Entrevistas
Modelo econômico impede melhoria das políticas públicas
Luiz Gonzaga Belluzzo
Avaliação
das políticas públicas é objeto de pesquisa
Marta Arretche
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Avaliação
de políticas públicas é objeto de pesquisa
A cientista política Marta Arretche vem desenvolvendo importantes
pesquisas na área de avaliação de políticas
públicas no Brasil, principalmente políticas sociais. Ela
acredita que o interesse acadêmico no funcionamento do Estado brasileiro
permite avançar no conhecimento sobre a nossa realidade. Para ela,
as pesquisas empíricas permitem superar as interpretações
baseadas num reduzido conhecimento efetivo e. essas pesquisas podem auxiliar
aos que operam a máquina pública. As pesquisas que Arretche
e outros pesquisadores da área vêm desenvolvendo também
podem fornecer base de informação para a gestão do
Estado. Atualmente, a pesquisadora se dedica à pesquisa e ensino
na Universidade do Estado de São Paulo (Unesp), campus de Araraquara.
ComCiência
- É possível "medir" a eficiência das políticas
públicas adotadas no Brasil? A senhora poderia explicar como isso
é feito e salientar as principais etapas? Quais fontes de dados
podem ser consideradas seguras para a avaliação das políticas
adotadas no Brasil?
Marta Arretche - É preciso, em primeiro lugar, saber o que
se entende por "medir" a eficiência de uma política.
Na linguagem de avaliação de políticas, convencionou-se
dizer que a eficiência de uma política está associada
à relação entre o esforço para implementá-la
e os resultados alcançados. Há técnicas estatísticas
de avaliação de eficiência que permitem estimar esta
relação, sim. É claro que são sempre aproximações
e estimativas que dependem em grande parte da confiabilidade das informações
e dados com os quais se conta. A confiabilidade e disponibilidade dos
dados, por sua vez, varia muito em função da política
pública em questão. Nas áreas de saúde e educação,
por exemplo, nós temos muito mais informação disponível
do que possibilidade de analisá-la. Em outras áreas, há
uma grande deficiência de informações, o que obriga
o investigador a trabalhar com dados aproximativos. Não é
possível listar uma fonte ou fontes seguras de dados. A utilidade
dos dados disponíveis depende muito da política e do problema
em questão. Mas é certo que no Brasil avançamos muitíssimo
nos últimos anos no que diz respeito à quantidade, qualidade
e confiabilidade dos dados disponíveis para pesquisas de avaliação.
ComCiência
- Qual a importância social e econômica de se conhecer os
resultados das políticas públicas adotadas no Brasil?
Arretche - Há uma importância política fundamental,
que é de ordem democrática. Ao implementar políticas
públicas, o governo gasta dinheiro que não é seu,
mas do contribuinte. Assim, a avaliação de políticas
públicas é a forma pela qual o governo pode prestar contas
à sociedade pelo uso de recursos que são públicos.
Do ponto de vista do cidadão, a avaliação permite
o controle social sobre o uso de recursos que são, em última
instância, da sociedade. Em segundo lugar, o emprego mais eficiente
de recursos públicos implica, na prática, a maximização
de recursos, na medida em que tem como conseqüência, que um
maior número de beneficiários pode ser atingido com um mesmo
volume de recursos. Somente avaliações tecnicamente bem
feitas podem responder com segurança a questões desta natureza.
ComCiência - As avaliações que vêm sendo
feitas atualmente no Brasil são eficientes? Como estão as
pesquisas acadêmicas sobre a avaliação de políticas
públicas no Brasil? Como os resultados dessas pesquisas podem otimizar
as avaliações?
Arretche - É impossível falar "das avaliações"
em geral, como que se elas fossem um conjunto homogêneo. Há
boas e más avaliações, assim como há avaliações
objetivas e avaliações inteiramente tendenciosas. No Brasil,
há um interesse crescente nessa área de investigação
e há excelentes equipes tanto no meio acadêmico como em institutos
independentes de pesquisa, assim como em órgãos do governo.
Têm se multiplicado as equipes de avaliação, assim
como os seminários, encontros e cursos nessa área. As avaliações
sobre os resultados das políticas aplicadas indicam que há
uma relação positiva entre a credibilidade da fonte e a
aceitação da avaliação. Também a utilidade
das avaliações depende em grande parte da percepção
sobre quem as realiza e da influência do receptor interno ao órgão
governamental que está sendo avaliado. Por fim, considera-se que
a forma pela qual a informação sobre a avaliação
é compartilhada entre os vários atores interessados é
de fundamental importância para a influência que os resultados
da avaliação possam vir a exercer. Em tese, uma avaliação
é considerada boa quando é útil (isto é, refere-se
a uma política de relevância), é oportuna (isto é,
é realizada em tempo hábil); é ética (isto
é, foi realizada com critérios e medidas justos e apropriados)
e é precisa (isto é, empregou procedimentos adequados).
ComCiência
- A importância dada nos países do primeiro mundo para a
avaliação das políticas públicas adotadas
é maior que nos países do terceiro mundo? Por quê?
Arretche - Penso que a diferença mais importante diz respeito
à longevidade dos regimes democráticos, isto é, a
tradição de avaliação diz menos respeito ao
nível de riqueza de um país e, mais à necessidade
de prestar contas à sociedade. Penso que a competição
política e o controle dos eleitores sobre o desempenho dos governos
tende a estimular pesquisas de avaliações das políticas
públicas. No Brasil, nós tivemos essa experiência.
O interesse pelos estudos de avaliação de políticas
cresceu tremendamente com a democratização e a competição
eleitoral.
ComCiência
- Quais os principais atores envolvidos na formulação e
implementação de políticas públicas no Brasil?
Qual o papel e contribuição desses atores para melhorar
a eficiência dessas políticas no país e como a participação
popular direta na avaliação pode contribuir para melhorar
o planejamento dessas políticas?
Arretche - Os atores envolvidos na formulação e implementação
de políticas variam enormemente de acordo com a política
em questão. Há políticas que envolvem um número
reduzido de atores, ao passo que outras, como é o caso da política
de saúde, por exemplo, envolve os três níveis de governo,
organismos internacionais, provedores privados de serviços, a indústria
farmacêutica e hospitalar, assim como seguradoras privadas. Somente
a análise de cada política particular pode listar os atores
envolvidos, seus papéis e sua importância para a avaliação.
Em algumas políticas, a participação popular tem
se revelado de enorme importância. Essa participação
pode ocorrer sob diversas formas, desde o preenchimento de questionários
de consulta sobre o grau de satisfação da população
com o serviço recebido até a organização de
grupos permanentes de avaliação do desempenho de uma dada
política.
ComCiência
- Como as diferenças regionais entre os estados brasileiros são
consideradas nas avaliações nacionais das políticas
públicas?
Arretche - Há uma tradição no Brasil de considerar
as diversidades regionais na avaliação de políticas.
Isto se deve às enormes disparidades que caracterizam as regiões
brasileiras. Entretanto, os estudos mais recentes têm revelado que
o recorte regional "esconde" desigualdades no interior das regiões
e a agregação analítica por regiões pode comprometer
a análise. Outros estudos, ainda, têm revelado que as políticas
e ações empreendidas pelos governos locais, dada sua autonomia
federativa pós-88, têm se revelado muito importantes. Há
governos locais em regiões muito pobres que têm revelado
um desempenho superior ao de governos locais em regiões mais ricas.
ComCiência
- Pensando no contexto político-econômico dos últimos
10 anos, qual o perfil que as políticas públicas brasileiras
vêm adquirindo? Quais são as perspectivas para o futuro?
Arretche- É muito difícil falar das políticas
públicas em geral. Em termos muito gerais, podemos dizer que há
fortes tendências no Brasil em direção à descentralização,
à participação do cidadão sob a forma de conselhos
os mais diversos, à introdução de mecanismos de parceria
com o setor privado, à privatização, à introdução
de mecanismos regulatórios estatais e assim por diante. Mas isso
é ainda muito genérico, pois varia de acordo com o tipo
de política. É mais difícil ainda falar de perspectivas
para o futuro. As tendências acima mencionadas não são
tendências universais, mas opções de governo. Isso
quer dizer que a alternância de governos, que é própria
às regras do jogo democrático, pode implicar uma reversão
dessas tendências num futuro próximo.
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