Impactos
econômicos, sociais e ambientais na implantação de obras hidroviárias, segundo
percepção dos beneficiários *
Alivinio Almeida
Definida em função dos serviços
que presta à sociedade, a infra-estrutura de transporte facilita a realização
da atividade produtiva e social de indivíduos e empresas. Ao propiciar
condições para o crescimento econômico, torna-se essencial
ao desenvolvimento, ainda que não seja, por si só, suficiente
para garanti-lo.
Dentre os desafios do investimento em infra-estrutura pública de transporte
estão a identificação e mensuração dos impactos
qualitativos de natureza econômica, social e ambiental. Quanto maiores
o número e a intensidade dos impactos esperados, mais significativa se
torna a necessidade de avaliação. Vale ressaltar que os serviços
de transporte acontecem em um espaço determinado, dentro de uma área
geográfica específica e que seu uso está relacionado ao
movimento de bens e pessoas entre dois pontos. Nesse contexto é fundamental
que se conheça tanto a visão dos idealizadores quanto a opinião
dos possíveis beneficiários/usuários dos projetos. Esse
contraponto tem por finalidade melhorar a sintonia entre ambos, projetista e
usuários, propiciando ambiente favorável para a escolha dos melhores
projetos sob o ponto de vista da sociedade como um todo. Tais procedimentos
devem ter por intenção complementar a tradicional análise
benefício-custo, buscando resultados que reflitam as diferentes naturezas
dos impactos provocados pelos projetos.
A preocupação com impactos qualitativos
de natureza econômica, social e ambiental da infra-estrutura pública
de transporte torna-se mais relevante quando o serviço de transporte
é prestado utilizando o leito de rios, como no caso das hidrovias. Nessa
situação as implicações da construção
das estruturas e da operação dos equipamentos de transporte têm
alcance amplo e, muitas vezes, quase imperceptíveis. Implantar e operar
uma hidrovia implica uma série de impactos positivos e negativos sobre
o meio ambiente da sua área de influência que, quando não
considerados, distorcem as expectativas de retorno sobre o investimento. Dentre
os positivos estão a geração de empregos diretos e indiretos,
os estímulos à produção agroindustrial e o aumento
da troca de informações e de oportunidades econômicas e
sociais entre comunidades distantes.Os negativos relacionam-se, principalmente,
aos aspectos ambientais tais como: aumento do risco de erosão e de assoreamento
dos rios e canais, causando perda de qualidade da água e da biodiversidade;
poluição por defensivos, resíduos urbanos, industriais
ou de extração mineral, bem como por óleo combustível
oriundo das próprias embarcações; fortes mudanças
no cenário devido à dragagem, canalização e estreitamento
de canais e ao desflorestamento; e, introdução de novas doenças
nas regiões, devido ao aumento da migração populacional
induzida e favorecida pela hidrovia. Como se nota, são aspectos de extrema
relevância que não devem ser negligenciados.
Utilizando como base um estudo sobre a hidrovia Tocantins-Araguaia, observa-se
que o empreendedor promoveu a avaliação dos impactos ambientais
e sócio-econômicos delimitando a área de influência
direta e indireta da hidrovia em função dos espaços físico,
biótico e antrópico suscetíveis de alterações
decorrentes da implantação, manutenção e operação
do empreendimento. Vale observar que os estudos físico e biótico
não se limitam às divisas estaduais e municipais, pois obedecem
fronteiras e limites naturais. Já o antrópico mantém relação
com a organização político-administrativa das regiões
sob influência dessa modalidade de transporte. A hidrovia Tocantins-Araguaia
faz parte do projeto do Corredor de Transporte Multimodal Centro-Norte, um eixo
de desenvolvimento de transporte hidro-rodo-ferroviário, que ligaria
regiões de Mato Grosso aos portos do Maranhão e Pará, através
do Tocantins, oferecendo a oportunidade de incorporação de novas
áreas agrícolas e de exploração de atividades de
turismo e de lazer regional. Em projeto, ela se associa à BR-153 (rodovia
Belém-Brasília) e à Ferrovia Norte-Sul, sendo alternativa
para o escoamento de grãos do cerrado oriental e reduzindo as distâncias
Brasil-Europa e Brasil-Japão.
Quando foram buscadas as percepções dos potenciais beneficiários/usuários
do projeto, observou-se que os entrevistados tinham expectativas formadas sob
os prováveis impactos nas suas vidas e negócios. De modo geral,
acreditavam em aumentos médios da atividade econômica e da ação
social, bem como numa perda de baixa intensidade da qualidade ambiental. Diante
disso, declararam que o grau de importância da hidrovia para os seus municípios
era elevado, mostrando interesse em que instituições públicas
ou privadas investissem recursos próprios na sua implantação.
No que respeita ao meio ambiente, assinalaram que a hidrovia traria um risco
elevado, principalmente para o Rio Araguaia, cujo leito ainda raso e indefinido,
serve de berçário para um grande número de espécies.
Quanto ao Rio Tocantins, antigo e de calha profunda, acreditavam que a implantação
teria impactos de menor intensidade apesar de recomendarem atenção
ao processo. Contudo, segundo eles, mesmo sob alto risco ambiental, a implantação
de projetos dessa natureza e dimensões propiciaria, também, ações
ambientais e sociais que não aconteceriam ou aconteceriam lentamente
na sua ausência.
Finalmente, o esforço de pesquisa revelou a importância de se
conhecer, também, a impressão dos potenciais beneficiários/usuários
sobre projetos de infra-estrutura pública de transporte. Essas impressões
qualitativas são fundamentais para a adequada avaliação
de viabilidade econômica das propostas e estão disponíveis.
O contraponto é fundamental para o melhor dimensionamento da importância
do projeto, uma vez que pode servir de parâmetro de ponderação
para as visões do projetista e do empreendedor. O fato de não
serem facilmente mensuráveis, não justifica que as impressões
qualitativas sejam ignoradas. Melhor é aperfeiçoar os métodos
de sua incorporação nas análises quantitativas do tipo
benefício-custo, buscando estimar, adequadamente, os retornos econômico
e social do empreendimento. Esse é o caminho.
Alivínio Almeida é professor adjunto
do curso de ciências econômicas da Universidade Federal do Tocantins.
* Artigo baseado em “ALMEIDA,
A. Hidrovia Tocantins-Araguaia: importância e impactos econômicos,
sociais e ambientais, segundo o ponto de vista dos beneficários. Piracicaba,
USP/ESALQ/DESR, 1994. (Tese de Doutorado)”
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