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Notícia é destaque hoje e esquecida amanhã

A memorização das informações veiculadas nos meios de comunicação tem relação direta com a emoção despertada no receptor (leitor, ouvinte ou telespectador) e com o nível de concentração envolvida na atividade. Mesmo assim, o excesso de informações divulgadas na mídia atualmente, dificulta a absorção do conteúdo e faz com que as pessoas se esqueçam facilmente do que foi veiculado.

"A informação passa muito rápido, dificilmente uma manchete sobrevive a mais de uma semana", afirma o sociólogo e professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), Waldenyr Caldas. O pesquisador considera que a falta de profundidade na abordagem dos temas pelos meios de comunicação contribui para que os assuntos não sejam memorizados. "O leitor passa batido por grande parte das informações com as quais se depara", conclui.

A retenção das informações disponibilizadas nos meios de comunicação está ligada à carga emocional que o assunto desperta nas pessoas. Para o psicólogo Sandro Vieira de Almeida, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, a organização das informações nos meios de comunicação pode estimular a emoção do receptor e, com isso, aumentar a atenção dispensada na atividade. "Quando nos interessamos por algo, nos concentramos mais para realizar a tarefa e, conseqüentemente, aprendemos mais facilmente o conteúdo", afirma Almeida.

O excesso de informação disponibilizada nos meios de comunicação pode resultar no que a teoria da comunicação chama de "disfunção narcotizante". Trata-se de uma disfunção causada pela exposição da massa a uma grande (e narcotizante) quantidade de informações, em que os receptores absorvem as informações sem refletir sobre o assunto. Além da disfunção, outro problema pode ser uma compreensão errônea dos fatos, como ressalta Caldas. "Podem ser criadas muitas versões sobre um mesmo assunto e o fato real se perde", diz o pesquisador.

Informação repetitiva
Mesmo considerando a seleção individual das informações de acordo com interesses próprios, a repetição maciça dessas, característica de nossos meios de comunicação, colabora para que sejam memorizadas de modo coletivo, o que é conhecido como memória coletiva. "Os meios de comunicação reforçam valores, transmitem ideologias, mostram versões do mundo e de seus acontecimentos como se fossem uma única verdade. Eles interferem na construção contínua do imaginário", diz a jornalista e docente da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Denise Siqueira.

Para a Siqueira, é importante que a mídia desenvolva um mecanismo de esquecimento. "Isso faz parte de uma estratégia da produção da informação midiática: o receptor deve obter a informação e esquecê-la superficialmente, pois precisar consumir novas informações", conclui a pesquisadora.

"Hoje em dia, o cérebro tende a evitar o recebimento de novas informações porque nos deparamos com dados novos o tempo inteiro. Há um limite de armazenamento, por isso, tudo o que for considerado como uma informação de curto prazo é eliminada", afirma o docente e pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Dirceu Tavares, que ressalta que, ao contrário das outras formas de comunicação, a mídia publicitária é produzida para ser memorizada a longo prazo.

Para não esquecer: a mídia publicitária
Para permanecer na cabeça dos receptores/consumidores, a publicidade lança mão de uma série de artifícios, sendo que o principal é a repetição da informação, sem que ela se torne exaustiva. É o que Tavares chama de "golpe de baixo impacto", estabelecendo uma comparação com uma luta de boxe, em que o lutador promove uma série de golpes leves no mesmo local o que, depois de um tempo, resulta num grande impacto.

Na mídia publicitária tem igual importância a originalidade no modo como a informação é passada e os sentimentos, emoções e a confiabilidade passadas ao receptor. "Atualmente, temos acesso a tantas informações que nos questionamos quem está certo. É uma questão de acreditar na informação que é passada. Por isso a importância das marcas que, se bem estabelecidas, passam confiança aos consumidores", conclui Tavares.

Dentre as formas que a informação publicitária é veiculada a mais eficiente é por meio da música, já que, de acordo com Tavares, as informações textuais são facilmente esquecidas. "Costumamos dizer que, quando não se tem nenhuma idéia publicitária, a solução é cantar. A música é agradável, chama atenção e tem um efeito muito grande na memoriabilidade", afirma o pesquisador.

Um exemplo significativo - e conhecido historicamente - de repetição de informação na publicidade é chamado de "propaganda subliminar". No caso, são veiculadas mensagens (informações) de maneira rápida e excessiva, percebidas de forma não consciente, e que influenciam as ações subseqüentes dos receptores. "Alguns autores afirmam que outdoors, imagens em formato de videoclip e algumas apresentações incidentais de mercadorias em programas e filmes são exemplos de propaganda subliminar", afirma o psicólogo Almeida.

Novas formas de comunicação
Imagens e textos podem ser memorizados com a mesma facilidade, mas, de acordo com Almeida, na sociedade ocidental moderna, e na brasileira mais especificamente, há um privilégio dos aspectos visuais, principalmente devido ao alto consumo dos produtos televisivos. "Isso faz com que exista uma maior facilidade em memorizar imagens devido a maior exposição e familiaridade das pessoas a esse tipo de informação", afirma.

Para alguns pesquisadores, a internet, o mais novo meio de informação, auxilia a compreensão e, por conseqüência, memorização das informações, mesmo com o excesso de informação veiculada. Isso devido a uma série de artifícios como a interatividade, o uso de imagens e, muitas vezes, os sons. "A internet promove uma maior fixação do conteúdo, pois possibilita que o indivíduo se aprofunde no tema, faça suas próprias combinações e crie seus próprios caminhos", ressalta a jornalista e docente da Universidade Federal de Pernambuco, Ângela Freire Prysthon.

Para Caldas, a internet se tornou um meio eficiente de se documentar o que acontece na sociedade urbana, mesmo que por meio de informações superficiais e passageiras. "A internet revolucionou porque o processo de urbanização da humanidade fez com que o meio urbano industrial se tornasse um grande acontecimento e tudo passou a ser documentado", afirma.

De acordo com Prysthon, estudos das etapas da memória dos receptores eram comum nas décadas de 50 e 60, quando a mídia tinha uma preocupação maior com a retenção das informações veiculadas. Atualmente, alguns trabalhos têm abordado a percepção das informações, apontando possíveis porcentagens do que foi absorvido pelos receptores em alguns meios de comunicação. Mesmo assim, os resultados são questionáveis, já que a absorção dos conteúdos tem relação direta com interesses pessoais dos receptores.

(SR)

 
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Atualizado em 10/03/2004
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