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Historiador da ciência diz que teoria do tudo não desbancará Einstein
Pietro Greco

 

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Historiador da ciência fala de Einstein no contexto da física moderna

 

Graduado em química, Pietro Greco é também jornalista, escritor e diretor do curso de mestrado em comunicação da ciência, da Escola Superior de Estudos Avançados (Sissa, na sigla em italiano), localizada em Trieste, Itália. Autor dos livros Hiroshima. A física conhece o pecado e O sonho de Einstein, entre outros, o pesquisador vem dedicando parte de sua carreira aos estudos sobre a história da ciência e da tecnologia no século 20. Sobre as teorias de Einstein que celebrizaram o físico, em entrevista à ComCiência, Greco afirma que a da relatividade se tornou mais conhecida por ser o final de uma jornada, ao contrário da do efeito fotoelétrico, que iniciou uma nova linha de pesquisas.

ComCiência - O nível de acurácia atingido por diversos experimentos recentes da física é muito alto, requerendo, às vezes, investimentos astronômicos. Pode-se dizer que a física foi pioneira numa nova maneira de fazer ciência, a ‘big science’?
Pietro Greco - Não há dúvidas de que a física experimental precisa de grandes investimentos ou grandes grupos. Trata-se realmente de grande ciência. No entanto, somente a física de altas energias e a física do espaço são ‘big science’. Muitas outras dimensões da física experimental — entre elas, a física da matéria condensada — não necessitam necessariamente de grandes grupos ou investimentos.

Por outro lado, a física teórica, em algumas áreas, como a teoria de cordas, não requer diretamente tantos recursos. Mas depende de verificações experimentais que hoje superam nossas possibilidades tecnológicas. É necessária uma física tão ‘grande’, que ninguém pode imaginar. Isso é um problema.

ComCiência - Do ponto de vista epistemológico, a física costumava servir como modelo para as outras ciências naturais. Isso ainda é verdadeiro para os diferentes saberes que, cada vez mais, reivindicam um status científico?
Greco - A física, devido à estrutura matemática de suas teorias, é um modelo para muitas ciências naturais que estudam sistemas não-biológicos. Para estudar sistemas biológicos e culturais são necessários outros aparatos epistemológicos, nos quais a história (contingência) desempenha um papel fundamental.

No entanto, a biologia e a física não são independentes, e sim domínios das ciências naturais conectados. Elas são epistemologicamente autônomas, mas não independentes. A física tem forte conexão com a biologia. Os sistemas biológicos sempre respeitam as leis da física. Mas a física não pode nos explicar suficientemente os sistemas biológicos. Na biologia, precisamos de mais.

ComCiência - Num tempo em que as questões mais ambiciosas da ciência exigem ‘big science’, interdisciplinar por natureza, o papel da física tende a ser redimensionado?
Greco - Na arena interdisciplinar, todas as disciplinas, por definição, têm de ser redimensionadas. Mas em muitas questões ambiciosas da ciência, como a ‘big science’ da mudança climática, a física, com suas teorias e sua epistemologia, desempenha um papel fundamental. Obviamente, outras disciplinas, como a geoquímica e a ecologia, também desempenham um papel importante. Cada uma com seus modelos e sua epistemologia. Conceber uma pesquisa realmente interdisciplinar não é nada simples. E também é raro.

ComCiência - Muitos testes importantes das teorias de Einstein aguardam financiamento. A física do século XXI permanecerá, basicamente, einsteiniana?
Greco - Einstein não matou Newton. Ele produziu uma teoria mais geral que a teoria da gravitação de Newton. Agora, buscamos uma teoria mais geral que a relatividade de Einstein, a teoria de tudo. Quando tivermos a teoria de tudo, a teoria de Einstein permanecerá válida, dentro de um contexto definido.

ComCiência - Seria necessário um novo Einstein para gerar uma teoria de tudo? Há diferenças entre as condições em que a relatividade e a mecânica quântica foram desenvolvidas e as condições atuais, quando se tenta unificar conceitos que geraram campos inteiros de conhecimento?
Greco - Sim, seria necessário um novo Einstein — seja um único indivíduo, seja um grupo — para elaborar a teoria de tudo. As condições sob as quais a física e a ciência em geral evoluem são sempre diferentes. Justamente porque evoluímos hoje sob condições diferentes é que tentamos unificar a mecânica quântica e a relatividade geral.

ComCiência - Por que é tão difícil juntar as duas pontas? Se e quando essa unificação acontecer, teremos explicado o universo?
Greco
- A dificuldade nasce, creio, da falta de matemática. Da mesma forma como, entre 1908 e 1916, Einstein encontrou dificuldades para formular a relatividade geral pela falta da matemática. Mas a unificação não explicará o universo. Ele é tão grande, que é impossível encerrá-lo numa única teoria, por mais geral que ela seja.

ComCiência - A relatividade se tornou mais famosa que o efeito fotoelétrico, pelo qual Einstein recebeu o Prêmio Nobel. Por quê?
Greco
- Com a relatividade, a restrita e depois a geral, Einstein chegou ao fim de uma jornada. E elaborou uma nova teoria da gravitação. Já com o trabalho sobre o efeito fotoelétrico ele contribuiu para iniciar uma jornada, a da mecânica quântica. Por isso, a relatividade ficou mais conhecida.

ComCiência - Seguindo as idéias de Karl Popper, apesar de sua ampla aceitação, tudo o que se pode dizer sobre as teorias de Einstein é que elas não foram refutadas ainda?
Greco
- Teorias, como Einstein escreveu, são construções livres da mente humana. Elas representam uma boa aproximação da realidade natural, e não uma descrição definitiva dessa realidade. Elas ‘preservam’ os fatos e não descrevem a realidade última. Então, acho que Popper tem razão: tudo o que podemos dizer é que as teorias de Einstein ainda não foram refutadas.

ComCiência - É possível aproximar a física contemporânea do público geral? Ou ela continuará a fascinar pelo ‘mistério’, como Einstein disse para explicar o sucesso da relatividade?
Greco
- Einstein disse, também, que a base conceitual da relatividade pode ser compreendida pelo público geral, mesmo que o público não compreenda a matemática da relatividade. Somente os especialistas precisam da matemática para compreender plenamente esse aspecto. O biólogo Stephen Jay Gould compartilhava dessa idéia: a base conceitual da biologia pode ser compreendida pelo público geral. E o que valia para a relatividade de Einstein e vale para a biologia contemporânea, é verdadeiro também para a física contemporânea.

Naturalmente, para entender as bases conceituais da ciência, o público geral precisa de ‘bons livros’. Cientistas e jornalistas especializados na cobertura de ciência devem escrever livros e artigos numa linguagem inteligível, atuando no sentido de captar a atenção e provocar a curiosidade do público geral. Einstein e Gould o fizeram.





Atualizado em 10/03/2005

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