O
uso econômico da biodiversidade
O
jornalista Luís Nassif é um dos poucos especializados no noticiário
econômico que consegue ter também uma visão mais ampla e abrangente,
que não se restringe às finanças. Nas composições que faz dos possíveis
cenários econômicos ele não deixa de analisar áreas correlatas que também
são relevantes na economia, como o sistema de Ciência & Tecnologia.
Falando sobre a biodiversidade brasileira à Com Ciência, Nassif
salientou a importância "da integração de esforços das universidade,
laboratórios nacionais, entidades financiadoras de pesquisa e empresas".
Para ele, o ideal é que as empresas que façam uso econômico da biodiversidade
seja nacionais. "Se vier uma empresa estrangeira aqui e usar a capacidade
nacional, isso não é tão bom como se fosse uma empresa nacional mas
não é ruim de todo".
Com
Ciência - Como você vê a importância estratégica da biodiversidade para
a economia do país?
Luís Nassif - Pelo que eu tenho conversado com alguns especialistas,
inclusive da área de laboratórios, eles dizem que o Brasil perdeu esse
bonde. O Brasil não conseguiu avançar nessa área. Agora o país tem uma
ampla condição, por conta da biodiversidade interna, com um começo de
pesquisas que está sendo feita e por conta do próprio marketing brasileiro
feitointernacionalmente. Tem a questão da Amazônia e do Pantanal que
são muito fortes. Então, existem algumas empresas nacionais que começam
a buscar mercado lá fora investindo nessa área. Eu não tenho condições
de dizer até que ponto qual vai ser o espaço ocupado pela biotecnologia
nesse período e se o fato de você deter a biodiversidade vai ser suficiente
para garantir o controle dos processos. Agora, o que está claro é que
tem que ter um enfoque muito pesado inclusive com apoio financeiro,
creditício, uma integração de esforços das universidade, laboratórios
nacionais, entidades financiadoras de pesquisa e de empresas também.
Para ser uma indústria forte nessa área.
Com
Ciência - Do que você conhece do sistema de pesquisa nacional, você
acha que o Brasil tem condições tecnológicas para fazer uso econômico
da biodiversidade?
Nassif - A tese de mestrado da minha mulher foi sobre fitoterapia.
Eu andei levando no meu programa (Dinheiro Vivo, na rede Gazeta) alguns
projetos aprovados pela Finep e a contribuição está sendo muito grande.
Desde coisas mais simples como a padronização do sistema de secagem
das plantas até o desenvolvimento de substâncias naturais para os laboratórios.
Acho que a base de pesquisadores a gente tem. O ponto é se criar o clima
adequado, por que se exige investimento e pesquisa. O setor privado
brasileiro, além de não ter muito folego, não tem tradição de investimento
nessa área. Então, o mais importante agora é criar o ambiente econômico
adequado, para poder canalizar essas pesquisas em produtos. Base de
pesquisadores nós temos, todo esse investimento em mestrados e doutorados
criou uma base relevante de pesquisadores. Então, temos que criar o
ambiente adequado para amarrar essas pesquisas para geração de produtos
pela indústria nacional.
Com
Ciência - Se as empresas nacionais não forem capazes de explorar economicamente
a biodiversidade brasileira você acha que essa tarefa pode ser passada
para empresas estrangeiras?
Nassif - Vai acabar tendo que ser passada. Mas o ideal seria que
as empresas fossem nacionais. Mesmo se vier uma empresa estrangeira
aqui e usar a capacidade nacional, isso não é tão bom como se fosse
uma empresa nacional mas não é ruim de todo. O que precisa é a universidade,
os institutos de pesquisa, se prepararem para criar uma legislação que
assegure pelo menos que o desenvolvimento de conhecimentos gere patentes
e permita que haja um avanço da ciência no Brasil como um todo. Para
que o país não seja meramente um distribuidor de mão de obra de pesquisa.
Aí a universidade teria que ter mais flexibilidade. O ideal é que o
projeto de pesquisa seja comandado de dentro da universidade com visão
de mercado, obviamente. Porque se os laboratórios internacionais chegarem
aqui, usarem os laboratórios de pesquisa da universidade, os pesquisadores
e detiverem o controle da pesquisa ficar com laboratório internacional
não assimilaremos o conhecimento para poder avançar nessa área.
Com Ciência - Se esse setor se desenvolver pode ser capaz de alavancar
a economia nacional?
Nassif - Olha, eu não digo ser o motor da economia, mas pelo que
eu ouvi falar... Eu estava coversando com o Bandeira de Melo, presidente
da Abifarma (Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica), e ele
montou um fundo de investimentos para investir em empresas que tem potencial
de desenvolver sistemas e processos para biotecnologia. É isso que me
faz acreditar, eu digo a partir da conversa com esse especialista que
esse mercado tende a ter uma relevância. Hoje a indústria farmacêutica
os laboratórios tem um peso na economia mundial extraordinário. Se o
novo paradigma é a biotecnologia e se o Brasil conseguir se posicionar
adequadamente, pode ter um peso muito importante, internamente.
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Com
Ciência - Você é muito crítico em relação ao papel da imprensa
nacional. Com relação às questões da biodiversidade, você acha que a
imprensa nacional tem dado relevância para isso?
Nassif - Não. Relavância que eu digo é ter uma cobertura sistemática,
das possibilidades, etc. A discussão está muito restrita a aspecto de
segurança nacional. Quando se fala em segurança nacional, grande temas
assim, eles dão manchetes. Agora, trocar em miúdos os processos econômicos,
quais são eles, os agentes que tem que entrar, quais são as necessidades
para a criação do ambiente econômico... Aí já entra numa visão mais
especializada que a imprensa não tem tido coragem nem competência até
para entrar.
Com Ciência - A questão da biodiversidade também tem um paradoxo que
é distância física das universidades dos sistemas mais importantes.
Você acha que isso pode ser um empecilho?
Nassif - Podem se criar campi avançados. Mas não sei se essa
presença física das universidades é relevante A gente tem uma visão
da universidade aqui, que é muito presa aos muros da escola, ao sistema
as classes, aos espaços. Para cada classe vai cada aluno, cada departamento.
E hoje em dia não é mais isso, a universidade tem que sair fora dos
limites do campos e se mandar. Eu acho que é importante uma universidade
como a Unicamp, fazer um planejamento, reservar uma verba, conseguir
um apoio e montar o campus avançado.