Museu expõe capacidade artística dos pacientes
A
história do Museu do Inconsciente confunde-se com a de sua fundadora,
Dra.
Nise da Silveira (1905-1999), uma psiquiatra que se posicionou
desde seus tempos de faculdade contra o eletrochoque, a lobotomia
e outros tipos de tratamento. Estes métodos são hoje considerados
desumanos pela opinião pública e pela maioria dos profissionais que
trabalham com doentes mentais.
A não concordância com essas formas de tratamento,
demonstrada pela Dra. Nise, desde o início de sua carreira, levou-a
a criar, em 1946, o Serviço de Terapia Ocupacional do Centro Psiquiátrico
Pedro II, no Engenho de Dentro, Rio de Janeiro. Sob sua orientação,
os funcionários do centro psiquiátrico começaram a estimular os internos
a terem contato com várias atividades artísticas. A partir deste contato,
que incita a criatividade, o paciente passa a ter novas ferramentas
para se expressar e refletir seu estado psíquico. Através da pintura,
da escultura e outras formas de expressão o esquizofrênico pode representar
seu mundo interno, suas angústias ou seu processo de cura, já que
é uma característica da esquizofrenia a dissociação e desordem da
linguagem.
"A comunicação com o esquizofrênico, nos casos graves,
terá um mínimo de probabilidades de êxito se for iniciada no nível
verbal de nossas relações interpessoais. Isso só ocorrerá quando o
processo de cura se achar bastante adiantado. Será preciso partir
do nível não verbal. É aí que se insere com maior oportunidade a terapêutica
ocupacional, oferecendo atividades que permitam a expressão de vivências
não verbalizáveis por aquele que se acha mergulhado na profundeza
do inconsciente, isto é, no mundo arcaico de pensamentos, emoções
e impulsos fora do alcance das elaborações da razão e da palavra [...]"
A principal função das atividades realizadas no Centro
de Terapia Ocupacional é justamente criar oportunidades para que as
imagens do inconsciente encontrem formas de expressão, possibilitando
ao doente uma melhor compreensão de sua condição, de sua situação
psicológica, de suas vivências internas, do significado dos seus sintomas.
A importância dessas atividades para os internos foi crescendo de
modo diretamente proporcional ao tamanho do acervo a ser conservado,
motivando a fundação do Museu de Imagens do Inconsciente em 1952,
localizado dentro do próprio Centro Psiquiátrico Pedro II.
Foi também com essa intenção que Dra. Nise criou
a Clínica Casa das Palmeiras em 1956, sem fins lucrativos, que funciona
em regime de externato, destinada ao tratamento e à reabilitação de
egressos de unidades psiquiátricas. Os trabalhos realizados na Casa
são pioneiros no tratamento da esquizofrenia fora das premissas do
hospício e comprovam a viabilidade terapêutica da expressão criativa
e da liberdade. Nise da Silveira aponta em seu livro Mundo das imagens
(1992) para a complexidade do universo das formas pictóricas e da
mente humana:
"[...]o mundo interno do psicótico encerra insuspeitadas
riquezas e as conserva mesmo depois de longos anos de doença, contrariando
conceitos estabelecidos. E dentre as diversas atividades praticadas
na nossa terapêutica ocupacional, aquelas que permitiam menos difícil
acesso aos enigmáticos fenômenos internos eram desenho, pintura, modelagem,
feitos livremente."
Assim na Casa das Palmeiras, é dada grande ênfase
às relações interpessoais entre corpo técnico e pacientes, sem as
marcadas distinções discriminatórias que os separam. A autoridade
da equipe técnica estabelece-se de maneira natural, pela atitude serena
de compreensão face aos problemas dos pacientes, pela evidência do
desejo de ajudá-los e por um profundo respeito a cada uma das pessoas.
No entanto, o Museu do Inconsciente padece dos mesmos
problemas de falta de recursos que atingem
boa parte das instituições brasileiras do gênero...