CARTA AO LEITORNOTÍCIASENTREVISTASREPORTAGENSRESENHASCRÍTICA DA MÍDIALINKS DE C&TCADASTRE-SE NA REVISTABUSCA POR PALAVRA-CHAVE

Carta ao leitor

Equipe

Mande uma mensagem

Cartas anteriores:

O salto Cântico da Física
10/05/2001

Outros Quinhentos
10/04/2001

Informação e Simulacro
10/03/2001

Pedradas Cósmicas
10/02/2001

Canções do Exílio
10/12/2000

Amazônia: Diversidade e Conflito
10/11/2000

Jogo de Espelhos
10/10/2000

Planeta Água
10/09/2000

Caixa de Pandora
10/08/2000

Com Ciência na SBPC
10/07/2000

 

 

 

 

 

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

Pedradas Cósmicas

Carlos Vogt

As matinês no Cine Santa Rita, em Sales Oliveira, aos domingos, reapresentavam a programação dos "seriados" do sábado à noite, como acontecia pelo Brasil afora nas cidades e vilas que tinham pelo menos uma sala de projeção.

O cine Santa Rita era um cine-teatro e também o salão de festas e bailes da sociedade salense. Foi lá que eu e a meninada assistimos às séries de aventuras que, aos sábados e aos domingos, nas matinês antecediam o filme principal.

Os Perigos de Paulina, Batman e Robin, Super-homem que já vinha de outra galáxia para defender a liberdade e a justiça na Terra, e Flash Gordon que partia da Terra para levar justiça e liberdade ao universo intergalático.

No planeta Mongo - alegoria mal disfarçada do "perigo amarelo" que o imperador Ming encarnava -, Flash Gordon, tão loiro quando Brick Bradford - outro herói do espaço - era ruivo, depois de uma saga de lutas e vitórias, implantava, por fim, o bem, identificado, é claro, com os valores sagrados da sociedade americana.

O pós-guerra e a guerra fria esquentaram os ânimos anti-comunistas do Tio Sam e a globalização que, então, se iniciava, espalhou as ideologias xenófobas do país nas representações cósmicas interplanetárias de alienígenas enlouquecidos no afã de invadir e conquistar nosso planeta, leia-se, os E.U.A.

As tecnologias espaciais desenvolvidas em decorrência das necessidades bélicas da Segunda Grande Guerra, as bombas U2 entre elas, permitiram detalhar e dar mais concretude e materialidade às fantasias representadas antes pelas latinhas que simulavam em estúdio os poderosos e rústicos foguetes das sideradas viagens de Flash Gordon.

O cinema produziu clássicos da paranóia como o excelente O dia em que Marte invadiu a Terra e o rádio produziu a maior mistificação de que se tem notícia, na encenação radiofônica de A Guerra dos Mundos, de H.G. Wells, por Orson Welles, apavorando multidões de crédulos com a narrativa dramatizada da invasão que, enfim, acontecia.

A literatura, além de Welles e Arthur Clarke, coleciona nomes, entre eles Isaac Asimov, Ray Bradbury, Olaf Stapledon, Robert Heinlein, que dignificaram a ficção científica e fazem, por séculos, viajar gerações e gerações de leitores.

O Projeto Lunar, talvez um dos três grandes programas de desenvolvimento científico e tecnológico do século XX, ao lado do Projeto Manhattan, da bomba atômica, e do Projeto Genoma, veio dar concretude definitiva às andanças cósmicas imaginárias. Antes, o Sputinik, Yuri Gagarin e a cadelinha Laika haviam emocionado os terráqueos com suas peripécias de vôo em torno do globo. "A Terra é azul" nos disse Gagarin, contemplando o efeito de luz e cor que a massa líquida - 2/3 do globo terrestre - provoca, mudando, no instante mesmo de sua declaração, a percepção de nós mesmos na Terra e da Terra no espaço e do espaço no tempo e do tempo em nossas vidas.

Tudo o que a teoria da relatividade e a física quântica teorizavam, percebido e vivenciado num átimo de percepção e sensibilidade.

As imagens do homem na lua, os astronautas pulando no solo vulcânico de nosso romantismo e plantando, em campo estéril, o estandarte perfilado dos EUA, são imagens que, em 1969, transmitidas para os recônditos do planeta, deixaram, contudo, dúvidas em muitos espíritos, já que o homem, antes, muitas vezes, lá já estivera, em ficção.

Depois, todos viajamos pelos mistérios e enigmas de duas obras-primas da filmografia sideral: 2001 - Uma Odisséia no Espaço e Solaris. Kubrick e Taskoviski nos intrigaram com suas narrativas de medo, solidão, abandono, e alegóricos fins e recomeços.

As missões espaciais multiplicaram-se e a Apolo XIII, com seu fracasso vitorioso, virou também filme.

As séries de televisão pareciam infindáveis e eram mesmo. Depois de esgotarem o modelo na telinha, enveredaram pelo cinema e dá-lhe Perdidos no Espaço, o filme, Jornada nas Estrelas, também, além de outras refilmagens com heróis e vilões clássicos, entre eles o famoso imperador Ming, de Flash Gordon, encenado por nada menos que o bergmaniano Max Von Sidow.

Com Ronald Regan, ex-cowboy de Hollywood, veio o período em que as jornadas viraram guerra e o sucesso da série de George Lucas, com os efeitos especiais obtidos pelas tecnologias digitais, acabou por constituir uma série de cults e Guerra nas Estrelas ser cultuada por gerações de devotos.

Os programas e as pesquisas espaciais continuaram, não com o mesmo ritmo que o programa Guerra nas Estrelas lhes imprimia, mas com perseverança suficiente para os grandes avanços que levaram aos ônibus espaciais, às missões em Marte, à permanência da estação MIR no espaço (agora condenada a descer), mesmo depois do fim da União Soviética, às notícias da possível existência de água e de vestígios de vida em outros planetas e até mesmo aos novos velhos cowboys do espaço, na companhia de Clint Eastwood e de outros ternos durões, nossos conhecidos.

E os avanços foram tantos que o próprio Brasil, sem grandes tradições na área, apesar dos esforços na Barreira do Inferno, entrou nos últimos anos, para o clube dos interplanetários e participa do projeto da Estação Espacial Internacional, programado para entrar em funcionamento em 2006, e nela terá o seu próprio e primeiro astronauta.

Mas os meteoros e os asteróides estão soltos e volta e meia surge o anúncio de que a Terra está sendo ameaçada por uma pedrada cósmica. Aí ,volta sempre a história da extinção dos dinossauros e dos grandes répteis e das medidas de preservação do planeta para evitar a reedição da catástrofe que, tendo banido os dinossauros no passado remoto, nos varreria, a nós e aos nossos semelhantes e dissemelhantes, da face e das profundezas da Terra.

É claro que sempre poderemos contar com Bruce Willis para vencer o Armagedon e superar todas as ameaças à nossa sobrevivência.

Para prevenir, além de "fazer uma canção de amor para lançar no espaço sideral" vamos, internautas, navegando pelo "oceano cósmico" (na bela expressão de Ulisses Capozoli) das informações, conceitos e metáforas que podem nos ajudar a compreender ao menos que o enigma do universo é daqueles com sinal invertido: o mistério não está na resposta, mas na pergunta a ser corretamente formulada. Acertar a pergunta, este é o desafio, já que a resposta está aí, mesmo que não a compreendamos inteiramente, sem a pergunta a que ela está respondendo. Ou, como diz Einstein: "A coisa mais incompreensível do universo é o fato de ser compreensível."

 

 

 

Atualizado em 10/04/2001

http://www.comciencia.br
contato@comciencia.br

© 2001
SBPC/Labjor
Brasil