Reportagens






Editorial:
O petróleo é nosso
Carlos Vogt
Reportagens:
Petróleo: fonte renovável de guerras
Países da Opep vivem constantes instabilidades
Quebra do monopólio divide interesses
Participação do petróleo na matriz energética brasileira
História do Petróleo no Brasil
Pesquisa petrolífera do Brasil na fronteira do conhecimento
Royalties de petróleo: sustentabilidade ou barganha política?
O petróleo e a agressão ao meio ambiente
Setor de petróleo recebe apoio de grandes programas
Mercado competitivo requer profissional mais capacitado
Bacia sedimentar do Amazonas é a terceira em produção de petróleo
As mil e uma utilidades de um líquido negro que vale ouro
Artigos:
Mudança institucional e política industrial no setor petróleo
André Tosi Furtado
A base legal do novo setor de petróleo no Brasil
Natália A. M. Fernandes Vianna
Abertura e política de preços no setor de petróleo
Adriano Pires e Leonardo Campos Filho
Petróleo: por que os preços sobem (e descem)?
Adilson de Oliveira
O combustível automotivo no Brasil
Luiz Pontes
O fim do petróleo e outros mitos
Newton Müller Pereira
Conhecer as incertezas: o desafio da indústria do petróleo
Saul B. Suslick
A indústria petroquímica brasileira
Saul Gonçalves d'Ávila
CT-Petro: novo instrumento de política no setor petrolífero nacional
Adriana Gomes de Freitas
Poema:
Hercúleo
Carlos Vogt
|
Créditos
 
Petróleo: fonte renovável de guerras


"O controle pelo controle dos recursos naturais voltou ao palco principal da geografia". A afirmação de Michael Klare, titular da cadeira de Paz e Segurança Mundial no Hampshire College e na Amhrest University, nos Estados Unidos, foi feita em seu livro "Resource Wars: the new landscape of global conflict". Klare argumenta que guerras como a do Golfo, a operação no Afeganistão e a anunciada intervenção no Iraque, pelo Estados Unidos, situam-se entre as disputas pelo controle de um recurso natural estratégico e fundamental: o petróleo.
Na opinião de Klare, uma boa parte das guerras de conquista e posicionamento estarão marcadas pelo controle geo-estratégico de recursos como os energéticos, os sistemas aqüíferos, minerais e florestais.

Guerras como a do Yom Kippur (1973), Irã x Iraque (1980-1988) ou a do Golfo (1991) são diretamente relacionadas às disputas pelo petróleo por vários intelectuais. Mas nem todos concordam que a causa fundamental seja o petróleo. Para o geógrafo Nelson Bacic Olic, o petróleo foi um dos elementos da Guerra do Golfo, mas não o único. "Saddam Hussein invadiu o Kwait também porque não reconhece que haja ali uma fronteira. A questão é que as fronteiras que conhecemos hoje no Oriente Médio, assim como as dos países africanos, são fronteiras artificiais, que vêm sendo feitas, por exemplo, pelos europeus desde o período colonial", diz Olic. Para ele, outra razão importante para essa guerra, e também para a anterior contra o Irã, é a necessidade do Iraque de uma saída mais ampla para o mar. "A única saída do Iraque é pelo estuário comum entre os rios Tigre e Eufrates, chamado Chatt-El-Arab. Uma das razões dessas guerras foi a tentativa do Iraque de ampliar seu espaço para a exportação", diz o geógrafo, que acredita também que os futuros conflitos no Oriente terão muito menos a ver com petróleo e muito mais com água.

A opinião é de certa forma compartilhada por Saul Suslick, diretor do Cepetro (Centro de Estudos do Petróleo) da Unicamp. Para ele, cada vez mais existe um esforço mundial para uma menor dependência do petróleo. Nos Estados Unidos, ao mesmo tempo que existe a preocupação de diversificar as fontes de energia, há um estoque de petróleo e seus derivados e uma campanha para explorar petróleo em territórios norte americanos não explorados. Suslick argumenta que por esse motivo e pela menor importância que o petróleo assume hoje, se comparado a década de 70, dificilmente poderá ocorrer um novo choque nos preços do petróleo. "O petróleo ainda ocupa uma agenda de preocupações, mas cada vez mais os conflitos estarão vinculados a outras questões, como a água, por exemplo", afirma Suslick.

Para Nelson Bacic, o mundo hoje é menos dependente do Oriente Médio também porque existe uma outra área muito promissora para exploração do petróleo: a região que bordeja o Mar Cáspio. "O Azerbaijão é conhecido atualmente como o novo Kwait. Junto com o Cazaquistão e o Turcomenistão possui mais petróleo que o Golfo Pérsico. A fronteira das regiões produtoras de petróleo está se deslocando para a Ásia Central", diz Bacic.

Ambições das potências do mar Cáspio
(Projeções e metas estratégicas para 2010)

Países Petróleo (1) Exp. Petróleo (1)
Azerbaijão 1,2 1
Cazaquistão 2 1,7
Turcomenistão 0,2 0,15
Fonte: Energy Information Administration, www.eia.doe.gov
Notas: (1) Milhões de barris diários

O Programa Traceca (Transport Corridor Europe, Caucasus, Asia) confirma essa idéia. Lançado numa conferência em Bruxelas em 1993, o programa pretende desenvolver um corredor de transporte, num eixo leste oeste, cruzando o Mar Negro através do Cáucaso e do Mar Cáspio até a Ásia Central. Com assistência técnica e financeira da União Européia e do Banco de Desenvolvimento da Ásia, o sistema de transporte deverá incluir rodovias, ferrovias, portos e oleodutos num trajeto ainda não definido, pela Ucrânia, Bulgária, Moldova, Romênia, Turquia, Georgia, Azerbaijão, Turcomenistão, Uzbequistão, Tadjiquistão e Kirquistão.

Segundo texto do jornalista e historiador José Arbex, para a revista Caros Amigos, o Traceca será um componente fundamental de estruturação da Eurásia no século XXI, como eixo de transporte de petróleo ou corredor de mercadorias. Para Arbex, o traçado da futura rota ajuda a compreender o interesse americano pelo Afeganistão, uma região de acesso entre o extremo asiático, o Oriente Médio e a Europa, e os conflitos entre a Índia e o Paquistão pela região da Caxemira, que pode se tornar um dos pontos de passagem da rota.

Mesmo que esteja ocorrendo esse deslocamento de interesses para a Ásia Central, atualmente o foco de tensão relacionado ao petróleo ainda é o Oriente Médio. De acordo com o Relatório Nacional de Política Energética do Estados Unidos de 2001 (Report of the National Energy Policy), o abastecimento norte-americano depende das reservas do Golfo Pérsico e coloca como prioridade o acesso dos Estados Unidos a essas reservas.

Segundo Michael Klare, o Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos declarou em 1999, que os norte americanos continuariam tendo um interesse vital em assegurar seu acesso aos suprimentos de petróleo no exterior e, neste sentido, deveriam conscientizar-se da necessidade de estabilidade e segurança regionais em áreas chave de produção, a fim de assegurar esse acesso aos recursos e sua livre circulação. Ainda segundo Klare, o presidente Jimmy Carter em 1980 afirmou que qualquer intenção de potências hostis para a interrupção da circulação de petróleo do Golfo Pérsico seria considerado como um ataque aos interesses vitais dos Estados Unidos, que poderia ser reprimido por qualquer meio necessário, incluindo a força militar.

Após o ataque de 11 de setembro ao World Trade Center foi aberto um precedente contra o terror que relaciona-se também com a necessidade "vital" norte-americana pelo petróleo. Não apenas o Afeganistão é um ponto de passagem estratégico, mas o Iraque, atualmente ameaçado pelos norte americanos, detém uma reserva potencial de petróleo que, em tese supera, as atuais reservas da Arábia Saudita principal fornecedora dos Estados Unidos.

De acordo com o estudo "Panorama do Petróleo e Gás 2002", realizado pela empresa italiana ENI (Ente Nazionale Idrocarburi), o Iraque é o país com maior disponibilidade de reservas, para um total de 130 anos, seguido pelo Kuwait, com reservas para 123 anos, os Emirados Árabes Unidos, para 105 anos, a Arábia Saudita, para 81 anos, e Venezuela, para 67 anos.

Países Reservas Comprovadas Produção Exportação
Iraque 112.500 milhões de barris 2,593 milhõesde barris diários 1,710 milhõesde barris por dia
Arábia Saudita 262.697 milhões de barris 7,888 milhõesde barris diários 6,035 milhõesde barris por dia
Fonte: Organization of the Petroleum Exporting Countries www.opec.org

De acordo com a Energy Information Administration, o Iraque, antecipando uma eventual suspensão das sanções econômicas impostas pela ONU e pelos EUA desde o final da Guerra do Golfo, assinou acordos com companhias da Rússia, França e China sobre as reservas potenciais de petróleo e gás, que serão efetivados quando as sanções forem suspensas. Segundo Michael Klare, os dissidentes americanos escolhidos por Washington para liderar o novo regime de Bagdá, após eventual queda do ditador iraquino, ameaçaram cancelar todos os contratos com os países que não auxiliarem na derrubada de Saddam Hussein.. O professor de Paz e Segurança Mundial Michael Klare afirma que o controle sobre as reservas potenciais iraquianas será estratégico no século XXI e prevê, que independente dos resultados das atuais inspeções da ONU no Iraque, uma invasão norte americana nesse país ocorrerá no máximo na terceira semana de fevereiro de 2003. Mesmo que existam outros elementos importantes entre os motivos para alguns conflitos, o petróleo, fonte não renovável de energia, continuará sendo na sua história, uma fonte constante de guerras.

(MK)

 
Anterior Próxima
Atualizado em 10/12/2002
http://www.comciencia.br
contato@comciencia.br

© 2002
SBPC/Labjor
Brasil