IPT produziu armamentos para a Revolução de 32
Em 1932 o Laboratório de Ensaios de Materiais (LEM),
da Escola politécnicatécnica de São Paulo foi o responsável
pela supervisão e execução de materiais bélicos destinados ao
exército paulista que combatia na Revolução. O Laboratório, dirigido
na época pelos engenheiros Ary Torres e Adriano Marchini, realizou
estudos, projetou e executou diversos instrumentos e armamentos.
Além do serviço prestado ao exército revolucionário, as dificuldades
ajudaram a incrementar a gama de experimentos e o rigor científico
aliou-se à criatividade, lançando a semente do Instituto de Pesquisas
Tecnológicas do Estado de São Paulo, nome que o Laboratório receberia,
em 1934, já com prestígio junto a indústria paulista.
A politécnica, e todos os seus laboratórios, foi requisitada
pelo governo para constituir o Serviço de Engenharia da Força
Pública. Neste momento, o LEM já havia avaliado suas possibilidades
e delineado planos de ação, o que vinha fazendo desde as primeiras
horas em que o movimento constitucionalista foi deflagrado. Com
a dificuldade de obtenção de matéria prima e a necessidade de
dar início imediato à produção, buscando suprir o movimento de
armas adequadas, os engenheiros do LEM desenvolveram vários armamentos,
muitos deles sofisticados para a época, e difíceis de serem encontrados
no exército brasileiro, contra quem combatiam. Além da intensa
produção, o aspecto mais importante dessa experiência para o LEM
foi o incremento de suas atividades e os desafios impostos pelo
desenvolvimento e inovações , usando, para isso, aplicações mais
nítidas das técnicas experimentais.
Este aumento de atividades, aliado ao estreitamento do contato
com as indústrias paulistas, levou à criação do Instituto de Pesquisas
Tecnológicas, o IPT, a partir do Laboratório de Ensaio de Materiais,
em 1934. O estreitamento do contato e o prestígio do LEM junto
a indústria paulista foi motivado pela sua participação ativa
no Movimento de 32.
Os relatos da época descrevem a coragem e o empenho de alunos
e professores da politécnicatécnica e de inúmeros voluntários,
que colocaram a criatividade em ação onde sobrava perigo e faltava
matéria prima. O engenheiro Miguel Siegel, fundador do Setor de
Metalurgia do IPT, conta que a dificuldade começou já na elaboração
dos mapas. Foi necessário ampliar fotos e preparar pranchas cartográficas,
o que facilitou o trabalho intenso e meticuloso de um grupo de
300 desenhistas e alunos. "Um dia entrei em uma sala e vi o grupo
ampliando os mapas à mão livre e pensei que deveria haver um modo
mais simples de fazer isso", disse ele, ao se referir ao trabalho.
"Com a pesquisa, projeto e execução de diferentes armamentos,
o IPT conseguiu realizar avanços importantes nos setores de metalurgia
e metrologia", comenta Cristiane Sousa, coordenadora do Centro
de Memória do IPT. Em 1932, os engenheiros do Laboratório
foram responsáveis pelo estudo, projeto e execução de periscópios
de trincheira, corretores de tiro para metralhadoras anti-aéreas,
telêmetros e binóculos milimetrados para artilharia. Além disso,
foram realizados ensaios e estudos com materiais para chapas de
blindagem, capacetes, morteiros de trincheira e também para munições
e granadas.
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Linha
de produção de armamentos do IPT. Fonte: Centro
Histórico do IPT
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Os experimentos para a fabricação de granadas de mão e munição
para artilharia foram os mais importantes, tanto pela técnica empregada
como pela sua importante contribuição para o Movimento.
Devido a dificuldade de encontrar o trotil, utilizado comumente
na época, foi necessário o uso do amonal, matéria prima de comportamento
incerto e por isso mais propensa a acidentes na fabricação de bombas
e munições. Químicos e técnicos do LEM sabiam do risco que corriam.
Uma fábrica com recursos e matéria prima da escola foi montada e
produziu algumas toneladas de explosivos.
A granada de mão era uma arma pouco difundida entre o exército brasileiro.
O LEM estudou vários tipos e decidiu adotar a granada de tipo Mill´s
, que foi adaptada às condições de produção que a politécnica dispunha.
Essa arma era tão pouco difundida e eficiente, que "lançava o terror
e o pânico", registrou a Revista Polytechnica, em dezembro
de 1932, ao se referir ao exército brasileiro. As granadas produzidas
na politécnica ficaram conhecidas entre os soldados como " abacaxizinhos".
O seu alcance médio era de 30 metros, mas foi adaptada ao fuzil
com bocal apropriado, também desenvolvido no laboratório, aumentando
seu alcance para a média de 180 metros. A fábrica na politécnica contou
com 3000 voluntários que, trabalhando em turnos, dia e noite, produziram
180 mil granadas.
Para ensinar os soldados a usar a arma, foi criada a Escola de Granadeiros,
que teve suas primeiras instruções dentro da área da Escola. Nesse
trabalho, os engenheiros Douglas McLean, Joaquim Bohn e o estudante
José Greff Borba, morreram. Na fabricação e testes com o artefato,
o voluntário Mario Bertacchi e o engenheiro Adriano Marchini, na
época diretor do LEM em substituição a Ary Torres, foram mutilados.O
acidente do diretor Adriano Marchini foi relatado por Miguel Siegel,
engenheiro do IPT, responsável pelo laboratório de metalurgia, como
uma imprudência. "Havia uma câmara onde a granada era colocada e
o detonador era puxado por uma corda. O detonador não abriu. Marchini
foi lá e puxou com a própria mão", esclarece.
O desenvolvimento de ligas de metal mais leves proporcionou capacetes
melhores e confortáveis, diferentes dos disponíveis no Brasil no
começo da década de 30. Além da produção das granadas e munições,
a politécnicatécnica coordenou a compra e distribuição de matéria prima
e o controle da qualidade de todo o material produzido pelas indústrias
paulistas, que juntaram esforços na produção dos artefatos necessários.
A adaptação das máquinas, também foi parte deste trabalho. Em 1930,
a metrologia e a metalografia eram áreas de grande importância dentro
da engenharia e foi com a demanda de trabalhos como esse que o LEM
passou a ser cada vez mais solicitado pela indústria paulista, sendo
desmembrado da politécnica para tornar-se o IPT.
Sob a orientação da politécnica foram construídos ainda trens e uma lancha
blindados. Os carros blindados que tinham peso inicial de 14 toneladas,
tinham mobilidade pequena, por causa da estrutura de pontes e estradas
da época, que não suportavam seu peso. Assim, foi criado um modelo
mais leve, de 4 toneladas, montado sobre chassi da Ford, reforçado
com molas e eixos Lincoln e com motor Ford.
Outros artefatos desenvolvidos ou adaptados pelo IPT/LEM foram:
morteiros, canhões de pequeno alcance, projétil de explosão por
percussão, bombas para aviões, bombas de fumaça, controles de munição,
lança chamas, munições para fuzis e metralhadoras, materiais para
trincheiras, lança minas, capacetes, carregadores de água e filtros
para cantis e também máscaras de proteção anti-gases. Alguns artigos
foram fabricados na politécnica e outros tiveram sua produção encaminhadas
às fábricas do estado, concentradas no esforço de guerra, imposto
pelo movimento.
Apesar da derrota do estado de São Paulo, as indústrias paulistas
receberam inovações importantes e os experimentos realizados no
LEM contribuíram para a formação do IPT e, de certa forma, prepararam
o Brasil para a Grande Guerra que o mundo assistiria em poucos anos.
(A.B.S)
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