Descobertas foram usadas nas Guerras Mundiais
O século XX traz consigo o fardo das guerras. Mas,
de 1914 a 1945, em exatamente trinta e um anos, a humanidade presenciou
também a maior revolução científica jamais vista. O homem fez,
nesse período, o que não havia feito em dezenove séculos. Ao mesmo
tempo em que causaram uma enorme destruição no mundo, as duas
grandes guerras trouxeram consigo o avanço científico e tecnológico.
A destruição causada pela guerra acompanha a trajetória da humanidade,
como explica o físico Rogério C. T. da Costa, do Instituto de
Física da USP/São Carlos: "a ligação entre as atividades bélicas
e a ciência, ou mais exatamente com a tecnologia dela derivada,
é muito antiga. Já na mais remota antigüidade as propriedades
elásticas dos materiais e a estabilização de projéteis foram largamente
empregadas na construção de arcos e flechas e posteriormente na
fabricação de máquinas de guerra, capazes de arremessar pedras
a distâncias consideráveis". "A história é pródiga em exemplos
de utilização perversa de resultados científicos obtidos com a
mais cândida das intenções", completa o físico Carlos Alberto
dos Santos, do Instituto de Física da UFRGS/RS.
Rogério Costa ressalta que dentre os cientistas, há indivíduos
muito diferentes no que diz respeito às lealdades, patriotismo,
ideologias e convicções a respeito da natureza humana e o seu
futuro. Para ele esse tema poderia se explicar da seguinte forma:
As armas usadas nas guerras estão baseadas nas leis naturais que
regem o comportamento de todas as outras coisas. A necessidade
de desenvolvê-las torna necessária a participação de especialistas
no funcionamento dessas leis (os cientistas). Esses desenvolvimentos
geralmente ultrapassam as aplicações imediatas para as quais foram
destinados, contribuindo para o progresso da própria ciência,
mas também de outras aplicações colaterais.
Fazendo uma recapitulação dos eventos científicos mais importantes
no período da Primeira Guerra Mundial, Carlos Alberto Santos salienta
que nem tudo esteve associado a ações bélicas. Ele destaca a participação
de Marie Curie, que trabalhou no serviço médico francês, montando
e administrando serviços de radiologia. E também a função do sonar,
que era a de detectar icebergs e não localizar submarinos inimigos
(o sonar é um equipamento que foi construído pelo físico francês
Paul Langevin, em 1917, para localizar submarinos alemães. Apesar
de já estar pronto, não foi usado antes do final da guerra).
Mas é preciso reconhecer que muitos desenvolvimentos tecnológicos
desse período, como o da aviação, serviram para aprimorar a atividade
militar. Como diz Costa, "é claro que nem Santos Dumont ou os
irmãos Wrigt eram cientistas propriamente ditos, mas sim pessoas
com o talento de aplicar princípios científicos a situações particulares
de interesse prático. A necessidade de melhores máquinas fez com
que cientistas fossem recrutados para desenvolver projetos de
aeronaves, o que resultou em progresso da aerodinâmica, metalurgia
e meteorologia".
Cronologia
de eventos |
1913 - o mundo já conhece o modelo atômico de Ernest Rutherford;
1914 - Primeira Guerra Mundial;
1917 - Paul Hangevin inventa o sonar;
1919 - Rutherford descobre o próton,
1920 - surge a teoria quântica moderna;
1929 - acelerador de partícular;
1930 - alemães descobrem a fissão nuclear/ ciclotron;
1932 - James Chadwick identifica o nêutron; através do bombardeio do urânio com nêutrons, a fissão nuclear estava pronto o caminho para a realização da bomba.
1941 - bomba atômica;
1942 - Erico Fermi desenvolve o reator nuclear;
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No final de 1930, a Alemanha descobre a fissão nuclear e os alemães
começam a pensar na bomba atômica. Albert Einstein, que é lembrado
erroneamente como tendo uma participação na fabricação da bomba,
se valeu de sua credibilidade para alertar sobre o projeto. No ano
de 1939, atendendo ao apelo de vários cientistas, envia uma carta
ao Presidente Roosevelt onde chamava a atenção para a possibilidade
da bomba nuclear alemã. Preocupado com a "falta de resposta", Einstein
escreve nova carta em 7 de março de 1940, terminando assim sua participação
nesse episódio.
Um ano depois, o governo do Presidente Roosevelt dá início ao Projeto
Manhathan. Nessa época muitos cientistas estavam nos Estados Unidos,
fugidos do nazismo. Enrico Fermi, físico italiano, coordenou a equipe
que estudava a produção de plutônio. J. Robert Oppenheimer, depois
de nomeado diretor do Laboratório de Pesquisas Atômicas, junta os
melhores físicos nucleares e dá início ao trabalho sigiloso que
culmina, em 6 de agosto de 1945, com o lançamento da bomba atômica
sobre a cidade de Hiroshima.
Dois ramos do conhecimento tiveram um desenvolvimento acentuado
na Segunda Guerra Mundial, segundo Rogério Costa. O primeiro foi
a produção e recepção de ondas sonoras e eletromagnéticas, que eram
essenciais para a detecção de submarinos (tecnologia do sonar) ou
navios e aviões (tecnologia do radar), dando origem a novos equipamentos,
com maior sensibilidade e capazes de operar em comprimento de onda
menores (da ordem de 1 cm, no caso do radar). O radar foi criado
em 1935, por Watson-Watt, e é um dispositivo eletrônico que permite
ao homem detectar e localizar objetos à distância e sob condições
de luminosidade precárias para o olho humano. O segundo ramo foi
energia nuclear, cuja descoberta praticamente coincidiu com o início
das operações militares da bomba atômica.
Como é sabido a construção da primeira bomba, dependeu da solução
de problemas que não eram "puramente" científicos, envolveu ramos
da engenharia e da metalurgia e só foi possível com o esforço coordenado
de vários especialistas. Mas a bomba não foi o único produto da
pesquisa nuclear. Um outro produto foi a construção de usinas nucleares
para produção de energia elétrica, as quais são hoje essenciais
para cobrir as necessidades energéticas de alguns países.
As principais conseqüências da Segunda Guerra Mundial foram: a redefinição
da ordem mundial em favor das superpotências; a confirmação dos
Estados Unidos com hegemonia no bloco capitalista; a União Soviética,
que emergiu como potência de primeira grandeza, exercendo uma considerável
influência na Europa Oriental. Essas duas superpotências tornaram-se
os grandes líderes políticos mundiais, reunindo em torno de si diversos
países. Houve um declínio da influência política, econômica e mesmo
cultural da Europa. No campo das técnicas militares, foram somados
aos instrumentos tradicionais de guerra novos tanques, foguetes,
radares, aviões, submarinos e, finalmente, a bomba atômica.
Na Primeira Guerra Mundial, as tensões advindas de disputas por
áreas coloniais, o revanchismo francês, a questão da Alsácia-Lorena
e a questão balcânica desencadearam o conflito entre os países.
A Alemanha, após a unificação política, passou a reivindicar áreas
coloniais e a contestar a hegemonia internacional inglesa, favorecendo
a formação de blocos antagônicos. Os blocos rivalizaram-se política
e militarmente até que, em 1914, surgiu o motivo da eclosão da Guerra:
o assassinato do herdeiro do trono austro-húngaro (Francisco Ferdinando),
em Sarajevo (Bósnia).
Nesse cenário, muitos cientistas fugiram de seus países de origem,
principalmente para os Estados Unidos, que se manteve neutro praticamente
durante todo o conflito, aproveitando para desenvolver sua produção
agrícola e industrial.O abrigo dado aos cientistas durante esse
período, reverteu-se em poderio, tanto intelectual como bélico.
(L.O.)
Para
saber mais |
- Como vejo o mundo/Albert Einstein;
tradução H.P. de Andrade - Rio de Janeiro : Nova Fronteira,
1981.
O livro traz histórias da vida de Einstein, incluindo suas
correspondências com outros cientistas e trechos de suas
conferências sobre paz.
- Infinito em todas as direções.
Freeman Dyson; tradução Laura teixeira Motta - São Paulo
: Companhia das Letras, 2000.
Traz os resumos de conferências proferidaspor ele em Aberdeen,
em 1985, e que trataram a respeito da diversidade do mundo
natural.
- Era dos extremos : o breve século
XX : 1914-1991 / Eric Hobsbawm : tradução Marcos Santarrita
; revisão técnica Maria Célia Paoli. - São Paulo : Companhia
das Letras, 1995.
O livro traz uma forte impressão da catástrofe humana que
foi o século XX. Catástrofe em relação às mortandades gigantescas,
sem equiparação possível com qualquer outro período histórico.
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