TUBERCULOSE PODE MATAR 30 MILHÕES
"A
tuberculose foi um dos maiores desafios da saúde no início do
século XX. Nós não podemos permitir que a TB-MDR (tuberculose
multidroga resistente ou TMR) torne-se o maior problema de saúde
no século XXI". Esta frase, do pesquisador Michael Iseman, da
Universidade de Colorado e do National Jewish Medical and Research
Center, explica, de modo sucinto, como a tuberculose é uma das
mais graves enfermidades atuais, apesar de todos os avanços da
Medicina.
Dados da Sociedade Brasileira de Pneumologia
e Tisiologia (SBPT)
apontam que um terço da população mundial está infectada com o
bacilo da tuberculose; 30 milhões de pessoas no mundo podem morrer
da doença nos próximos 10 anos; 45 milhões de brasileiros estão
infectados; entre 5% e 10% dos infectados contraem a doença; e
6 mil brasileiros morrem de tuberculose por ano. Estes indicadores
comprovam a urgência do desafio apontado no artigo de Iseman.
Ainda segundo indicadores divulgados pela SBPT,
no Brasil, foram notificados 85.860 novos casos em 1995, de todas
as formas de tuberculose (pulmonar, pulmonar bacilífera e extrapulmonar),
sendo que 73% dos doentes foram curados. Os novos casos notificados
representam um coeficiente de incidência - em cada 100 mil habitantes
- de 54,7%, considerando-se o total de habitantes do Brasil em
1995 de 156.857.493 pessoas. O número de óbitos por tuberculose
no Brasil, neste mesmo ano, foi de 5.978, o que representa um
coeficiente de 3,8% em cada 100 mil habitantes.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS),
cerca de 32% da população mundial (1,86 bilhão de pessoas) está
infectada com o bacilo da tuberculose. Esses dados foram publicados
recentemente no Journal of the American Medical Association. O
artigo diz ainda que a cada ano a tuberculose: mata 2 a 3 milhões
de pessoas; tem 8,5 milhões de novos casos. Devido à gravidade
da situação e a facilidade da proliferação, já que o bacilo contamina
pelo ar, a OMS decretou, em abril de 1993, Emergência Global contra
a Tuberculose, e desde então vem desenvolvendo políticas para
conter o crescimento de casos. De acordo com o relatório publicado,
que também criticou a falta de estratégias para o controle da
doença, mais da metade dos novos casos registrados em 1997 ocorreu
em países do sul da Ásia.
O sudeste da Ásia conta com o maior número de
casos, com 44% da população infectada, seguido pela África, com
35%. Entre as nações africanas, a situação é mais grave em Botsuana,
Namíbia, África do Sul, Zâmbia e Zimbabwe. Entre as seis regiões
estudadas no mundo, a América é a mais diversificada em termos
epidemiológicos. A incidência varia de menos de 10 casos por 100
mil no Canadá e Estados Unidos até mais de 250 por 100 mil na
Bolívia, Peru e Haiti. Em relação a casos detectados, Brasil e
o Peru são os mais destacados. Outro relatório divulgado recentemente
pelo UNICEF (Fundação das Nações Unidas para a Infância) revela
que o Brasil é o quarto país do mundo em casos de tuberculose
(só perde para a Índia, China e Filipinas).
A tuberculose é uma doença de notificação obrigatória
aos órgãos de saúde quando diagnosticada. O Ministério da Saúde
vem há longo tempo acompanhando os dados notificados. Em 1998,
foram notificados 86.000 casos de tuberculose no Brasil, que causaram
pelo menos 6.000 mortes. O Ministério da Saúde estima, entretanto,
que a incidência da doença seja de 129 mil casos por ano, uma
vez que o índice de sub-notificações ainda é alto. O Sudeste concentra
a maioria (47,7%) dos casos de tuberculose registrados no país
em 98, com 40 mil notificados. O Nordeste aparece em segundo lugar,
com 24 mil casos. Os Estados campeões de registro são, nesta ordem,
São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais.
Quando se relaciona o número de casos com a população
do Estado, se verifica também que os coeficientes se mantêm em
torno de 55 casos por 100 mil habitantes. Isso vem se registrando
durante toda a década de 70, 80 e a atual. Portanto não houve
um período de declínio da doença nos últimos 30 anos. A tuberculose
não é uma doença "reemergente" no Brasil porque ela nunca se foi.
Ela continua se mantendo em todo o Brasil. O que existe na verdade
é uma tendência de aumento no número de óbitos. Há uma certa estabilidade
no que se refere ao número de casos novos. Contudo, em relação
aos óbitos, observa-se a partir de 1986 um aumento desse número
e dos coeficientes de mortalidade.
INCIDÊNCIA DA DOENÇA - Uma série de fatores
contribuem para a disseminação da tuberculose, dentre os quais
podemos destacar: o uso incorreto da terapêutica, o abandono de
tratamento, a alta capacidade infectante desses agentes, as viagens
migratórias constantes, e a ocorrência de grandes aglomerados
populacionais. Além disso, esta situação é seriamente agravada
por problemas sociais como a pobreza, o uso crescente de drogas,
a infecção pelo HIV (entre 12 a 15% dos casos notificados de tuberculose
estão associados à co-infecção pelo HIV), e o crescente número
de casos de resistência múltipla às drogas anti-tuberculose (aproximadamente
50% dos casos de pacientes não tratados morrem, enquanto os casos
de resistência às drogas são de difícil tratamento).
A tuberculose é responsável por 32% do agravamento
das condições de saúde de pacientes HIV-positivo, o triplo de
qualquer outra causa patológica (como as neoplasias malignas,
septicemia e demais infecções). A AIDS - ao atingir o sistema
imunológico do paciente - colocou a tuberculose em alta evidência,
como uma das doenças associadas mais citadas, refletindo o acentuado
grau de infecção da população pelo bacilo de Koch.
O bacilo da tuberculose é um agente infeccioso
que acompanha o ser humano até a sua morte, prestes a atacá-lo
a qualquer momento e podendo potencializar outras doenças ou substituindo-as
como causa mortis, como é o caso da AIDS. A infecção se dá pelo
ar, diminuindo as chances de proteção humana. Somente a identificação
precoce do doente e o tratamento ininterrupto podem reduzir os
riscos de infecção para a população. A tuberculose é uma doença
infecto-contagiosa transmitida de pessoa para pessoa através do
contato direto, ou pela tosse ou por espirros. A população tem
ojeriza em relação ao tuberculoso. Vale salientar que a tuberculose
não se transmite através de toalha, copo, talheres. As pessoas
não precisam ter este tipo de receio.
O deficiente controle da tuberculose nos dias
atuais cria uma situação extremamente perigosa, considerando o
aparecimento dos bacilos resistentes a múltiplas drogas. Doentes
de tuberculose das duas maiores cidades brasileiras, São Paulo
e Rio de Janeiro, estão entre os pacientes que mais abandonam
o tratamento no mundo. Cerca de 40% dos doentes paulistanos e
50% dos cariocas não tomam os remédios durante o período mínimo
de seis meses. A OMS admite uma taxa máxima de abandono de 5%.
O abandono acaba gerando bacilos resistentes e fazendo saltar
o custo do tratamento de R$ 78,00 por paciente para R$ 4.000,
sem contar os gastos com hospitalizações. Entre esses pacientes,
mais da metade acaba morrendo com a doença.
As pessoas que abandonam o tratamento adquirem
uma resistência do bacilo da tuberculose aos medicamentos existentes
e são chamadas de multidroga resistentes (MDR). Os doentes MDR
possuem uma doença incurável, por não seguir a medicação recomendada
pelo serviço de saúde. O pior é que o bacilo também se transmite
e a pessoa infectada adquire uma moléstia incurável. A tuberculose
resistente às terapias convencionais pode implicar a proliferação
universal da doença. Felizmente, a porcentagem de pacientes MDR
ainda está em torno de 5% do total de tuberculosos. A tendência
é que esse número aumente e que haja e não dispomos de novas drogas
para a medicação desses indivíduos. A terapia gênica seria a solução.
Segundo os dados do Ministério da Saúde, enquanto
São Paulo e Rio têm os maiores índices de abandono, o bom exemplo
vem de pequenas capitais. Cuiabá reduziu a taxa de abandono de
40% para 5% em dois anos. A queda se deve à implantação do programa
de "tratamento supervisionado" no qual o doente passa a receber
o remédio diante de um profissional de saúde.
Dentro desse "plano nacional de controle da tuberculose",
criado no ano passado, o governo também estabeleceu um bônus para
a instituição que conseguisse fazer seu paciente tomar os remédios
até o fim. A cada doente curado, a instituição receberia entre
R$100 e R$150. Até agora pouquíssimas instituições reinvindicaram
esse bônus.
Outra ameaça tão séria quanto o abandono é a
sub-notificação. No país todo, cerca de 90.000 casos de tuberculose
são notificados por ano, mas o governo estima que cerca de 50
a 60 mil doentes estejam perambulando pelo país sem notificação
nem tratamento.
Outro problema grave é a demora no diagnóstico
da doença. Essa demora não é culpa somente do paciente. Muitas
vezes as pessoas vão várias vezes ao serviço de saúde e não têm
a tuberculose diagnosticada, apesar de ela ser uma doença que
clinicamente dá uma série de indícios para o médico, como por
exemplo, a tosse com expectoração há mais de um mês, febre constante,
calafrios noturnos e emagrecimento. Às vezes se elimina sangue
pela tosse. Mas nem todas as pessoas com esses sintomas são tuberculosas,
muitas são fumantes crônicas ou o diagnóstico é confundido com
doenças crônicas pulmonares, como a bronquite, principalmente
no inverno.
Mesmo em estado avançado a doença é curável.
Basta que o paciente siga a medicação durante 6 meses. É um tratamento
longo, mas já é muito mais curto do que foi no passado, quando
consumia 18 meses.
Tire suas dúvidas sobre
tuberculose.
|