Brasil
ainda não se beneficia da agricultura de precisão
A agricultura
brasileira vem sofrendo profundas transformações nos
últimos anos. O Brasil já alcançou a posição
de grande produtor e exportador de produtos agrícolas, no
entanto, Estados Unidos e países da Europa Ocidental ainda
apresentam uma agricultura mais desenvolvida em relação
à brasileira. Esses países fazem uso das Novas Tecnologias
da Informação (NTI) que possibilitam o manejo da atividade
agrícola com dados precisos sobre a localização
e o crescimento das lavouras. A chamada agricultura de precisão
surgiu nos países europeus e, em seguida, nos Estados Unidos.
De acordo com José Paulo Molin pesquisador da Escola Superior
de Agricultura "Luiz de Queiroz" da Universidade de São
Paulo (Esalq-USP), o surgimento dessa técnica se deu pela
necessidade de adaptação à legislação
ambiental de alguns países, como a Holanda e Dinamarca, que
obrigam o agricultor a controlar os níveis de insumos adicionados
ao solo, evitando danos ao meio ambiente. No começo da década
de 90, os norte-americanos transformaram a agricultura de precisão
em um grande negócio e empresas começaram a colocar
no mercado sensores, softwares e serviços.
A agricultura
de precisão faz uso intenso de Sistemas de Posicionamento
por Satélite (GPS - Global Positioning System, em inglês)
e Sistemas de Informação Geográfica (GIS -
Geographic Information Systems, em inglês), permitindo o tratamento
e análise de dados coletados no campo. A análise dos
dados permite a otimização do uso de insumos agrícolas,
possibilitando ganhos econômicos para o agricultor e reduzindo
o impacto ambiental da atividade. Esses são os principais
objetivos perseguidos pela agricultura de precisão, que afirma
que o meio-ambiente estaria mais protegido se a aplicação
de adubos e defensivos fosse restrita a necessidades específicas,
evitando excessos que possam causar toxidade e poluição
de solos e recursos hídricos. Economicamente, a vantagem
estaria na redução do custo do produto final.
Uma
ferramenta fundamental da agricultura de precisão é
o mapa de produtividade que fornece ao agricultor informações
bastante exatas sobre eventuais varições da produtividade,
possibilitando um melhor diagnóstico de problemas. Molin
conta que o uso desses mapas está aumentando o lucro do agricultor,
dada a redução dos custos de produção.
"No final da história ele economiza mais do que se fizesse
'pela média', que consiste em fazer uma amostra para representar
o talhão inteiro e aplicar as mesmas quantidades de fertilizante
na área toda. O ideal é 'espacializar' a informação,
localizar as demandas e fazer localizadamente a aplicação",
enfatiza o pesquisador.
A
experiência brasileira
A agricultura de precisão é, ainda, um ramo pouco
explorado no Brasil. No entanto, de acordo com Molin, merece ser
amplamente pesquisado para que, no futuro, possa colaborar para
a otimização da produção agrícola
do país. "O estágio atual da agricultura brasileira
não tem hoje ligação com a agricultura de precisão.
Mas é uma obrigação para o Brasil entrar nesse
ramo, pensando na necessidade de melhorar tecnicamente o padrão
da nossa agricultura", enfatiza ele.
Ricardo
Castillo, pesquisador do Instituto de Geociências da Universidade
Estadual de Campinas (IG - Unicamp), concorda que, no que diz respeito
à agricultura de precisão, o Brasil ainda está
no início. Segundo ele, em 1998, foi criado um ambicioso
projeto que pretendia implantar esse conjunto de técnicas
no Brasil. O consórcio Agrisat Soluções Integradas
LTDA, em Uberlândia-MG, composto por quatro grandes empresas
do setor agrícola - Case IH, Manah, Dupont e Algar - foi
criado como um projeto piloto, com um investimento inicial de US$
148 milhões, e deveria permanecer por 10 anos, gerando 830
empregos diretos e abrangendo uma área de 400 mil hectares.
Em 2001 o projeto foi impedido de continuar, não completando
os dez anos previstos inicialmente. "Não foram razões
propiamente técnicas, mas econômicas que fizeram com
que isso acontecesse. Os retornos não estavam sendo satisfatórios
e os investidores estavam perdendo dinheiro", conta ele.
Ele
enfatiza que as condições para a aplicação
dessas técnicas em território brasileiro, sobretudo
no cerrado, são mais favoráveis que nos países
do hemisfério norte. "A agricultura de precisão
como corretivo das variabilidades presentes no campo, será
mais eficiente quanto mais heterogênea for a área de
cultivo", explica. As primeiras aplicações em
solos brasileiros mostraram que pode haver um bom ganho de produtividade
com a racionalização da produção agrícola.
O
uso de satélites na agricultura
O sensoriamento remoto diz respeito à observação
de determinada área da superfície da terra sem o contato
físico, podendo abranger uma distância de 1 ou 2m como
em fotocélulas ou até milhares de quilômetros,
no caso dos satélites orbitais. Existem os sistemas de sensoriamento
remoto ativo (os que emitem um sinal em direção ao
alvo) e os passivos (aqueles que aproveitam as condições
de luminosidade local). Outro sistema que também faz uso
dos sátélites é o GPS, um aparelho fundamental
para a agricultura de precisão. Esse aparelho, que envia
e recebe mensagens através de um sistema de satélites,
permite saber a localização exata das máquinas
no campo, através de coordenadas geográficas (latitude
e longitude).
Para
a agricultura, a utilização de sistemas de sensoriamento
passivo é potencialmente maior. O chefe adjunto de Pesquisa
& Desenvolvimento da Embrapa Monitoramento por Satélite,
Evaristo Eduardo de Miranda, informa que as imagens de sensoriamento
remoto são geradas por sistemas de satélites em órbita
e não apenas um satélite. Existem os satélites
imageadores, dos quais a agricultura faz uso, e os não imageadores,
que são os satélites de comunicação.
"Hoje temos, por exemplo, a família de satélites
franceses SPOT gerando vários tipos de imagens para a agricultura.
Conforme as famílias de satélites a precisão
das imagens varia muito, desde detalhes de 70 cm até dezenas
de quilômetros e também a frequênica ou o intervalo
com que são adquiridas, podendo variar de 15 em 15 minutos
até cerca de uma imagem por mês, dependendo do satélite",
explica Miranda.
Quanto
à resolução temporal as imagens podem ser diárias,
semanais ou mensais, dependendo do sistema orbital. Já a
resolução espacial se refere ao tamanho do objeto
captado na superfície terrestre, que pode variar de quilômetros
até 60 cm. Miranda conta que, em 2004, está previsto
o lançamento de um satélite capaz de "enxergar"
objetos com até 20 cm de detalhe. Por último, temos
a resolução espectral, que é a capacidade dos
satélites captarem diferentes ondas de radiação
eletromagnética. Alguns captam dentro da faixa do espectro
visível - aquela faixa vista pelo olho humano - enquanto
outros captam imagens no infra vermelho. Existem variados sistemas
orbitais e cada um tem a sua aplicação.
O monitoramento
orbital da agricultura utiliza muitas faixas do espectro eletromagnético
e é a necesidade que determinará o uso. Segundo Miranda,
são várias as aplicações do sensoriamento
remoto na agricultura: agrometeorologia, monitoramento do uso das
terras, detecção de desmatamentos e queimadas, previsão
de safra, mapeamento da infra-estrutura rural, etc. A previão
de safras em países europeus e nos Estados Unidos é
feita, fundamentalmente, por sensoriamento remoto o que não
acontece no Brasil. Aqui ela é feita pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE) e pela Companhia Nacional
de Abastecimento (Conab) baseada em métodos tradicionais
de estatística. "Apesar de existir, no país,
tecnologia para isso, profissionais competentes e métodos
para fazê-lo o país ainda não foi capaz de organizar
essa iniciativa a ponto de gerar uma boa previsão de safra",
critica Miranda.
O único
satélite brasileiro de sensoriamento remoto, CBERS, é
o satélite sino-brasileiro de recursos terrestres, lançado
em 1999 em conjunto com a China. Suas principais aplicações
são: monitoramento de áreas de preservação,
acompanhamento do uso agrícola das terras, cartografia e
atualização de mapas, controle de desmatamento e queimadas,
análise meteorológica e agrometeorológica.
Miranda explica que, devido ao tempo que esse satélite está
em órbita, as imagens geradas não têm a qualidade
necessária. "A esperança é o CBERS 2,
que vai ser lançado neste mês, também em cooperação
com a China. Como vai ser um satéliete que nos pertence poderemos
usá-lo de acordo com nossas necessidades e em melhores condições
de custo e rapidez no acesso as imagens.. Por enquanto estamos usando
satélites de vários países como Israel, Índia,
França, Japão Europa, EUA e Canadá", conta.
Mas,
alguns empecilhos devem ser considerados quando se trata de sensoriamento
remoto na agricultura. A captação de informação
não é influenciada apenas pelo estado do objeto (nutricional,
vegetativo ou tipo de cultura), mas pela quantidade de energia refletida
pela plantação. Outro fato é que o vapor de
água é transparente à radiação,
mas gotas de água na atmosfera e o gás carbônico
(CO2) absorvem grande quantidade de energia. Molin, da Esalq/USP,
alerta para as frustações que se pode ter em razão
dessas limitações. Ele conta o caso de uma empresa
norte-americana que desenvolve um trabalho em parceria com uma empresa
de Rondonópolis-MT. Eles coletaram imagens de diferentes
satélites, com o objetivo de acompanhar a lavoura durante
o ciclo produtivo e orientar o agricultor. Foi grande a frustração
quando se verificou a grande quantidade de nuvens durante o ano.
"Este foi um ano que choveu bastante na região de Rondonópolis,
onde eles estão trabalhando, e as empresas tiveram dificuldades
para gerar imagens de satélite e fazerem as recomendações
conforme foi proposto" conclui Molin.
(AG)
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