos recursos à tecnologia
Programas especiais financiam pesquisas
Fapesp é modelo no fomento à ciência e tecnologia
A inovação tecnológica nas grandes empresas
Incubadoras geram empregos e inovações
Comunidade científica faz prévia para conferência nacional
O Brasil tem cientistas, mas faltam empregos
Artigos:
O intinerário da pesquisa no Brasil:
Evando Mirra
Os desafios para transformar conhecimento em valor econômico:
Roberto Nicolsky
Livro Verde pode ampliar conceito de política científica:
Ulisses Capozoli
Interação Rhodia-universidades no Brasil:
Saul D'Ávila
Quando o setor produtivo faz C&T:
Adermerval Garcia
Poema
Bibliografia
Créditos

 

 

Comunidade científica faz prévia para a Conferência Nacional

Nos dias 16 e 17 de agosto, foram realizadas simultaneamente em seis capitais do país as Reuniões Regionais preparativas para a Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, que acontece em Brasília, de 18 a 21 de setembro. A base das discussões estava pautada no Livro Verde da Conferência Nacional, apresentado em julho à comunidade científica, durante a 53ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Salvador.

O Livro Verde, encomendado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e pela Academia Brasileira de Ciências a professores, cientistas, empresários e técnicos do governo, foi coordenado por Cylon Gonçalves da Silva, do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, e por Lúcia Carvalho Pinto de Melo, do MCT. O documento faz um diagnóstico do atual estado da Ciência e Tecnologia no país e traça metas para o setor. "O Avanço do Conhecimento", "Qualidade de Vida", "Desenvolvimento Econômico", "Desafios Estratégicos" e "Desafios Institucionais" são os cinco grandes temas do Livro Verde, contidos na agenda das Reuniões Regionais.

Um dos dados apontados no documento mostra que o setor privado, incluindo o produtivo, mas principalmente o de ensino, absorve metade dos pós-graduados do país. O investimento privado em pesquisa e desenvolvimento, no entanto, é baixo em relação a outros países em desenvolvimento, tanto na indústria quanto nas universidades privadas. O secretário-executivo do MCT, Carlos Américo Pacheco, atribui o baixo investimento brasileiro em inovação, à política de substituição de importações que impulsionou a indústria do país na década de 50. O Brasil passou a ser forte em setores como o automobilístico, mas o investimento em inovação das indústrias multinacionais alemãs e norte-americanas continuou sendo feito em suas matrizes.

"O Livro Verde é um instrumento importante para o debate, porque mapeia esses problemas de uma forma ampla", afirma Antônio Márcio Buainain, professor do Instituto de Economia da Unicamp e coordenador do Grupo de Concepção e Redação do documento. "As Reuniões Regionais foram bem sucedidas", diz Buainain, "e as expectativas para a Conferência Nacional são muito boas", completa. A última conferência do gênero no Brasil aconteceu em 1985. O objetivo do MCT é elaborar durante o encontro de setembro as diretrizes das políticas de C&T para os próximos dez anos.

As Regionais

Um dos temas mais polêmicos discutidos nas Reuniões Regionais foi o da integração entre a academia e o setor produtivo. Na Regional Centro-Oeste, realizada em Goiânia, representantes de universidades se queixaram da falta de interesse dos empresários em investir a longo prazo em tecnologia. Os empresários, por sua vez, afirmaram que as universidades públicas apresentam resistência para realizar parcerias com a iniciativa privada. Após o debate, ambas as partes concluíram que a parceria entre elas iria fortalecer o desenvolvimento do país, apresentando propostas com vistas à transferência de conhecimento do meio acadêmico para o setor privado.

Na Regional Nordeste, que aconteceu em Maceió, a parceria entre universidades e empresas também esteve no centro das discussões. Um dos debates tratou do fato de que a maioria dos pesquisadores do país está no meio acadêmico, e não no setor produtivo. Segundo os debatedores, a academia não é especializada na apropriação do conhecimento, e sim em sua geração. "Ciência e Tecnologia só vão se tornar veículo para inovação se tivermos uma política empresarial ligada à pesquisa, como na Embraer e na Petrobras", disse Lindberg Lima Gonçalves, professor da Universidade Federal do Ceará e representante da SBPC.

O físico Carlos Henrique de Brito Cruz, presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), além de reforçar a importância da parceria entre universidade e empresa, apresentou na Regional São Paulo os programas da Fapesp de incentivo às micro e pequenas empresas que investem em pesquisa e desenvolvimento. A proporção das contribuições científicas e tecnológicas de São Paulo, em relação ao país como um todo, levaram à realização de uma Reunião Regional exclusiva para o estado. Nessa Regional, o simpósio "Como Transformar Conhecimento em Valor Econômico e Social" também abordou a questão da apropriação do conhecimento. Dividido em duas partes, o simpósio teve a sua primeira etapa voltada para o "Desenvolvimento Econômico" e a segunda, para "Qualidade de Vida". Durante o simpósio, o professor Carlos Vogt, vice-presidente da SBPC, apontou uma lacuna no Livro Verde em relação aos fundamentos sociais do panorama traçado para a ciência e tecnologia no país. Vogt apresentou o projeto de criação do Instituto Virtual de Estudos de Impacto de C,T&I Sobre a Sociedade, que agrega diferentes áreas do conhecimento. Segundo ele, o projeto poderá contribuir positivamente para a integração estrutural das ciências humanas e sociais nas discussões sobre o tema.

Reunião regional de São Paulo reuniu cientistas, políticos e empresários.

A Regional Sudeste, que aconteceu no Rio de Janeiro, dividiu o tópico "Qualidade de Vida" em "Saúde", "Meio-Ambiente" e "Índice de Desenvolvimento Humano e Social". Paulo Buss, presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), entidade de ensino e pesquisa ligada ao Ministério da Saúde, salientou a importância do investimento em C&T nessa área. "A saúde é o principal indicador de qualidade de vida da população", disse. A exemplo da Regional São Paulo, no encontro do Sudeste, representantes do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) participaram do debate sobre "Desenvolvimento Econômico", propondo uma política de incentivo fiscal para que o setor invista em P&D. Uma das propostas apresentadas nas discussões sobre "O Avanço do Conhecimento" visava o incentivo ao ensino à distância.

Essa também foi uma das proposições levantadas na Regional Sul, em Florianópolis, com o exemplo da bem sucedida experiência de pós-graduação à distância realizada pela Universidade Federal de Santa Catarina. Ao final do encontro, os participantes elaboraram a "Carta de Florianópolis", documento com as propostas a serem encaminhadas para a conferência de Brasília. Entre elas estão a revitalização dos mecanismos fiscais de apoio à inovação nas empresas, a regulamentação dos Fundos Setoriais, e o incentivo a projetos de parceria entre estados e municípios visando o desenvolvimento sustentável.

Em Belém, onde aconteceu a Regional Norte, o tema do uso sustentável dos recursos biológicos da Amazônia foi amplamente discutido. Também estiveram em pauta a gestão dos recursos hídricos na Amazônia e os levantamentos da biodiversidade, entre os tópicos de "Desafios Estratégicos e Institucionais". Nas discussões sobre "Desenvolvimento Econômico", foi apresentada a experiência do CONATI - Núcleo Consorciado de Assessoria Tecnológica à Indústria do Estado do Tocantins, para ilustrar a questão da interface entre demanda e oferta tecnológica. A "Carta de Belém", com as propostas dos participantes da Reunião Regional, inclui a criação de um Fundo Amazônico de C,T&I para pesquisas na região e de um Fundo Setorial de abrangência nacional para produtos da biodiversidade.

A discussão sobre Fundos Setoriais, levantada nas Reuniões Regionais, continua na Conferência Nacional de Brasília. Reinaldo Guimarães, professor do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e consultor do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ao discutir a seção "Políticas de C,T&I: uma Revisão de Instrumentos" do Livro Verde, destaca a desproporção entre os recursos aplicados em desenvolvimento tecnológico nas empresas e os recursos voltados para a pesquisa científica nas universidades. "O montante dos Fundos destinados à pesquisa acadêmica é pequeno", diz Guimarães. Ele também coloca em questão os critérios de alocação dos recursos. "Os setores de atividade econômica que fornecem as receitas para os Fundos não são, necessariamente, aqueles que mais demandam recursos para desenvolvimento tecnológico", afirma.

Atualizado em 10/09/2001

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