Fundos
Setoriais garantem injeção de recursos à C&T
Com
a proposta de financiar a infra-estrutura, o desenvolvimento e a
pesquisa científica e tecnológica de forma clara e
a longo prazo, foram criados pelo Ministério da Ciência
e Tecnologia, em 1999, os Fundos Setoriais. Entre suas vantagens
podem ser listadas a estabilidade ao financiamento, uma vez que
este está determinado em lei; a aplicação dos
recursos por uma gestão compartilhada; e sua contribuição
à redução do desequilíbrio regional.
Entretanto, nem toda a comunidade científica considera a
criação dos Fundos um avanço na política
de C&T. Surgem interpretações várias sobre
suas reais finalidades, o que precisa ser definido na busca de um
entendimento entre os responsáveis por sua gestão
e por seus potenciais parceiros e beneficiários.
Discussões
à parte, os Fundos Setoriais irão permitir a injeção
de recursos de R$ 1 bilhão ao ano, praticamente dobrando
aos recursos geridos pelo Ministério de Ciência e Tecnologia
e a previsão é que esse montante chegue a R$ 4,5 bilhões
até 2005.
Funcionamento
Os Fundos Setoriais são formados por contribuições
incidentes sobre o faturamento das empresas, sobre o resultado da
exploração de recursos naturais à União
ou da cobrança de royalties pela transferência de tecnologia.
Com exceção do Funtel (gerido pelo Ministério
das Comunicações), os recursos captados são
alocados, em categoria de Programação Específica,
no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(FNDCT).
O Brasil
conta com dez fundos setoriais aprovados e sancionados pelo governo:
petróleo e gás (CTPetro), recursos hídricos
(CTHidro), energia elétrica (CTEnerg), mineração
(CTmineral), espacial (CTespacial), transporte (CTTranspo), informática
(CTInfo), integração universidade-empresa (Verde-Amarelo),
infra-estrutura (CTinfra) e Funtel. Cada um possui um Comitê
Gestor que define diretrizes em suas áreas. Trata-se de um
órgão colegiado, constituído por membros de
diversos ministérios, do setor produtivo e da comunidade
científica.
Os
únicos fundos em atividade são o CTPetro, de 1999,
e o CTInfra, regulamentado em abril de 2001. Os recursos do CTPetro
são provenientes dos royalties da produção
do petróleo e do gás natural, sendo 40% dos recursos
destinados às regiões Norte e Nordeste e têm
por objetivo o financiamento de programas de amparo à pesquisa
e ao desenvolvimento tecnológico aplicados à indústria
do petróleo. Para o período 2001-2005 os recursos
planejados são da ordem de R$900 milhões.
Já
os recursos do CTInfra são constituídos por 20% dos
valores do FNDCT. A previsão para 2001 é de R$150
milhões, sendo que 30% deste montante deverão ser
aplicados em instituições sediadas nas Regiões
Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O fundo tem como objetivo o fortalecimento
da infra-estrutura e de serviços de apoio técnico-científico
desenvolvido em instituições públicas de ensino
superior, e de pesquisas brasileiras para o desenvolvimento de pesquisadores.
O primeiro edital dá prioridade à recuperação
da infra-estrutura de pesquisa das universidades e institutos de
pesquisa federais, destinando para isso 80% dos recursos. A verba
poderá ser usada na recuperação e ampliação
de laboratórios, aquisição de equipamentos,
compra de material bibliográfico e na construção
de instalações. Está previsto para o período
2001-2005 um total de R$1.160 milhão.
No
mês de setembro passarão a funcionar os seguintes fundos:
CTEnerg, CTMineral e CTHidro. O CTEnerg prevê o financiamento
de programas na área de energia, com ênfase na área
de eficiência energética e na utilização
de fontes alternativas. O CTMineral deverá estimular a atuação
da indústria nacional e apoiar o crescimento de pequenas
e médias empresas na área mineral. O objetivo do CTHidro
é assegurar o financiamento de projetos científicos
e de desenvolvimento tecnológico nas áreas de gerenciamento
de Bacias Hidrográficas, Limnologia, Hidrologia e Climatologia.
Ainda
em fase de regulamentação, estão os fundos
Verde-Amarelo - conhecido também por fundo Universidade-Empresa,
Telecomunicações, Transporte e Espacial. O Verde-Amarelo
deve impulsionar o desenvolvimento tecnológico brasileiro
através de projetos de pesquisa cooperativa entre universidades,
centros de pesquisa e setor produtivo, reduzindo desta maneira a
dependência de tecnologias produzidas no exterior.
O CTEspacial
pretende financiar o Programa de Desenvolvimento Científico
e Tecnológico do Setor Espacial, principalmente no que diz
respeito aos projetos de satélites e lançadores. O
CTranspo garante financiamento para programas e projetos com impacto
imediato sobre a pesquisa e o desenvolvimento em engenharia civil,
engenharia de transportes, materiais, logística, equipamentos
e softwares.
A regulamentação
do fundo de Informática deverá ocorrer em 2002, tendo
como objetivo estimular as empresas nacionais a desenvolverem e
produzirem bens e serviços de informática e automação,
investindo em atividades de pesquisas científicas e tecnológicas.
Para o período 2001-2005, já foram previstos recursos
da ordem R$1.320 milhões para Verde e Amarelo, R$700 milhões
para CTEnerg, R$120 milhões para CTHidro, R$20 milhões
para CTMineral, R$80 milhões para CTEspacial e R$120 milhões
para CTTrasnpo. O orçamento do Funtell, em 2001, foi de R$
240 milhões , com previsão de R$ 570 milhões
para o período 2001-2005. Ainda em discussão estão
os fundos Saúde, Agronegócios, Aeronáutica
e Biotecnologia.
Centro
de Gestão e Estudos Estratégicos
O
tipo de gestão dos Fundos Setoriais será inovador.
Em junho do ano passado, o ministro Ronaldo Sardenberg anunciou
a criação do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos,
que tem entre as suas atribuições, ser a secretaria
técnica de cada fundo. Para o secretário-executivo
do MCT Carlos Américo Pacheco, "é extremamente
relevante criar uma estrutura permanente de suporte técnico
para os fundos e precisamos de uma equipe permanente". Foi
planejada para o Centro uma estrutura reduzida, mas com atuação
forte e funções estratégicas, e com responsabilidades
sobre a prospecção tecnológica, estudos e diagnósticos
e imprescindíveis exercícios de acompanhamento e avaliação.
A idéia é ter nesse Centro um mecanismo de avaliação
para os projetos.
Em
21 de fevereiro, o senador Saturnino Braga apresentou o seu descontentamento
em relação à criação do Centro,
na tribuna do Senado. Ele declarou que "criar uma nova agência
e deixar ao abandono aquela que lá está (Finep), com
todo o patrimônio de pessoal muito bem formado, com experiência
e tradição, é alguma coisa não-razoável,
que contraria o espírito, por exemplo, da Lei de Responsabilidade
Fiscal, que vai constituir-se num prejuízo".
A opinião
pessoal da presidente da SBPC é de que o Centro é
perfeitamente dispensável. Segundo Glaci Zancan, bastava
criar um Conselho Deliberativo do FNDCT. "Temo que provoque
o esvaziamento do próprio MCT", diz. Essa posição
não é da SBPC, já que não houve uma
reunião para discutir o assunto.
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Salles
Filho diz que o sucesso dos fundos depende da ação
conjunta de agências, ministérios e pesquisadores |
Mas
segundo o Superintendente de Planejamento Operacional da Finep-MCT,
Sergio Salles Filho, "o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos
será instância de ação prospectiva e
de avaliação. Portanto, não afetará
o papel desenvolvido, hoje, pela Finep ou pelos comitês gestores".
Adicionalmente, James Gama, Assessor de Imprensa do Centro de Estudos
Estratégicos, esclarece que o mesmo abrigará as ações
relativas ao Centro, aos fundos setoriais e aos projetos especiais
do MCT. Esse órgão que está em construção
deverá secretariar os fundos e não interferirá
na definição de suas prioridades. Os Comitês
gestores, embora partam de documento com diretrizes fornecidas pelo
MCT, são instância deliberativa quanto à definição
de prioridades.
Críticas
Sobre a criação dos fundos, entre os pesquisadores
que criticam a implantação desses está Roberto
Nicolsky, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
e membro do Conselho Empresarial de Tecnologia de Federação
das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Para
ele, a idéia inicial dos Fundos é boa, porém
corre-se o risco de não gerar os avanços tecnológicos
que a economia necessita para se tornar mais competitiva, principalmente
no comércio exterior.
Um
dos pontos mais criticados por Nicolsky é o das empresas
não terem acesso direto aos recursos dos Fundos, embora esses
recursos tenham sido deduzidos de suas receitas. "A meu ver
isso configura uma situação injusta, pois a empresa
não pode passar essas deduções para a tarifa
por ser classificado de investimento. Mas também não
pode usá-los livremente. Isso tem a cara de imposto",
declara. A limitação de uso dos recursos por universidades
e institutos de pesquisas não possibilita, segundo ele, que
os fundos cumpram a sua missão. Ou seja, gerar tecnologia
e inovações, posto que esses órgãos
fazem apenas pesquisa, enquanto que para se ter uma tecnologia completa
é necessário também o componente desenvolvimento
no contexto de P&D (Pesquisa & Desenvolvimento).
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Glaci
Zancan teme que centro de estudos estratégicos esvazie
o MCT |
A presidente
da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC),
Glaci Zancan, acredita que os Fundos Setorias irão alavancar
a inovação. Porém ela defende a continuação
do financiamento da ciência, sendo contrária ao direcionamento
do financiamento apenas para o desenvolvimento tecnológico.
Como exemplo de equilíbrio, ela cita a Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp)
que não abandonou os programas anteriores ao acrescentar
o financiamento à inovação.
Sergio
Salles Filho, Superintendente de Planejamento Operacional da Financiadora
de Estudos e Projetos (Finep), não vê riscos de reflexo
negativo em áreas de pesquisa não contempladas pelos
fundos, já que o Verde-Amarelo pode ser aplicado sem diretriz
setorial e amenizará as possíveis distorções
do sistema. "Os fundos setoriais representam um rompimento
com o sistema até então vigente de financiamento de
C&T. Isso leva a alguns conflitos, indagações,
a algumas preocupações, mas acima de tudo há
uma expectativa extremamente positiva de que essa fonte permanente
de recursos reflita de forma significativa gerando inovação
no país." Salles Filho, complementa: "o sucesso
dos fundos depende da ação concertada entre agências
(Finep, CNPq, Secretarias do MCT, Centro de Gestão e Estudos
Estratégicos), ministérios e pesquisadores. Os pesquisadores
devem estar articulados com empresas, adotar proposta de inovação,
ter perspectiva de longo prazo, e utilizar o mecanismo de participação
aberta nos comitês gestores."
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