CARTAS DE LEITORES
E-mail enviado por Florianita Coelho Braga Campos*
"Pela primeira vez tenho acesso a Revista. Achei uma excelente
iniciativa, pois será uma importante contribuição para as pessoas
que buscam informações para suas pesquisas, desde escolares até os
próprios jornalistas, que muitas vezes são pegos de surpresa em algum
fato do cotidiano.
Como este é um dos objetivos da revista, coloco
algumas questões sobre o artigo/reportagem "Reforma Manicomial", que
acho fundamentais para sua real compreensão:
1. Exatamente sobre o título. Todos os projetos
de reforma citados (portaria 224/92, Projeto-Lei Federal do Paulo
Delgado, Lei Estadual do Roberto Gouveia, etc..) e mesmo todas as
experiências mostradas elas não visam REFORMAR O MANICÔMIO, mas extinguir
A INSTITUIÇÃO TOTAL ( segundo Goffmam) que o manicômio representa.
O propósito é reformar a assistência psiquiátrica. A PSIQUIATRIA,
que é uma ciência que foi utilizada por séculos para a contenção (geográfica
e medicamentosa) de pessoas indesejáveis e difíceis - pois diferentes
da "norma" - a sociedade, não conseguiu nesse tempo resolver a vida
de quem estava sob seus cuidados, com a internação. Então, o título
mais correto seria REFORMA PSIQUIÁTRICA.
2. O artigo 1, traz uma frase que fala sobre "unanimidade"
em não voltar atrás. Infelizmente, não é unanimidade: donos de grandes
manicômios, que recebem do SUS R$640,00/ mês pelo paciente internado,
continuam contra todas estas iniciativas citadas de Reforma Psiquiátrica,
continuamos ainda no Brasil com hospícios de até 1300 leitos !! Não
é muito dinheiro/mes para concordar em dar vida e liberdade para os
internos?? O governo federal assinou a portaria que entrou em vigor
em jan/00, sobre utilização da verba de internações para que se organize
moradias para os pacientes (como já é feito no Cândido Ferreira que
vocês mostram na mesma reportagem) e - tão nova a portaria - está
sofrendo muito ataque por parte dos que têm os leitos enclausurados.
3. No artigo 2, fala-se sobre a 224/92 que descrevia
"estruturas inéditas". O conteúdo da portaria realmente era inédito
no Brasil, mas as estruturas já existiam...talvez por isso que veio
a portaria, foi uma conquista. Em 1992, já existiam o CAPS-Itapeva
desde 1986 na cidade de São Paulo, os NAPS de Santos desde 1989, o
HD do Cândido Ferreria desde 1990, só exemplificando alguns do Estado
de SP. E outra coisa é que infelizmente não foi na 224/92 que descreve
os Lares Abrigados, ela não tocou nisso... algumas portaria foram
excritas que versavam sobre assunto, mas ou não foram "promulgadas"
ou engavetadas.
Espero ter contribuido com a Revista e forneço
alguma bibliografia para que possam pesquisar e não ficar apenas com
minhas palavras:
Amarante, P (org) "Psiquiatria Comunitária e Reforma Psiquiátrica"
, Ed. Fiocruz/RJ, 1996
Amarante, P (org) "Loucos pela Vida", Ed. Fiocruz/RJ, 1998
Amarante e Rotteli, (org) "psiquiatria sem Hospício", Relume Dumara/RJ,
1992
Pitta, Ana (org) "Reabilitação Psicossocial no Brasil", Ed. Hucitec/SP,
1996
Henriques e Campos (org) "Contra a Maré à Beira-Mar", Ed. Hucitec/SP,
1997
Lancetti A. (org) Saudeloucura, coleção, vol 1, 2 e 4, Ed. Hucitec/SP,
Colocando-me à disposição, agradeço a chance de
me expressar,
* Florianita Coelho Braga Campos Psicóloga, professora
de Psicologia do IPF/ PUCCampinas; Coordenadora da Subsede Campinas
do Conselho Regional de Psicologia/SP e membro do Movimento da Lutaantimanicomial
e-mail: campinas@crpsp.org.br fone: 243 7877"
Agradecemos os comentários da leitora. Gostaríamos de
esclarecer, sobre o título, que a matéria, efetivamente, trata
da reforma manicomial, primeiro e mais objetivo passo para a reforma
psiquiátrica. Sobre a "unanimidade" citada no texto, ela
refere-se, de fato, apenas aos agentes de saúde mencionados: meios
médicos, Congresso Nacional e, principalmente, os próprios pacientes
e familiares. Em relação às "estruturas
inéditas" citadas pela Portaria 224/92, as experiências
que cita a leitora não eram realmente inéditas. Porém,
outras o eram, como registros de procedimentos diagnósticos e estruturas
regulamentares de hospitais-dia. Finalmente, o texto da Portaria não
cita o termo "lares abrigados", mas previa, em 1992, estruturas benéficas
aos pacientes nos quais se incluem atividades comunitárias visando
trabalhar a integração do paciente mental na comunidade e sua inserção
social (item 3, Ponto 1.3), como fazem hoje os lares abrigados.