A
política nacional antidrogas
Paulo
R. Yog M. Uchôa
O uso
indevido de drogas lícitas ou ilícitas constitui-se,
atualmente, em problema de ordem internacional, preocupando nações
do mundo inteiro. Por sua complexidade e amplitude, é um
mal que ameaça as estruturas dos Estados, afetando seus valores
políticos, econômicos, sociais e culturais.
A droga
atinge, indistintamente, homens e mulheres de todos os níveis
sociais e econômicos - independente da idade, do grupo étnico,
do nível de instrução e de profissionalização
-, afetando as sociedades, em todos seus setores. Seus efeitos podem
ser detectados nos crescentes gastos com tratamento médico
e internação hospitalar; no aumento do número
de mortes prematuras; no crescimento nos índices de acidentes
de trânsito, de acidentes do trabalho e de violência
urbana e, ainda, na perda de produtividade dos trabalhadores.
No
caso do Brasil, pode-se dizer que os impactos negativos causados
pelo problema foram agravados pelo fato de o país haver evoluído
de simples rota, por onde a droga passava para ser exportada para
as nações do primeiro mundo, para se constituir em
florescente mercado consumidor de drogas.
Nesse
sentido, os resultados de estudos e pesquisas realizados no país
sinalizam que o uso indevido de drogas está se tornando cada
vez mais presente na vida cotidiana dos cidadãos, atingindo,
crescentemente, o jovem. Comprovando essa realidade, levantamento
realizado em 19971, registrou,
entre crianças e adolescentes de 1º e 2º graus,
o aumento significativo na tendência de uso dos anfetamínicos,
maconha e cocaína quando comparado a estudos anteriores na
mesma população.
Dados
preliminares do primeiro estudo epidemiológico nacional2,
realizado em 2002, identificaram que as drogas mais consumidas pela
população brasileira - uso na vida - são o
álcool (68,7%) e o tabaco (41,1%). Em seguida, tem-se, como
drogas de consumo significativo, a maconha (6,9%), os solventes
(5,8%), os orexígenos (4,3) e a cocaína (2,3%).
Deve-se
ressaltar que a extensão territorial, o tamanho da população
e a diversidade de culturas e realidades sócio-econômicas
coexistentes representam agravantes para o tratamento do problema
no Brasil, tornando mais complexa uma questão que já
se caracteriza por seu elevado nível de complexidade.
Diante
da gravidade do quadro, o assunto vem recebendo tratamento de alta
prioridade pelo governo federal, dentro do princípio do compartilhamento
das responsabilidades com os governos estaduais e municipais, setor
produtivo e sociedade civil. A orientação adotada
é a de que o combate ao uso indevido de drogas exige que,
não só o setor público, mas todos cidadãos
brasileiros, se conscientizem da magnitude do problema e se mobilizem
e atuem de forma efetiva, integrando esforços e maximizando
resultados.
Dessa
forma, os governos estaduais e municipais têm sido estimulados
a empreender as ações antidrogas em seus respectivos
estados e municípios, instituindo conselhos normativos, deliberativos
e de natureza paritária - com representação
dos principais órgãos públicos, do setor produtivo,
da comunidade científica e da sociedade civil.
Nesse
contexto, o lançamento da política Nacional Antidrogas
pelo Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, ocorrido
em 11 de dezembro de 2001, representou um importante marco no esforço
nacional de combate às drogas. O documento estabeleceu os
objetivos, as diretrizes e as estratégias para a ação
antidrogas - definições indispensáveis para
que os esforços de redução da demanda e da
oferta de drogas pudessem ser conduzidos de forma planejada e articulada,
viabilizando a sinergia entre os diversos agentes nacionais.
É
importante ressaltar que a elaboração da Política
resultou de um processo participativo de debates, havendo incorporado
contribuições da sociedade brasileira e de sua comunidade
científica, levantadas durante o I Fórum Nacional
Antidrogas, realizado em 2000. Dessa forma, ao ser sancionada pelo
presidente, a política já havia sido legitimada pela
sociedade brasileira, que contribuiu, na qualidade de parceira,
para a definição de seu conteúdo.
O lançamento
da Política Nacional Antidrogas oficializou, portanto, a
determinação governamental de conduzir o país
para uma realidade livre das ameaças das drogas, e estabeleceu
a "linha mestra" para as ações antidrogas,
sinalizando os rumos e os caminhos para que as forças nacionais
públicas e privadas pudessem atuar de forma coordenada e
sintonizada.
A política
estabeleceu importantes orientações para a ação
nacional de combate às drogas, como a necessidade de buscar
fundamentação técnica e científica para
os programas, projetos e atividades antidrogas, por meio da aplicação
regular de pesquisas/levantamentos nacionais e realização
de estudos. Além disso, contemplou a preocupação
com o desenvolvimento de um modelo de gestão empreendedor
para a condução das ações nacionais,
estaduais e municipais, dotado de sistemas de informação,
de planejamento, acompanhamento e avaliação, que permitissem
coerência, eficiência, eficácia e efetividade
ao Sistema Nacional Antidrogas.
É
importante mencionar que, em sua Política Nacional Antidrogas,
o Brasil assumiu postura inovadora, concedendo especial atenção
à dimensão da redução da demanda de
drogas, no entendimento de que somente por meio da prevenção
primária é possível atingir as causas do problema,
cortando o mal pela raiz. Com isso, reconhece que é importante
evitar os primeiros desvios e que, nesse aspecto, a educação
sistemática - principalmente dos jovens - para o reconhecimento
dos efeitos negativos, individuais e sociais do uso indevido de
drogas e para a valorização de uma vida saudável
parece ser o caminho viável e sensato para uma realidade
livre das ameaças representadas pelas drogas. Neste sentido,
busca conscientizar o usuário de drogas ilícitas quanto
ao seu papel nocivo ao alimentar as atividades e organizações
criminosas que têm, no narcotráfico, sua principal
fonte de renda.
Como
importante e inovador conceito - que reflete o anseio da sociedade
brasileira - a política reconhece a diferença entre
o usuário ou dependente e o traficante de drogas, admitindo
que a dependência - antes de se configurar crime, deve ser
considerada uma doença, precisando receber tratamento adequado.
A política
afirma, ainda, a opção brasileira pela municipalização
das ações como estratégia adequada para conceder
a necessária capilaridade à mensagem antidrogas e
potencializar a participação do setor privado e da
sociedade civil no esforço de combate às drogas. Dessa
forma, atribuiu aos municípios brasileiros o papel desafiador
de atuar como instância de formação de uma consciência
social refratária ao consumo indevido de drogas e aos estados
a tarefa de acompanhá-los na sua esfera de atividades, tudo em consonância
com a Secretaria Nacional Antidrogas - Senad, cuja missão,
como órgão executivo do Sistema Nacional Antidrogas,
é a de articular, organizar e orientar, em nível nacional,
as ações da Política Nacional Antidrogas, estimulando
a sua municipalização. E esse trabalho a Secretaria
vem desenvolvendo com o inestimável auxílio da Rede
Integrada Senad - Conselhos Estaduais de Entorpecentes, a cada dia
mais fortalecida pela mobilização que já se
faz sentir no país.
O Brasil
entende que a Política Nacional Antidrogas responde aos anseios
da sociedade brasileira e que sua implementação, certamente,
conduzirá o país a uma nova realidade - de melhor
qualidade de vida, maior segurança e mais saúde. Mas
entende, também, que para alcançar essa nova realidade
é preciso que esta sociedade esteja conscientizada, mobilizada
e preparada para dizer não às drogas, atuando em conjunto
em prol da redução da demanda.
Paulo
R. Yog M. Uchôa é Secretário Nacional Antidrogas.
Notas
1. O levantamento sobre uso de drogas,
foi realizado com estudantes de 1º e 2º graus, em dez
capitais brasileiras, pelo Centro Brasileiro de Informações
sobre Drogas Psicotrópicas - CEBRID. [voltar]
2. A Secretaria Nacional Antidrogas, por meio do
Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas
- CEBRID promoveu, no ano de 2002, o I Levantamento Nacional Domiciliar
sobre o Uso de Drogas, nas 107 maiores cidades brasileiras.[voltar]
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