Entrevista
com Kate Oakley
Diretora
da ONG Local Futures,
Kate Oakley há vários anos presta consultoria
para o governo britânico, sobretudo a municípios interessados
em implantar ou avaliar programas de difusão de tecnologias
de informação. Consciente dos desafios e limitações
envolvidos nesses projetos, a pesquisadora fala, nesta entrevista,
sobre como a tecnologia se relaciona com a educação
e com os processos tradicionais de interação social.
Com
Ciência: Qual o papel da educação tradicional
na preparação dos cidadãos para usar as novas
tecnologias da informação e comunicação
(TIC)?
Kate Oakley: A OCDE produziu um relatório sobre Economia
do Conhecimento, há um ano, mostrando que as sociedades em
que as TIC mais se difundiram, cruzando as fronteiras entre as classes
sociais, são aquelas que têm o melhor sistema educacional
público, por exemplo os países escandinavos. Situação
totalmente diferente é a dos EUA, que, apesar de desenvolvido,
é um país com grandes desigualdades sociais e de acesso
à tecnologia. Então, claramente, a educação
tradicional é a ferramenta mais importante para promover
a difusão das TIC pela sociedade. Mas acho que não
é só uma questão da aquisição
formal de habilidades no uso das TIC, como ler, escrever e usar
uma tela de computador. É uma questão também
de sociabilidade. Pessoas mais velhas, por exemplo, experimentam
dificuldades para lidar com a tecnologia, mesmo que tenham meios
financeiros ou educacionais de acesso a ela. Se você vive
num ambiente onde as pessoas usam a Internet, por exemplo, existe
um estímulo. Caso contrário, isso não faz parte
de sua experiência social.
Com
Ciência: Não seria questão de criar diferentes
serviços e formas de acesso às TIC para cada tipo
de usuário?
Oakley: Sim, é claro que é preciso haver diferentes
estratégias para diferentes grupos. Pensando no governo eletrônico,
é preciso também reconhecer que haverá muitas
pessoas, particularmente das gerações mais velhas,
que não vão querer mudar sua forma de relacionamento
com o governo. Para esses, uma política sensível deveria
tornar disponíveis as duas formas de atendimento: digital
e tradicional, face a face. Eu não acho, de fato, que o contato
face a face vai ser substituído, pelo menos não nos
próximos 20 ou 30 anos, no Reino Unido. Espero que consigamos
fazer com que as TIC possam ser uma forma de liberar as pessoas
da burocracia tradicional, abrindo maior espaço para formas
mais ricas e interessantes de interação face a face.
Com
Ciência: Pode dar um exemplo?
Oakley: Uma idéia interessante é simplificar
o processo de registro e documentação da morte de
alguém, ajudando as pessoas num momento que normalmente é
de grande estresse e sofrimento. Estou trabalhando num projeto desses
junto a uma autoridade municipal na Inglaterra. Nossa grande dificuldade
é conseguir integrar os bancos de dados de municípios
diversos para permitir o registro de óbito de pessoas oriundas
de cidades diferentes daquela em que faleceram. Além de facilitar
o processo de registro, o projeto inclui também aconselhamento
e auxílio aos familiares.
Com
Ciência: Como a senhora avalia a integração
das TIC no ensino britânico?
Oakley: Não há ainda material suficiente para
afirmar que há integração total das escolas
às TIC. Nem todas as escolas têm microcomputador para
todos os alunos ou, sequer, um micro por sala. Mas estamos começando.
Os alunos aprendem a lidar com as TIC através de disciplinas
que estão integradas ao currículo escolar. Há
alguns projetos focados em bairros pobres, visando a incentivar
o uso das TIC por pessoas que não dispõem de acesso
à computador e Internet de casa, mantendo, por exemplo, as
escolas abertas até mais tarde. O problema é que esses
projetos não são sistemáticos; eles muitas
vezes só vão para a frente porque há um financiamento
especial ou a autoridade municipal sabe fazer uma política
eficiente de levantamento de recursos.
Com
Ciência: A tecnologia facilita a participação
social e a democracia?
Oakley: Não acho que a tecnologia, em si, mudará
o processo de participação social. Mas é preciso
ensinar e capacitar as pessoas a usá-la. A menos que as pessoas
saibam usar as TIC, em algum nível, elas não terão
como participar economicamente. A principal razão para ensinar
e difundir as TIC é, em primeiro lugar, econômica.
É um projeto de longo prazo.
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