Física
atômica: perspectivas dentro do Ano Internacional da Física
Vanderlei
S. Bagnato
O
entendimento da natureza atômica da matéria foi um dos maiores
passos para o estabelecimento da ciência moderna. Imaginem como seria
a química se não fosse o bom entendimento dos elementos químicos.
Seria uma ciência empírica, dominada por leis fenomenológicas,
como já o era antes o avanço causado pela atomística.
Hoje, dizer que tudo é constituído por átomos já
faz parte de nosso cotidiano, ninguém mais fica assustado, passou a
ser o óbvio. Crianças aprendem nos primeiros anos de sua educação
que átomos existem e são importantes. O caminho percorrido pela
ciência até chegar a este estágio não foi tão
simples assim, e cada pequeno progresso que ele apresentou, causou uma verdadeira
revolução. A procura dos tijolos fundamentais da natureza sempre
foi fascinante e cheia de surpresas. Inicialmente imaginava-se que os átomos
eram como bolas rígidas, montando a matéria macroscópica
observável como se fosse um punhado de grãos de areia empilhados
e ligados por uma cola mágica. Depois, verificou-se que na verdade
o átomo tinha uma estrutura interna: elétrons, prótons
e nêutrons convenientemente distribuídos. O entendimento de como
estes componentes constituem os átomos de uma forma estável,
deu origem a uma das mais brilhantes teorias de todos os tempo: a mecânica
quântica. A mecânica quântica foi uma revolução
nunca antes sofrida pela ciência. Com ela, a espécie humana dá
um salto enorme, e cria o panorama atual de toda ciência. É praticamente
impossível falar-se em qualquer uma das ciências básicas
(matemática, biologia, química e física) sem que o conceito
da natureza atômica da matéria esteja presente e com ela o conceito
quântico. Na matemática, muito avanço ocorreu exatamente
na procura de ferramentas para se poder expressar os átomos e seus
constituintes através de funções e números.
Entendemos
hoje muito da natureza dos átomos, e com isso temos sido capazes de
realizar aventuras inéditas no mundo subatômico. O problema é
que trata-se de um campo inesgotável de surpresas. Todas vez que achamos
que temos todas as respostas, a natureza atômica nos supera, colocando
novas perguntas.
Como
estamos no Ano Internacional da Física, ano comemorativo dos trabalhos
de Einstein, é interessante colocarmos suas contribuições
à física atômica.
Uma
das contribuições seminais para a atomística moderna
foi dada por Einstein ao estudar o chamado movimento browniano. Este é
o movimento de zig-zag observado em pequenos corpos colocados em suspensão,
como os grãos de pólem etc. Einstein explicou que esse movimento
era devido aos pequenos empurrões que essas partículas recebem
devido ao fato do líquido ser constituído de moléculas
em constante movimento. Corpos muito grandes não sofrem esse movimento
pois sofrem tantos empurrões, em tantas direções, cuja
média vai a zero.
Einstein
investigou com muito cuidado a interação da luz com a matéria,
e descobriu as leis fundamentais da troca de energia-campo de radiação-matéria.
Estes estudos formariam as bases da moderna espectroscopia atômica,
tão amplamente utilizada nos laboratórios de pesquisa e mesmo
como técnicas analíticas industriais. As análises de
Einstein da interação da radiação com os átomos
mostrava a ocorrência da chamada emissão estimulada de radiação,
fenômeno fundamental para o surgimento do laser, aparelho que conquistou
a humanidade tanto nos aspectos científicos quanto tecnológicos.
Ao
longo de sua carreira, Einstein realizou inúmeras contribuições
para a física atômica, mas seu trabalho combinado com outro físico
N. Bose, é que foi de extrema relevância para criar as novas
perspectivas para a física atômica. A chamada condensação
de Bose-Einstein, relevante para vários campos da ciências. Esse
fenômeno previsto por esses dois cientistas há quase um século,
só pôde ser demonstrado de forma clara e controlada recentemente,
em 1995. A condensação de Bose-Einstein ocorre quando confinamos
átomos neutros e os resfriamos, por técnicas modernas de resfriamento
a laser, até próximo do zero absoluto de temperatura. Nessas
condições, os átomos passam a se comportar de acordo
com as leis da mecânica quântica, mesmo no mundo macroscópico.
Trata-se, portanto, de tornar visível os efeitos da mecânica
quântica, antes só observados no interior do átomo. Essa
manifestacão quântica macroscópica é uma nova janela
para que possamos explorar o intrigante mundo atômico. Toda vez que
a mecânica quântica manifesta-se no mundo macroscópico
novos efeitos inesperados são descobertos. Foi assim que descobriu-se
a chamada supercondutividade e a superfluidez. A condensacão de Bose-Einstein,
ainda é muito nova do ponto de vista experimental para que possamos
saber que novas super-propriedades ela deverá nos revelar. Por essa
razão, esse tópico é um dos mais importantes para os
próximos anos e sem dúvida constituiu-se numa das maiores perspectivas
de avanços para o campo da física atômica. Outro campo
de grande perspectiva é o de entender como esses átomos, nesse
regime quântico, interagem formando moléculas.
O
entendimento dos átomos sempre foi a mola propulsora da ciência
moderna. Entendê-los, cada vez com maior riqueza de detalhes, só
promove o avanço da ciência como um todo. Hoje já estamos
na área atômica, onde blocos de matérias semicondutores
são criados, camada por camada, atômicas, produzindo matérias
de propriedades inatingíveis de forma diferente. As moléculas
biológicas também já entraram nesta era. Temos que manipular
partes, ou mesmo átomos, dentro dessas moléculas para podermos
controlar o percurso de certas etapas da vida. Cada vez mais o poder da ciência
em dominar e controlar a espécie atômica determina seu próprio
avanço.
Nunca
escaparemos da necessidade de entender como as características do mundo
que nos rodeia depende das propriedades do mundo atômico microscópico
e, para isso, é preciso continuar trabalhando para entender cada vez
melhor essa entidade fundamental, chamada de átomo.
Vanderlei
S. Bagnato é professor do Instituto de Física de São
Carlos – Universidade de São Paulo.