Carência
econômica de estudantes supera o limite de ajuda financeira
das universidades
Manter-se na faculdade é, para a maioria dos estudantes brasileiros
de baixa renda, quase tão difícil quanto ser aprovado
no vestibular. Em cada região do país, as instituições
públicas de ensino de nível superior, federais ou
estaduais, oferecem benefícios diferenciados para os alunos,
umas mais, outras menos. As bolsas-trabalho, moradia, alimentação
e transporte estão entre as necessidades mais comuns, especialmente
para aqueles que são de outros estados ou cidades. Nesse
processo de disputa, faltam vagas e milhares de estudantes não
recebem auxílio.
O Ministério
da Educação (MEC) deixa sob a responsabilidade de
cada instituição pública de ensino superior
gerar programas que possibilitem aos universitários pobres
continuar os seus estudos. Espalhadas pelas cinco regiões
brasileiras - Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sul e Sudeste, as universidades
públicas apresentam várias discrepâncias no
atendimento aos estudantes dependentes de ajuda financeira. A Universidade
Federal da Bahia (UFBA) possui três tipos de moradias em Salvador,
duas mistas e uma masculina, num total de 220 vagas, e mais três
no Campus Universitário de Cruz das Almas, a 170 quilômetros
da capital, onde funciona o curso de Agronomia, que abriga 83 pessoas.
Segundo
o superintendente estudantil da UFBA, professor José Ângelo,
faltam vagas para atender todos os alunos que precisam do serviço.
O restaurante universitário da UFBA é utilizado por
460 estudantes e, de acordo com o professor, não funciona
a contento. As bolsas-alimentação são liberadas
para estudantes cuja renda per capita da família seja menor
ou igual a um salário mínimo por mês, que não
tenham família na mesma cidade onde fazem faculdade e comprovem
matrícula regular no curso. As bolsas-trabalho, antes obtidas
por alunos da graduação que pretendiam estagiar na
própria universidade, foram suspensas pela UFBA por dificuldade
em mantê-las com recursos próprios.
Regiões
N e NE têm menos recursos para auxiliar alunos
Não
há moradia estudantil na Universidade Federal do Pará
(UFPA), a segunda maior em número de alunos no país.
O pró-reitor de ensino de graduação, Sílvio
Holanda, informa que, na capital, isso não representa um
problema, pois a maioria dos alunos é de Belém, mas
no interior a ausência de casas para os estudantes é
uma preocupação. Como a UFPA desenvolve um trabalho
de interiorização em seus "centros de ensino"
- eles não usam a palavra "faculdade" -, há
universitários que se deslocam de suas casas para assistir
aulas nos campi em Santarém, Marabá, Marajó,
Abaetetuba, Altamira, Bragança, Cametá e Castanhal.
As
bolsas-moradia, alimentação e trabalho são
as mais solicitadas entre os estudantes da Universidade de São
Paulo (USP). Dos 767 alunos de graduação inscritos
em 2002 para obter a bolsa-moradia, 239 foram selecionados. Entre
os pós-graduandos, de 181 inscritos a USP atendeu 109. Hoje,
moram no Conjunto Residencial da USP (Crusp) 1.060 alunos de graduação
e 414 de pós-graduação. A moradia da Unicamp
dispõe de 227 casas, cada uma com capacidade para quatro
moradores, e mais 27 unidades menores para casais ou mães
com filhos. Segundo o professor da Engenharia Química e coordenador
da moradia na Unicamp, Gustavo Paim Valença, não há
previsão de alteração das instalações.
"Para as funções a que se destina, ela é
suficiente", acredita.
Aluna
do Curso de Nutrição da USP e integrante do Diretório
Central dos Estudantes (DCE), Ana Carolina Feldenheimer da Silva
diz que os alojamentos temporários do Crusp lotam de calouros,
a maioria à espera de uma vaga, mas não há
apartamentos suficientes para todos, principalmente para as mães,
para quem são oferecidas somente oito vagas.
Corrida
por trabalho aumenta, enquanto a renda é reduzida
Com
base num critério sócio-econômico de seleção,
o Serviço Social da Universidade Federal do Pará (UFPA)
seleciona alunos para bolsas-trabalho de três horas diárias.
Sílvio Holanda explica que o objetivo é auxiliar o
universitário e não explorá-lo. "Não
queremos que o nosso estudante seja usado como mão-de-obra
barata", comenta. Por enquanto, a pró-reitoria tenta
não deixar sem trabalho nenhum dos alunos que solicitam a
bolsa. No entanto, para ampliar o serviço exige-se mais recursos,
ainda inexistentes. A Central de Estágios é outra
alternativa da UFPA e permite o encaminhamento de estudantes para
várias instituições e empresas, como a Vale
do Rio Doce, que recebe vários estagiários, especialmente
da área de Comunicação Social.
O Seviço
de Apoio ao Estudante (SAE) da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp) oferece 1.856 auxílios, que incluem bolsas-trabalho,
emergência, transporte, alimentação e pesquisa.
A procura aumenta ano após ano, à medida que diminui
o nível de renda dos estudantes. Em 2002, de um total previsto
de 636 bolsas-trabalho, o número foi ampliado para 818. O
professor da Engenharia Química e coordenador do SAE, Marco
Aurélio Cremasco, esclarece que de todos os benefícios
que a universidade cria para os alunos, as bolsas-trabalho, com
salários médios de 330 reais por 15 horas semanais,
são as mais requisitadas.
Uma
vantagem para boa parte dos alunos que obtêm a bolsa-trabalho
é que eles também recebem ajuda financeira para cobrir
despesas com alimentação e transporte. As bolsas-emergência
são liberadas uma única vez ao ano para estudantes
em dificuldades momentâneas, como o fim de um estágio,
que resulta em falta de dinheiro para se manter na cidade. Só
tem direito às bolsas-pesquisa, assim como às de trabalho,
os alunos da graduação. O critério de seleção
para as bolsas-pesquisa ou de iniciação científica,
concedidas em parceria com a Pró-Reitoria de Pesquisa, ao
contrário dos demais auxílios, não leva em
consideração a condição sócio-econômica
do aluno, mas sim o desempenho acadêmico. Alunos com notas
altas estão entre os mais cotados para recebê-las.
Até
o final de janeiro de 2003, a equipe do SAE tinha escolhido 400
alunos dos 1.800 inscritos para as bolsas-trabalho, sem contar os
calouros que chegarão quando sair o resultado do vestibular.
Dois mil novos estudantes comprovaram carência. O coordenador
do SAE informa que há muitos planos de melhoria do serviço
e um deles é ampliar o número de estágios,
que no ano passado foi de 814, a partir do contato com empresários,
convidados a conhecer a universidade. "O SAE é muito
forte. Ele exerce essa responsabilidade social e não é
assistencialista", comenta.
A busca
pelas bolsas-trabalho na Universidade de São Paulo (USP)
é alta e, em 2002, 600 alunos tiveram acesso, número
que deve ser mantido este ano. "A bolsa-trabalho é um
excelente recurso para o aluno que quer permanecer no ambiente universitário
e precisa complementar sua renda para continuar os estudos",
informa a supervisora do Serviço de Atuação
Comunitária da Coordenadoria de Assistência Social
(Coseas), Marília Zalaf. Para a graduanda em Matemática
na Unicamp, Welma Pereira, a bolsa-trabalho lhe permite desenvolver
uma aprendizagem interessante no Laboratório Interdisciplinar
de Tecnologias Educacionais (Lite) da Faculdade de Educação,
além de custear sua permanência na universidade.
A Universidade
de Brasília (UnB) conta, entre outras coisas, como moradia
e trabalho, com o Programa Vale Livro. Depois de uma avaliação
sócio-econômica pela assistência social, o aluno
recebe cinco vales por semestre que dão o direito de comprar
livros com 10% de desconto na Editora da UnB. A programadora cultural
e responsável pelo programa, Edelzita Moreira Costa, destaca
que a intenção é ajudar quem não pode
adquirir livros. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
não possui apenas programas de manutenção do
estudante nas faculdades, como moradia, emprego, assistências
médica e odontológica. Durante todo o ano os alunos
podem visitar as colônias de férias em Tramandaí
e o Centro de Lazer em Capão Novo.
O Serviço
de Apoio ao Estudante (SAE) da Unicamp também possui orientação
nas áreas jurídica, para auxiliar alunos a fazer contratos
de aluguel, a obter empréstimos em bancos; educacional, para
ajudar o aluno a se sentir inserido no meio acadêmico e descobrir
qual é a melhor escolha profissional; e, por último,
há a parte de atendimento psicológico, em que os estudantes
de graduação e pós-graduação
interessados, depois de uma triagem, podem fazer tratamento no Serviço
de Assistência Psicológica e Psiquiátrica ao
Estudante (SAPPE), ligado à Pró-Reitoria de Graduação.
Tanto a Unicamp como a USP atendem gratuitamente os estudantes em
seus hospitais ou em centros de saúde, como o Centro de Atendimento
Médico e Odontológico (Cecom), na Unicamp.
Outra
das preocupações da coordenação do SAE/Unicamp
é reavivar, segundo o professor Marco Cremasco, as atividades
culturais e artísticas dentro da universidade, que foram
se dissipando com o passar dos anos. Uma dessas atividades é
o programa Universidade Aberta, que objetiva mostrar ao público
o que se faz dentro do campus e aproximar os estudantes da comunidade.
E, para tornar os serviços do SAE mais conhecidos, especialmente
entre os calouros, dia 17 de fevereiro estará disponível,
em cada unidade de ensino da Unicamp, um estande com todas as informações
sobre o acesso aos serviços.
(RB)
|