Obras
requerem salvamento arqueológico
Como
a descoberta de sítios arqueológicos é freqüentemente
ocasional, sendo muitas vezes feita por proprietários rurais,
agricultores, construtores ou pedreiros durante suas atividades
de trabalho, muito do patrimônio arqueológico já
foi destruído por falta de conhecimento ou para evitar a
pesquisa no local, considerada um problema para muitos. Quando vestígios
arqueológicos são encontrados em pequenas obras, o
empreendedor tem que contatar o Instituto do Patrimônio Histórico
e Artístico Nacional (Iphan) que realizará estudos
e liberará o local. A demora do Iphan na realização
desses estudos -o que paralisa as obras- é um dos principais
motivos da não notificação e da destruição
proposital. Já para as grandes obras de engenharia (como
hidrelétricas, estradas e construções habitacionais)
há, desde 1986, uma lei que obriga a realização
prévia de um estudo de impacto ambiental (o chamado EIA-Rima)
que inclui medidas de salvamento arqueológico.
A exigência
de EIA-Rima obrigou os empreendedores a desenvolverem estudos e
implementarem medidas minimizadoras de impactos negativos, não
só para os meios físico e biótico, mas também
para o meio sócio-cultural, o que abrange inclusive o patrimônio
arqueológico. Com isso, desenvolveu-se, nos últimos
anos, uma nova modalidade arqueológica no Brasil: a "arqueologia
por contrato". Surgiu, então, a figura do arqueólogo
'profissional liberal', além de empresas especializadas em
prestar consultorias e desenvolver pesquisas no âmbito de
empreendimentos. Dessa forma, a destruição dos sítios,
até então muito freqüente, foi amenizada pelos
salvamentos. É uma forma de proteção parcial
porque não exclui a destruição dos sítios,
mas preserva a informação sobre os materiais neles
encontrados.
Para
Maria Clara Migliaccio, arqueóloga licenciada do Iphan, as
pesquisas arqueológicas desenvolvidas no âmbito da
"arqueologia por contrato" estão trazendo à
pauta novos desafios como, por exemplo, a regulamentação
da profissão de arqueólogo
e a discussão das práticas de campo no chamado "salvamento
arqueológico" dos sítios ameaçados por
obras e empreendimentos. Segundo ela, muito do patrimônio
arqueológico brasileiro já foi perdido e houve muitos
problemas de paralisação de obra, mediante embargo.
Nos casos de omissão e destruição proposital
dos sítios, além de ter que arcar com os custos do
salvamento arqueológico - a remoção das peças
do local -, o empreendedor pode ser responsabilizado e ter que implementar
medidas adicionais compensatórias.
A destruição
de sítios ocorreu em muitos casos porque, quando um sítio
arqueológico é encontrado surgem impedimentos legais
à exploração da área. Isso pode implicar
paralisação de projetos que poderiam empregar as pessoas
de uma região ou, em outro caso, impedimento do cultivo agrícola
de uma propriedade, até que sejam realizados os trabalhos
de salvamento. "Como o Iphan nunca tem verba para diárias,
não tem número de arqueólogos suficiente em
seus quadros, essas questões ficam muito mais complicadas",
diz Martha Maria de Castro e Silva, do Museu de História
Natural da UFMG.
O problema
da demora excessiva para o licenciamento de pesquisas foi um dos
motivos de uma ação movida pela Sociedade de Arqueologia
Brasileira (SAB), entre 1990 e 1991, contra o Iphan. Além
desse problema, uma série de arqueólogos contestava
as autorizações fornecidas pelo Iphan para a pesquisa
nos sítios identificados, que favoreciam alguns poucos pesquisadores
e restringiam a ampliação das possibilidades de pesquisa.
Maria Clara Migliaccio entende a preocupação da SAB
em relação à demora nos processos de autorização
para pesquisas, mas acredita que a pressão da entidade deveria
ter sido direcionada para que o governo brasileiro melhorasse a
infra-estrutura da instituição. Segundo ela, a pressão
resultou numa menor exigência para o licenciamento de novas
pesquisas. "Hoje o Iphan continua com a mesma carência
de estrutura e, para atender a demanda, passou a priorizar os processos
de licenciamento em fase de autorização para as pesquisas,
continuando com poucas condições de realizar um acompanhamento
mais rigoroso dos relatórios e dos resultados". Na opinião
de Maria Clara Migliaccio, a SAB, na época, perdeu a oportunidade
de ajudar a melhorar a estrutura de uma instituição
imprescindível para a proteção do patrimônio
arqueológico brasileiro.
Sítios
são bens da União
Como forma de tornar público e coletivo o patrimônio
arqueológico brasileiro, os sítios arqueológicos
são considerados, desde a Constituição Federal
de 1988, bens da União. A legislação básica
é de 1961, Lei 3924, mas a Constituição de
1988 a redefiniu e a reafirmou. O Iphan, criado em 1937, e atualmente
vinculado ao Ministério da Cultura, é o responsável
legal pela gestão, preservação, fiscalização
e autorização de pesquisa e exploração
dos sítios arqueológicos no Brasil. Além dessa
entidade, outras instituições patrimoniais estaduais
e municipais participam dessa gestão, como é o caso
do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico
(Iepha) de Minas Gerais, ou do Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico
do Estado de São Paulo (Condephaat). Os estados e municípios
podem criar leis relativas ao patrimônio, instrumentos normativos
e portarias, desde que não contradigam a legislação
federal. Nessa gestão, ainda colaboram junto ao Iphan, instituições
de ensino, sobretudo universidades, museus e organizações
da sociedade civil.
(MK)
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