Políticos
tentam regulamentar mundialmente a clonagem
Na
era da genética, freqüentemente a ciência invade
áreas do sentimento público. Da terapia gênica
aos alimentos geneticamente modificados, os assuntos envolvendo
DNA evocam retórica ética e opiniões fortemente
polarizadas.
O centro
do debate parece ser ultimamente a possibilidade da clonagem humana.
De um lado, a clonagem pode ajudar a resolver alguns dos mistérios
da nossa existência biológica e levar a curas de desordens
tais como o mal de Parkinson, lesões da espinha dorsal, doenças
cardíacas, e algumas outras condições envolvendo
a morte de células. Por outro lado, a história tem
ilustrado, muitas vezes, conseqüências potenciais horríveis
do progresso científico quando é utilizado com ética
e política doentias.
A tensão
entre o conhecimento científico bom e o progresso científico
mau provoca a idéia que a clonagem desafia nossa noção
de si mesmo e o básico significado de "ser".
De
certa maneira, surgiu uma intranqüilidade desde que a ovelha
clonada Dolly foi apresentada há alguns anos atrás.
Em janeiro de 1998, como resposta à Dolly, o Council
of Europe(COE) delineou um Protocolo
(Protocol on Prohibition of Cloning Human Beings) sobre a proibição
de clonar seres humanos como parte da existente Convenção
Européia sobre direitos humanos e biomedicina (Convention
on Human Rights and Biomedicine).
O protocolo
compromete os países que o assinaram a proibir, por lei,
qualquer intervenção que procure criar seres humanos
geneticamente idênticos a um outro ser humano, se vivo ou
morto, sem exceção. As razões, baseiam-se em
conceitos filosóficos e de segurança, e são
para proteger a identidade de seres humanos, preservar as características
casuais de recombinações genéticas de ocorrência
natural e impedir instrumentalização através
de clonagem artificial.
O tratado,
assinado então por 19 membros do COE, poderia tornar-se realidade
se ratificado por 5 países. Em 1º de março de
2001, legisladores da Eslováquia (22/10/1998), Eslovênia
(5/11/98), Grécia (22/12/1998), Espanha (24/01/2000) e Geórgia
(22/11/2000) ratificaram o protocolo, tornando-o o primeiro e único
acordo internacional a banir a clonagem. Vinte e quatro dos 43 estados
do COE assinaram, indicando o comprometimento em introduzir os preceitos
do tratado em sua legislação dentro de 5 anos após
assinatura.
O protocolo
abrange clonagem humana mas deixa para os países, individualmente,
a determinação do escopo do termo "ser humano".
Além disso, o tratado não toma posição
"sobre a admissibilidade ética de clonagem de células
e tecidos para pesquisa que resultem em aplicação
médica, um campo em que essa técnica pode se tornar
ferramenta importante". De acordo com o COE, questões
com relação ao uso de células de embrião
em técnicas de clonagem serão cobertas por protocolo
sobre proteção de embriões que está
por vir.
Adicionalmente,
Japão, Portugal, Alemanha, e Dinamarca proibiram toda clonagem
humana fora do protocolo da COE, embora os três países
europeus não tenham assinado o protocolo.
À
parte dos aspectos legais, filosóficos e políticos
está a questão da praticabilidade e da segurança
da ciência já que a possibilidade da clonagem humana
parece iminente. Poucos dias após o protocolo da COE ter
entrado em efeito, dois pesquisadores anunciaram na Itália
o início do projeto de clonagem humana. Panos
Zavos , professor emérito em fisiologia da reprodução
e andrologia da Universidade de Kentucky e diretor do Instituto
de Andrologia da América, e seu colega italiano, Severino
Antinori, planejavam produzir um embrião viável dentro
de 12 a 18 meses. Antinori é um especialista em fertilidade,
bem conhecido por ajudar mulheres após menopausa a conceberem.
Zavos, para desenvolver o projeto, organizou uma equipe internacional
de especialistas provenientes do campo da reprodução
humana no último quarto do século passado, incluindo
um cientista responsável por clonar, pela primeira vez, um
rato, em 1979. O propósito do projeto é ajudar casais
inférteis a terem filhos.
É
interessante notar que, embora haja proibição legal,
a exata linguagem das leis, assim como suas bases, diferem. A Alemanha,
por exemplo, declinou de assinar o tratado da COE porque sentiu
que a medida enfraqueceria a sua lei, já existente, que proíbe
pesquisas com embriões humanos.
A legislação
existente no mundo que restringe a clonagem parece exibir uma diversidade
tão grande quanto são as opiniões sobre a ciência
e a ética. As leis vão desde excluir da proteção
por patentes nos processos de clonagem, na Austrália, à
proibição da aplicação de fundos federais
para pesquisa com clonagem humana, em Missouri (EUA), e a proibições
penais na Califórnia (EUA).
O Reino
Unido, uma outra nação não signatária,
vinha mostrando uma evolução das políticas
quando chegou a clonagem. A Casa dos Lordes decidiu, em janeiro
de 2001, permitir clonagem de embriões humanos sob a condição
que os clones não vivessem mais do que 14 dias. A política
foi saudada positivamente por muitos, posicionando a Inglaterra
como a líder da pesquisa médica.
Na
arena da clonagem reprodutiva humana, entretanto, a política
não é permissiva. Em abril de 2001, o secretário
de saúde Britânico, Alan Milburn anunciou uma iniciativa
que poderia excluir a clonagem reprodutiva humana da licença
concedida pela lei: "No momento neste país, a clonagem
reprodutiva humana está proibida porque a Human Fertilisation
and Embryology Authority não mais a licenciará".
Até o momento do anúncio, a Human
Fertilisation and Embryology Authority podia emitir licença
para experimentos envolvendo clonagem.
Alan
Milburn disse: "a clonagem humana deve ser proibida pela lei
e não simplesmente pela licença. O governo legislará
em futuro próximo para explicitamente banir a clonagem humana
reprodutiva do Reino Unido."
Ele
também anunciou planos para criar quatro centros de tecnologia
genética que poderiam colocar a "Grã-Bretanha
como líder dos novos serviços genéticos e tecnológicos".
Nos
EUA, o assunto tem provocado ondas de atividades no Congresso. Em
28 de março de 2001, em audiência preparada pelo House
Subcommitee on Oversight and Investigations (Subcomitê Interno
de Supervisão e Investigação), representantes
da indústria, academia e comunidades éticas e religiosas
apresentaram seus pontos de vista. Rudolf Jaenisch do Instituto
Whitehead para Pesquisa Biomédica
tem sido um feroz crítico dos esforços correntes em
clonagem humana, incluindo os de Zavos. A clonagem humana poderia
ser "perigosa e irresponsável" devido a altas taxas
de morte fetal e "evidência de anormalidades" em
animais clonados. Entretanto, Thomas Okarma, presidente da companhia
de biotecnologia GERON, chama
a atenção quanto à distinção
entre o uso da tecnologia de clonagem para "criar um novo ser
humano, daqueles usos apropriados e importantes da tecnologia -
tais como clonagem específica de células humanas,
genes, e outros tecidos que não levarão a um ser humano
clonado." Essas últimas aplicações são
"úteis à produção de medicina preventiva,
diagnósticos" e outras doenças. Thomas Murray
da National Bioethics Advisory Commission
(Comissão Nacional de Bioética)relatou as recomendações
da Comissão. Embora membros possam não concordar com
tudo em relação aos "assuntos éticos que
cercam a clonagem de seres humanos, nós apesar de tudo unanimemente
concluímos que, dado o estado da ciência, qualquer
tentativa para criar uma criança usando transferência
de núcleo de célula somática, no setor público
ou privado, é incerto em seu resultado, é inaceitavelmente
perigoso ao feto e portanto, moralmente inaceitável."
A partir
da audiência, muitos membros do Congresso americano propuseram
legislação proibindo clonagem para propósitos
reprodutivos. Dos seis projetos de lei do Congresso, apresentados
até a data, quatro são da Casa dos Representantes
e dois são do Senado. Cinco estados já tem promulgado
legislação para, diretamente, proibir a clonagem humana,
e dez estados têm leis regulando pesquisa com embriões
e fetos que também restringem atividades de clonagem.
Atualmente,
nos EUA, pesquisas usando tecnologias de clonagem estão sob
a jurisdição da FDA (Food and Drug Administration).
Pesquisadores precisam submeter uma solicitação de
investigação de aplicação de nova droga
ao FDA, que a agência examina para determinar se a pesquisa
pode prosseguir.
Em
31 de julho de 2001, a Casa dos Representantes votou ampla proibição
sobre clonagem humana, tanto a clonagem para reprodução
como para fins de pesquisa, tais como para produção
de células-tronco que podem ser usadas em terapias. Essa
legislação prevê multas e prisão para
a desobediência e refere-se a todos os pesquisadores nos Estados
Unidos, não somente aqueles que trabalham financiados pelo
governo. Para cumprir seus efeitos falta, ainda, referendo do Senado
americano, previsto para início de 2002.
Jose
B. Cibelli, vice presidente de pesquisa, Robert P. Lanza, vice presidente
de desenvolvimento médico e científico, e Michael
D. West, presidente, todos da Advanced Cell Technology, uma companhia
privada de biotecnologia sediada em Worcester, Massachusetts (EUA),
anunciaram em 25 de novembro de 2001 que haviam clonado o primeiro
embrião humano (veja
reportagem da Scientific American), antecipando-se aos efeitos
rigorosos da nova legislação.
Na
Europa, a equipe do COE está desenvolvendo um protocolo sobre
embriões na pesquisa que foram consideradas pelo Steering
Commitee on Bioethics, em junho de 2001. O Conselho está
também trabalhando em quatro protocolos sobre genética
humana e um protocolo sobre transplante de órgãos
que será apresentado ao comitê de ministros para adoção
e assinatura em 2002.
(JF)
|