Brasil desenvolve foguetes e mísseis
O Programa Espacial Brasileiro começou a ser projetado
em 1961, quatro anos após o primeiro lançamento do satélite russo
Sputinik 1. Nesses quarenta anos foram criados centros de pesquisas
para o desenvolvimento de projetos espaciais que incluem a criação
de foguetes, satélites e bases de lançamento. Hoje, várias instituições
brasileiras, governamentais e privadas, desenvolvem pesquisas
na área de tecnologia espacial para a produção de foguetes e mísseis.
Estes produtos podem ser fabricados com duas finalidades principais,
para uso militar ou civil. A indústria bélica fornece equipamentos
para as Forças Armadas Brasileiras ou busca exportar para o mercado
internacional. As tecnologias espaciais com fins pacíficos produzem
sondas e satélites, que podem ser utilizados em diversas áreas
da pesquisa científica como a meteorologia e o mapeamento geográfico.
No Brasil, os principais centros de pesquisa aeroespacial são
o CTA (Centro
Tecnológico Aeroespacial), ligado à Aeronáutica e ao Ministério
da Defesa e o Inpe
(Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), atrelado ao Ministério
de Ciência e Tecnologia. No ITA
(Instituto Tecnológico de Aeronáutica) são formados os profissionais
da área espacial, com cursos fundamentais, de graduação e pós-graduação
em engenharia aeronáutica, eletrônica, mecânica de aeronaves e
computação. A principal indústria privada que fabrica armamentos
e foguetes é a Avibrás.
A região onde se concentram estas empresas é o Vale do Paraíba,
interior do Estado de São Paulo, nas cidades de São José dos Campos
e Jacareí.
O jornalista Roberto Godoy, editor no jornal O Estado de São
Paulo, é um dos maiores especialistas em armamentos e estratégias
militares e se dedica ao assunto a mais de 20 anos. Ele diz que
o Brasil tem tecnologia suficiente para desenvolver mísseis de
longo alcance. "O Brasil produz mísseis de médio alcance, na faixa
de 400 quilômetros e tem infra-estrutura para desenvolver mísseis
acima desta capacidade e até nuclear. O Brasil não usa esta capacidade
por opção, como o programa nuclear que foi abandonado", diz Godoy.
A falta de dinheiro é o principal motivo para a não fabricação
de foguetes militares e mísseis de longo alcance. Os foguetes
têm uma forma aerodinâmica e trajetória balística, já os mísseis
podem ser guiados e possuem componentes eletrônicos. Para desenvolver
mísseis de longo alcance são precisos vários testes que consomem
milhares de dólares.
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O
foguete VLS-1 se autodestruiu ao ser lançado, em
1997
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O Brasil tem o domínio da tecnologia para a construção
do Veículo Lançador de Satélite (VLS) e desenvolveu uma tecnologia
própria de propulsão utilizando combustível sólido. Mas o país
tem algumas deficiências no lançamentos em longas distâncias.
"O problema é na parte de guiagem, no sistema de controle do direcionamento.
O combustível produz uma aceleração brutal e há problemas no balanceamento.
O que falta é um aperfeiçoamento", diz Godoy.
O primeiro míssil produzido com tecnologia 100% nacional é o Piranha.
O projeto para a construção desse míssil começou em 1976, a partir
de uma parceria da Aeronáutica com empresas privadas e estatais.
Depois de passar por várias empresas como a Embraer e a Engesa,
o Projeto Piranha foi assumido pela empresa Mectron, em 1993.
Hoje, é produzido o míssil ar-ar de curto alcance, guiado por
infravermelho, que foi homologado em 1998 e é considerado o primeiro
armamento inteligente desenvolvido no Brasil.
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Piranha
é o primeiro míssel inteligente brasileiro
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Esse míssil é lançado de aviões, tem um alcance
de cerca de 8 quilômetros e custa cerca de 100 mil dólares. A
tecnologia é sempre atualizada e, em 2003, deve ser entregue a
nova versão do míssil. Além desse modelo, está sendo desenvolvida
uma família de mísseis como o modelo TA-X (terra-ar) que está
em fase de testes e o um míssil ar-terra.
A Avibrás, sediada em Jacareí, produz foguetes e mísseis. Os foguetes
da linha Astros foram bastante utilizados na guerra Irã-Iraque
e na Guerra do Golfo na década de 80. Eles são lançados de um
caminhão e atingem alvos com distâncias de nove a noventa quilômetros.
A Avibrás também fabrica o míssil Névoa - MPM (Multi-Purpose
Missile), com sistema de orientação baseado na transmissão
de dados por cabos de fibra ótica.
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O
Névoa - MPM é produzido pela Avibrás
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Esse tipo de tecnologia bélica deve ser desenvolvida
no país porque os países desenvolvidos consideram estrategicamente
inaceitável a transferência do conhecimento. Os Estados Unidos
estabelecem uma série de regras para não repassar a tecnologia
para outros países. Para se ter uma idéia das proibições, alguns
mísseis que estavam para ser vendidos para o Brasil e Chile deveriam,
por exigência americana, ficar estocados nos Estados Unidos e
só poderiam ser liberados em épocas de crise diplomática.
O Brasil não aceitou as exigências e não fechou negócio com os
aviões de caça norte-americanos porque, segundo as regras da licitação
brasileira, os softwares deveriam ter os códigos abertos,
cláusula que os americanos não concordam. Outro exemplo da tática
americana para evitar a transferência de tecnologia aconteceu
durante as negociações para a utilização da base de lançamentos
de Alcântara, que seria controlada pelos Estado Unidos nos períodos
de lançamento de seus satélites. O Brasil não fez o negócio com
os EUA e acabou fazendo um acordo de cooperação com a Ucrânia.
Uma nova versão do acordo está sendo discutida pelo Congresso
e deverá ser renegociada com os norte-americanos.
Fins Pacíficos
Desde o surgimento dos foguetes, com os protótipos alemães V1
e VS durante a Segunda Guerra Mundial, e depois, com a Guerra
Fria, a tecnologia de lançamento de foguetes vêm sendo usada com
propósitos bélicos. Depois da chegada do homem à Lua, quando o
mundo já estava infestado de foguetes intercontinentais nucleares
das duas superpotências, a corrida espacial abriu novas perspectivas
para as pesquisas científicas e as telecomunicações. No Brasil,
o Governo Federal criou em 1994 a Agência Espacial Brasileira
(AEB)
para coordenar as várias instituições de pesquisa espacial com
fins pacíficos, como o Instituto de Aeronaútica e Espaço (IAE)
do CTA, o Inpe. O assessor da presidência da AEB, Eduardo Dorneles,
está escrevendo um livro sobre os 40 anos do Programa Espacial
Brasileiro, de 1961 a 2001. Dorneles faz um balanço das conquistas
e da posição brasileira no cenário internacional. "As metas estabelecidas
na década de 80 foram cumpridas, que eram a criação de satélites,
de campos e bases de lançamentos e veículos lançadores de satélites
(VLS)", diz. O país tem duas bases de lançamentos de foguetes,
o Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI), criado em
1965 na cidade de Natal (RN), e o Centro de Lançamento de Alcântara
(CLA) no Maranhão, inaugurado nos anos 80.
Hoje, o Brasil têm dois satélites construídos com tecnologia nacional
em órbita, a cerca de 650 quilômetros da Terra. São os Satélites
de Coleta de Dados (SCD) fabricados no Inpe. O SCD-1 foi lançado
em 1993 e o SCD-2 em 1998. Estes modelos foram colocados em órbita
em através dos veículos Pégasus americanos. O terceiro satélite
brasileiro em órbita foi feito em parceria com a China. É o CBERS-1
(China-Brasil Earth Research Satelite), que entrou em órbita
em 1999. Esse satélite está a cerca de 790 quilômetros da Terra
e é equipado com câmeras que transmitem imagens para o sensoreamento
remoto de todo o território nacional.
Este ano deve ser lançado o CBERS-2. Uma missão chinesa chegou
em junho ao Brasil para discutir a prorrogação da cooperação com
o lançamento de mais dois satélites. Outro projeto de satélite
brasileiro não teve a mesma sorte. O Saci-1 (Satélite Científico)
foi lançado em 1997 e explodiu durante o lançamento do VLS-1.
O Saci 2 foi lançado junto com o CBERS 1 na China e ficou sem
comunicação, se perdendo no espaço.
Desde os anos 60 o Brasil desenvolve foguetes para o lançamentos
de sondas. São foguetes com trajetória balística que não entram
em órbita e ficam na alta atmosfera em cerca de 100 a 500 quilômetros,
podendo chegar até 1000 quilômetros. Esses foguetes fazem uma
trajetória parabólica, atingem o ápice e caem no mar. Já aconteceram
mais de 30 lançamentos. O Brasil criou os projetos Sonda I ao
Sonda IV e agora está desenvolvendo os modelos VS-30 e VS-40.
O último lançamento foi em maio de 2002. O V31 do Projeto Sonda
III partiu do Centro de Lançamento da Barreira do Inferno levando
projetos para a pesquisa da ionosfera para telecomunicações à
distância.
A diferença entre lançar uma sonda e um satélite é o direcionamento.
Para carregar satélites é preciso um direcionamento de controle.
Os outros tipos de foguetes em desenvolvimento para essa área
são os VLS. O Brasil realizou dois lançamentos de VLS que não
foram bem sucedidos. Os testes começaram na década de 80. Em 1984,
foi lançada uma versão reduzida para teste, o VLS R1, que teve
problemas na propulsão. Em 1989, foi lançada outra versão reduzida
do VLS, o VLS R2, que também teve problemas mas os resultados
considerados bons para os estudos. Em 1997, aconteceu a primeira
tentativa real no lançamento da VLS-1 V01, no Centro de Lançamento
de Alcântara. Uma falha no acendimento fez o foguete se autodestruir
em 29 segundos.
A outra tentativa de lançamento aconteceu em dezembro de 1999.
Este segundo protótipo, chamado VLS-1 V02, também teve problemas.
Desta vez ocorreu uma liberação irregular dos motores do primeiro
estágio, ocasionando uma explosão aos 55 segundo de vôo, que acionou
a separação prematura do segundo e do terceiro estágio. O terceiro
e quarto estágio continuaram em vôo, porém de forma balística,
sem controle. A provável causa da explosão teria sido a entrada
de fogo na interface do propelente. De acordo com a Agência Espacial
Brasileira, estão programados mais dois vôos de VLS. A próxima
tentativa de lançamento deverá acontecer ainda este ano.
Para Eduardo Dorneles, da AEB, os 40 anos de Programa Espacial
Brasileiro serviram para desenvolver uma tecnologia espacial própria
que, para um país com a extensão territorial do Brasil, é muito
importante. Ouro fator positivo apontado por Dorneles é a inserção
do país nas discussões internacionais. O Brasil mantém hoje acordos
de cooperação espacial com vários países, com a França, Argentina,
China, Rússia, Ucrânia, Índia, Estados Unidos e Alemanha. O Brasil
também participa do Projeto da Estação Espacial Internacional,
que prevê a viagem do primeiro astronauta brasileiro, o Major
Pontes, hoje em treinamento na Nasa,
em Huston, nos EUA. Ele deve embarcar em um ônibus espacial no
próximo ano. A estação está sendo montada e deve estar pronta
em 2005. Depois da primeira viagem de reconhecimento, o Major
Pontes deverá ficar três meses na Estação Espacial.
(G.P.)