"Creio
que o setor espacial ainda não tem a prioridade que poderia e deveria
ter entre nós"
Conversamos
com o gaúcho José Monserrat Filho sobre a história da participação brasileira
em projetos e parcerias internacionais na área espacial. O prof. Monserrat
possui uma extensa experiência na área de direito espacial, tendo acompanhado
desde o início o projeto espacial brasileiro e assessorado a Agência
Espacial Brasileira em questões de relações espaciais. Mestre em
Direito, com especialização em Direito Internacional, pela Universidade
da Amizade dos Povos Patrice Lumumba (Moscou); estudou na Universidade
Internacional do Espaço e no Centro Europeu de Direito Espacial; é vice-presidente
da Sociedade Brasileira de Direito Aeroespacial (SBDA). Integrou como
consultor jurídico a delegação oficial do Brasil à III Conferência das
Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço Exterior (Unispace III),
realizada em Viena, em julho de 1998.
Além
de sua atuação nesta área, Monserrat Filho é jornalista profissional,
e editor do Jornal da Ciência e do JC
E-Mail, da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Com
Ciência - A pesquisa científica relacionada com o espaço tem sido
tradicionalmente conduzida pelos países desenvolvidos. O sr. acredita
que esta área tecnológica pode trazer benefícios sociais para os países
mais pobres?
José Monserrat Filho - A Era Espacial começou em 4 de outubro
de 1957 com o lançamento ao espaço do primeiro satélite feito pelo homem,
o Sputnik, da ex-União Soviética. A conquista do espaço, portanto, começou
há cerca de 44 anos. Neste período, é ainda relativamente muito pequeno
o número de países com capacidade para realizar atividades espaciais
e promover pesquisas científicas e tecnológicas sobre o espaço. Dá para
contar nos dedos os países com capacidade para efetuar lançamentos espaciais:
EUA, Rússia, França, China, Japão, Índia, Israel. O Brasil talvez venha
a ser o próximo, se a terceira tentativa de lançamento do VLS (Veículo
Lançador de Satélites) tiver êxito, este ano ou em 2002. Na realidade,
a maioria absoluta dos lançamentos é feita pelos EUA, França/Europa,
Rússia e China. O número de países que dominam a tecnologia de construir
satélites é um pouco maior, mas não muito; anda em torno de 20, e aí,
sim, entra o Brasil, que já produziu dois satélites de coleta de dados
(SCD-1 e SCD-2), postos em órbita pelo foguete norte-americano Pegasus,
da Orbital Sciences, e um satélite de sensoriamento remoto, em cooperação
com a China, o CBERS (Chinese-Brazilian Earth Resources Satellite),
lançado pelo foguete chinês Langa Marcha. Tem sido uma luta para fazer
com que os benefícios do sensoriamento remoto (observação da Terra),
por exemplo, cheguem à legião dos países em desenvolvimento, que certamente
muito ganhariam com isso. Ocorre que uma das coisas mais difíceis no
mundo de hoje é a transferência de tecnologia espacial. Assim, o homem
penetra no espaço deixando atrás de si um planeta dividido entre um
punhado de países que dominam a ciência e a tecnologia espaciais e os
outros, mais de 150, cada vez mais distantes dos novos conhecimentos
e técnicas dessa área estratégica
Com
Ciência - Quais seriam as aplicações mais interessantes deste
conhecimento para o Brasil?
Monserrat - Creio que os países pobres não deixarão de ser pobres
enquanto não gozarem dos benefícios das tecnologias espaciais e enquanto
não puderem participar de alguma forma das pesquisas científicas de
ponta, entre elas as que se defrontam com os caminhos e os enigmas do
Universo. As tecnologias espaciais permitem que os países tenham modernos
sistemas de comunicação, conheçam e administrem melhor suas riquezas
em todos os setores, e contem com competentes serviços de previsão do
tempo. O Brasil é um país de dimensões continentais e óbvia vocação
espacial. Impossível mapear, monitorar e aproveitar nosso vasto território,
nossa imensa costa e nosso variadíssimo patrimônio de recursos naturais,
de forma eficiente e sistemática, sem dados de satélite. Já fizemos
muito em diferentes áreas das ciências e das tecnologias espaciais.
Mas poderíamos ter feito muito mais. Formamos muita gente boa durante
décadas, algo excepcional, embora depois tenhamos perdido grande número
de especialistas e pesquisadores como resultado de uma política salarial
perversa. Creio que o setor espacial ainda não tem a prioridade que
poderia e deveria ter entre nós. Basta confrontar o Brasil e a Índia,
cujas atividades espaciais começaram juntas, no começo dos anos 60.
Hoje, a Índia está bem adiante de nós.
"A
órbita geoestacionária é um recurso valiosíssimo e limitado. Não
há lugar para todo mundo."
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Com
Ciência - Em artigo intitulado "A Luta pela Órbita Geoestacionária",
o sr. aborda a utilização de um recurso espacial (a órbita) e a forma
como este recurso foi repartido internacionalmente. O sr. menciona ainda
que o subcomitê jurídico espacial da ONU, em 31 de março de 2000, legislou
facilitando o acesso a esta órbita para países em desenvolvimento, após
muita mobilização e luta política. Como está esta discussão atualmente?
Que países em desenvolvimento contam com satélites na órbita geoestacionária?
Monserrat - De fato, os países em desenvolvimento conseguiram a
adoção de um princípio internacional que lhes reconhece o direito de
ter, pelo menos, uma vaga na órbita geoestacionária, a mais importante
sobretudo para os satélites de telecomunicações. A órbita geoestacionária
é um recurso valorosíssimo e limitado. Não há lugar para todo mundo.
Os melhores trechos da órbita estão cada vez mais congestionados. A
conquista jurídica dos países em desenvolvimento, por enquanto pelo
menos, tem pouco efeito prático. A maioria deles está ainda muito longe
de poder colocar um satélite na órbita geoestacionária. O que alguns
países pobres tem feito é negociar com empresas multinacionais, vendendo
a elas seu direito de acesso à órbita. Não era isso o que se tinha em
vista quando a luta por esse direito começou nos anos 70. Quanto aos
países em desenvolvimento que têm satélites na órbita geoestacionária,
não disponho da lista completa deles. Cito os que me ocorrem neste momento:
Brasil, México, Argentina, Índia, Indonésia, Tailândia, Malásia e a
Liga de Países Árabes. Mas os satélites destes países foram comprados
dos países desenvolvidos. De todos eles, apenas a Índia desenvolve seu
próprio satélite geoestacionário. A produção de satélites de telecomunicações
(que circulam na órbita geoestacionária) se concentra nos EUA e alguns
países da Europa. Os cinco satélites da Embratel já colocados na órbita
geoestacionária foram produzidos pela Hughes, EUA.
Com
Ciência - Em linhas gerais, qual a sua posição em relação à participação
brasileira no projeto Estação Espacial Internacional?
Monserrat - Ainda não estou convencido de que o Brasil terá vantagens
efetivas com o acordo bilateral concluído apressadamente com os EUA,
quando da rápida visita do presidente Clinton a Brasília em 1997. O
acordo nos abre uma pequena participação na Estação Espacial Internacional,
mas ainda não deu para ver o que vamos ganhar de fato com isso, além
do orgulho de proclamar que somos um dos 16 países envolvidos com o
megaprojeto. Continuo no aguardo de dados concretos e convincentes,
capazes de comprovar que fizemos um bom negócio. Aprecio o entusiasmo
de algumas pessoas envolvidas. Mas sigo a lição de São Tomé. Não posso
crer antes de ver.
Com
Ciência - A imprensa noticiou recentemente que a participação
brasileira na ISS está sendo revisada, e deverá custar mais caro do
que os 120 milhões de dólares inicialmente previstos. Como o sr. avalia
a relação custo-benefício desta empreitada?
Monserrat - A questão do custo-benefício da participação brasileira
na ISS é um convite a uma análise serena e objetiva. Creio que isso
ainda não foi feito com a necessária isenção e com uma visão larga de
todo o conjunto do programa espacial brasileiro. Mas um dia certamente
o será. Tenho a impressão de que fizemos o acordo com os EUA para participar
na ISS muito mais por razões e injunções políticas conjunturais - e
irresistíveis - do que como fruto de uma decisão amadurecida, tomada
a partir de avaliação profunda, com perspectiva de mais longo prazo.
Gostaria que me provassem o contrário, que não houve improvisação no
caso.
"Só
vale a pena engolir o sapo que o acordo em pauta representa se
verdadeiramente estamos dispostos a imprimir muito mais dinamismo
aos nossos objetivos espaciais."
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Com
Ciência - O acordo Brasil-EUA de utilização do Centro de Lançamentos
de Alcântara (CLA) prevê algumas cláusulas de duvidoso interesse para
o Brasil. Uma delas é a que impede o Brasil de utilizar recursos obtidos
com os lançamentos em seus próprios projetos de desenvolvimento de lançadores.
Qual a opinião do sr., como jurista, a respeito deste acordo? Não teria
sido possível negociar um acordo mais vantajoso ao Brasil?
Monserrat - O acordo foi concluído por insistência do Brasil. Para
os EUA, essa história de um país em desenvolvimento como o Brasil chegar
muito perto das tecnologias de foguetes e satélites é sempre uma preocupação
exasperante. O Brasil entrou para o Regime de Controle de Tecnologia
de Mísseis (MTCR) e criou toda a legislação necessária ao mais rigoroso
controle da exportação de equipamentos sensíveis (de uso duplo, civil
e militar, como são as tecnologias espaciais). Fizemos o nosso dever
de casa para podermos ser considerados confiáveis. Pois mesmo assim
a confiança não veio na medida esperada e certamente merecida. O acordo
de salvaguardas tecnológicas para o uso dos serviços do Centro de Lançamento
de Alcântara por empresas norte-americanas é duro demais. O Brasil é
tratado como país suspeito. Na realidade, o Brasil estava em posição
negociadora muito fraca. A iniciativa do acordo era nossa, o interesse
era praticamente só nosso. Ocorre que para conseguir colocar o Centro
de Alcântara no mercado mundial de lançamentos comerciais, hoje em grande
parte oligopolizado, o Brasil tem de contar com o apoio dos EUA, ou
pelo menos com sua não-oposição. Caso contrário, não recebe o sinal
verde para entrar nesse mercado fechado, onde a livre concorrência ainda
é um sonho impossível. Considerando todo esse contexto adverso, parece-me
que o Brasil conseguiu romper o bloqueio ao levar os EUA a assinar um
acordo, mesmo considerando a severidade excessiva de algumas de suas
cláusulas. Uma delas é a de que o Brasil não poderá aplicar no desenvolvimento
de seus foguetes os recursos ganhos com o lançamento de veículos ou
satélites de empresas norte-americanas. Essa cláusula tinha de constar
obrigatoriamente do acordo para atender a uma diretriz política fixada
há anos pelo governo dos EUA. Sem essa cláusula os EUA não assinariam
o acordo. Na realidade, porém, é uma cláusula inócua. Como provar que
o dinheiro pago por uma empresa norte-americana, depositado no Tesouro
brasileiro, beneficiou justamente o nosso VLS? A questão é que, se não
assinássemos o acordo, apesar dos termos em que está, os maiores prejudicados,
a meu ver, seríamos nós mesmos. Mais tempo teríamos de esperar para
entrar no negócio de lançamentos comerciais que movimenta muito dinheiro
e que tende a crescer cada vez mais. Acho que já perdemos muito tempo
e devemos agora atuar com muito mais determinação e agressividade para
vender as vantagens de Alcântara como opção realmente competitiva no
mercado mundial. Isso poderá trazer mais recursos e mais experiência
para todo o nosso programa espacial, que, por sua vez, precisa ganhar
mais ímpeto. Aliás, só vale a pena engolir o sapo que o acordo em pauta
representa se verdadeiramente estamos dispostos a imprimir muito mais
dinamismo aos nossos objetivos espaciais.
Com
Ciência - O sr. discute, em artigo intitulado "Non paper, Alcântara
e Direito Espacial", que os EUA teriam se oposto à conclusão de um acordo
entre o Brasil e a empresa italiana Fiat Avio para utilização da Base
de Alcântara. Qual teria sido o interesse americano ao se posicionar
neste assunto? Não seria um contra-senso, este mesmo país agora estar
interessado em utilizar a Base brasileira?
Monserrat - Aqui é necessário esclarecer os fatos. Foi justamente
o bloqueio dos EUA ao acordo que o Brasil estava negociando com a Itália
(Fiat Avio) e com a Ucrânia (para o lançamento em Alcântara de satélites
de uma empresa norte-americana) que levou o Brasil a empenhar-se junto
ao governo dos EUA para concluir um acordo de salvaguardas tecnológicas
para o uso dos serviços de Alcântara por empresas norte-americanas.
Foi exatamente o referido bloqueio que mostrou ao governo brasileiro
a necessidade indispensável e urgente de, antes, lograr um acordo com
os EUA, pois isso abriria a possibilidade de outros acordos. Agora,
feito o acordo com os EUA, o negócio com a empresa italiana e com duas
empresas da Ucrânia (donas dos foguetes Ciclon, a serem lançados de
Alcântara) poderá chegar a bom termo. Sem o acordo com os EUA isso seria
impossível.
Com
Ciência - O programa espacial brasileiro tem dado ênfase ao sensoriamento
remoto do território nacional - notadamente a Amazônia - e a construção
de satélites de comunicação. Algumas tentativas foram feitas para desenvolver
lançadores, como os VLS's, mas ainda com resultados insatisfatórios.
Excluindo-se a questão da participação na ISS, quais são as principais
críticas que podem ser feitas ao encaminhamento dado a este programa?
Que aspectos o sr. considera mais discutíveis?
Monserrat - Convém esclarecer que o Brasil ainda não tem um projeto
aprovado para a construção de um satélite de comunicação. Isso é lamentável,
mas é verdade. Creio que o principal tema a ser discutido sobre o programa
espacial brasileiro é se estamos aproveitando devidamente nosso grande
potencial nesta área. Tenho a impressão de que ainda não andamos com
a agilidade que as atividades espaciais impõem cada vez mais, sobretudo
na época atual de intensa comercialização dessas atividades. Aqui, quem
menos corre, voa. E nosso ritmo não prima pela velocidade. Melhoramos
bastante nos dois últimos anos. Criaram-se algumas expectativas animadoras.
Mas o programa espacial brasileiro ainda não é uma real prioridade do
governo.
Com
Ciência - Robert Park - físico americano - publicou um livro recentemente
(Voodoo Science: the road from foolishness to fraud), onde dedica
um capítulo inteiro a questionar o projeto ISS, classificando-o como
político, mais do que científico. Ele cita inclusive que o projeto esteve
muito próximo de ser abandonado durante uma votação no Congresso Americano,
permanecendo por apenas um voto de diferença. O sr. considera que a
conclusão da estação espacial seja muito dependente da política interna
americana, e consequentemente, um investimento de risco para os outros
países? Como o sr. enxerga o projeto ISS, como um todo?
Monserrat - Alguém já chamou a ISS de o elefante branco do espaço.
Pode custar mais de 100 bilhões de dólares. Apesar desse preço desconcertante
e até hoje não desautorizado, a ISS ainda não logrou demonstrar à comunidade
científica tanto dos EUA como da Europa que ela trará resultados compensadores.
Estou entre aqueles que acreditam que os 100 bilhões de dólares seriam
muito melhor empregados se fossem investidos no retorno à Lua, para
ali se estabelecer o primeiro laboratório de pesquisa da humanidade
em outro corpo celeste. A ISS parece ser um excelente negócio para as
empresas contratadas, que terão garantidas gigantescas encomendas pelo
menos para os próximos dez anos. Os interesses industriais e comerciais
são de tal monta que o exame crítico do projeto fica literalmente soterrado.
Não por acaso, a quase totalidade do material que se lê e vê na mídia
a respeito da ISS é pura e simples propaganda.
Com
Ciência - Qual a opinião do sr. a respeito da parceria Brasil-China
na área espacial? É possível dizer que estes dois países estão na dianteira
da pesquisa espacial entre os subdesenvolvidos? Qual seriam as vantagens
destes avanços para o resto do mundo em desenvolvimento?
Monserrat - A cooperação espacial Brasil-China é a primeira grande
experiência neste campo entre países em desenvolvimento. É um exemplo
marcante para todos os países do Terceiro Mundo. Um protótipo emblemático
da colaboração Sul-Sul em área de alta tecnologia. Por isso mesmo já
houve quem quisesse acabar com esse programa. Felizmente, houve também
quem soube resistir, e as pressões destrutivas foram vencidas. No programa
sino-brasileiro, ambas as partes são protagonistas e trabalham com tecnologias
avançadas. Isso nos permite ter uma posição invejável no universo do
sensoriamento remoto. Pode haver vantagem maior do que essa?
Com
Ciência - Quais são os principais assuntos e polêmicas a serem
tratados pelo Direito Espacial, nos próximos anos, particularmente pela
SBDA e pelo Brasil? É possível dizer que o ambiente para a utilização
do espaço pelos países em desenvolvimento melhorou, desde a guerra fria
até o presente?
Monserrat - Não, o ambiente para um maior uso do espaço por parte
dos países em desenvolvimento não melhorou depois do fim da Guerra Fria.
Temo até que tenha piorado, posto que piorou a posição e diminuiu a
influência política dos países em desenvolvimento. Hoje vivemos o processo
de comercialização e privatização das atividades espaciais. Isso, tudo
indica, intensifica e diversifica as atividades espaciais, mas também
concentra nas mãos de alguns poucos países e algumas poucas empresas.
O uso e a exploração do espaço devem ser realizados exclusivamente para
o bem e o interesse de todos os países, de toda a humanidade. É o princípio
do bem comum, lavrado no artigo 1º do Tratado do Espaço de 1967, o principal
código das atividades espaciais em plena vigência. Como harmonizar esse
princípio humanista com o mero jogo do mercado que está se estendendo
pelo espaço? Como garantir a preservação do espaço como patrimônio comum
da humanidade? Como levar as atividades espaciais a conterem e depois
reduzirem o distanciamento crescente entre os países desenvolvidos e
os subdesenvolvidos? Como estabelecer sistemas e programas espaciais
que não só dêem lucro como também beneficiem todos os países, indistintamente?
Por outro lado, surge o temor da militarização completa do espaço, com
a colocação de armas em órbita, algo que nunca aconteceu, nem nos piores
tempos da Guerra Fria. O novo governo dos EUA já reiterou sua disposição
de implantar o sistema de defesa antimíssil, que poderá provocar uma
corrida armamentista no espaço, como nunca se viu antes. É preciso fechar
o espaço para a instalação de armas super modernas que o transformará
em teatro de guerra. Esses são alguns dos grandes problemas político-jurídicos
que hoje desafiam a comunidade internacional e que serão temas de muitas
discussões onde quer que se queira olhar de frente a realidade atual
do nosso planeta e suas tendências mais deletérias.
Quanto
às artividades da Sociedade Brasileira de Direito Aeroespacial (SBDA),
acho importante informar que essa veterana e respeitada instituição,
com 50 anos de existência, tem hoje um ativo Núcleo de Estudos de Direito
Espacial, que é único no país e que tem realizado estudos e debates
em torno dos problemas de especial interesse para o Brasil. Uma de suas
mais relevantes contribuições foi o ante-projeto de lei de regulamentação
do funcionamento do Centro de Lançamento de Alcântara, que se lança
ao mercado mundial de lançamentos comerciais como alternativa econômica
e altamente competitiva. Neste momento, o Núcleo examina a questão da
definição de Estado Lançador, tema de um grupo de trabalho especial
do Subcomitê Jurídico do Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico
do Espaço (Copuos), o fórum da ONU que cuida das questões espaciais.
O exame do conceito de Estado Lançador é de grande atualidade, em virtude
do processo de comercialização e privatização das atividades espaciais.
Para quem quiser conhecer melhor o trabalho da SBDA, deixo aqui o site
da entidade: http://www.sbda.org.br.
Com
Ciência - A utilização do espaço pelo ser humano e as viagens
espaciais sempre foram tema de grande entusiasmo para o público em geral.
O sr. considera satisfatória a divulgação pelo jornalismo científico
brasileiro, deste tema?
Monserrat - Parece-me ausente uma visão analítica e crítica dos
fatos e notícias relacionados com as atividades espaciais. O público
em geral está acostumado apenas com os aspectos espetaculares e emocionantes
do que o homem vem realizando no espaço. Falta mostrar os bastidores,
o jogo de interesses subalternos, a manipulação do lobby milionário,
a concentração de renda e poder, as manobras e o custo do militarismo
imperial, o desprezo aos direitos e deveres democráticos, comprometidos
e solidários com os interesses fundamentais da espécie humana. É preciso
democratizar o espaço, assim como é preciso democratizar a Terra, as
relações entre os países, as relações entre os povos e as pessoas. O
espaço é a maior expressão de abertura, de liberdade, de transparência,
de conquista para todos, sem exceção. Isso deve ser discutido a cada
passo e diante de cada projeto espacial.