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Estudo sobre a cadeia produtiva dinamiza agronegócio

Não são apenas os produtos tradicionais da indústria que passam por várias etapas até chegar ao consumidor final. O agronegócio também opera em sistema de cadeias produtivas complexas, que envolvem processos que estão em constante modernização e otimização. No caso brasileiro, a laranja e o trigo são dois exemplos de produtos que passaram por mudanças visando a competitividade e a expansão no mercado nacional e internacional. Entre os indutores dessa modernização estão as pesquisas realizadas por universidades e instituições públicas, iniciativas do setor privado e ações articuladas com o governo.

O que chama a atenção nesse processo é o crescimento de uma tendência relativamente recente no Brasil, que é o desenvolvimento de pesquisas por instituições públicas em parceria com o setor privado. Um exemplo é o Programa de Estudos dos Negócios do Sistema Agroindustrial (Pensa-FIA/USP), que integra os Departamentos de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP). O Pensa surgiu em 1990, como um projeto acadêmico cujo objetivo era estudar a dinâmica do setor agroindustrial, oferecendo subsídios ao planejamento de empresas e organizações públicas e privadas que atuam na área. A participação de empresários e de representantes do setor privado sempre foi crescente desde o início do projeto. Segundo o professor Marcos Fava Neves, que integra o Programa, essa tendência tem orientado o trabalho de núcleos e grupos de pesquisa em todo o Brasil: "Existem grupos no Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e em outros locais que buscam analisar os agronegócios de maneira semelhante." O professor também menciona que um dos modelos que mais influenciou a criação do Pensa foi o da Universidade de Harvard, que já realizava estudos de caso de empresas do agronegócio por meio da interação academia-setor privado.

Esses estudos têm gerado resultados bastante significativos para alguns ramos da agroindústia nacional. No caso específico da cadeia de cítricos, o Pensa desenvolveu estudos em parceria com o Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), fundação que congrega produtores e indústrias de suco, possibilitando um amplo mapeamento da cadeia produtiva, concluído em maio de 2000. A partir dessas informações, o Pensa propôs a formação de uma organização privada, juntamente com a Fundecitrus, que congrega todos os demais setores da cadeia produtiva, visando o desenvolvimento do agronegócio citrícola. A associação, denominada "Laranja Brasil", foi criada em julho de 2001 e reúne produtores de laranja, indústrias de suco, fabricantes de máquinas e equipamentos, fornecedores de insumos, transportadores, fornecedores de embalagens e consultores em citros. O presidente da associação, Marcos Lourenço Santin, em entrevista concedida à revista da Coopercitrus, pontuou três objetivos prioritários da entidade. O primeiro é promover o aumento do consumo da laranja e do suco de laranja no mercado interno. O segundo é defender os interesses comuns e convergentes da cadeia produtiva, promovendo um aumento de competitividade do setor. E o terceiro, é pesquisar dados e informações necessárias ao conhecimento da realidade do consumo de frutas cítricas e seus derivados naturais, para orientar as ações no mercado interno, que levem a um aumento do consumo.

Figura ilustra uma das análises feitas por pesquisador do Pensa, que investiga as relações contratuais entre o produtor e a indústria da laranja

Segundo Marcos Neves, o mesmo caminho está sendo trilhado pela agroindústria do trigo: "Fomos contratados para fazer o mapeamento dessa cadeia produtiva; o estudo já foi realizado e será instalada a 'Trigo Brasil', aplicando o mesmo modelo". A realidade desse ramo do agronegócio, no entanto, é um pouco mais complexa, segundo o pesquisador: "É uma cadeia muito maior que envolve um número grande de ramificações e produtos finais, como massas, pães e biscoitos, por exemplo". Neves afirma que o trabalho de mapeamento e articulação da cadeia também é dificultado devido ao número de moinhos ser muito grande, com a presença de grupos familiares muito dispersos no país. No caso da laranja, a coordenação das ações é mais fácil porque são poucas indústrias, concentradas no interior do estado de São Paulo.

Com relação ao trigo, o estudo feito pelo Pensa, em parceria com o Instituto Uniemp (Fórum Permanente das Relações Universidade-Empresa) também analisou dados que ilustram a necessidade da expansão da produção. O produto lidera a lista de importações agrícolas do país e a produção nacional supre apenas 44% da demanda de consumo. Além de repercutir positivamente na balança comercial, a expansão do setor pode trazer benefícios adicionais. Em 2002, o aumento médio dos índices de emprego na agricultura em geral foi de 4,7%, enquanto que na cadeia produtiva do trigo foi de 15%. Além disso, estima-se que os agentes desse segmento contribuam com cerca de R$ 1 bilhão de reais em impostos, anualmente.

Pesquisas como essa também contribuem para a geração de benefícios que podem atingir o pequeno e médio produtor rural: "A preocupação social do Pensa é muito grande e sabemos que, melhorando as cadeias produtivas, teremos mais renda e aumentaremos a chance de permanência do pequenos e médio empresário, que são importantes agentes da cadeia", afirma Marcos Neves.

Os estudos do Pensa, no entanto, não entram em questões técnicas. As pesquisas se limitam às áreas de planejamento econômico e estratégias de aperfeiçoamento da produção. São feitas apenas algumas recomendações, tendo em vista a existência de "gargalos" na cadeia produtiva. Caso exista algum tipo de praga que comprometa a qualidade de algum produto, por exemplo, os estudos do Pensa indicam a necessidade de pesquisas que possam combater o problema e o conseqüente impacto na comercialização.

Isso demonstra que a maior parte das pesquisas desenvolvidas por universidades e instituições de pesquisa também podem repercutir, a médio e longo prazo, na cadeia produtiva. Um exemplo é a pesquisa intitulada "Integração de melhoramento genético, genoma funcional e comparativo de citros" desenvolvida pelo Centro de Citricultura Sylvio Moreira (CCSM/IAC), vinculado ao Instituto Agronômico (IAC). A pesquisa, iniciada em 2002, faz parte do "Programa Instituto do Milênio", do Ministério da Ciência e Tecnologia. O objetivo é efetivar o melhoramento de citros a partir da obtenção de espécies híbridas e mapeadas geneticamente, ou seja, integrar mapeamento e melhoramento genético. A pesquisa deve culminar na obtenção de espécies mais resistentes a diversos tipos de pragas, invertendo uma lógica presente no setor, que tem sido a de pesquisar a solução de problemas já consumados. Embora o projeto já tenha resultado em algumas espécies híbridas, mapas genéticos e um banco de dados de 95 mil seqüências de genes expressos, os dados estão sendo preservados por questões estratégicas e não é possível precisar quando as espécies obtidas poderão ser utilizadas pelos agricultores.

Segundo Marcos A. Machado, diretor do CCSM, as empresas não costumam investir em projetos desse porte por se tratar de pesquisa básica, cuja dinâmica não gera lucros diretos, e pelo risco de associação aos transgênicos: "Embora estejamos apenas desenvolvendo espécies híbridas, o público pode associar isso a organismos geneticamente modificados e a imagem da empresa pode sair arranhada", afirma Machado e, desse modo, a grande maioria das pesquisas acabam sendo diretamente financiadas pelo governo.

A articulação de projetos de pesquisa desenvolvidos pelo Pensa e pelo IAC com a esfera pública está relacionada a questões de conjuntura política, algumas vezes motivadas pela transição de governo. No caso do IAC, segundo Marcos Machado, os recursos oriundos do MCT para o projeto citado diminuíram bastante, e no caso do Pensa, algumas iniciativas da qual o projeto participou foram reformuladas.

Fóruns de competitividade
Em 2000, foram instalados os Fóruns de Competitividade de Cadeias Produtivas, congregando o setor privado e representantes do Governo em torno do objetivo de aumentar a produtividade e a competividade internacional de alguns setores da economia. O projeto, vinculado à Secretaria de Política Industrial, subordinada ao Ministério do Desenvolvimento e Comércio Exterior (MDIC), contemplou alguns ramos dos agronegócios. Chegaram a ser instalados os Fóruns da cadeia de algodão e têxteis, madeira e móveis e o último deles, em meados de 2001, da área de couro e calçados. O Pensa prestou assessoria a esse programa federal, oferecendo subsídios técnicos para que medidas concretas fossem tomadas. Segundo declarações da professora Elisabeth Farina, coordenadora adjunta do Pensa, o objetivo geral era agregar valor às exportações brasileiras, fazendo com que a matéria-prima fosse substituída por produtos industrializados. O trabalho consistiu, de acordo com a linha de atuação do Pensa, em uma análise sistêmica dos segmentos que compõem a cadeia produtiva de diversos ramos do agronegócio, envolvendo insumos, agricultura, agroindústria e distribuição. Na etapa final, foi elaborado um relatório para ser entregue ao Ministério, com as recomendações e conclusões para cada área, que serviram de base para a instalação dos fóruns.

A transição de governo, no entanto, motivou algumas alterações. De acordo com as informações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o período de maio a junho deste ano foi marcado pela reinstalação de vários Fóruns criados no governo passado. Estão em fase de estudo outros fóruns relacionados a diversas cadeias produtivas, incluindo Frangos e Suínos, Lácteos e Café. Esse novo planejamento tem objetivos mais audaciosos, que refletem a tônica da política externa brasileira: a participação do Brasil no "Programa dos Fóruns de Competitividade das Cadeias Produtivas do Mercosul", cuja criação foi aprovada pelo Conselho do Mercado Comum do Mercosul no final de 2002 (Mercosul/CMC/Dec. nº 23/02). O Programa passará a integrar as ações dos subgrupos e de outros órgãos do bloco. Os resultados efetivos, no entanto, ainda não podem ser mensurados.

(DC)

 
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Atualizado em 10/10/2003
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