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Editorial:
Ciência e contingência
Carlos Vogt
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Poema:
Mal-du-siècle
Carlos Vogt
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  Guerra e Ciência
O CBPF e a política nuclear brasileira

Em fins da década de 40 e início da de 50, o Brasil assistiu a um salto fundamental no desenvolvimento institucional da sua ciência, representado, principalmente, pela criação do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), em 1949, e do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq), em 1951. Estes desenvolvimentos ligavam-se intimamente a uma relação estreita entre ciência e política. A ação do setor desenvolvimentista da classe militar, que considerava o desenvolvimento científico fundamental para o crescimento do país (especialmente no setor da energia nuclear), foi fundamental para que as duas entidades saíssem do papel.

O alinhamento da política científica com os interesses militares era muito favorecido pela conjuntura internacional da época. A importância da tecnologia na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), particularmente da bomba atômica, fez com que a física nuclear e o domínio sobre os minerais ditos estratégicos (minerais contendo terras raras - elementos com características química semelhantes ao urânio) se tornassem assunto político estratégico. Assistiu-se a uma grande intensificação na relação entre ciência, política e Forças Armadas.

A tensão internacional dos anos que se seguiram, um dos períodos mais tensos da Guerra Fria, reforçou as razões do incremento dessa relação e ajudou a aprofundá-la. O ano de 1949 assistiu ao bloqueio de Berlim Ocidental pelos soviéticos (iniciado no ano anterior); à criação da OTAN, a aliança militar anti-soviética liderada pelos EUA; à explosão da primeira bomba atômica da URSS, pondo fim ao monopólio norte-americano das armas nucleares e dando início à corrida armamentista; e à vitória da revolução comunista de Mao Tsé-Tung na China. A China de Mao entraria em choque militar com os EUA no ano seguinte, durante a Guerra da Coréia (1950-1953), ao lado das forças norte-coreanas. No território norte-americano, reinava o clima de perseguição política anti-comunista conhecido como Macarthismo (1951-1960).

A criação do CBPF

O aprofundamento das relações entre militares, ciência e política reproduziu-se no Brasil e permitiu a sustentação financeira do CBPF nos seus primeiros anos. Mas a idéia original da criação do CBPF não veio dos interesses militares, mas da intenção de um grupo de cientistas de se criar, no Rio de Janeiro, um centro de excelência em física diferente do estilo de ensino e pesquisa até então feito no Brasil. Algumas diferenças principais estavam na adoção da avaliação dos professores e pesquisadores baseada no mérito, ao contrário do sistema de cátedras, e na instituição de cursos de pós-graduação. Além disso, o CBPF foi a primeira instituição de pesquisa criada como entidade de direito civil e procurou firmar-se em financiamentos da iniciativa privada (apesar de nunca ter conseguido livrar-se totalmente do financiamento público). Entre os principais cientistas fundadores do CBPF, estavam os físicos César Lattes e José Leite Lopes.

As duas principais linhas de pesquisa do Centro eram sobre raios cósmicos, liderada por César Lattes, e partículas elementares, lideradas por José Leite Lopes. O prestígio de Lattes foi fundamental para a implementação do Centro. O cientista havia obtido reconhecimento internacional poucos anos antes, após conseguir observar pela primeira vez (1947) o méson-pi, uma partícula subatômica cuja existência era prevista pela teoria sobre forças nucleares (teoria de Yukawa), corroborando fortemente essa teoria.

Para garantir financiamento e apoio, os cientistas fundadores aliaram-se a membros das classes militar e política, representadas, respectivamente, por João Alberto Lins de Barros e pelo contra-almirante Álvaro Alberto da Motta e Silva. Tal aliança foi fundamental para a implementação do Centro. O setor militar desenvolvimentista tinha, no CBPF, um ponto de apoio para cooptar, junto ao Congresso Nacional, apoio governamental para a ciência, visando o aproveitamento da energia nuclear. A argumentação pró-energia nuclear era facilitada pela crise de racionamento de energia elétrica dos anos 1948-52. Os cientistas, por sua vez, obtinham por essa via muito do financiamento necessário. A ação junto aos políticos foi feita principalmente por Álvaro Alberto.

Essa dinâmica foi facilitada com a criação do CNPq em 1951. Até 1954, 74% dos recursos do setor de Pesquisas Físicas do CNPq foram repassados para o CBPF. O CNPq foi criado nos moldes da Comissão de Energia Atômica dos EUA; ao contrário do CBPF, era uma autarquia vinculada diretamente à Presidência da República, com autonomia técnico-científica, administrativa e financeira.

(R.B.)

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Atualizado em 10/06/2002
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