Há
mais espaços lá embaixo
Um
convite para penetrar em um novo campo da física
Richard
P. Feynman
Esta
é a transcrição de uma conferência
dada pelo físico norte-americano Richard Feynman em
29 de dezembro de 1959, no encontro anual da Sociedade Americana
de Física (APS) no Instituto de Tecnologia da Califórnia
(Caltech). Foi publicado pela primeira vez na edição
de fevereiro de 1960 do Caltech's Engineering and Science.
Pode ser também encontrado no Journal of Microelectromechanical
Systems, vol. 1, número 1, pág. 60, de março
de 1992, ou, na Internet
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Eu
imagino que um físico experimental deva freqüentemente
olhar com inveja para homens como Kamerlingh Onnes, que descobriu
o campo das baixas temperaturas, que parece não ter fim e
no qual pode-se sempre ir mais e mais fundo. Um homem assim é
um líder e tem um certo monopólio temporário
na aventura científica. Percy Bridgman, ao projetar um meio
de obter altas pressões, abriu outro novo campo e foi capaz
de penetrar nele e de orientar-nos nesse novo percurso. O desenvolvimento
de vácuos mais e mais perfeitos foi um desenvolvimento contínuo
do mesmo tipo. Eu gostaria de descrever um campo no qual pouco tem
sido feito, mas no qual, em princípio, uma enormidade pode
ser conseguida. Esse campo não é exatamente do mesmo
tipo que os outros, no sentido em que não nos dirá
muito sobre a física fundamental (na linha de "o que
são as partículas estranhas?"), mas assemelha-se
mais com a física do estado sólido, no sentido em
que pode dizer-nos muitas coisas de grande interesse sobre os estranhos
fenômenos que ocorrem em situações complexas;
além disso, um aspecto muito importante é que esse
campo terá um enorme número de aplicações
técnicas.
O que
eu quero falar é sobre o problema de manipular e controlar
coisas em escala atômica.
Tão
logo eu menciono isto, as pessoas me falam sobre miniaturização
e o quanto ela tem progredido nos dias de hoje. Elas contam-me sobre
motores elétricos com o tamanho de uma unha do seu dedo mindinho.
E que há um dispositivo no mercado, dizem elas, com o qual
pode-se escrever o Pai Nosso na cabeça de um alfinete.
Mas isso não é nada: é o passo mais primitivo
e hesitante na direção que eu pretendo discutir. É
um novo mundo surpreendentemente pequeno. No ano 2000, quando olharem
para esta época, elas se perguntarão por que só
no ano de 1960 que alguém começou a se movimentar
seriamente nessa direção.
Por
que não podemos escrever os 24 volumes inteiros da Enciclopédia
Britânica na cabeça de um alfinete?
Vamos
ver o que estaria envolvido nisso. A cabeça de um alfinete
tem um dezesseis avos de polegada de largura. Se você aumentar
seu diâmetro 25.000 vezes, a área da cabeça
do alfinete será igual a área de todas as páginas
da Enciclopédia Britânica. Assim, tudo o que se precisa
fazer é reduzir 25.000 vezes em tamanho todo o texto da Enciclopédia.
Isso é possível? O poder de resolução
do olho é de cerca de 1/120 de uma polegada - aproximadamente,
o diâmetro de um dos pequenos pontos em uma das boas e vetustas
edições da Enciclopédia. Isto, quando você
diminui em 25.000 vezes, ainda tem 80 angstroms de diâmetro
- 32 átomos de largura, em um metal ordinário. Em
outras palavras, um daqueles pontos ainda poderá conter em
sua área 1.000 átomos. Assim, cada ponto pode ter
seu tamanho facilmente ajustado segundo o requerido pela gravação,
e não resta dúvida sobre se há espaço
suficiente na cabeça de um alfinete para toda a Enciclopédia
Britânica.
Além
disso, ela poderá ser lida se puder ser escrita dessa forma.
Imaginemos que ela seja escrita em letras em alto-relevo de metal;
ou seja, onde existe o preto na Enciclopédia, fazemos letras
de metal em alto-relevo com 1/25.000 do seu tamanho ordinário.
Como leríamos isso?
Se
tivéssemos algo escrito dessa forma, poderíamos lê-lo
usando técnicas hoje comuns. (Eles indubitavelmente encontrarão
um meio melhor quando o tivermos de fato escrito, mas, para sermos
realistas, vou considerar apenas técnicas conhecidas hoje.)
Pressionaríamos o metal sobre um material plástico
e faríamos um molde; então, tiraríamos muito
cuidadosamente o plástico; vaporizaríamos sílica
sobre o plástico para obter um filme bem fino; depois, sombrearíamos
a sílica, vaporizando ouro em ângulo contra ela, de
forma que todas as letras apareçam claramente; dissolveríamos
o plástico do filme de sílica; e então olharíamos
através do filme com um microscópio eletrônico!
Não
há dúvida de que, se tudo fosse reduzido 25.000 vezes
na forma de letras em alto-relevo no alfinete, hoje seria fácil
para nós lermo-las. Além disso, não há
dúvida de que acharíamos fácil fazer cópias
da matriz; precisaríamos apenas de prensar a mesma placa
de metal contra o plástico e teríamos outra cópia.
Como
escrevemos pequeno?
A próxima questão é: como escrevemos isso?
Não temos nenhuma técnica padrão para fazê-lo
agora. Mas deixem-me argumentar que não é tão
difícil como pode parecer à primeira vista. Podemos
inverter as lentes de um microscópio eletrônico, de
forma que ele passe a reduzir tão bem quando amplie. Uma
fonte de íons, enviada através das lentes de um microscópio
invertido, poderia ser focalizada em um ponto muito pequeno. Poderíamos
escrever com esse ponto, como escrevemos com um osciloscópio
de raios catódicos de TV, caminhando por linhas, e com um
ajuste que determinaria a quantidade de material que seria depositada
enquanto corremos sobre as linhas.
Este
método pode ser muito lento, por causa das limitações
de espaço para carga. Haverá métodos mais rápidos.
Poderíamos primeiro fazer, talvez através de algum
processo fotográfico, um anteparo com orifícios em
forma de letras. Então, dispararíamos um arco elétrico
atrás dos buracos e faríamos passar íons metálicos
através deles; depois, poderíamos novamente usar nosso
sistema de lentes e fazer uma imagem pequena na forma de íons,
que depositariam o metal no alfinete.
Uma
maneira mais simples poderia ser esta (ainda que eu não esteja
certo de que funcionaria): Através de um microscópio
óptico invertido, focalizamos luz sobre uma superfície
fotoelétrica muito pequena. Então, os elétrons
escapam da superfície, a partir do ponto que a luz está
iluminando. Esses elétrons são focalizados pelas lentes
de um microscópio eletrônico, para chocar-se diretamente
contra a superfície do metal. Tal feixe escavará o
metal se funcionar por tempo suficiente? Eu não sei. Se não
funcionar para uma superfície metálica, pode ser possível
encontrar uma superfície com a qual se cubra o alfinete original
e tal que, quando os elétrons a bombardeiem, ocorra alguma
mudança que possamos reconhecer mais tarde.
Não
há problema nesses dispositivos com relação
à intensidade - ao contrário do que você está
acostumado na ampliação, onde você tem que pegar
uns poucos elétrons e espalhá-los sobre um anteparo
cada vez maior; é justamente o contrário. A luz que
obtemos de uma página é concentrada em uma área
muito pequena, e por isso é muito intensa. Os poucos elétrons
que vêm da superfície fotoelétrica são
reduzidos a uma área bem diminuta, de forma que, novamente,
são muito intensos. Não sei por que isso não
foi feito antes!
Isso
quanto à Enciclopédia Britânica na cabeça
de um alfinete; mas vamos considerar todos os livros do mundo. A
Biblioteca do Congresso [norte-americano] tem aproximadamente 9
milhões de volumes; a Biblioteca do Museu Britânico
tem 5 milhões de volumes; há também 5 milhões
de volumes na Biblioteca Nacional na França. Indubitavelmente,
há duplicações; portanto, digamos que há
cerca de 24 milhões de volumes de interesse no mundo.
O que
aconteceria se eu imprimisse tudo isso na escala sobre a qual vimos
discutindo? Quanto espaço vai ocupar? Ocuparia, claro, a
área de cerca de um milhão de alfinetes, porque, ao
invés de haver apenas os 24 volumes da Enciclopédia,
haveria 24 milhões de volumes. Um milhão de cabeças
de alfinete podem ser postas em um quadrado de mil alfinetes de
lado, ou uma área de cerca de 3 jardas quadradas [cerca de
2,5 metros quadrados]. Ou seja, a réplica de sílica
com o recobrimento de plástico da espessura de um papel,
com a qual fizemos as cópias, com toda essa informação,
está em uma área de aproximadamente o tamanho de 35
páginas da Enciclopédia. Isto é cerca de metade
da quantidade de páginas que há nesta revista. Toda
a informação que toda a humanidade já registrou
em livros pode ser transferida para um panfleto em sua mão
- e não escrita em código, mas uma simples reprodução
das imagens e estampas originais e tudo o mais em uma escala pequena,
sem perda de resolução.
O que
diria nossa bibliotecária no Caltech, enquanto ela circula
pelo acervo, se eu lhe disser que daqui a dez anos toda a informação
que ela está lutando para não perder de vista - 120.000
volumes, empilhados do chão até o teto, gavetas cheias
de fichas, depósitos cheios de livros antigos - poderá
ser armazenado em uma única ficha! Quando a Universidade
do Brasil, por exemplo, descobrir que sua biblioteca foi incendiada,
podemos enviar-lhes uma cópia de cada livro em nossa biblioteca
tirando uma réplica da placa-matriz em umas poucas horas
e enviando-a em um envelope não maior nem mais pesado do
que qualquer outra carta comum por via aérea.
Agora,
o título dessa palestra é "Há muito espaço
lá embaixo" - não apenas "Há espaço
lá embaixo". O que eu demonstrei é que há
espaço - que você pode diminuir o tamanho das coisas
de uma maneira prática. Eu agora quero mostrar que há
muito espaço. Não vou discutir agora como faremos
isso, mas somente o que é possível em princípio
- em outras palavras, o que é possível de acordo
com as leis da física. Não estou inventando a anti-gravidade,
que será possível um dia apenas se as leis não
sejam as que nós pensamos. Estou dizendo a vocês o
que poderíamos fazer se as leis fossem as que pensamos; ainda
não o estamos fazendo simplesmente porque ainda não
chegamos lá.
Informação
em escala pequena
Suponha que, ao invés de tentarmos reproduzir as imagens
e toda a informação diretamente em sua forma presente,
escrevamos apenas o conteúdo de informação
em um código de pontos e traços ou algo do tipo, para
representar as várias letras. Cada letra representa seis
ou sete "bits" de informação; isto é,
você precisa de apenas cerca de seis ou sete pontos ou traços
para cada letra. Agora, ao invés de escrever tudo na superfície
da cabeça de um alfinete, como fizemos antes, vou usar também
o interior do material. Representemos um ponto por uma pequena marca
de metal, o próximo traço por uma marca adjacente
feita de outro metal, e assim por diante. Suponha, para mantermos
os pés no chão, que um bit de informação
necessitará de um pequeno cubo de 5 por 5 por 5 átomos
- ou seja, 125 átomos. Talvez precisemos de uns cento e
poucos átomos para termos certeza de que a informação
não foi perdida por difusão ou algum outro processo.
Eu
estimei quantas letras existem na Enciclopédia e supus que
cada um dos meus 24 milhões de livros é tão
grande quanto um de seus volumes, e calculei, então, quantos
bits de informação existem (10^15). Para cada bit,
eu deixo 100 átomos. E o resultado é que toda a informação
que o homem cuidadosamente acumulou em todos os livros do mundo
pode ser escrita desta forma em um cubo de material com um ducentésimo
de polegada de largura - que é a menor partícula
de poeira que pode ser distinguida pelo olho humano. Assim, há
muito espaço lá embaixo! Não me falem de microfilmes!
Este
fato - que quantidades enormes de informação podem
ser colocadas em um espaço extraordinariamente pequeno -
é, evidentemente, bem conhecido dos biólogos, e resolve
o mistério que existia antes de compreendermos tudo isso
claramente, ou seja, como podia ser que, na mais diminuta célula,
toda a informação para a organização
de uma criatura complexa como nós mesmos podia estar armazenada.
Toda essa informação - se temos olhos castanhos,
se raciocinamos, ou que no embrião o osso da mandíbula
deveria se desenvolver inicialmente com um pequeno orifício
do lado, de forma que mais tarde um nervo poderia crescer através
dele - toda essa informação está contida em
uma fração minúscula da célula, em forma
de uma longa cadeia de moléculas de DNA, na qual aproximadamente
50 átomos são usados para cada bit de informação
sobre a célula.
Melhores
microscópios eletrônicos
Se eu escrevi em código, usando 5 por 5 por 5 átomos
para um bit, a pergunta é: como eu poderia ler isso hoje?
O microscópio eletrônico não é bom o
suficiente; com o maior cuidado e esforço, ele pode resolver
apenas até cerca de 10 angstroms. Eu gostaria de tentar e
transmitir a vocês, enquanto estou falando de todas essas
coisas em escala pequena, a importância de melhorar o microscópio
eletrônico cem vezes. Não é impossível;
não está contra as leis da difração
do elétron. O comprimento de onda do elétron em um
tal microscópio é de apenas 1/20 de um angstrom. Assim,
deveria ser possível ver os átomos individuais. Que
vantagem haveria em distinguir os átomos individuais?
Temos
amigos em outros campos - em biologia, por exemplo. Nós,
físicos, freqüentemente os vemos e dizemos: "Vocês
sabem a razão pela qual seus camaradas estão fazendo
tão pouco progresso?" (Na verdade, não conheço
nenhum campo onde estão progredindo mais rápido que
na biologia hoje.) "Vocês deveriam usar mais matemática,
como nós." Eles poderiam responder - mas eles são
educados, então eu vou responder por eles: "O que vocês
poderiam fazer por nós para progredirmos mais rapidamente
é fazer um microscópio eletrônico 100 vezes
melhor."
Quais
são os problemas mais centrais e fundamentais da biologia
hoje? Há perguntas do tipo: qual é a seqüência
de bases no DNA? O que acontece quando há uma mutação?
Como a ordem das bases no DNA está relacionada com a ordem
dos aminoácidos nas proteínas? Qual é a estrutura
do RNA; é uma cadeia simples ou dupla, e como a ordem de
suas bases está relacionada ao DNA? Qual é a organização
dos microssomos? Como as proteínas são sintetizadas?
Onde entra o RNA? Como atua? Onde entram as proteínas? Qual
o papel dos aminoácidos? Na fotossíntese, onde entra
a clorofila; como está diposta; onde estão os carotenóides
envolvidos? Qual é o sistema de conversão da luz em
energia química?
É
fácil responder a muitas dessas questões biológicas
fundamentais; você simplesmente olha para a coisa! Você
verá a ordem de bases na cadeia; você verá a
estrutura do microssomo. Infelizmente, os microscópios atuais
vêem em uma escala apenas um pouco tosca demais. Faça-se
um microscópio cem vezes mais poderoso e muitos problemas
da biologia se tornariam muito mais fáceis. Eu exagero, claro,
mas os biólogos estariam certamente muito agradecidos a vocês
- e eles prefeririam isso do que a crítica de que deveriam
usar mais matemática.
A teoria
atual dos processos químicos é baseada na física
teórica. Neste sentido, a física provê o fundamento
da química. Mas a química também tem análise.
Se você tem uma substância estranha e você quer
saber o que é, você passa por um longo e complicado
processo de análise química. Hoje você pode
analisar quase qualquer coisa; então, estou um pouco atrasado
com minha idéia. Mas, se os físicos quisessem, eles
poderiam também "cutucar" o problema da análise
química. Seria muito fácil fazer uma análise
de qualquer substância química complexa; tudo o que
teria que se fazer seria olhá-la e ver onde os átomos
estão. O único problema é que o microscópio
eletrônico é cem vezes pobre demais. (Depois, eu gostaria
de colocar a questão: poderão os físicos fazer
algo a respeito do terceiro problema da química - a síntese?
Há algum meio físico para sintetizar uma substância
química?)
A razão
pela qual o microscópio eletrônico é tão
fraco é que o número f das lentes é apenas
de uma parte em 1000; você não tem uma abertura grande
o suficiente. E eu sei que há teoremas que provam que é
impossível, com lentes de campo estacionário axialmente
simétricas, produzir um número f maior do que isso;
e, portanto, o poder de resolução hoje está
no seu máximo teórico. Mas em qualquer teorema há
suposições. Por que o campo deveria ser simétrico?
Eu coloco isso como um desafio: Não há nenhuma maneira
de fazer um microscópio eletrônico mais poderoso?
O
maravilhoso sistema biológico
O exemplo biológico de escrever informação
em uma escala pequena inspirou-me a pensar em algo que pudesse ser
possível. A biologia não é simplesmente escrever
informação; é fazer algo com ela. Várias
das células são muito pequenas, mas podem ser muito
ativas; elas fabricam várias substâncias; deslocam-se;
vibram; e fazem todos os tipos de coisas maravilhosas - tudo em
uma escala muito pequena. Além disso, armazenam informação.
Considerem a possibilidade de que nós também possamos
construir algo muito pequeno que faça o que queiramos -
que possamos fabricar um objeto que manobra naquele nível!
Pode
haver inclusive aspectos econômicos com relação
a essa atividade de fazer coisas muito pequenas. Deixem-me lembrá-los
de alguns problemas dos computadores. Nessas máquinas, temos
que armazenar uma enorme quantidade de informação.
O tipo de escrita que eu mencionava antes, na qual eu tinha tudo
como uma configuração de metal, é permanente.
Muito mais interessante para um computador é uma forma de
escrever, apagar e escrever outra coisa. (Isso, em geral porque
não queremos desperdiçar o material sobre o qual já
escrevemos. Mesmo que pudéssemos escrevê-lo em um espaço
muito pequeno, não faria nenhuma diferença; poderia
simplesmente ser jogado fora depois que lido. Não custa muito
para o material).
Miniaturizando
o computador
Eu não sei como fazer isso em uma escala pequena de uma maneira
prática, mas eu sei que os computadores são bem grandes;
eles preenchem cômodos inteiros. Por que não poderíamos
fazê-los muito pequenos, fazê-los de pequenos
fios, pequenos elementos - e, por pequeno, eu quero dizer pequeno.
Por exemplo, os fios deveriam ter 10 ou 100 átomos de diâmetro,
e os circuitos deveriam ter uns poucos milhares de angstroms de
largura. Todo mundo que já tenha analisado a teoria lógica
dos computadores já chegou à conclusão de que
as possibilidades dos computadores são muito interessantes
- se eles puderem tornar-se mais complexos em várias ordens
de grandeza. Se eles tivessem milhões de vezes mais elementos,
poderiam fazer julgamentos. Teriam tempo para calcular qual é
o melhor caminho para fazer um cálculo que estejam prestes
a executar. Selecionariam o método de análise que,
de sua experiência, seja melhor do que o que lhes fornecemos.
E, de muitas outras formas, eles teriam muitos aspectos qualitativos
novos. Se eu olho para a sua face, eu reconheço imediatamente
o que eu havia visto antes. (Na verdade, meus amigos diriam que
eu escolhi um exemplo ruim como ilustração. Pelo menos,
eu reconheço que é um homem e não uma maçã.)
Mas não há nenhuma máquina que, com essa velocidade,
possa pegar a imagem de uma face e dizer nem mesmo que é
um homem; e muito menos que é o mesmo homem que você
mostrou antes - a menos que seja exatamente a mesma imagem. Se
a face é alterada; se estou mais perto da face; se estou
mais longe; se muda a luz - eu reconheço-a. Agora, este
pequeno computador que eu carrego em minha cabeça é
facilmente capaz de fazer isso. Já os computadores que construímos
não são. O número de elementos nesta minha
caixa óssea é enormemente maior do que o número
de elementos em nossos computadores "maravilhosos". Mas
nossos computadores mecânicos são muito grandes; os
elementos nesta caixa são microscópicos. Eu quero
fazer alguns submicroscópicos.
Se
quiséssemos fazer um computador que tivesse todas essas maravilhosas
habilidades qualitativas extras, teríamos que fazê-lo,
talvez, do tamanho do Pentágono. Isso tem várias desvantagens.
Primeiro, precisa de muito material; pode não haver germânio
suficiente no mundo para todos os transístores que teriam
que ser colocados nessa coisa enorme. Há também o
problema da geração de calor e consumo de potência;
seria necessário TVA para fazer o computador funcionar. Mais
uma dificuldade ainda mais prática é que o computador
seria limitado a uma certa velocidade. Por causa de seu grande tamanho,
é requerido um tempo finito para levar a informação
de um lugar a outro. A informação não pode
viajar mais rápido do que a velocidade da luz - assim, em
última análise, à medida que nossos computadores
tornam-se mais e mais rápidos e mais e mais elaborados, teremos
que fazê-los menores e menores.
Mas
há muito espaço para fazê-los menores. Não
há nada que eu possa ver nas leis físicas que diga
que os elementos dos computadores não possam ser feitos enormemente
menores que são atualmente. Na verdade, pode haver certas
vantagens.
Miniaturização
e evaporação
Como faríamos um equipamento assim? Que tipo de processo
de fabricação usaríamos? Uma possibilidade
que poderíamos considerar, desde que conversamos sobre escrever
e colocar átomos em uma certa disposição, seria
vaporizar o material, e então vaporizar o isolante ao seu
lado. Então, para a próxima camada, vaporizar outro
fio em outra posição, outro isolante, e assim por
diante. Assim, você simplesmente vaporiza até que você
tenha um bloco que contenha os elementos - bobinas e condensadores,
transístores, etc. - com dimensões extraordinariamente
minúsculas.
Mas
eu gostaria de discutir, só para nos divertirmos, que existem
ainda outras possiblidades. Por que não podemos fabricar
esses pequenos computadores da mesma forma que fabricamos os grandes?
Por que não podemos furar buracos, cortar, soldar ou estampar
coisas, modelar diferentes formas, tudo em um nível infinitesimal?
Quais as limitações em relação a quão
pequeno algo tem de ser antes que você não consiga
mais modelá-la? Quantas vezes, quando você está
trabalhando em algo tão frustrantemente minúsculo
como o relógio de pulso de sua esposa, você disse a
si mesmo: "Ah! se eu pudesse treinar uma formiga para fazer
isso!" O que eu gostaria de sugerir é a possibilidade
de treinar uma formiga para treinar um ácaro para fazer isso.
Quais as possibilidades para máquinas diminutas, porém
móveis? Elas podem ou não ser úteis, mas certamente
seria muito divertido fazê-las.
Considerem
qualquer máquina - por exemplo, um automóvel - e
perguntem-se sobre os problemas de se replicar uma tal máquina
em escala infinitesimal. Suponham, no design particular de
um automóvel, que nós precisemos de uma certa precisão
em relação aos componentes; precisamos de uma exatidão
de, digamos, 4/10.000 de polegada. Se as coisas forem mais imprecisas
do que isso na forma de um cilindro ou outras formas, não
vai funcionar muito bem. Se eu faço muito pequeno, eu tenho
de me preocupar com o tamanho dos átomos; não posso
fazer um círculo de "bolas", por assim dizer, se
o círculo é muito pequeno. Assim, se eu cometer um
erro correspondente a 4/10.000 de polegada, que corresponderá
a um erro de 10 átomos, resulta que eu posso reduzir as dimensões
de um automóvel em aproximadamente 4.000 vezes - de forma
que ele fica com um milímetro de comprimento. Obviamente,
se você redesenha o carro de modo que ele funcione dentro
de uma faixa de tolerância muito maior, o que não é
de todo impossível, você poderia obter um equipamento
muito menor.
É
interessante considerar quais seriam os problemas em máquinas
tão pequenas. Primeiramente, em componentes tensionadas no
mesmo grau, as forças crescem como a área que você
está reduzindo, de forma que coisas como peso ou inércia
são relativamente sem importância. A resistência
do material, em outras palavras, é proporcionalmente muito
maior. As tensões e a expansão do volante do motor
sob as forças centrífugas, por exemplo, estariam na
mesma proporção apenas se a velocidade de rotação
aumentasse na mesma proporção em que diminuímos
o tamanho. Por outro lado, os metais que usamos têm uma estrutura
granular, e isso causaria muitos aborrecimentos em uma escala pequena,
já que o material não é homogêneo. Plásticos,
vidros e coisas de natureza amorfa semelhante são muito mais
homogêneos e, assim, teríamos de fazer nossas máquinas
a partir de tais materiais.
Há
problemas associados com as partes elétricas do sistema -
com os fios de cobre e os componentes magnéticos. As propriedades
magnéticas, em uma escala muito pequena, não são
as mesmas que em uma escala maior; há o problema do "domínio"
envolvido. Um grande magneto feito de milhões de domínios
pode ser reproduzido em escala pequena com até um único
domínio, apenas. O equipamento elétrico não
será só redimensionado; terá de ser redesenhado.
Mas eu não vejo razão por que ele não possa
ser redesenhado de forma a poder funcionar novamente.
Problemas
de lubrificação
A lubrificação envolve algumas questões
interessantes. A viscosidade efetiva do óleo seria cada vez
mais alta à medida que diminuímos a escala (e se aumentamos
a velocidade tanto quanto possamos). Se não aumentamos tanto
a velocidade, e substituímos o óleo por querosene
ou outro fluido, o problema não parece tão ruim. Mas,
na verdade, nós talvez não tenhamos de lubrificá-lo!
Temos muita força extra. Deixemos os mancais secos; eles
não se aquecerão, porque o calor escapa de dispositivos
tão pequenos muito, muito rapidamente.
Esta
perda rápida de calor impediria que a gasolina explodisse;
assim, seria impossível utilizarmos um motor de combustão
interna. Outras reações químicas, que liberem
energia a frio, poderiam ser usadas. Provavelmente, uma fonte externa
de eletricidade seria mais conveniente para máquinas tão
pequenas.
Qual
seria a utilidade de tais máquinas? Quem sabe? Naturalmente,
um pequeno automóvel seria útil apenas para os ácaros
passearem, e eu suponho que nossas inclinações de
bom samaritano não cheguem a tanto. Entretanto, nós
enfatizamos a possibilidade da fabricação de pequenos
elementos para computadores em fábricas totalmente automatizadas,
contendo tornos e outras ferramentas em escala muito pequena. O
pequeno torno não precisaria ser exatamente como o nosso
grande torno. Deixo para sua imaginação os aperfeiçoamentos
do design que possam ser mais vantajosos para as propriedades
de objetos em pequena escala, e de forma que fique mais fácil
dar conta da necessidade de automatização.
Um
amigo meu (Albert R. Hibbs) sugere uma possibilidade muito interessante
para máquinas relativamente pequenas. Ele diz que, embora
seja uma idéia bastante selvagem, seria interessante se,
numa cirurgia, você pudesse engolir o cirurgião. Você
coloca o cirurgião mecânico dentro da veia, e ele vai
até o coração e "dá uma olhada"
em torno. (Naturalmente, a informação tem que ser
transmitida para fora.) Ele descobre qual é a válvula
defeituosa, saca uma pequena faca e corta-a fora. Outras máquinas
pequenas poderiam ser permanentemente incorporadas ao organismo
para assistir algum órgão deficiente.
Agora
vem a questão interessante: como fazemos um mecanismo tão
pequeno? Deixo isso para vocês. Entretanto, deixem-me sugerir
uma possibilidade estranha. Você sabe, nas usinas atômicas
eles têm materiais e máquinas que não podem
ser manuseadas diretamente, porque tornaram-se radioativos. Para
desparafusar porcas, colocar parafusos, etc., eles têm um
conjunto de mãos mestres e servas, de forma que, operando
um conjunto de alavancas aqui, você controla as "mãos"
lá, pode virá-las para lá e para cá,
e assim você pode manusear as coisas confortavelmente.
Grande
parte desses dispositivos são, na verdade, feitos de modo
bastante simples, no sentido de que há um cabo específico,
como um cordão de marionete, que vai diretamente dos controles
até as "mãos". Mas, é claro, eles
também fizeram isso usando servomotores, de forma que a conexão
entre uma coisa e outra fosse mais elétrica que mecânica.
Quando você manuseia as alavancas, elas acionam um servomotor,
o que altera as correntes elétricas nos fios, que reposicionam
um motor na outra extremidade.
Agora,
eu quero fazer reproduzir o mesmo dispositivo - um sistema servo-mestre
que opera eletricamente. Mas eu quero que os servos sejam feitos
de forma particularmente cuidadosa por operadores modernos em escala
grande, de forma que eles tenham um quarto do tamanho das "mãos"
que você normalmente manobra. Assim, você tem um esquema
com o qual você pode produzir coisas numa escala reduzida
em quatro vezes - os pequenos servomotores com pequenas mãos
operam com pequenas porcas e parafusos; fazem pequenos buracos;
eles são quatro vezes menores. Ahá! Assim, eu produzo
um torno quatro vezes menor; ferramentas quatro vezes menores; e
produzo, em escala quatro vezes menor, ainda outro conjunto de mãos,
por sua vez mais quatro vezes menores. Isso dá um dezesseis
avos do tamanho, do meu ponto de vista. Depois de acabar isso, eu
passo diretamente do meu sistema em escala grande, talvez usando
transformadores, para os servomotores 16 vezes menores. Logo, eu
posso manipular as mãos 16 vezes menores.
Bem,
a partir disso, vocês têm os princípios. É
um programa um tanto difícil, mas é uma possibilidade.
Você poderia dizer que pode-se ir mais longe em um único
estágio do que por etapas. Naturalmente, tudo isso deve ser
desenhado de forma muito cuidadosa, e não é necessário
fazê-lo apenas como mãos. Se você pensar sobre
isso com cuidado, você provavelmente chegaria em um sistema
muito melhor.
Se
você trabalhar com um pantógrafo, mesmo hoje, você
pode conseguir um fator muito melhor do que quatro em um único
passo. Mas você não pode trabalhar diretamente com
um pantógrafo que faz um pantógrafo menor, que então
faz um pantógrafo ainda menor - por causa da imprecisão
dos buracos e irregularidades da construção. A extremidade
do pantógrafo oscila de forma relativamente mais irregular
do que o movimento de suas mãos. Diminuindo essa escala,
eu veria a extremidade do pantógrafo na extremidade do pantógrafo
na extremidade do pantógrafo sacudindo tanto que não
estaria fazendo nada de aproveitável.
Em
cada etapa, é necessário aumentar a precisão
do equipamento. Se, por exemplo, tendo feito um pequeno torno com
um pantógrafo, constatarmos que seu parafuso está
irregular - mais irregular do que o na escala grande - poderíamos
pegar o parafuso e uma porca e lapidá-los um contra o outro,
virando para a frente e para trás da maneira usual, até
que o parafuso esteja, em sua escala, tão preciso quanto
nossos parafusos originais na nossa escala.
Podemos
fazer superfícies planas esfregando superfícies não-planas
três a três, e as superfícies se tornariam mais
planas que a original. Assim, não é impossível
melhorar a precisão em escala pequena usando as operações
adequadas. Desta forma, quando construímos esses dispositivos,
é necessário, em cada passo, aumentar a precisão
do equipamento, trabalhando por algum tempo em escala pequena, produzindo
parafusos precisos, blocos de Johansen e todos os demais materiais
que usamos em trabalhos de precisão no nível grande.
Temos que parar em cada nível e fabricar todas as peças
para chegar ao próximo nível - um programa muito
longo e difícil. Talvez você possa imaginar uma maneira
melhor para chegar mais depressa à escala pequena.
Ainda
assim, depois de tudo isso, você apenas obteve um pequeno
torno-bebê quatro mil vezes menor do que o normal. Mas estávamos
pensando em fazer um computador enorme, que construiríamos
fazendo buracos com esse torno, para fazer pequenas arruelas para
o computador. Quantas arruelas você poderia fabricar com esse
único torno?
Mil
pequenas mãos
Quando eu faço meu primeiro conjunto de "mãos"
servas na escala quatro vezes menor, vou fazer dez conjuntos. Faço
dez conjuntos de "mãos" e eu as conecto às
minhas alavancas originais, de forma que cada uma delas faça
exatamente a mesma coisa ao mesmo tempo e em paralelo. Agora, quando
estou fazendo meus novos dispositivos novamente quatro vezes menores,
deixo cada um deles produzir dez cópias, e assim terei cem
"mãos" em uma escala de 1/16. Onde colocarei o
milhão de tornos que terei? Por que, não tem nada
de mais; o volume é muito menor do que o de um único
torno em escala normal. Por exemplo, se eu fiz um bilhão
de pequenos tornos, cada um deles em uma escala de 1/4.000 do torno
normal, haverá considerável quantidade de materiais
e espaço disponíveis, porque, no bilhão de
pequenos tornos, há menos do que 2 por cento do material
usados no grande.
Não
custa nada em termos de materiais, vocês podem ver. Assim,
quero construir um bilhão de pequenas fábricas, modelos
umas das outras, que estão simultaneamente produzindo, fazendo
buracos, juntando componentes, etc.
À
medida que diminuímos o tamanho, há um número
de problemas interessantes que vão surgindo. As coisas não
reduzem a escala simplesmente de forma proporcional. Há o
problema de que os materiais unem-se pelas atrações
intermoleculares (van der Waals). Seria algo como isso: depois que
você fabrica um componente e desparafusa uma porca, ele não
cairá, porque a gravidade não é apreciável;
seria mesmo mais difícil tirá-lo do parafuso. Seria
como aqueles velhos filmes com um homem tentando se livrar de um
copo d'água com mãos cheias de melaço. Haverá
vários problemas dessa natureza com os quais deveremos estar
prontos para lidar.
Rearranjando
os átomos
Mas não tenho medo de considerar a questão final
em relação a se, em última análise -
no futuro longínquo -, poderemos arranjar os átomos
da maneira que queremos; os próprios átomos, no último
nível de miniaturização! O que aconteceria
se pudéssemos dispor os átomos um por um da forma
como desejamos (dentro do razoável, é claro; você
não pode dispô-los de forma que, por exemplo, sejam
quimicamente instáveis).
Até
agora, nós nos contentamos em escavar o chão para
encontrar minerais. Nós os aquecemos e fazemos coisas com
eles em escala grande, e esperamos obter uma substância pura
a partir de tanta impureza, e assim por diante. Mas temos sempre
de aceitar alguns arranjos atômicos que a natureza nos dá.
Não temos nada como, digamos, um arranjo do tipo "tabuleiro
de damas", com os átomos de impureza dispostos exatamente
1.000 angstroms uns dos outros, ou em algum outro padrão
específico.
O que
poderíamos fazer com estruturas em camadas se tivéssemos
exatamente as camadas corretas? Quais seriam as propriedades dos
materiais se pudéssemos realmente arranjar os átomos
como bem entendêssemos? Elas seriam muito interessantes de
se investigar teoricamente. Não posso ver exatamente o que
aconteceria, mas dificilmente posso duvidar que, quando tivermos
algum controle sobre a disposição das coisas na escala
pequena, teremos um leque enormemente maior de propriedades possíveis
para as substâncias, e de diferentes coisas que poderíamos
fazer.
Considere,
por exemplo, um pedaço de material no qual fazemos pequenas
bobinas e condensadores (ou seus análogos do estado sólido)
de 1.000 ou 10.000 angstroms em um circuito, um exatamente ao lado
do outro, sobre uma área extensa, com pequenas antenas espetadas
na outra extremidade - toda uma série de circuitos. É
possível, por exemplo, emitir luz de todo um conjunto de
antenas, como emitimos ondas de rádio de um conjunto organizado
de antenas para transmitir programas para a Europa? O mesmo aconteceria
para transmitir luz de intensidade muito alta em uma direção
definida. (Talvez tal transmissão não seja muito útil
técnica ou economicamente).
Tenho
pensado sobre alguns dos problemas relativos à construção
de circuitos elétricos em escala pequena, e o problema da
resistência é sério. Se você faz um circuito
correspondente em escala pequena, sua freqüência natural
aumenta, uma vez que o comprimento de onda diminui com a escala;
mas a profundidade de penetração do campo eletromagnético
decresce só com a raiz quadrada da escala e, assim, os problemas
de resistência apresentam dificuldade crescente. Possivelmente,
podemos dar conta da resistência usando a supercondutividade,
se a freqüência não é demasiadamente alta,
ou por outros artifícios.
Átomos
no mundo pequeno
Quando vamos ao mundo muito, muito pequeno - digamos, circuitos
de sete átomos -, acontecem uma série de coisas novas
que significam oportunidades completamente novas para design.
Átomos na escala pequena não se comportam como nada
na escala grande, pois eles seguem as leis da mecânica quântica.
Assim, à medida em que descemos de escala e brincamos com
os átomos, estaremos trabalhando com leis diferentes, e poderemos
esperar fazer coisas diferentes. Podemos produzir de formas diferentes.
Podemos usar não apenas circuitos, mas algum sistema envolvendo
os níveis quantizados de energia, ou as interações
entre spins quantizados, etc.
Outra
coisa que constataremos é que, se formos longe o bastante,
todos os nossos dispositivos poderão ser produzidos em massa,
de forma que serão réplicas absolutamente perfeitas
uns dos outros. Não podemos fazer duas máquinas grandes
de forma a que as dimensões sejam exatamente as mesmas. Mas,
se a sua máquina tem apenas 100 átomos de altura,
você tem de torná-la precisa em apenas meio por cento
para ter certeza de que a outra máquina tenha exatamente
o mesmo tamanho - ou seja, 100 átomos de altura!
No
nível atômico, temos novos tipos de forças e
novos tipos de possibilidades, novos tipos de efeitos. Os problemas
de fabricação e reprodução de materiais
serão bem diferentes. Minha inspiração, como
eu disse, vem de fenômenos biológicos, nos quais as
forças químicas são usadas de uma forma repetitiva
para produzir todo tipo de efeitos estranhos (um dos quais é
este autor).
Os
princípios da física, tanto quanto podemos perceber,
não implicam na impossibilidade de manipular coisas átomo
por átomo. Não se trata de uma tentativa de violar
quaisquer leis; é algo que, em princípio, pode ser
feito, mas, na prática, ainda não o foi, porque nós
somos grandes demais.
Em
última análise, podemos fazer sínteses químicas.
Um químico vem e nos diz: "Olhe, eu quero uma molécula
que tenha os átomos dispostos assim e assim; faça-me
essa molécula." O químico faz uma coisa misteriosa
quando ele quer obter uma molécula. Ele vê que ela
tem tal forma; então ele mistura isso e aquilo, chacoalha
e brinca um pouco com aquilo. E, no final de um processo difícil,
em geral ele obtém sucesso em sintetizar o que quer. Na altura
em que eu conseguir meus dispositivos funcionando, de modo a podermos
fazer isso com a física, ele terá descoberto como
sintetizar absolutamente qualquer coisa, de forma que isso será
completamente inútil.
Mas
é interessante que seria possível, em princípio
(eu acho), para um físico, sintetizar qualquer substância
química que o químico escreva. Dê as ordens
e o físico sintetiza. Como? Coloque os átomos ali
onde o químico diz; assim, você faz a substância.
Os problemas de química e biologia poderão ser bastante
reduzidos se nossa habilidade de ver o que estamos fazendo, e de
fazer as coisas em nível atômico, for finalmente desenvolvida
- um avanço que, penso, não pode ser evitado.
Agora,
você pode dizer: "Quem deveria fazer isso e por que deveriam
fazê-lo?" Bem, eu mostrei algumas das aplicações
econômicas, mas eu sei que a razão pela qual você
o faria seria por pura diversão. Mas divirta-se! Vamos fazer
uma competição entre laboratórios. Um laboratório
faz um pequeno motor, que manda para um outro laboratório,
que manda-o de volta com uma coisa que se encaixa no eixo do primeiro
motor.
Competição
escolar
Apenas por diversão, e para provocar interesse por esse
campo nas crianças, eu proporia que alguém que tenha
algum contato com escolas de ensino médio pensasse em fazer
algum tipo de competição escolar. Afinal, nós
ainda nem começamos nesse campo, e até mesmo as crianças
podem escrever menor do que jamais foi escrito antes. Elas poderiam
fazer concursos nas escolas. A escola de Los Angeles poderia enviar
um alfinete para uma escola de Veneza, onde estaria escrito: "Como
vão as coisas?" Eles recebem de volta o alfinete e,
no pingo do "i" está escrito: "Não
muito quente".
Talvez
isso não o motive a fazer isso, e apenas a economia poderia
fazê-lo. Então, eu gostaria de fazer alguma coisa;
mas eu não posso fazê-la agora, pois ainda não
preparei o terreno. Pretendo então oferecer um prêmio
de US$ 1.000 para a primeira pessoa que possa pegar a informação
na página de um livro e colocá-la em uma área
25.000 vezes menor, em escala linear, de tal forma que ela possa
ser lida com um microscópio eletrônico.
E eu
gostaria de oferecer um outro prêmio - se eu puder encontrar
um jeito de enunciar isso de forma a não me meter em uma
confusão de discussões sobre definições
- de outros US$ 1.000 para a primeira pessoa que fizer um motor
elétrico funcional - um motor elétrico rotativo que
possa ser controlado de fora e, sem contar os cabos de entrada,
tenha 1/64 de polegada cúbica.
Eu
não acho que esses prêmios tenham que esperar muito
para os candidatos aparecerem.
Nota
do editor da Journal of Microelectromechanical Systems: O prêmio
acima foi apresentado pelo dr. Feynman em 28 de novembro de 1960
para William McLellan, que construiu um motor elétrico com
o tamanho de um grão de poeira. O outro prêmio ainda
está em aberto.
Texto
traduzido por Roberto Belisário e Elizabeth Gigliotti de
Sousa
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