Sustentabilidade
é fundamental para desenvolvimento da aquicultura
reportagem:
Juliana Schober
edição:
Rafael Evangelista
A aquicultura
tem garantido cada vez mais a presença do peixe na mesa do
consumidor. Enquanto muitos estoques pesqueiros naturais já
se encontram em seu limite máximo de exploração,
a produção de pescado pela aquicultura tem aumentado
muito nos últimos anos. Atualmente, este é o setor
de produção de alimentos de maior crescimento no mundo.
O Brasil é um país com grande potencial para o desenvolvimento
dessa atividade, mas enfrenta um grande desafio: utilizar seu potencial
de forma sustentável.
A aquicultura
pode ser definida como o processo de produção em cativeiro,
de organismos com habitat predominantemente aquático, tais
como peixes, camarões, rãs, entre outras espécies.
Apesar de ser uma atividade produtiva muito antiga, o crescimento
mundial da aquicultura, nos últimos anos, tem preocupado
os pesquisadores. Eles dizem que a aquicultura deve ser desenvolvida
de maneira sustentável para que o ambiente seja utilizado
de forma racional e a atividade possa ser praticada por muito tempo.
O professor
da Universidade de Brasília (UnB), Marcel Bursztyn, afirma
que o conceito de sustentabilidade surgiu há pouco tempo,
e tem como idéia central o princípio da precaução,
ou seja, antes do desenvolvimento de uma atividade produtiva deve
ser feita uma avaliação de todos os tipos de impactos
que essa atividade pode causar. A implantação dos
projetos deve ser cautelosa para que não cause danos irreversíveis.
"A tecnologia deve ser usada de forma apropriada e em uma escala
de produção tolerável pela natureza",
diz o pesquisador.
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A
Tilápia do Nilo é espécie exótica
cultivada no Brasil.
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No
caso da aquicultura, as criações exigem água
de boa qualidade em abundância. Se a água utilizada
nessa atividade for poluída, o produtor vai comprometer a
continuidade do cultivo. Para que isso não aconteça,
ele pode investir financeiramente no restabelecimento da qualidade
da água e, assim, continuar a sua produção.
Porém, muitos produtores preferem mudar o empreendimento
de lugar ao invés de gastar dinheiro com o recurso hídrico
que já foi poluído, pois no Brasil a água ainda
é abundante e barata.
Bursztyn
esclarece que o conceito de sustentabilidade vai além da
associação com meio ambiente. Ele explica que o conceito
é mais amplo e não está relacionado apenas
aos aspectos ambientais das produções, mas diz respeito
também às dimensões econômica, social,
cultural, territorial e político-institucional.
Para
ele, a dimensão político-institucional é a
mais importante e precede as demais porque é a que cria as
condições para o desenvolvimento de uma produção
sustentável, direcionando a atividade através de normas,
programas e políticas específicas. Sob o aspecto econômico,
um empreendimento é sustentável quando é capaz
de gerar lucros para os produtores. Mas isso não é
suficiente, e Bursztyn salienta que a sustentabilidade econômica
não depende mais das estratégias puramente econômicas.
Na
dimensão social do conceito de sustentabilidade existe a
preocupação de não prejudicar as populações
envolvidas. "As possibilidades de utilização
da aquicultura para o desenvolvimento social são muito promissoras",
afirma o pesquisador. Para explicar essa dimensão social
ele utiliza o exemplo da instalação de um projeto
moderno em uma região tradicional, como ocorre freqüentemente
na zona costeira. Se a tecnologia apresentada é sofisticada
do ponto de vista tecnológico, existe o risco de que populações
sejam expulsas da região, pois o produto deles não
será competitivo. Muitas vezes, esses indivíduos não
conseguem nem mesmo um emprego na nova atividade e são obrigados
a vender suas posses e migrar para a cidade, potencializando as
conseqüências desastrosas do êxodo rural.
A outra
dimensão apontada por Bursztyn é a territorial. Deve-se
evitar que os empreendimentos sejam concentrados em grandes aglomerações
pontuais do território, o que intensifica os impactos ambientais
locais e pode causar conflitos com as regiões vizinhas.
A última
dimensão envolvida na avaliação da sustentabilidade
dos projetos de aquicultura é a cultural: "É
preciso respeitar as culturas, entendendo que a diversidade social
é uma riqueza", diz o pesquisador.
Certificação
Na
opinião de Newton Castagnolli, professor do Centro de Aquicultura
da Universidade Estadual de São Paulo (Caunesp), as exigências
do mercado externo quanto à certificação de
produtos provenientes de criações sustentáveis
é mais um motivo para investir nessa área. "A
sustentabilidade é importante em qualquer atividade. Uma
atividade sem sustentabilidade não dura muito", afirma
Castagnolli. Para ele, há uma forte relação
entre a a sustentabilidade e a produção com qualidade
ambiental. "Hoje, a exigência maior é a ISO 14000
aplicada à aquicultura, o que significa produzir sem agredir
o meio ambiente. Além de atestar a qualidade do pescado é
preciso atestar também a qualidade do meio ambiente onde
o pescado é produzido", diz o professor do Caunesp.
Para
ele, a aquicultura está enfrentando um grande impasse no
momento. "O caminho é expandir a atividade pela industrialização.
Mas, para isso, a sustentabilidade é imprescindível.
Para atender ao mercado interno e até mesmo ao mercado externo,
se não houver um sistema de rastreabilidade no processo produtivo,
não haverá compradores." A rastreabilidade garante
a qualidade dos produtos, informando os consumidores sobre todas
as etapas envolvidas na produção, desde onde o peixe
foi criado até o local da venda. Tanto o Brasil, como o mercado
externo (principalmente de países de maior poder aquisitivo),
estão cada vez mais exigentes nesse sentido.
Bursztyn
também ressalta que o controle de qualidade terá que
ser cada vez mais rigoroso. "Fatalmente ocorrerá a cobrança
da qualidade ambiental. O diferencial 'qualidade ambiental' pesa
e vai pesar cada vez mais, sobretudo a partir do momento em que
o país tiver competitividade nos custos", complementa.
Castagnolli
admite que o cuidado com o meio ambiente é imprescindível,
mas diz que o excesso de cuidados pode ser prejudicial ao desenvolvimento
da atividade, do ponto de vista legal. Para ele, o problema ambiental
da aquicultura não é tão grave quanto se propaga:
"Existem muitos problemas em relação à
licença ambiental, que 'atravanca' nossa aquicultura por
excesso de zelo e falta de conhecimento". Ele diz que no estado
de São Paulo, por exemplo, há tantas restrições
que o pequeno proprietário fica impedido de desenvolver a
aquicultura. "Geralmente, as pessoas que avaliam esses projetos
não conhecem aquicultura, e fazem recomendações
precipitadas. Eu concordo, e muito, que é preciso respeitar
o meio ambiente, mas sem exageros", destaca Castagnolli.
Clique
aqui
e veja quais são as principais espécies criadas
no Brasil.
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Na
opinião de Bursztyn, o grande entrave para o Brasil desenvolver
a aquicultura sustentável é o não cumprimento
das leis ambientais. "O problema do Brasil é, por um
lado, normativo e, por outro, fazer com que as normas sejam cumpridas.
O problema normativo não é tão grave, pois
nossa legislação ambiental evolui com certa dinâmica
e rapidez. O problema é fazer com que as normas sejam cumpridas",
afirma.
O "ambientalmente
sustentável" tem predominado nos debates sobre aquicultura.
Apesar de esses debates ainda não terem gerado medidas práticas
de grande amplitude, pelo menos no Brasil, uma coisa já é
certa: a produção sustentável é um quebra-cabeça
de muitas peças, e que todas tem que ser muito bem conhecidas
para poderem ser ordenadas. O problema é que os estudos sobre
sustentabilidade ainda estão muito voltados para os aspectos
ambientais das produções. Os aspectos sócio-econômicos,
por exemplo, são pouco conhecidos e pouco estudados.
Para
Bursztyn, isso deve-se ao fato de que as universidades brasileiras
ainda estão impregnadas com uma cultura institucional de
que o pesquisador precisa ser cada vez mais competente em um campo
específico do saber. Segundo ele, faltam pessoas com uma
formação multidisciplinar, o que é fundamental
para desenvolver atividades sustentáveis. "É
preciso reconhecer as instituições que sejam de fato
interessadas na generalidade, não no sentido pejorativo.
Pessoas que tenham uma visão abrangente do tema. Nas universidades,
deve haver espaço para colocar lado a lado engenheiros, sociólogos,
biólogos e economistas. Tem que ter o especialista, mas também
o generalista", conclui Bursztyn.
Divisão
mundial da produção em aqüicultura
|
Posição |
País |
Quantidade Produzida (ton) |
% |
1 |
China |
24.030.313 |
66.7 |
2 |
Índia |
1.776.450 |
4.9 |
3 |
Japão |
1.339.861 |
3.7 |
11 |
Estados Unidos |
438.331 |
1.2 |
12 |
Chile |
375.113 |
1.0 |
18 |
Equador |
135.297 |
0.4 |
25 |
Brasil |
70.480 |
0.2 |
|
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