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A degradação ambiental oculta pelos garimpos de topázio imperial no Alto Maracujá

Robson José Peixoto

O garimpo é uma atividade de extração mineral existente já há muito tempo no mundo. Os primeiros sinais dessa atividade datam do século XV, com os europeus que partiam em busca de novas terras para conquistar suas riquezas minerais. No Brasil, os garimpos começaram a despontar com maior destaque no século XVIII, com as campanhas em busca de ouro e diamantes no estado de Minas Gerais.

Para melhor entendimento, o garimpo é uma forma de extrair riquezas minerais (pedras preciosas e semipreciosas são mais comuns) utilizando-se, na maioria das vezes, de poucos recursos, baixo investimento, equipamentos simples e ferramentas rústicas. Segundo a legislação brasileira vigente sobre mineração, a atividade garimpeira é considerada uma forma legal de extração de riquezas minerais desde que atenda a determinadas regras e obrigações. É facultado a qualquer brasileiro ou cooperativa de garimpeiros que esteja regularizado no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), órgão no país que controla todas as atividades de mineração.

O garimpo se torna problema justamente porque a maioria deles segue às margens da lei. Infelizmente, no Brasil, muitos garimpos quase sempre estão associados a confrontos, assassinatos, roubos, disputas de terra, prostituição, vícios, insegurança, impunidade, patrocínio de armas e narcotráfico e à degradação ambiental. Isto porque os garimpos ilegais são extremamente difíceis de serem controlados. Situam-se em regiões de difícil acesso, são dispersos pelo país, é migratório e não há regularidade na mão-de-obra e no regime de trabalho. Há muitos riscos para se estudar diretamente essa atividade. Dentro deste cenário se insere o garimpo de topázio imperial no Alto Maracujá, no distrito de Cachoeira do Campo, município de Ouro Preto, Minas Gerais. Este garimpo se enquadra muito bem em parte das descrições expostas anteriormente.

O Alto Maracujá vem sofrendo desde a década de 1970, com a ação de garimpos de topázio imperial. O nome Alto Maracujá se refere à região que abriga as nascentes do rio Maracujá, afluente da margem esquerda do rio das Velhas, este último afluente da margem direita do rio São Francisco.

Revista Gems&Gemologist
Topázio imperial lapidado

O topázio imperial é uma pedra preciosa de beleza impressionante, porém muito rara na natureza. Logo, tem valor de mercado muito elevado, o que aguça a procura pelos garimpeiros.

Desde 1750, o topázio imperial é extraído na região de Ouro Preto. Esse município é considerado, atualmente, como o único local no mundo onde ainda é possível se extrair este mineral em condições econômicas viáveis, visto que a formação geológica permite sua retirada com o mínimo de danos possíveis à sua estrutura. Uma pedra de topázio imperial que sofre danos físicos, apresentando-se trincada ou lascada, tem seu preço desvalorizado no mercado.

O Alto Maracujá tem toda sua área praticamente exposta à ação dos garimpos de topázio imperial. Quase todos os pontos de extração do mineral são clandestinos, o que agrava a situação. São utilizados métodos de lavra agressivos em termos ambientais além da grande quantidade de água gasta na extração e lavagem do topázio.

O rio Maracujá é formado basicamente por quatro córregos: Cipó, Arranchador ou Ranchador, Caxambu ou Olaria e Cascalho. Os garimpos se concentram, em sua maioria, no leito, às margens e nas cabeceiras dos córregos Cipó e Caxambu. O Cipó é considerado o principal córrego formador do rio Maracujá. Logo, todas as atividades que geram degradação ambiental nesse curso d'água afetam de forma negativa grande parte do rio. Os córregos Cascalho e Arranchador são os únicos que se encontram em melhor qualidade ambiental. O Cascalho, porque não há ocorrência de topázio em suas margens e leito, e o Arranchador, devido à ação efetiva da proibição de garimpos pelos proprietários das terras por onde ele passa.

O topázio imperial é geralmente encontrado a profundidades que variam de dois a sete metros na região do Alto Maracujá. É comum a existência de uma camada de solo que encobre os veios de cascalho (quartzo) onde está embutido o topázio. A retirada dessa camada de solo é feita por meio de escavação com picareta, enxadas e enxadões ou trator, quando o garimpo é semimecanizado. Essa operação é uma das principais causadoras da degradação ambiental e dos acidentes de trabalho na região. O solo exposto é carregado pela água da chuva ou dos próprios córregos, quando em períodos de cheias, e os sedimentos se espalham pela bacia, gerando o que se conhece como assoreamento. Este impacto dificulta a sobrevivência de peixes, entope canais e tubulações, muda o curso dos córregos bruscamente, aumenta os riscos de enchentes, além de proporcionar um aspecto visual negativo ao espelho d'água, degradando a paisagem.

Além do assoreamento, o garimpo instalado junto às margens dos córregos promove a retirada de boa parte das matas ciliares e de cabeceira, que são formações vegetais essenciais à proteção não só das águas, mas principalmente das nascentes (áreas de recarga). Na região, não é difícil visualizar árvores derrubadas lançadas no leito dos córregos. Esta prática é crime porque vai contra o Código Florestal que proíbe atividades desse tipo em áreas como as descritas acima.

Margem do córrego Cipó destruída por garimpo

Muitas vezes são construídas pequenas barragens rudimentares para a lavagem do solo e cascalho que contêm o topázio. Essas barragens modificam o curso dos córregos, fazendo com que eles atinjam estradas e pastos de pequenos sítios da região, causando prejuízos consideráveis principalmente no período das chuvas.

Como se não bastasse a degradação ambiental, os garimpeiros e pessoas que trabalham e trafegam pela região estão expostos a uma série de riscos de segurança e saúde ocupacional. Como as escavações para a retirada do topázio são realizadas sem técnica, há riscos de desmoronamento constantes. Já houve vários casos de acidentes fatais. Outros riscos podem ser citados tais como problemas ergonômicos, doenças devido ao trabalho exposto à intensa umidade, alcoolismo, brigas entre garimpeiros, assassinatos, quedas em buracos sem proteção ou cheios de água e lama, etc.

Barragens feitas no leito do Córrego Cipó

Enfim, os problemas são muitos para serem descritos. Tanto a polícia do meio ambiente quanto a prefeitura local vêm tentando resolver o problema, mas o nível de complexidade da situação, somado à falta de aparelhamento dessas entidades, inibe uma solução a curto prazo.

Realmente, soluções definitivas para esse problema estão muito longe de serem alcançadas. Isto porque os garimpos geram impactos não só nos meios físico e biótico, como também no social. A criação de uma cooperativa de garimpeiros seria uma alternativa, porém, não se sabe com precisão quantos são, quem são e onde estão esses trabalhadores. Não existe um censo que demonstre com certeza a massa trabalhadora que se expõe nas frentes de lavra dos garimpos de topázio imperial do Alto Maracujá. Informações extra-oficiais indicam que existem pais de família que dependem desse trabalho para sustento familiar devido ao desemprego, assim como existem pessoas de má índole, aventureiros, aqueles que buscam o garimpo de topázio como fonte de renda extra, aqueles que tem o garimpo como vício e não querem mudar de situação, grandes empresários que agem nos "bastidores" e pessoas com grau de instrução considerável, estes últimos fazem tanto estrago quanto aqueles garimpeiros sem instrução, o que é mais lamentável ainda.

Uma das nascentes do córrego Cipó destruída pelo garimpo

O que é necessário se fazer hoje pela "saúde" da bacia do rio Maracujá, bem como pela segurança dos seres humanos envolvidos direta ou indiretamente no garimpo, é um estudo de grande porte, abrangendo diversas áreas do conhecimento, de forma a identificar todos os problemas detalhadamente nos campos físico, biótico e socioeconômico para que as alternativas de solução possam ser mais bem elaboradas e aplicadas. O certo é que o foco deve ser direcionado para a informação do garimpeiro e a tentativa de persuadi-lo de que suas ações impensadas corresponderão a reações irreversíveis no futuro não só dele mas dos seus descendentes. O que foi percebido nos estudos de campo é que vários garimpeiros sabem que seu trabalho prejudica o meio ambiente. Provavelmente, as medidas a serem tomadas para mudança desse panorama devam começar por esses elementos.

O rio Maracujá está sujeito a problemas de poluição muito parecidos com os de outros rios brasileiros. Logo, a revitalização da bacia tem que passar por políticas públicas de saneamento e investimento em informação. A questão do garimpo é só mais um agravante que influencia a já crítica situação do rio.

Programas de educação ambiental devem ser realizados junto à população, principalmente nas escolas, para que todos tomem consciência de que a água é um bem essencial ao ser humano. Este deve protegê-la com sabedoria , para que um dia ela não se torne artigo de luxo, como já anda acontecendo em muitos lugares do planeta.

Cascata do Dom Bosco formada pelas águas do rio Maracujá

E quanto ao garimpo? Bem, os recursos minerais existem na natureza para serem utilizados. Afinal, muitos deles são essenciais à vida da sociedade moderna. O que se deve levar em consideração é que é possível se fazer garimpo, ou mineração em geral, com responsabilidade social e ambiental. Basta haver investimento, boa vontade, e trabalho dentro das normas técnicas e de desenvolvimento sustentável.

Robson José Peixoto é mestre em engenharia mineral pela Universidade Federal de Ouro Preto, engenheiro de minas da empresa TECISAN - Técnica de Engenharia Civil e Sanitária LTDA.

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Atualizado em 10/11/2005

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