Entrevistas Modelo econômico impede melhoria das políticas públicas Avaliação
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Modelo econômico impede melhoria das políticas públicas Para o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda, professor titular do Instituto de Economia da Unicamp e editor da revista Carta Capital, estamos vivendo um fenômeno de decomposição do capitalismo, uma crise da atual forma de articulação da economia mundial, e uma recuperação crítica dos pontos centrais que construíram o Estado de Bem Estar e a sua relação com o crescimento econômico. Belluzzo argumenta que a atual configuração do capitalismo não permite melhorar a qualidade das políticas sociais públicas, principalmente nos países em desenvolvimento que vivem a competição "perversa" de implantar condições de proteção social menos efetivas para atrair capitais. O economista afirma a necessidade de revalorização do âmbito público e da compreensão de que sem isso a economia de mercado não funciona. Luiz Gonzaga Belluzzo abordou esses pontos na entrevista que concedeu à ComCiência.
ComCiência - Que impactos o atual quadro sócio-político, caracterizado
pela globalização, reestruturação produtiva e neoliberalismo, tem sobre
as políticas sociais públicas? No caso das políticas públicas dos países em desenvolvimento, apesar da retórica em favor da redução da pobreza, e até do aumento de gastos sociais, o efeito da operação da economia em baixo crescimento gerou mais pobreza do que o aumento dos gastos era capaz de absorver. Nós estamos vivendo, nesse momento, uma crise desse modelo e dessa forma de articulação da economia mundial. A outra conseqüência é que o crescimento mundial ficou muito dependente do que acontece com os Estados Unidos. Há, hoje, uma economia americanocêntrica, com as fontes de crescimento excessivamente concentradas nos Estados Unidos. Quando a economia entra numa fase recessiva é óbvio que o resto dos países, com essa articulação, com essa forma de organização da economia mundial que aí está, não consegue restabelecer formas de organização que superem alguns obstáculos e que: primeiro, imponham restrições ao movimento de capitais - que perturba as políticas econômicas -; segundo, que redistribuam o poder econômico de modo o ultrapassar essa limitação imposta pela concentração nos Estados Unidos e; terceiro, superem a incapacidade crescente dos Estados nacionais de executarem suas políticas. ComCiência - As teses neoliberais questionam o excesso de proteção
social do modelo de Estado de Bem Estar social. Qual sua opinião sobre
essa idéia? A proteção é um obstáculo para o crescimento econômico e para
a criação de empregos? O colapso da bolsa mostrou que o modelo americano dos fundos de pensão é inviável como, na verdade, a quebra de 1929 já tinha mostrado. O sistema ideal é o de repartição simples e não o de capitalização. Isso já é uma coisa decretada, ainda que no Brasil, por incrível que pareça, tenha gente atrasada em relação a isso. O que se tem, de fato, é um fenômeno de decomposição desse capitalismo destrambelhado, uma recuperação crítica dos pontos centrais que construíram o Estado de Bem Estar e a sua relação com o crescimento econômico. É isso o que estamos observando nesse momento. ComCiência - Que tipo de política de proteção social é viável a partir
da transição que vivemos, essa nova concepção de Estado? É claro que tivemos distorções na execução da idéia do Estado de Bem Estar, tivemos um desequilíbrio em que até os setores sociais mais poderosos tiveram uma cobertura melhor. Mas há algumas questões que já são definitivamente resolvidas, como por exemplo o caráter universal das políticas de saúde e educação. No caso do Brasil, essa idéia não vingou ainda. As políticas de educação são deficientes porque caíram os gastos, caiu a participação no orçamento de setores como saúde e educação. Houve uma falta de sincronia nos movimentos. O desemprego e o baixo crescimento aumentaram a demanda por esses serviços. Mas a oferta cresceu muito lentamente. A idéia neoliberal é a de focalização das políticas para determinados setores da sociedade e, na minha opinião, isso é impossível em um país como o nosso. Acontece que, com a focalização das políticas nos pobres você dessolidariza uma parte da população. No caso, a classe média brasileira é absolutamente indiferente, pelo menos era até pouco tempo atrás, ao destino das políticas públicas porque conseguia se resolver com o lado privado. Mas isso já não é mais possível. A classe média depende cada vez mais das políticas públicas. Essa é uma transição que tem dois níveis, um é o nível da execução, da melhoria das políticas. Outro é um nível subjetivo: as pessoas precisam revalorizar o setor público e entender que, sem um âmbito público importante, a economia de mercado não funciona. ComCiência - Como o senhor avalia os programas como o de Renda Mínima
ou Bolsa Escola e programas que oferecem renda àqueles que prestam serviços
sociais? Em um país como o Brasil, programas como esses devem ter caráter
emergencial ou permanente? Pode-se dizer que esses programas promovem
a inclusão social de fato?
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Atualizado em 10/10/02 |
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